Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao curso de Direito da Universidade Brasil, para obtenção de título de bacharel em Direito. Área de Concentração: Direito Penal. Orientador: Prof.Me. Ademir Gasques Sanches e Prof.Me. Marcia Kazume Pereira Sato.
RESUMO: O presente artigo tem por objetivo o estudo da violência sexual praticadas contra crianças e adolescentes, protegidas juridicamente e socialmente por conta da fragilidade e inocência. Necessário, inicialmente, trazer à baila conceitos e definições legais da violência, além das diversas formas em que é praticada, tanto em ambiente familiar, como no extrafamiliar, por familiares, amigos, conhecidos ou profissionais, todos com uma semelhança essencial: a confiança que emprega na vítima menor. Por fim, necessário demonstrar a importância da denúncia, seja pela família, seja por pessoas próximas, que também possuem papel extremamente relevante no tocante ao acompanhamento e cuidado pós violência, que, por muitas das vezes, deixam marcas permanentes.
Palavras-Chave: abuso sexual, violência sexual infantil, criança, adolescente.
ABSTRACT: This article aims to study sexual violence against children and adolescents, legally and socially protected due to fragility and innocence. Initially, it is necessary to bring up concepts and legal definitions of violence, in addition to the various ways in which it is practiced, both in the family environment and outside the family, by family, friends, acquaintances or professionals, but with an essential similarity: the trust that employs the minor victim. Finally, it is necessary to demonstrate the importance of the complaint, whether by the family or by close people, who also play an extremely relevant role in post-violence monitoring and care, which often leave permanent marks.
KEYWORDS: sexual abuse, child sexual violence, child, adolescent.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2.ABUSO SEXUAL INFANTIL: CONCEITO E DEFINIÇÕES LEGAIS. 3.O ABUSO SEXUAL INTRA E EXTRAFAMILIAR. 4.DENÚNCIA: O TRABALHO E ATENDIMENTO DOS PROFISSIONAIS. 5.CONCLUSÃO.
Embora difícil e revoltante, a violência sexual praticada contra criança e adolescente é um problema vivenciado diariamente pelo mundo. Dia a dia, é possível descobrir casos em que um menor de idade é tragicamente violado, tanto fisicamente, como psicologicamente, e pior, de forma silenciosa e dissimulada.
Trata-se, deste modo, de um problema que acomete ambos os sexos e não costuma obedecer a nenhuma regra como nível social, econômico, religioso ou cultural.
É amplo os modos em que as atividades sexuais em crianças e adolescentes é praticada, em que pode ou não haver contato físico, porém todas com a intenção de satisfazer o desejo sexual de outro. Qualquer seja o indivíduo que insira um menor nas suas práticas sexuais, sendo dentro ou fora do âmbito familiar, pratica o abuso sexual infantil.
Segundo a psicóloga Elaine Ribeiro dos Santos, da Universidade de São Paulo, não é em todos os casos que se consegue identificar os sinais físicos da agressão, o que gera a dificuldade de sua identificação. Ocorre, também, que em muitos casos os abusos decorrem em constantes ameaças, de modo a causar o medo da vítima em denunciar. Diante de toda a situação vivenciada, é natural que a criança comece a produzir alterações comportamentais e emocionais, como o medo- o mais frequente - depressão, retração, choro frequente, dentre tantos outros problemas que podem variar de vítima para vítima. Estes, são os sinais mais visíveis, que podem ajudar, e muito, na busca pela descoberta da violência.
Dependendo do tipo de violência praticada, do tempo entre o abuso e a descoberta, sem a existência de vestígios do ato sexual, confirmação nenhuma subsiste de forma a comprovação da violência, pois pelo exame pericial não existirá como prova completa e suficiente do delito praticado. Por se tratar de um ato ilícito, praticado as escondidas, raramente havendo testemunhas, resta somente a palavra da criança ou adolescente vítima como prova.
Embora a proteção infantil seja assegurada em lei, sabe-se não é só por ela que todo o contexto do abuso sexual infantil deve decair. É necessário um estudo social, familiar e psicológico da situação como um todo, visto tratar-se de um assunto extremamente delicado e preocupante, já que as vítimas são aquelas que mais merecem atenção social dentro de todo contexto.
2. ABUSO SEXUAL INFANTIL: CONCEITO E DEFINIÇÕES LEGAIS
Azevedo e Guerra assim conceituam violência sexual:
todo o ato ou jogo sexual, relação heterossexual ou homossexual entre um ou mais adultos e uma criança menor de 18 anos, tendo por finalidade estimular sexualmente esta criança ou utilizá-la para obter estimulação sexual sobre sua pessoa ou de outra pessoa (AZEVEDO & GUERRA, 1989, p. 42).
Tal conceito apresenta a dificuldade de um tema que engloba uma infinidade de questões, sejam elas sexuais, sociais, psicológicas, legais e outras mais.
Socialmente, sabemos que uma criança ainda não tem todo o preparo psicológico e nem físico para opor resistência a atos que socialmente e juridicamente são caracterizados como errôneos. Mais difícil ainda quando a violência é praticada por alguém que ela é afetivamente dependente.
São diversas as modalidades de abuso sexual cometidas contra crianças e adolescentes, que, por sua vez, apresentam também formas de expressão que ultrapassam a violência física e psicológica. A variar de cada situação, a forma do abuso pode ter caráter tão mais impactante do que a relação sexual em si.
Dentre as várias formas de abuso, tem-se: a exploração sexual, voyeurismo, o exibicionismo, os telefonemas obscenos, abuso sexual verbal, exposição de vídeos pornográficos, e até mesmo o sadismo.
Tem-se por abuso sexual o ato em que se manipula da criança ou adolescente para fins de gratificação sexual de um maior de idade, através de um estado de poder que inclui diversas formas de abuso, como os já descritos acima, contendo ou não o ato de violência. Forçar uma criança ou adolescente a tomar parte em atividades sexuais, estando ou não em consciência do que acontece. O ato pode englobar não só o contato físico, como também, atos não-penetrantes e penetrantes. Pode, ainda, haver atividades sem contato, como levar o menor a presenciar ou produzir material pornográfico ou assistir atividades sexuais e encoraja-lo a maneiras sexualmente inapropriadas.
Trata-se de violência absoluta as condutas sexuais praticadas com menores de 14 (quatorze) anos, sendo irrelevante o consentimento ou não para a ação, de modo que não reflete no sistema jurídico penal tal condição. Observa-se, aqui, que o legislador busca proteger a criança e adolescente de qualquer ação que possa lhe prejudicar, mesmo que indiretamente. O crime resta consumado quando o agente mantém ato libidinoso ou conjunção carnal com menor de 14 (quatorze) anos, ou seja, o vulnerável.
Considera-se como vulnerável todo aquele que seja desprotegido, exposto, desarmado, indefeso e derrotável pela fragilidade que possui ou pela falta de conhecimento e discernimento necessário que ainda não possui diante da pouca idade.
Assim disciplina o Código Penal acerca dos crimes sexuais praticados contra menores de idade:
Art. 217-A: Estupro de vulnerável
Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14(catorze) anos:
Pena – reclusão, de 8 a (oito) a 15 (quinze) anos.
§1° Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
§ Vetado
§3° Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:
Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.
§4° Se da conduta resulta morte:
Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.
Art.218: Corrupção de menores;
Induzir alguém menor de 14 (catorze) anos a satisfazer a lascívia de outrem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos.
Art.218-A: Satisfação de lascívia mediante presença de criança ou adolescente;
Praticar, na presença de alguém menor de 14 (catorze) anos, ou induzi-lo a presenciar, conjunção carnal ou outro ato libidinoso, a fim de satisfazer lascívia própria ou de outrem:
Pena – reclusão, de (dois) a (quatro) anos.
Art.218-B: Favorecimento da prostituição ou de outra forma de exploração sexual de criança ou adolescente ou de vulnerável.
Submeter, induzir ou atrair a prostituição ou outra forma de exploração sexual alguém menor de 18 (dezoito) anos ou que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, facilita-la, impedir ou dificultar que a abandone:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) anos a 10 (dez) anos.
O estudo em questão aborda um tema extremamente delicado, já que o abuso sexual tem consequências diretas em crianças e adolescentes, sejam eles permanentes, sejam eles passageiros, dentre os aspectos emocionais, comportamentais, interpessoais, cognitivos, sexuais e físicos.
Muito embora em muitos casos não haja a violência concreta, não afasta a perturbação psicológica vivenciada pelo menor. Qualquer ato de abuso sexual provoca marcas significativas, além comprometer o desenvolvimento. Ainda mais quando corriqueiro os abusos, esses podem agravar, e muito mais, o progresso da vida de um jovem.
A Constituição Federal de 1988, a lei das leis, adverte e protege o menor, senão vejamos:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
[...]
§ 4º. A lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
O artigo 227 nos chama a agirmos na defesa e promoção dos direitos de todas as crianças: da criança desconhecida, mas que sofre os abusos da violência diária em suas casas, mas sobrevivente em um cenário concreto e visível de violações de seus direitos e desrespeito a sua condição de vulnerabilidade e de indivíduo em desenvolvimento.
Além disso, resta também protegido o jovem nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente. Dispõe em seu Artigo 5º:
[...] nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais.
Ademais, também nos artigos 240 e 241 dispõe a lei:
[…] o ato de produzir ou dirigir representação teatral, televisiva ou película cinematográfica, utilizando-se de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica, assim como de fotografar ou publicar cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança e adolescente.
Embora assegurados, e até mesmo obvio tal proteção, observa-se que as concretizações dos seus direitos ainda parecem um tanto distantes. Os noticiários, jornais, e os meios de comunicação jogam dia a dia o abuso e a exploração sexual infantil, que, por sua vez, atingem índices assombrosos e alarmantes dia a dia.
3. O ABUSO SEXUAL INTRA E EXTRAFAMILIAR
O abuso sexual pode ser classificado em duas categorias: intrafamiliar e extrafamiliar.
O abuso sexual intrafamiliar ocorre dentro do ambiente do convívio familiar, e é executado justamente por um membro da família: sendo o pai, mãe, avo, avó, tio, tia, padrastos e madrastas e até os irmãos. Em alguns casos, envolve não só abusador e abusado, mas, de forma direta ou indireta, todos os membros da família, pela participação ativa no crime, ou, até mesmo pela omissão, o silencio.Já o abuso sexual extrafamiliar acontece fora do âmbito familiar e, normalmente, é praticado por pessoas que possuem algum vínculo afetivo com a criança, de forma a conquista-la. Pode, inclusive, desenvolver-se na própria residência da vítima, de modo que as denúncias podem partir da família.
No tocante as razões da violência sexual, tem-se que o primeiro deles é o abuso de poder: a figura de um maior de idade, adulto, que possui mais desenvolvimento físico e psicológico, capaz de dominar a mente e o físico de uma criança ou de um adolescente. Pode ainda ser em razão dos traços de personalidade do agressor.
Neste sentido, afirma Santos (1998):
“[…] estados psicóticos ou perversos, depressão, baixo controle dos impulsos, problemas neurológicos, baixa tolerância ao stress, bem como o uso de álcool e outras drogas são fatores relevantes para a compreensão desse problema” (SANTOS, 1998, p. 21).
Em vários casos, o abusador reconhece a gravidade do seu ato e tamanho o erro, e que tal justamente constitui na violação de um dispositivo legal, ou seja, sabe que é crime. Sabe, ademais, que o abuso prejudica o menor, mas o intento de satisfazer sua própria lascívia torna-se maior. Para o agressor o abuso constitui um alívio de tensão que o conduz à compulsão e, consequentemente, à repetição, fazendo-o dependente.
O que mais preocupa nos casos de abuso sexual é que, na maioria dos casos, as vítimas convivem muito frequentemente com o risco. A situação de risco, neste caso, é compreendida pelo conjunto de eventos negativos presentes na vida da pessoa em desenvolvimento e que aumentam diretamente na probabilidade de surgirem problemas físicos, sociais e emocionais.
No caso da violência intrafamiliar, as pessoas não precisam sair de casa, pois “elas presenciam diariamente, em seu ambiente familiar, os atos violentos e hostis que, certamente, agem contra a sua natureza e têm influência deletéria em seu desenvolvimento” (KOLLER & DI ANTONI, 2004, p. 294). Para contrapor-se aos mecanismos de risco que esta grave questão suscita, é preciso gerar fatores de proteção que transformem esta situação. Se a família é responsável por expor a criança à violência, cabe aos demais microssistemas que formam a rede de atendimento social, por exemplo, a escola, atuar de forma protetiva para impedir que o abuso perdure.
Nas palavras de Bitencourt (2013, p. 94):
O abuso sexual intrafamiliar é um dos temas mais sensíveis da realidade social e criminal nos tempos atuais, principalmente porque se sabe que as consequências para as crianças e os adolescentes abusados sexualmente são perenes, colocando em risco o equilíbrio biopsicossocial para o resto de suas vidas.
Ainda, quanto a jurisprudência, importante trazer à baila:
APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL EM CONTINUIDADE DELITIVA. ART. 217-A, CAPUT, C/C ART. 226, INC. II, E ART. 71, CAPUT, TODOS DO CÓDIGO PENAL. SATISFAÇÃO DA LASCÍVIA MEDIANTE PRESENÇA DE CRIANÇA E OU ADOLESCENTE. ART. 218-A, C/C ART. 226, INC. II, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. VIAS DE FATO. DUAS VEZES. ART. 21 DO DECRETO-LEI Nº 3.688/41. PRELIMINAR DE REVOGAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA AFASTADA. EXISTÊNCIA DOS FATOS E AUTORIA COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA ENTRE O 3º E 4º FATOS. BASILARES REDUZIDAS. APENAMENTO REDIMENSIONADO. 1. Considerando que o réu respondeu o processo preso, não se mostra admissível que, após a prolação de sentença condenatória e em se tratando de pena alta, venha a ser beneficiado com a liberdade provisória, até porque mantidos os requisitos autorizadores da segregação. Preliminar afastada. 2. As provas produzidas no presente feito são robustas e autorizam a manutenção do decreto condenatório pela prática dos delitos descritos na denúncia, não sendo o caso de absolvição. No caso, o acusado (com 43 anos de idade à época dos fatos) abusou sexualmente da sua enteada (de 11 anos de idade), resultando, inclusive, em uma gravidez. Além disso, E. manteve relações sexuais na presença de criança (irmã... da vítima do 1º fato) e praticou vias de fato contra sua companheira e contra a enteada (vítima do 1º fato). Delitos comprovados pelas falas das vítimas e das testemunhas. 3. A existência de um suposto relacionamento amoroso e o consentimento da vítima (1º fato) não afastam a responsabilidade criminal do réu pela prática do crime de estupro de vulnerável, nos termos da Súmula 593 do STJ. Além disso, restou demonstrado nos autos o elemento subjetivo referente ao delito previsto no art. 218-A do Código Penal (2º fato). 4. Estupro de vulnerável. Basilar reduzida para 09 anos de reclusão, em virtude do afastamento das vetoriais culpabilidade e circunstâncias do delito (mantida a valoração das consequências). Na segunda fase, ausentes agravantes e atenuantes. Na terceira fase, pela presença da majorante do art. 226, inc. II, do Código Penal, confirmado o aumento da pena em ½. Pela continuidade delitiva, considerando que os abusos ocorreram em diversas oportunidades, confirmado o aumento da pena em 2/3. Pena definitiva redimensionada para 22 anos e 06 meses de reclusão. Satisfação da Lascívia. Basilar reduzida para 02 anos e 04 meses de reclusão, em virtude do afastamento das vetoriais culpabilidade e circunstâncias do delito (mantida a valoração das consequências). Na segunda... fase, ausentes agravantes e atenuantes. Na terceira fase, pela presença da majorante do art. 226, inc. II, do Código Penal, confirmado o aumento da pena em ½. Pena definitiva redimensionada para 03 anos e 06 meses de reclusão. Vias de fato. Basilares confirmadas no mínimo legal (15 dias). Na segunda fase, mantida a agravante do art. 61, inc. II, f , do Código Penal, e o aumento das penas em 15 dias. Ausentes outras causas modificadoras, confirmada a pena definitiva de cada fato em 01 mês de prisão simples. Concurso material. Pelo concurso material (art. 69 do Código Penal), ficam estabelecidas as penas do acusado em 26anos de reclusão e 02 meses de prisão simples. Mantido o regimefechado, nos termos do art. 33, § 2º, a, do Código Penal. Inviável asubstituição da pena privativa de liberdade por pena restritiva dedireitos, nos termos do art. 44 do Código Penal. PRELIMINARREJEITADA. MÉRITO PARCIALMENTE PROVIDO. (BRASIL, 2018)
Mesmo diante das diversas formas de abuso a que nos deparamos pelo dia a dia, ainda é espantoso a própria violência em si.
O abuso sexual extrafamiliar sobrevém fora do ambiente familiar e, em grande parte dos casos, o autor é aquele que também tem um vínculo de confiança com o menor: amigos da família, profissionais da saúde, professores, dirigentes espirituais, ou até mesmo os empregados.
Outrossim, pode acontecer ainda em instituições sociais, responsáveis pelo cuidado e proteção do menor.
A ofensa pode, por fim, partir de um agente desconhecido pela criança. Na mídia, vemos diariamente casos em que adolescentes são aliciados por maiores de idade, com falsas amizades ou até mesmo um relacionamento amoroso iniciado em salas bate papo da web, redes sociais e afins. Nestes aplicativos, os abusadores criam uma imagem diversa do real, sempre com assuntos diferentes, de modo a atrair a atenção e confiança da vítima. E é a partir desta certeza que mora o perigo. Desde fotos intimas enviadas, até encontros marcados que podem gerar o ato sexual consumado forçado, são várias as formas de exploração e abuso sexual infantil.
4. DENÚNCIA: O TRABALHO E ATENDIMENTO DOS PROFISSIONAIS
A denúncia em casos de violência é de suma importância. Isto porque sabe-se que muitos jovens, no decorrer do abuso, sofrem não só a dor e o trauma da exposição sexual, mas também asagressões físicas, verbais, e em grande maioria dos casos as ameaças constantes do agressor. Tem-se, portanto, que denunciar é garantir o absoluto sentido de proteção e preservação da vida e da integridade dos envolvidos.
A denúncia ou notificação de uma situação de abuso sexual em qualquer situação, compreendem ações que não dependem de atitudes isoladas. É necessário haver uma ligação e colaboração de um conjunto de fatores que agrupam a rede de apoio social dos envolvidos, seja a criança, o adolescente e ou a família. Contudo, mais importante ainda, envolve a participação de pessoas chave, que precisam estar devidamente preparadas para reconhecer os indícios de uma prática abusiva.
É necessário, ainda, frisar que se trata de uma modalidade de violência que pode marcar profundamente o desenvolvimento da vítima, de modo que exige urgência no tocante a intervenção, seja ela familiar ou não.
Aliás, é um papel não só familiar, porém social. Trata-se de vidas precoces e sem o devido discernimento para o certo e o errado, além do fato de serem indefesos, sem possibilidade nenhuma de defesa, ficando à mercê do abusador.
Presume-se, contudo, que os dados das estatísticas podem ainda estar baixos. Isto pois muito se vê a omissão das vítimas, pelo medo e a vergonha, constantes e consequentes da violência causada externa e internamente.
A omissão, por muitas das vezes, decorre do medo. O medo de sofrer retaliações, o medo de sua família sofrer, o medo de enfrentar a sociedade, o medo de ser tachada como culpadas. Por isso tão difícil sentirem confiança para relatar um abuso.
Os agressores, por sua vez, utilizam-se dos meios mais cruéis e ameaçadores já existentes, ou ainda através da alienação, trazendo a culpa para o lado mais fraco do polo: a vítima. Cria-se, assim, uma eterna confusão na mente precoce do menor, impedindo a procura da ajuda.
Tabajaski, Paiva e Visnievski, explicam:
Essa confusão muitas vezes é reforçada pelas ameaças do abusador, que frequentemente afirma que a criança será responsável pelas consequências que possam ocorrer caso ela rompa com o silêncio, revelando a situação abusiva. Assim, os sentimentos de culpa pela ocorrência do abuso, associados ao medo de ser responsabilizada por danos potenciais decorrentes da revelação, contribuem para a manutenção da situação abusiva e perpetuação do silêncio. (TABAJASKI,PAIVA EVISNIEVSKI, 2010, P. 59).
Na grande maioria dos casos, o abuso dura por muito tempo, visto que abusador se utiliza das constantes ameaças para fortalecer o sigilo da criança, consequência da repetição das situações abusivas.
O amparo familiar juntamente com a criança ou adolescente é importantíssimo no caso concreto. Na maioria dos casos são as mães/avós que são as mais presentes para dar o colo e proteção para a criança, pois é ela quem precisa aprender a lidar com a situação do abuso sofrido pela vítima. Se a reação do protetor for negativa, esta pode ser mais danosa do que a própria violência. Por se tratar de uma situação muito difícil em que ninguém sabe lidar e nem imagina como se passar, os familiares da criança vítima precisam também de apoio e orientação.
É na família que a criança conseguirá a força necessária para seguir construindo a vida, de afagar a tristeza profunda e contribuir para o processo criminal contra o violentador. Nesses casos, o depoimento da vítima é a prova mais robusta da ação penal, já que não há testemunhas e em alguns casos, nem mesmo prova material.
É por esse motivo que é fundamental conter todo um acompanhamento psicológico, psicossocial, amparando a vítima e dando suporte para que consiga contribuir para a produção da prova, além do mais importante, é claro, desenvolver-se e tratar o trauma sofrido.
Em último caso, porém, há a possibilidade de acolhimento pelo serviço social local. Esse acolhimento pode acontecer por meio de abrigos ou famílias acolhedoras (provisórias), as adoções também podem ser intermediadas pelo Poder Judiciário.
O presente estudo teve por objetivo trazer à tona a grave problemática da violência sexual sofrida por crianças e adolescentes, além das consequências do abuso, não só de conjuntura física, mas psicológica, talvez, inclusive, a pior. Ademais, buscou-se demonstrar o papel primordial dos profissionais e familiares na busca pela solução do problema.
Dentre as maiores dificuldades, a denúncia. Muitas das vezes, o ato ocorre dentro do próprio ambiente familiar, com um longo histórico de ameaças e, consequentemente, o receio e sentimento de culpa por parte da vítima, que se vê só, fragilizada, e com imensuráveis pressões.
As constatações são árduas, duras e até mesmo cruéis. Além da vítima, outras são os personagens diretos dos atos praticados pelo abusador, como família e amigos. A todos recaem as difíceis consequências.
Contudo, é fundamental que todos estejam diretamente ligados na busca pela solução do problema. Necessário, pois, retirar o véu do preconceito, encarar o fato de frente e compreender que é preciso um longo trabalho para que a vítima possa sentir-se protegida e consiga, doravante, prosseguir no seu desenvolvimento social, físico e psicológico.
De um outro lado, recorrer a esforços por parte dos poderes públicos e privados, como conselho tutelar, profissionais da saúde e da educação, Ministério Público e ter um elo entre os familiares da vítima e a sociedade, ajudam na identificação e no processo do combate ao abuso sexual.
Embora expressamente previsto em lei, é um dever social a proteção dos direitos da criança e do adolescente. É, portanto, imprescindível, a atuação conjunta do Estado e de toda a sociedade a fim de garantir à eles o necessário para um crescimento digno e saudável.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AZEVEDO, M. A.; GUERRA, V. N. A. Pele de asno não é só história... um estudo sobre a vitimização sexual de crianças e adolescentes em família. São Paulo: Rocca, 1998.
BITENCOURT, C.R. Tratado de Direito Penal. Parte Especial 4 - Dos crimes contra a dignidade sexual até dos crimes contra a fé pública. 7ª. Ed. São Paulo: Saraiva,2013, p. 94-97.
BRASIL. Constituição da república Federativa do Brasil 1988. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em 14 de outubro de 2019.
BRASIL. Lei n.º 2.048, de 07 de Dezembro de 1940: Código Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm. Acesso em 14 de outubro de 2019.
BRASIL. Lei nº 8.036/90, de 13 de julho de 1990: Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Disponível em: <http://www.presidencia.gov.br. Acesso em 14 de outubro de 2019.
SANTOS, B. C., et alii. Maus-tratos e abuso sexual contra crianças e adolescentes: Uma abordagem multidisciplinar. São Leopoldo: Com-texto Gráfica e Editora, 1998.
Auxiliar Administrativa. Bacharelanda em Direito pela Universidade Brasil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PONCIANO, Marcia Alessandra de Araújo. Abuso sexual infantil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 abr 2020, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54388/abuso-sexual-infantil. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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