RESUMO: Sob o título ‘integração e globalização da economia latinoamericana’, apresentam-se os benefícios e prejuízos da globalização, analisando-se esse fenômeno e sua repercussão economia mundial e na proteção aos direitos humanos fundamentais. O objetivo do estudo foi analisar os impactos positivos e negativos da globalização sobre a economia mundial. Analisa-se o desenvolvimento sob a perspectiva das liberdades individuais e coletivas. Trata-se de um estudo descritivo e exploratório sobre o tema, fundamentado em pesquisa essencialmente bibliográfica. Concluiu-se que, apesar da globalização apresentar uma importante e fundamental na difusão dos Direitos Humanos, sua atuação continua não sendo aproveitada pela maioria da população desconhece seus direitos fundamentais. A globalização econômica, caminha no sentido de manutenção de desigualdades sociais profundas, se apresenta de forma antagônica aos interesses da população mais carente, pois ela não se volta para o social, ampliando-se de forma arrebatadora e descontrolada, sempre beneficiando uns poucos que não só dela, mas de tudo, sabem tirar o devido proveito.
Palavras-chave – Direitos Humanos. Globalização. Liberdade.
ABSTRACT: Under the title ‘integration and globalization of Latin American economy’, presents the benefits and drawbacks of globalization, analyzing this phenomenon and its impact on world economy and protection of fundamental human rights. The aim of this study was to analyze positive and negative impacts of globalization on the world economy. Analyzes the development from the perspective of individual and collective freedoms. It is a descriptive study on the topic, based mainly on research literature. It was concluded that, despite globalization provide an important and instrumental in the spread of Human Rights, its performance is still not grasped by most people unaware of their fundamental rights. Economic globalization, goes towards maintenance of deep social inequalities, is presented in a manner antagonistic to the interests of the poorest people, because it does not turn to the social, expanding on a sweeping, uncontrolled, always a few who do not benefit only her but all, know how to take proper advantage.
Keywords - Human Rights. Globalization. Freedom.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 A GLOBALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO. 1.1 Globalização da Economia e Direitos Humanos. 1.2 Impacto da globalização econômica no processo de efetivação dos direitos humanos. 1.3 A Integração Bilateral Brasil - Argentina e a formação do MERCOSUL. 1.4 A formação do MERCOSUL. 1.5 O Processo de Ampliação do MERCOSUL, até a Possibilidade de Criação da ALCSA. 1.6 Problemas e desafios a serem solucionados no MERCOSUL e ALADI. 1.7 As influências positivas e negativas da legislação brasileira na defesa do consumidor no MERCOSUL. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem como objetivo analisar os impactos positivos e negativos da globalização sobre a economia e o desenvolvimento latinoamericano. Trata-se de um estudo descritivo e exploratório sobre o tema, fundamentado em pesquisa essencialmente bibliográfica.
A identificação dos sistemas econômicos capitalistas com o processo de globalização decorre do ideal de comércio existente nestes sistemas, uma vez que a economia capitalista é fundada na própria idéia de troca de bens materiais nos mercados.
Nessa perspectiva, a globalização como agente facilitador da atividade empresarial, reduziu a participação estatal nos meios de produção, visto que o Estado, como instituição essencialmente burocrática, não tem capacidade para atender à competitividade na velocidade exigida por esse modelo de economia globalizada, que permitiu a criação e o aprimoramento de instituições internacionais e permitiu a redução de barreiras alfandegárias.
As atividades empresariais assumiram enormes proporções em decorrência da globalização, pelo grande crescimento do comércio eletrônico e das atividades de serviços na área da comunicação e da informação.
Nessa perspectiva, o comércio eletrônico é o fator que mais tem incrementado o desenvolvimento do comércio internacional, entretanto, muitos problemas também têm surgido em decorrência do uso do meio eletrônico nas comunicações.
A globalização tem levado as nações a enfrentar grandes desafios, como o crescimento das desigualdades entre as nações e dentro delas, a volatilidade no mercado financeiro e deteriorações ambientais. Outro aspecto negativo da globalização é que a grande maioria dos países em desenvolvimento permanece fora desse processo.
São vários os problemas que atrapalham a criação de uma solução definitiva para o problema do consumidor no MERCOSUL, que é a falta de uma legislação que assegure os seus direitos, na qualidade de consumidor, e a existência dos meios apropriados para que essa defesa seja devidamente exercida. Esses são problemas que dizem respeito à própria organização estrutural e institucional do MERCOSUL e às diferenças das legislações internas dos países membros sobre o assunto.
Nessa perspectiva, analisa-se o desenvolvimento como um processo de expansão das liberdades reais que todas as pessoas, indistintamente, devem desfrutar, em busca de uma qualidade de vida que deve ser avaliada, não pelos bens individuais acumulados, mas pelo nível de liberdade proporcionado a cada pessoa.
1 A GLOBALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
A globalização ou internacionalização é um fenômeno que envolve as mais variadas relações entre pessoas e entre instituições, decorrente do aprimoramento científico e tecnológico, principalmente, no campo da comunicação, redefinindo o papel dos Estados, dos indivíduos, das comunidades, da sociedade, das empresas e dos blocos politicoeconômicos (NAISBITT, 1982).
Rocher (1997) afirma que a globalização envolve as trocas econômicas, políticas e culturais entre nações, e às relações que daí resultam, pacíficas ou conflituosas, de complementaridade ou de concorrência.
Os ideais de universalidade dos Direitos Humanos, defendidos pela Organização das Nações Unidas (ONU, 1948) desde sua criação, estão expressos na Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, estão ganhando maior força e consistência, em busca do enfrentamento aos desrespeitos e violação dos direitos e garantias dos cidadãos. Contudo, recentemente, na II Conferência Mundial de Direitos Humanos na cidade de Viena, capital da Áustria, foram debatidas temáticas como a pobreza, a democracia e os instrumentos legais e jurídicos de efetivação dos Direitos Humanos, em busca de definir, internacionalmente, meios de minimizar esses problemas que afligem a humanidade (VIENA, 1993).
No que diz respeito à globalização econômica, presencia-se o aviltamento dos impostos exigidos do homem. A filosofia do lucro tem desvirtuado a visão do homem como um ser dotado de direitos, deveres e garantias, que preservem a sua liberdade e integridade (MONTAIGNE, 1972). Mais do que nunca, a sociedade internacional tem que permanecer alerta às intenções destorcidas dos detentores do poder, canalizadas, muito mais, para os interesses econômicos do que para princípios humanitaristas.
Nas últimas décadas, desenvolvimento tecnológico tem se dado de forma bastante veloz, vendo-se concretizados muitos dos sonhos de Júlio Verne (1995). A ficção científica tem se tornado realidade, sendo visualizada nas viagens espaciais, na conquista da Lua, na comunicação imediata por meio de satélites, na implementação da informática internacional, que interliga o mundo inteiro, de forma instantânea e em alta velocidade, que caracterizam o fenômeno da globalização, tornando as nações cada vez mais poderosas.
Os fenômenos da globalização ocorrem nos vários campos da atuação humana, não tendo um vetor comum, contudo os resultados alcançados e os que estão por serem vivenciados têm o condão de possibilitar uma maior interação das relações, seja no nível da economia, seja no nível da cultura, entre as pessoas e instituições, em todos as localidades do globo terrestre.
Indiscutivelmente, só se atingiu esse estágio de interrelacionamento graças ao grande aprimoramento dos meios de comunicação. O saber e a notícia, durante longo tempo, privativos de poucos e, por isso, mecanismo de controle e uso do poder, estão se diluindo e, em breves dias, deixarão de ser bens exclusivos daqueles economicamente mais favorecidos. Além disso, com a globalização reescreve o valor e o papel, não somente, dos Estados-Soberanos inclusos em blocos econômicos, mas principalmente dos cidadãos que vivem em pequenas comunidades ou tribos.
Um dos aspectos positivos da globalização é a capacidade de difusão dos Direitos Humanos. Essa seria a grande vantagem do processo de globalização, na medida em que os valores da pessoa humana acabam por se universalizar. Os institutos de controle dos Direitos Humanos, como a Corte, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos e o Tribunal Penal Internacional contribuem, de forma decisiva, para essa universalização (BOBBIO, 1985). Resta, entretanto, saber se a linearidade dessa evolução poderá fomentar a expansão da ideia de universalização dos Direitos Humanos .
A Declaração Universal nasceu como resposta às atrocidades e aos horrores cometidos durante o Nazismo. Em face do regime do terror, passou a imperar a lógica da destruição, pela qual as pessoas eram vistas como ‘descartáveis’ em razão do não pertencimento a determinada raça: a chamada raça ariana. Com isso, milhões de pessoas passam por campos de concentração e a maioria ali sucumbiu. A Segunda Guerra Mundial trouxe a marca do Estado como o grande delinquente, o que resulta na barbárie do genocídio com o maior número de civis mortos, ao longo da história da humanidade. O regime do terror implicou na ruptura do paradigma jusnaturalista, que afirmava que os Direitos Humanos decorrem da dignidade inerente a toda pessoa humana. Assim, ser, ou não, um ariano passou a ser o termômetro que indicava a condição de sujeito de direito.
A reconstrução do respeito aos Direitos Humanos, tornou-se paradigma e referencial ético norteadores da manutenção da ordem internacional. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, surgiu como o esteio moral da humanidade, como um código que aponta os princípios e valores universais a serem respeitados pelos Estados. Esse documento é o parâmetro que distingue a civilização da barbárie. Ela demarca a concepção inovadora de que os Direitos Humanos são direitos universais, pois ultrapassam as fronteiras da soberania do Estado, valendo em qualquer parte do mundo. Ela é, portanto, o marco inicial da ‘globalização’ e da ‘internacionalização’ dos Direitos Humanos.
Nesse cenário, fortalece-se a ideia de que a proteção aos Direitos Humanos não deve se restringir ao domínio reservado do Estado, não se reduzindo à competência nacional exclusiva ou à jurisdição doméstica exclusiva, porque revela tema de legítimo interesse internacional.
Essa inovação aponta para duas importantes consequências: a revisão da noção tradicional de soberania absoluta do Estado, que passa a sofrer um processo de relativização, na medida em que são admitidas intervenções no plano nacional em prol da proteção dos Direitos Humanos; e a cristalização da ideia de que o indivíduo deve ter direitos protegidos na esfera internacional, na condição de sujeito de Direito.
Os altos índices de exclusão socioeconômica e de concentração de renda representam um grave problema que envolve os preceitos da universalidade e indivisibilidade dos Direitos Humanos (STIGLITZ, 2002).
O alcance universal dos Direitos Humanos é um forte amenizador dos prejuízos aos excluídos, vítimas do paradigma econômico vigente, vivendo bem mais no ‘Estado da natureza’ do que, propriamente, no ‘Estado Democrático de Direito’. Por sua vez, o caráter indivisível desses direitos é também mitigado pelo esvaziamento dos direitos sociais fundamentais, especialmente em virtude da tendência de flexibilização de direitos sociais básicos, que integram o conteúdo de Direitos Humanos fundamentais. A garantia dos direitos sociais básicos (como o direito ao trabalho, à saúde e à educação), que integram o conteúdo dos Direitos Humanos, tem sido apontada como um entrave ao funcionamento do mercado e um obstáculo à livre circulação do capital e à competitividade internacional.
A educação, a saúde e a previdência, tornaram-se mercadoria perdendo sua conceituação como direitos sociais básicos, pois passam a ser objetos de contratos privados de compra e venda, em um mercado bastante desigual e desumano, no qual grande parcela populacional não dispõe de meios mais essenciais à sobrevivência. Em razão da indivisibilidade dos Direitos Humanos, a violação aos direitos econômicos, sociais e culturais propicia a violação aos direitos civis e políticos, enquanto a vulnerabilidade economicossocial leva à vulnerabilidade dos direitos civis e políticos. Acrescente-se, ainda, que esse processo de violação dos Direitos Humanos alcança, prioritariamente, os grupos sociais vulneráveis, como as mulheres e a população negra fazendo surgir os fenômenos da ‘feminização’ e ‘etninização’ da pobreza (STIGLITZ, 2002).
1.1 Globalização da Economia e Direitos Humanos
Nesse novo cenário mundial, o homem, a sociedade e os poderes públicos estão sendo redefinidos em suas atribuições, pois estão insertos num ambiente universalizado e, ao mesmo tempo, tribalizado. Nessa perspectiva, a universalização dos Direitos Humanos não anda no mesmo sentido da globalização das finanças e da economia mundial que está vinculada à lógica do lucro, da acumulação e da concentração de riqueza, desvinculada de qualquer compromisso com a realização do bem-estar social e dos direitos do homem. O processo de globalização e a ideologia neoliberal que o domina, representam um retrocesso em relação à defesa dos direitos de liberdade, com uma intervenção mínima do Estado. Dessa forma, não há mais lugar para os direitos economicossociais ou de solidariedade, conforme a tradição socialista e do cristianismo social; por isso, novas e velhas desigualdades sociais e econômicas estão surgindo no mundo inteiro.
Esta situação é visualizada mundialmente, transparecendo sempre mais claramente, sobretudo para quem olha o mundo na perspectiva social dos excluídos, que a forma como os Direitos Humanos se apresentam na atualidade, além de não ser um fato universal, também não pode ser ‘universalizável’, porque precisa reproduzir continuamente a contradição excluídos-incluídos, emancipação-exploração, dominantes-dominados.
1.2 Impacto da globalização econômica no processo de efetivação dos direitos humanos
Nesse novo cenário mundializado existe um grande esforço de reconstrução do paradigma dos Direitos Humanos o que acaba exigindo o repensar a respeito da soberania nacional do Estado e a revisão da noção tradicional de soberania absoluta do Estado, que passa a sofrer uma relativização, uma flexibilização, na medida em que são admitidas intervenções em prol dos Direitos Humanos. Além disso, surge a visão de que os indivíduos devem ser concebidos como sujeitos de direito internacional. Isso significa que com a democratização do cenário internacional, do qual apenas os Estados participavam, os indivíduos também se tornam sujeitos de direito internacional.
Esses indivíduos ganham, com a globalização, visibilidade, universalização passam a ser alvo dos Direitos Humanos. O pós-guerra vivenciou, portanto, a grande revolução ou, o início do processo de universalização internacional e globalização dos Direitos Humanos. A Segunda Guerra representou o fim da era em que a forma pela qual o Estado tratava os seus nacionais era concebida como um problema de jurisdição doméstica, um problema a quatro paredes, um problema a ser resolvido dentro das fronteiras de um Estado.
A Declaração Universal transmuda a concepção dos Direitos Humanos ao introduzir a ideia da indivisibilidade e da interrelação entre os valores de liberdade e igualdade, pois não há igualdade sem liberdade e, nesse sentido, a recíproca também é verdadeira: não há liberdade sem igualdade.
A Declaração dos Direitos Humanos (GENEBRA, 1948), é o primeiro documento que associou os direitos civis e políticos, aos direitos econômicos, sociais e culturais. Existia, portanto, em dezembro de 48, cinquenta e seis Estados, dentre os quais quarenta e oito disseram sim à Declaração, enquanto oito se abstiveram, o que representou uma grande aceitação que a fez nascer forte, por ter sido gerada consensualmente.
Em 1993 ocorreu em Viena, uma Segunda Grande Conferência Mundial de Direitos Humanos, com mais de cento e oitenta e cinco delegações representadas. O parágrafo quinto da Declaração de Viena define que todos os Direitos Humanos são universais, interdependentes e interrelacionados, e que a comunidade internacional deve tratar esses direitos globalmente, de forma justa, equitativa, em pé de igualdade e com a mesma ênfase. Dessa forma as ideias apresentadas, há mais de cinquenta anos, foram revigoradas na Conferência de Viena, de modo que um grande número de novos Estados aderiu a esse pacto confirmando o seu fortalecimento.
A seguir, passa-se refletir sobre o impacto do processo de globalização em relação aos Direitos Humanos, à luz do contexto latinoamericano.
A longo das últimas décadas, os grandes desafios dos países latinoamericanos se concentraram em três grandes pautas: abertura política, estabilização econômica e reforma social. Com a globalização, surgiu essa demanda por inclusão forçada, em que os Estados passam a ter a necessidade de se inserir na economia e no mercado sem fronteiras, que é o mercado globalizado, um mercado mundial, gerado pelo aumento da competitividade internacional.
Entretanto, o padrão de globalização econômica tem sido ditado por países hegemônicos, em relação aos países periféricos. Isso significa que todos os delineamentos do processo de globalização econômica foram firmados, a princípio, no Consenso de Washington, partilhado pelo Departamento de Estado dos Estados Unidos, Ministérios das Finanças dos demais países do Grupo dos Sete e pelos Presidentes dos vinte maiores Bancos Internacionais. O Consenso de Washington tem como plataforma o neoliberalismo, a redefinição do Estado e o emagrecimento de políticas públicas no campo social, a disciplina fiscal para eliminar o déficit público, a reforma tributária e a abertura dos mercados ao comércio internacional. Mas, segundo estatísticas, esse processo tem agravado, ainda mais, o dualismo estrutural econômico experimentado pela realidade latino-americana.
A globalização econômica tem se esboçado, nos países como a internacionalização, também, da pobreza e da miséria, que fomenta e agrava a situação de miséria extrema. Nesse sentido, tomam-se, aqui, três pontos básicos enfrentados nesse processo: a internacionalização, a universalização e a indivisibilidade dos Direitos Humanos, que são fundamentais para o enfrentamento dessa questão (NEVES. 1982).
Com relação à internacionalização dos Direitos Humanos, acredita-se que a globalização, ao eliminar as fronteiras entre as nações, impõe uma revisão sobre o conceito de soberania absoluta. Se o mercado é global, pelo menos para entrar nesse mercado, os Estados devem redefinir seus limites, fragilizando-os em algum sentido. Isso reforça a ideia de mundo globalizado como um mundo sem fronteiras. Até as comunicações entram como instrumental dessa visão e os diretos humanos passam a se espraiar por todo o mundo. Nesse processo, não há mais como se dizer que os Direitos Humanos são um tema da jurisdição doméstica de um Estado, porque as fronteiras passam a ser questionadas. Entretanto, se esse é um lado positivo da globalização econômica, o desmanche das fronteiras, no tocante à universalidade e indivisibilidade dos Direitos Humanos, apresenta-se como uma questão crítica (IANNI, 1997).
Com relação à universalidade, o que se vê é um grande exército de excluídos, de párias, que se situam fora do mercado formal de emprego e que sobrevivem de forma miserável. São pessoas que se tornam supérfluas e que vivem, para além das fronteiras do Estado Democrático de Direito, nos limites do estado da natureza. Além disso, com relação à indivisibilidade dos Direitos Humanos, pode-se dizer que a globalização causa o atrofiamento do Estado, pelo emagrecimento das políticas públicas e restrição dos direitos sociais, o que, na realidade brasileira, é extremamente preocupante (IANNI, 1997). O Brasil é o país que tem um volume de violência epidêmica, perdendo apenas para a Colômbia, nas estatísticas sobre abusos contra as pessoas, elegendo-se como o primeiro em desigualdade social. Desse modo, o esvaziamento dos direitos sociais faz crescer assustadoramente a massa de excluídos em relação aos bens econômicos, culturais sociais e, até mesmo àqueles imprescindíveis à sobrevivência.
Cada vez mais, pode-se pensar que, apesar do previsto na Constituição Federal Brasileira (BRASIL, 1988) que se volta à construção de um Estado de bem-estar social, o Estado Brasileiro só existe, para o excluído, como Estado-polícia e Estado-repressão e, jamais, como Estado devedor e mantenedor de políticas públicas voltadas à melhoria da qualidade de vida do cidadão. Essa é uma reflexão que tem chamado muito a atenção, diante das privações e carências vivenciadas pelos que vivem à margem dos benefícios do Estado. O Estado é eficiente na sua malha repressora, mas no que diz respeito à prestação de benefícios ao cidadão pobre por meio de políticas públicas humanizas, ele ainda é ausente e excludente.
De um lado, com relação à internacionalização, exige-se um avanço no que diz respeito à soberania do Estado, que precisa ser repensada e repensada, cada vez mais, por exigência da globalização, pois ela não ocorre de forma absolutista, inclusa em um ambiente fechado e restrito, de fronteiras insuperáveis, no qual não se pode falar em globalização, universalização e internacionalização.
Com relação à indivisibilidade dos Direitos Humanos, que antevê a necessidade de igualdade e liberdade, para que haja a universalização dos Direitos Humanos, todos têm direitos e são sujeitos de direito. Entretanto, o que mais se visualiza é a exclusão de uma grande massa popular, em relação aos benefícios sociais, culturais e em favor da saúde, o que, cada vez mais, faz crescer o universo dos excluídos, que não têm nome, não têm moradia, que vivem desumanamente o presente e sem quaisquer perspectivas para o futuro.
Dessa forma, nos dias atuais, mais do que nunca, depara-se com o desafio de resgatar os Direitos Humanos como o guia, como valor paradigmático e referencial nesse cenário desumano de globalização econômica. Atualmente, tem-se, nos Direitos Humanos, a esperança de emancipação daqueles que vivem à margem dos processos culturais, sociais e econômicos, a partir de uma luta pela humanização do Direito. Nessa perspectiva, os Direitos Humanos não são ofertados, mas devem ser construídos e reconstruídos por cada indivíduo como sujeito da história da humanidade.
1.3 A Integração Bilateral Brasil - Argentina e a formação do MERCOSUL
Embora tenha sido muito favorecida pela ALADI e somente tenha sido completamente desenvolvida após o restabelecimento da democracia na América Latina, a integração Brasil - Argentina, que levou à criação do MERCOSUL, já mostrava traços de uma união bilateral, há muito tempo.
Em 1941, Brasil e Argentina fizeram um ensaio de ‘união aduaneira’, que não vingou devido às diferenças políticas e diplomáticas da época, principalmente em relação as posições tomadas quanto aos países do eixo durante a segunda guerra mundial.
Já em 1944, começavam a aparecer os primeiros mercados comuns, a exemplo do chamado BENELUX, união aduaneira entre Bélgica Luxemburgo e Países Baixos, demonstrando o início da tendência de integração que se fortalecerá até os nossos dias.
Em 1947, o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT) foi estabelecido, em Havana, durante a Conferência sobre Comércio e Emprego das Nações Unidas. Em 1948 a recém criada a Comissão Econômica para a América Latina (CEPAL), da Organização das Nações Unidas (ONU), que defende a integração regional para a América Latina.
Entre 1950 e 1953, Brasil e Argentina tentaram uma nova aproximação, desta vez incluindo o Chile, mas novamente não se efetiva devido a diferenças e rivalidades entre os países. Com a assinatura do Tratado de Roma em 1957, criando o Mercado Comum Europeu, volta o interesse do Brasil em uma integração econômica com os países do cone Sul. Esse interesse efetivar-se-á com a “Operação Panamericana” lançada pelo Brasil em 1958, com o objetivo da integração econômica e a reaproximação Brasil - Argentina, através do Memorândum Horácio Lafer.
Em 1960 foi criada a ALALC, com o objetivo de formar uma Zona de Livre Comércio, de acordo com as regras do GATT. A partir daí, começam as negociações para a criação dessa Zona de Livre Comércio, com a inclusão de listas de exceções, até 1964, quando o início da onda de regimes militares afetam de modo negativo a ALALC e suas negociações, devido ao ultra-nacionalismo já visto.
Entre 1964 e 1969 o processo integracionista iniciado com a criação da ALALC fica estagnado, rompendo-se definitivamente com a criação do Grupo Andino em 1969. O Grupo Andino evoluirá bastante até ser atingido pela crise do petróleo em 1975.
Em 1980 cria-se a ALADI, que dá novo fôlego as negociações internacionais com objetivo integracionista, este novo fôlego durará até a crise das dívidas externas que se segue em 1982.
Finalmente, em 1985 começa-se de modo definitivo a aproximação Brasil - Argentina, após o restabelecimento da democracia, com a “Declaração de Iguaçu”, onde se declara a “firme vontade de acelerar o processo de integração bilateral” Este processo demonstra sua intenção realmente integracionista no momento em que é realizada uma “Declaração Conjunta sobre Política Nuclear”, onde se nota a importância dos assuntos tratados e a real disposição de ambos os lados para esta integração.
Em 1988, Brasil e Argentina celebram o “Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento”, com o qual pretendem consolidar o processo de integração bilateral e estabelecimento de uma união aduaneira e demais políticas em comum num prazo máximo de dez anos para o posterior estabelecimento de um Mercado Comum. Já em 1990 os presidentes da Argentina e Brasil assinam a “Ata de Buenos Aires”, como projeto de formar um Mercado Comum até 31 de dezembro de 1994. Ainda neste ano a Ata de Buenos Aires é registrada na ALADI, confirmando os compromissos da Ata.
Também em 1990 destaca-se a “Iniciativa para as Américas”, lançada pelo presidente Bush, com o estabelecimento de um novo relacionamento dos Estados Unidos com a América Latina, com vistas a uma zona de livre comércio para toda a América, o que demonstra a tendência de integração que domina a América e todo o mundo hodierno.
O “Tratado de Assunção”, firmado em 26 de março de 1991, com o objetivo de constituir um mercado comum entre Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, denominado MERCOSUL, fixando primeiramente um período de transição para os membros ajustarem suas economias e ordem interna, até 31 de dezembro de 1994, efetivando-se então o MERCOSUL a partir de 1995.
O “Protocolo de Brasília para a Solução de Controvérsias”, de 1991 não criou o direito comunitário para o MERCOSUL, de modo a privilegiar o modelo seguido pelo BENELUX. A não adoção do direito comunitário vem a ser alvo de diversas críticas por parte dos juristas, uma vez que a fórmula adotada não se demonstrará eficaz.
O ‘Tratado de Maastricht’ criou a União Europeia, que prevê, inclusive, a união monetária e legislativa. A fórmula da União Europeia, baseada no direito comunitário demonstra o bom nível atingido, após décadas de estudos, tratados, pesquisas e preparação para a união definitiva.
1.4 A formação do MERCOSUL
O primeiro passo para a formação do MERCOSUL, foi a assinatura da ‘Declaração de Iguaçu’, pelos presidentes José Sarney e Alfonsin, do Brasil e Argentina, respectivamente. Essa declaração teve, basicamente, a função de demonstrar os interesses dos dois países numa integração bilateral. Logo em seguida, em 1986, a ‘Ata para a integração Brasil – Argentina’ criou o Programa de Integração e Cooperação Econômica (PICE). Essa Ata baseava-se nos princípios que guiaram, mais tarde, o Tratado de Assunção, constando do Preâmbulo que será transcrito no cap. III: flexibilidade, ‘gradualidade’, e equilíbrio dinâmico.
O ‘Tratado de Integração, Cooperação e Desenvolvimento’, assinado entre Argentina e Brasil, previa a fixação de um espaço econômico em dez anos, sendo que o auge deste tratado foi na assinatura da “Ata de Buenos Aires”, em julho de 1990, a qual previa a criação de um mercado comum até dezembro de 1994, prazo que será utilizado para a criação do MERCOSUL.
Esses tratados aproximaram o Brasil e a Argentina que, conjuntamente, buscaram a integração com o Uruguai. Essa tríplice aliança levou à assinatura, em março de 1991, do ‘Tratado de Assunção’, que deu origem ao Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), formado pela Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai. A origem desse mercado comum baseia-se na relação bilateral Brasil - Argentina, que decorreu da crescente e positiva aproximação entre esses dois Países e do processo democrático, restaurado e fortalecido dos dois países.
A consolidação do MERCOSUL é bastante complicada, uma vez que é formado por quatro países com características muito distintas. Embora ainda em desenvolvimento, se comparados aos países europeus ou a América do Norte, o Brasil e a Argentina apresentam uma industrialização e organização comercial e empresarial muito mais fortes do que o Paraguai e o Uruguai, diferença que se estende até ao campo agropecuário, devido às diferenças climáticas. Essas diferenças são um desafio a ser superado, de modo que todos os membros do mercado comum tenham condições de competitividade entre si, e para que o mercado comum sirva de base para o crescimento e desenvolvimento de todos os membros, e não de alguns em detrimento de outros.
Estas diferenças são agravadas por serem todos países que não têm uma história de democracia e estabilidade econômica, que só foi alcançada muito recentemente.
1.5 O Processo de Ampliação do MERCOSUL, até a Possibilidade de Criação da ALCSA
O MERCOSUL, apesar das dificuldades enfrentadas, tem se mostrado eficaz, sendo que outros países pleiteiam sua entrada no mercado comum. Em 1994, após a propositura da ‘Iniciativa Amazônica’, o presidente Itamar Franco, do Brasil, ampliou esta proposta, passando a propor a Área de Livre Comércio Sul-Americana (ALCSA). Essa área, não tendo as pretensões do MERCOSUL, tem como objetivo, apenas, derrubar as tarifações e barreiras dos bens de origem sul-americana para os países signatários.
O processo proposto, nos moldes do MERCOSUL, previu a desgravação gradual de listas de exceções em um prazo de dez anos, sendo todo o resto de obrigação da iniciativa privada. A ALCSA trouxe muitas vantagens para todos os seus membros, mesmo sendo um acordo apenas comercial, pois trouxe o livre comércio para regiões de fronteira e ampliou o comércio na região amazônica.
Sua implementação inicial se deu segundo os preceitos da ALADI, com vistas a, em longo prazo, atingir-se os objetivos propostos por esta. A orientação da integração comercial se daria nos moldes do MERCOSUL, com processo gradativo e flexível de desgravação das listas de exceção propostas pelos países pactuantes.
Numa rápida análise do preâmbulo do Tratado de Assunção, podemos perceber a sua montagem, já tendo sido preparado a partir da percepção do dinamismo do mundo atual e da nova tendência de globalização e integracionismo, conforme se observa por sua parte em negrito.
O MERCOSUL não se furta da necessidade de manter-se de acordo com a tendência integracionista e dos princípios prescritos pela Associação Latino-Americana de Integração (ALADI), que preveem uma integralização entre todos os países latinoamericanos, que já tem sido demonstrada por diversos meios e tratados entre diversos países e organizações internacionais.
O objetivo primordial do MERCOSUL é ampliar as atuais dimensões de seus mercados nacionais, através da integração, constituindo-se uma condição fundamental para acelerar seus processos de desenvolvimento econômico com justiça social. Entende-se que esse objetivo deve ser alcançado mediante o aproveitamento mais eficaz dos recursos disponíveis, a preservação do meio ambiente, o melhoramento das interconexões físicas, a coordenação das políticas macroeconômicas e a complementação dos diferentes setores da economia, com base nos princípios de gradualidade, flexibilidade e equilíbrio (JAGUARIBE, 1996).
Nessa perspectiva é preciso ter-se em conta a evolução dos acontecimentos internacionais, em especial a consolidação de grandes espaços econômicos, e a importância de lograr uma adequada inserção internacional para seus países. Esse processo de integração constitui-se uma resposta adequada a tais acontecimentos.
Conscientes de que o MERCOSUL deve ser considerado como um avanço em busca do desenvolvimento progressivo da integração dos países da América Latina, conforme o objetivo do Tratado de Montevidéu de 1980, convencidos da necessidade de promover o desenvolvimento científico e tecnológico dos Estados-Partes e de modernizar suas economias para ampliar a oferta e a qualidade dos bens de serviço disponíveis, a fim de melhorar as condições de vida de seus habitantes. Nesse sentido, esses países reafirmaram sua vontade política de deixar estabelecidas as bases para a união, cada vez mais estreita, entre seus povos, com a finalidade de alcançar os objetivos supramencionado (VAN LIEMT, 1996).
Diversos tratados têm sido elaborados com o objetivo de integrar a América Latina ou mesmo a América como um todo, tendo vindo das mais diversas origens, como por exemplo a “Iniciativa para as Américas”, do presidente americano George Bush, de 1990; o “Acordo relativo a um Conselho sobre Comércio e Investimentos”, entre os Estados Unidos e os países do MERCOSUL, de 1991; a “Cúpula das Américas”, de dezembro de 1994, onde se proclama o objetivo de criar-se uma área de livre comércio hemisférica; a própria ALCSA, proposta pelo Brasil.
Outros blocos também alimentam o intercâmbio a nível internacional, como a ajuda oferecida pela União Européia no “Acordo de Cooperação Interinstitucional”, de 1992, onde a União Européia se propõe a transferir conhecimentos ao MERCOSUL, com vistas a elaboração do mercado comum, atingindo diversos setores, como questões aduaneiras, normas técnicas, e outras, embora esta cooperação não represente facilidades comerciais, mesmo sendo a UE o segundo parceiro comercial do MERCOSUL.
Bastante recentemente têm-se discutido a maior integração comercial entre a UE e o MERCOSUL, numa evidente prova da tendência globalizante pela qual passamos paralelamente a tendência integracionista.
1.6 Problemas e desafios a serem solucionados no MERCOSUL e ALADI
Dentro das dificuldades que ainda tem que enfrentar, o MERCOSUL teme a polarização que os Estados Unidos podem exercer, atraindo os países latino-americanos para o North American Free Trade Agreement (NAFTA), caso que já ocorreu com o Chile, que ao que parece acabou definindo-se pelo MERCOSUL. A Argentina, antes da consolidação do MERCOSUL, também havia demonstrado interesse pelo NAFTA, mas com a efetivação do MERCOSUL estes interesses cessaram.
Também no campo dos desafios internacionais que precisam ser vencidos, encontra-se a entrada do México no NAFTA, o que contraria a cláusula da nação mais favorecida da ALADI, sendo que terá, então, que fazer concessões aos outros países membros, mas sua situação na ALADI está sendo negociada.
Nos aspectos dos desafios internos a serem cumpridos, encontra-se a questão tarifária, pois os países integrantes do MERCOSUL possuem tarifas muito altas em comparação com os outros países latino-americanos, sendo estas de aproximadamente 10%, enquanto a média do MERCOSUL é o dobro (20%). Embora na maioria dos produtos do MERCOSUL a tarifa proposta seja zero, a TEC (Tarifa Externa Comum), que se relaciona aos outros países é de aproximadamente 20%. Esta tarifa mais alta é um empecilho para a entrada do Chile ao MERCOSUL, pois o Chile utiliza tarifas mais baixas, e a sua adaptação a TEC pode ser prejudicial a sua economia interna.
Um aspecto negativo que se pode observar em relação à política tributária utilizada pelo Brasil é a crise gerada pelo repentino aumento tarifário sobre os automóveis importados no primeiro semestre de 1995, onde as tarifas subiram 250% num curto período de tempo, criando diversos problemas no âmbito da OMC e principalmente para a Argentina que teve suas exportações de peças e automóveis para o Brasil bastante prejudicadas.
Este aumento tornou-se uma grande gafe política, diplomática e jurídica, pois interferiu em sobretaxação contrária a normatividade do MERCOSUL, uma vez que na lista de exceções apresentada em Ouro Preto, em dezembro de 1994, o Brasil apresentou apenas 29 produtos, não estando incluídos nesta lista os automóveis.
1.7 As influências positivas e negativas da legislação brasileira na defesa do consumidor no Mercosul
De acordo com Silva (1999, p. 82), "o MERCOSUL se baseia, para suas negociações, no exemplo do Brasil, que possui uma das legislações mais modernas do mundo em nível de defesa do consumidor." Diante dessa afirmação, seria óbvia a conclusão de que o Código de Defesa do Consumidor brasileiro possui grandes qualidades que favorecem, em todos os aspectos, o processo de formação de uma defesa eficaz do consumidor do MERCOSUL. Mas na realidade existe uma série de fatores que fazem essa legislação ser, em vários pontos, uma espécie de impedimento à integração desejada. Da mesma maneira, é controvertida a ideia de que a harmonização das legislações dos Estados-partes trará benefícios a todos, inclusive aos consumidores brasileiros.
O desejo de harmonização de legislações, expresso no Tratado de Assunção, traz um perigo iminente para o Código brasileiro de Defesa do Consumidor, ou, mais precisamente, para os consumidores brasileiros. Pode-se colocar em risco as conquistas já realizadas em matéria de proteção ao consumidor atingida nos mercados e ordenamentos nacionais. Este risco é ainda mais expressivo no que diz respeito à legislação brasileira, pois "essa verdadeira unificação que se está a promover encontra-se muito aquém, em termos de proteção ao consumidor, daquela que já foi alcançada pelo legislador brasileiro" (LUCCA, 1998, p.156). Para que os direitos já atingidos pelo consumidor brasileiro sejam então mantidos, admite-se que
A compatibilização da lei brasileira com os objetivos do Mercosul seria, pois, a solução ideal, onde a lei brasileira assumiria seu papel de norma fundamental tuteladora dos interesses sociais e econômicos dos cidadãos no Mercosul, e o nível de proteção já atingido seria mantido e estendido aos outros mercados e indivíduos (MARQUES, 1993, p..52).
Deve ser analisado ainda, outro aspecto importante nesse processo de harmonização: a legitimação de um órgão do MERCOSUL, para legislar sobre matéria de direito civil, comercial e, até mesmo, de direitos fundamentais, como os da defesa do consumidor. Trata-se de questão muito importante, pois o MERCOSUL possui uma frágil estrutura e base jurídica, e mesmo com uma precária força de coação e de controle supranacional ele atua e até legisla. A relevância desse fato não é outra, senão, a demonstração de que o processo de integração não deve passar por cima de direitos fundamentais dos cidadãos, e muito menos da ordem constitucional dos países.
Quanto à ordem constitucional, é importante mencionar a constitucionalidade do Código de Defesa do Consumidor Brasileiro, em face a este processo de harmonização. A defesa do consumidor no Brasil é notoriamente estabelecida pela Constituição Federal de 1988, em seus artigos 5.º, inciso XXXII, e 170, inciso V.
A tradição jurídica brasileira é de primazia da ordem constitucional em relação aos Tratados internacionais e, para ser concretizada uma verdadeira integração no âmbito do MERCOSUL, será necessário que haja, da mesma forma que ocorreu com os países integrantes da Comunidade Europeia, uma modificação constitucional. Estes países,
Qquando passaram a integrar a Comunidade Econômica Européia, introduziram em suas Constituições normas permitindo a eficácia imediata das leis obrigatórias formuladas pela Comunidade e normas prevendo a primazia, não de todas as regras de direito internacional público, mas sim do direito comunitário, oriundo da atividade legisladora daquela instituição supranacional, legitimada para tal (MARQUES, 1993, p. 44).
No entanto, atualmente, em caso de conflito entre o Código de Defesa do Consumidor e a legislação oriunda do MERCOSUL, a origem constitucional da lei brasileira poderá garantir sua manutenção pelo Judiciário brasileiro.
Há também uma série de controvérsias acerca da coerência entre as regras de defesa e proteção do consumidor e a tendência liberal das economias dos Estados que adotam tais regras, pois elas impõem várias condutas aos fornecedores, limitando de certo modo a autonomia das partes para livremente contratar. Nessa perspectiva, surgiram as ideias que conduziram à promulgação do Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, como uma espécie de lei limitadora ao livre comércio no MERCOSUL, posto que suas regras são as mais avançadas e as que mais exigem condutas positivas dos fornecedores.
Ora, a legislação brasileira de proteção ao consumidor caracteriza, faticamente, um novum, uma diferença marcante no mercado brasileiro em relação aos mercados que não possuem normas impondo tais níveis de qualidade, segurança e informação em relação aos produtos e serviços (MARQUES, 1993, p. 1).
Fica, portanto, evidente que há uma exigência concreta na colocação de produtos e serviços estrangeiros no mercado brasileiro, porque todos deverão obedecer os padrões impostos pela legislação, e isso, sob determinado aspecto, pode mesmo ser considerado como uma barreira não-tarifária. Porém, a conceituação do Código brasileiro de Defesa do Consumidor como uma barreira desta espécie ou não, depende de um preconceito, pois
[...] se definimos ‘barreira ou restrição’ toda dificuldade ou standard imposto por um país, a resposta será necessariamente afirmativa, pois o CDC impõe efetivamente um novo patamar de conduta para os produtores de outros países não acostumados a estes níveis de qualidade ou segurança. Se definimos ‘barreira’ aquele tratamento, fático ou jurídico, diferenciado para o estrangeiro, então o CDC não seria considerado como tal, pois, na verdade, trata-se de um novo patamar de boa-fé nas relações de consumo imposto a todos, nacionais e estrangeiros no mercado (MARQUES, 1993, p..51).
A possibilidade da legislação brasileira de defesa do consumidor estar funcionando como barreira não-tarifária foi alvo de preocupação até mesmo da Internacional Organization of Consumers Unions I(OCU), que já em 1993 advertia que:
[...] sem a harmonização das leis, existirá um outro perigo: os fabricantes brasileiros poderão começar a produzir dois tipos de produtos: um, em conformidade com o código, para venda no mercado interno; e outro, de qualidade inferior e fora das especificações, para comercialização nos países do Mercosul (FEKETE, 1996, p.16-17).
Ressalta-se que a IOCU refere-se ao termo harmonização, que, ao contrário da expressão unificação, significa um processo tênue de aproximação das legislações, onde são unificadas somente algumas regras básicas e elaboradas normas acessórias para os países cuja legislação é mais precária. Já a unificação caracteriza-se pela adoção de um mesmo conteúdo normativo, onde há uma coordenação intensa das diferenças existentes nos ordenamentos jurídicos nacionais, medida esta que viria realmente ameaçar os direitos e garantias absolutamente consagrados em benefício do consumidor brasileiro.
Se o intuito é preservar os direitos dos consumidores brasileiros, de modo que eles não sejam vítimas de um retrocesso causado pela formação de um regulamento comum, parece então que a harmonização, enquanto processo de complementação de legislações tímidas e não de modificação de legislações avançadas (como é o caso da brasileira), é o meio mais adequado para que sejam resguardados tais direitos.
Segundo a opinião isolada de Silva (1999, p. 82), é praticamente este processo que atualmente se inicia no âmbito da integração, pois "o MERCOSUL se baseia, para suas negociações, no exemplo do Brasil, que possui uma das legislações mais modernas do mundo em nível de defesa do consumidor".
CONCLUSÃO
Analisou-se a problemática que envolve a questão da integração e globalização da economia latinoamericana, em busca de encontrar respostas sobre a possibilidade da proteção ao consumidor, no nível internacional, no âmbito de um bloco econômico como o MERCOSUL.
Tomando por base a experiência europeia, acredita-se que a resposta a esse questionamento é positiva, porém, a exemplo da União Europeia, serão necessárias mudanças estruturais profundas, a fim de facilitar a aplicação da legislação requerida.
Sem o objetivo de apresentar uma teoria sobre o assunto, porque não se dispõe de uma boa base teórica para tal tarefa, elencam-se aqui algumas sugestões ou ideias, sobre uma possível alternativa para o problema.
O Mercado Comum exige um compromisso dos Estados-Parte no sentido de harmonizar suas legislações, nas áreas pertinentes, para lograr o fortalecimento do processo de integração. Nesse sentido, a harmonização fundamenta-se em duas hipóteses: na aplicação de uma das legislações (argentina ou brasileira) que regem a matéria, ou na criação de um terceiro código específico.
Seria uma boa solução a criação de uma nova legislação específica, própria para o MERCOSUL, pois a aplicação pura e seca de uma solução adotada por outros países nem sempre é benéfica, por ter sido elaborada e destinada a uma realidade completamente distinta daquela em que ela seria aplicada.
Surge, entretanto, um problema: como todas as resoluções, no MERCOSUL, devem ser elaboradas em consenso por países afiliados a esse bloco, o processo de elaboração legislativa torna-se muito lento e, em alguns aspectos pode resultar num retrocesso. Assim, a modificação é aceita por unanimidade, ou ela não é aceita, trazendo ainda todos os riscos possíveis.
Pelo fato de ser por consenso, tal processo pode ser muito demorado, tomando-se como exemplo a discussão que houve na Europa, com a União Europeia, sobre as especificações da margarina, que levou mais de 12 anos.
A adoção da legislação argentina é inviável, pelo menos no ponto de vista brasileiro, pois representaria um largo retrocesso. Não é outra a preocupação do coordenados da delegação brasileira do consumidor no MERCOSUL, diante das tentativas de efetivar um acordo sobre o assunto.
Dessa forma, seria mais viável a aplicação da legislação brasileira. Constata-se, portanto, que na discussão sobre qual legislação deve ser adotada, as normatizações brasileiras são as mais cotadas e as discussões giram praticamente em torno dos grandes avanços trazidos pelo Código de Defesa do Consumidor Brasileiro que, em certos casos, geram grande polêmica.
Acredita-se que a sua aplicação não deve ser pura e simples, precisando adaptar-se a uma nova realidade social, econômica e comercial que representa o MERCOSUL, o que, certamente, trará muitos benefícios. A exemplo disso, exemplifica-se o acordo firmado sobre a defesa do consumidor que já supera o atual código brasileiro, em um aspecto: além de vedar a publicidade enganosa e abusiva, proibida pelo código brasileiro, também não permite a publicidade comparativa.
Depois de determinadas as normas que regulamentam a proteção ao consumidor, será necessária a criação de um órgão nacional, ou supranacional, que passasse a integrar a estrutura institucional do MERCOSUL e que seja responsável pela fiscalização da aplicação de tal estatuto. Esses órgãos se assemelham ao Órgão de Proteção e Defesa do Consumidor (Procon), instituição estatal brasileira responsável pela defesa dos direitos dos consumidores.
Outra medida a ser tomada seria a reformulação do sistema de solução de controvérsias adotado no MERCOSUL, instituído pelo Protocolo de Brasília para a Solução de Controvérsias, e implementado pelo Protocolo de Ouro Preto. Como deficiências, esse sistema apresenta o restrito acesso pelos particulares, a falta de um tribunal supranacional e a dificuldade da criação de uma jurisprudência que auxiliasse na interpretação dos tratados que compões o MERCOSUL.
Entretanto, a globalização da economia tem trazido prejuízos a trabalhadores em países como o Brasil. Esses prejuízos se manifestam, basicamente, no desemprego, pois chegam de outros países, para o mercado brasileiro, artigos mais baratos do que os equivalentes nacionais. Com isso, as fábricas brasileiras fecham ou reduzem os seus negócios, aumentando o desemprego, que tem também outras razões, como o desenvolvimento tecnológico que se dá igualmente em escala mundial.
Além disso, a globalização pode prejudicar os trabalhadores brasileiros por outras formas, pois o país está, cada vez mais, dependente da entrada de capitais especulativos, atraídos pelos juros altos, que podem fugir a qualquer momento, causando uma crise nas suas atividades econômicas.
A globalização da economia tende a aumentar as disparidades na distribuição de renda, pois se concentra na ampliação de mercados de bens de alta tecnologia e, além disso, cria problemas para os países emergentes, pois exclui uma parcela cada vez maior da população.
Para que os efeitos negativos da globalização não sejam sentidos, é preciso um grande empenho dos governantes no sentido de acelerar os processos de desenvolvimento econômico, com justiça social, em cada região, de uma forma integrativa. É importante, para isso, criar um mercado comum, que amplie as atuais dimensões dos mercados nacionais, mediante a livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos, entre os países, estabelecendo-se tarifas externas comuns.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LOPES, FRANCISCO WILLIAM PINHEIRO. Integração e globalização da economia latinoamericana Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 abr 2020, 04:34. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54413/integrao-e-globalizao-da-economia-latinoamericana. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Luis Carlos Donizeti Esprita Junior
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