Resumo: O presente trabalho tem como objetivo realizar uma análise de como a sustentabilidade pode ser re(significada) por meio do Direito. Toma-se como ponto de partida o conceito de sustentabilidade e como este pode ser transformado pelo Direito. A metodologia empregada foi a qualitativa, em uma busca dedutiva da bibliografia da sustentabilidade de forma holística e, a partir disso, ter como resultado o debate teórico sobre manejos agroecológicos e como o direito tem alterado o que se entende sobre a sustentabilidade.
Palavras-Chave: Sustentabilidade. Agroecologia. Paradigma. Direito. Significação.
Abstract: The present work aims to carry out an analysis of how sustainability can be re (signified) through the right. The concept of sustainability is taken as a starting point and how it can be transformed by right. The methodology used was qualitative, in a deductive search for the sustainability bibliography in a holistic way and from that result in a theoretical debate on agroecological management and how the right has changed what is understood about sustainability.
Keywords: Sustainability. Agroecology. Paradigm. Right. Meaning.
Sumário: 1. Introdução. 2. A (re)significação da sustentabilidade pelo Direito. 3. Conclusão. 4. Referências.
1 INTRODUÇÃO
Primeiramente, o ser humano é parte da natureza, é parte integrante da teia da vida. Diante de tal premissa, já se torna admissível compreender que o direito é imprescindível para o deslocamento da posição do homem como centro, para se encontrar como parte do meio natural. Significa dizer que o ser humano não está desvinculado ou separado da natureza. Ele é parte da natureza, e não há uma separação entre os dois, mas uma simbiose. Em outras palavras, a sustentabilidade como direito está diretamente ligado ao contexto da dignidade, à autodeterminação e à satisfação de outras necessidades básicas que traduzem o significado de vida.
O presente trabalho pretende refletir sobre os atributos associados ao conceito de sustentabilidade que permitem identificar e analisar, de forma sistêmica, os impactos das inovações agroecológicas sob o parâmetro do Direito.
A pesquisa foi desenvolvida através do método dedutivo, partindo-se de dados resultantes de pesquisa bibliográfica, a fim de compreender o processo agroecológico, que permitiram construção de resultados representados pela adequação do procedimento ao incremento à produção e implemento do direito à uma vida saudável.
Em um primeiro momento, o trabalho buscou um enfoque interdisciplinar, em um empenho para romper com o confinamento do Direito e com a sua rigidez dogmática. Posteriormente, realizou-se algumas incursões feitas por várias áreas de conhecimento, sem as quais a análise da agroecologia como instrumento de direito e vida se tornaria extremamente pobre e limitada.
2 A (RE)SIGNIFICAÇÃO DA SUSTENTABILIDADE PELO DIREITO
Inicialmente, insta salientar que a (re)significação perpassa o significado de sustentabilidade. Alguns autores o consideram como um “conceito de moda e em moda” e um favorecedor de ocultações ideológicas[1]. Outros rotulam de “conceito holístico”[2], ou seja, procura compreender os fenômenos na sua totalidade inteiramente assente em conceitos também da justiça intergeracional, participação e equidade geracional[3]. Outros, ainda, veem nele um “conceito-chave”[4], um “conceito represa” que se aproxima do princípio do Estado de Direito e do princípio democrático, pressupõe intervenções metódicas de otimização e de concretização[5].
Convém, ainda, apontar as diferenças entre sustentabilidade em sentido restrito ou ecológico e sustentabilidade em sentido amplo. A sustentabilidade em sentido restrito aponta para a proteção/manutenção em longo prazo de recursos por meio do planejamento, economização e obrigações de condutas e de resultados. O princípio da sustentabilidade[6], por sua vez, aponta para a necessidade de novas direções propiciadoras de um verdadeiro Estado de direito ambiental. Isto alude que, ao lado dos tradicionais traçados de ordem, permissão e proibição, apregoados em atos de poder público, assiste-se ao recurso a diversas formas de “estímulo” destinadas a promover programas de sustentabilidade[7]. Nesse sentido, a modificação do Direito, segundo o princípio da sustentabilidade, não significa o desprezo da observância de outros princípios estruturantes, como o princípio do Estado de direito e o princípio democrático[8].
Nesse contexto, J. J. Canotilho explica: “Mas, com alguma coisa a mais do ponto de vista da experiência e, finalmente, da ordem do tempo. A patrimonialização do meio ambiente, que designa a extensão provavelmente a mais massiva e a mais nova da noção, abre indubitavelmente sobre o futuro ou sobre novas interações entre presente e futuro. Não saímos, então, do círculo do presente, pois a preocupação com o futuro se apresenta mesmo como a razão de ser deste fenômeno? Salvo que este futuro não é mais promessa ou "princípio de esperança", mas ameaça. Tal é a reviravolta. Uma ameaça da qual nós fomos os iniciadores e da qual nós devemos nos reconhecer, hoje, na falta já de ontem, como os responsáveis”[9].
O que está claro, a esta altura, é que a sustentabilidade se abre para um novo paradigma jurídico, na medida que se utiliza de novos preceitos de preservação da vida. A sustentabilidade é um paradigma de ação, mas, também, é jurídico que supera as discussões de liberdade e de igualdade, próprios do Estado contemporâneo[10]. Nesse sentido, os paradigmas demonstrados pelos manejos agroecológicos é, portanto, próprio da sociedade pós-moderna, transnacional para qual podemos caminhar[11].
A juridicidade ambiental deve se ajustar às exigências de um Estado constitucional ecológico e de uma democracia sustentada. A natureza, como princípio confiado a muitas regras estruturantes da Constituição, como o princípio do meio ambiente equilibrado, está atrelada ao princípio do aproveitamento racional dos recursos, princípio da preservação da capacidade de renovação e de estabilidade ecológica, princípio da solidariedade entre gerações[12]. Isso obrigará a uma sistemática constitucional de concretização particularmente centrada nos critérios de ponderação e de otimização dos interesses ambientais e ecológicos[13]. O Direito só se converterá no instrumento agroecológico que necessitamos para ordenação e transformação social, quando se estabelecer como objetivo de sustentabilidade.
Portanto, a relação homem e natureza é algo muito complexo e só passível de ser harmônica se a humanidade modificar radicalmente o seu modo de lidar com o meio que a cerca. A sustentabilidade agroecológica pode ser aproveitada de fato sob uma ótica holística, determinando-se como um processo criativo de transformação do meio ambiente, direcionando as técnicas ecologicamente prudentes, como a agroflorestal, compostagem, rochagem, refletidas para as potencialidades deste meio, mitigando o desperdício dos recursos[14].
Fomentar a sustentabilidade no campo seria, no interior do seu conceito, contribuir com as populações em se organizar, em se educar, para que repensem seus problemas, identifiquem suas necessidades e os recursos potenciais para receber e realizar um futuro digno a ser vivido, segundo os postulados de justiça social e prudência ecológica[15].
Dessa forma, a agroecologia, na gênese desta construção jurídica, está inserida na sustentabilidade, como um todo interligado que impulsiona para a ideia de um modelo de desenvolvimento escolhido e prudente para o mundo. Além disso, propicia a compatibilização da proteção do meio ambiente com a preservação dos conhecimentos tradicionais, mantendo-se indefinidamente no tempo, não obstante tal modelo encontrar oposição por setores que preferem as antigas práticas do lucro a qualquer custo, portanto, resistentes à ideia de um Direito transformador.
Como resposta a esse Direito transformador, comina-se a visibilidade da realidade pontual e busca direcionamento para a consagração do direito ligado à defesa da vida (expressa ou implicitamente) e seu objetivo é garantir a apropriada defesa contra agressões (i)legais à natureza, emanadas quer de entidades públicas, quer de privadas, no campo individual protegido pelas bases constitucionais[16].
Dessa feita, o Direito expressa o sentido legítimo à agroecologia, a partir da semeadura de alimentos em sua dignidade, até a colheita e destinação do fruto, consequentemente, direito legítimo à sustentabilidade como protetora da vida.
Desta forma, a agroecologia é instrumento de direito, útil para promover a conservação e o uso sustentável da terra, enfocando tanto os instrumentos em vigor como os que ainda estão em construção. Em outras palavras, agroecologia é um instrumento de direito e direciona o que não se deve fazer e o que pode ser feito sob a visão do Direito e de suas ferramentas em um contexto sustentável.
Por outro lado, a agricultura tem sido avaliada como uma das principais causas e, ao mesmo tempo, uma das principais vítimas dos problemas ambientais da contemporaneidade. Essa analogia negativa não é resultado de uma evolução histórica natural e incontornável, deriva tão somente do enfoque técnico-científico, que, no século 20, fomentou a transplantação para a lavoura da lógica produtiva[17].
Pode-se considerar, então, que a modernidade passou a ser a ressignificação da sustentabilidade, através da ideologia da maximização da produção de alimentos, no discurso de que esta seria um novo paradigma de erradicação da fome e melhora da vida.
O planeta Terra vive, nos dias atuais, um período de evidentes transformações técnico-científicas, resultado dos fenômenos de desequilíbrios ecológicos, que, ao ponto em que chegaram, se não forem remediados, ameaçam a sustentabilidade em sua superfície. Concomitantemente a tais fatores que perturbam as formas de vida humana, individuais e coletivas, elas evoluem no sentido de uma progressiva degradação[18]. Nesta prima, o papel do Direito diante de tais transformações que ameaçam a sustentabilidade e o meio ambiente é de extrema relevância. Além disso, denota-se também o papel da agroecologia como instrumento e re(significação) de sustentabilidade e garantia do direito à vida.
O Homem, por não viver isolado e interagir uns com os outros e com o meio ambiente, faz parte de um ecossistema, que é o conjunto formado pelo meio ambiente físico, ou seja, o biótopo, e por fatores abióticos como: solo, água, ar, somado à comunidade (seres vivos) que com o meio se relaciona[19].
Assim, compõem a vida, que, em outras palavras, denota em sentido amplo a própria natureza que é equivalente ao "mundo natural" ou "universo físico". Por esse prisma, natureza faz referência aos fenômenos do mundo físico e, também, à vida em geral. A palavra natureza provém da palavra latina natura, que significa “qualidade essencial, disposição inata, o curso das coisas e o próprio universo”. Natura é a tradução para o latim da palavra grega physis, que em seu significado original fazia referência à forma inata que crescem espontaneamente plantas, animais e o Homem[20].
De acordo com o exposto, o Direito é um compromisso principiológico com o futuro, mantendo a boa-fé para com o passado, traduzindo o significado de sustentabilidade[21]. Tal compromisso é historicamente desenvolvido e socialmente firmado, no sentido de que a edificação de um sistema alimentar, que proteja a vida e colabore na implementação de sistemas produtivos futuros mais saudáveis[22], tem como resultado os fundamentos do que se pode entender por direito à vida.
3 CONCLUSÃO
Como demonstrado, a sustentabilidade se abre para um novo paradigma jurídico, na medida que se utiliza de novos preceitos de preservação da vida. A sustentabilidade é um paradigma em movimento, mas, também, é jurídico que supera as discussões de liberdade e de igualdade. Nesse sentido, os paradigmas demonstrados pelos manejos agroecológicos é, portanto, próprio da sociedade pós-moderna, transnacional para qual podemos caminhar.
Portanto, a sustentabilidade agroecológica pode ser considerada de fato sob uma ótica holística, para vir, então, a se determinar como um processo criativo de transformação do meio ambiente, direcionando as técnicas ecologicamente prudentes como forma de se amparar um meio ambiente equilibrado e saudável.
Dessa feita, o Direito expressa o sentido de legítimo à agroecologia, a partir do seu esforço por sustentabilidade como protetora da vida. E, assim, pode ser ressignificada a sustentabilidade como instrumento de direito, útil para promover a conservação e o uso da terra, enfocando tanto os instrumentos em vigor como os que ainda estão em construção.
Dessa forma, pode-se concluir que a agroecologia, na gênese desta construção jurídica, está inserida na sustentabilidade, como um todo interligado que impulsiona para a ideia de um modelo de desenvolvimento escolhido e prudente para o mundo. Em outras palavras, a sustentabilidade é um instrumento de Direito e direciona o que não se deve fazer e o que pode ser feito sob a visão do Direito e de suas ferramentas em um contexto sustentável.
4 REFERÊNCIAS
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[1] MIKHAILOVA, Irina. Sustentabilidade: evolução dos conceitos teóricos e os problemas da mensuração prática. Economia e Desenvolvimento, n. 16, 2004.
[2] ALZATE, Adriana Gómez. A paisagem como sistema visual e holístico: proposta metodológica para a sustentabilidade da qualidade visual ambiental, experimentada em Manizales, cidade andina colombiana. Ateliê Geográfico, v. 2, n. 2, 2008, p. 1-17.
[3] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O Princípio da sustentabilidade como Princípio estruturante do Direito Constitucional. Tékhne – Revista de Estudos Politécnicos, n. 13, 2010, p. 07-18.
[4] SANTANA, Derli Prudente; BAHIA FILHO, A. C. Qualidade do solo: Uma visão holística. B. Inf. SBCS, v. 27, 2002, p. 15-18.
[5] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O Princípio da sustentabilidade como Princípio estruturante do Direito Constitucional. Tékhne – Revista de Estudos Politécnicos, n. 13, 2010, p. 07-18.
[6] COELHO, Saulo de Oliveira Pinto; MELLO, Rodrigo Antonio Calixto. A sustentabilidade como um direito fundamental: a concretização da dignidade da pessoa humana e a necessidade de interdisciplinaridade do direito. Veredas do Direito: Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável, v. 8, n. 15, 2011.
[7] Ibidem. 2011, p. 07-18.
[8] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O Princípio da sustentabilidade como Princípio estruturante do Direito Constitucional. Tékhne – Revista de Estudos Politécnicos, n. 13, 2010, p. 07-18.
[9] HARTOG, François. Tempo e patrimônio. Varia história, v. 22, n. 36, 2006, p. 261-273.
[10] SIMIONI, Rafael Lazzarotto. Direito ambiental e sustentabilidade. Curitiba: Juruá, 2006.
[11] REAL FERRER, Gabriel; GLASENAPP, Maikon Cristiano; CRUZ, Paulo Márcio. Sustentabilidade: um novo paradigma para o direito. 2014. Revista Novos Estudos Jurídicos - Eletrônica, Vol. 19 - n. 4 - Edição Especial.
[12] FREITAS, Juarez. Sustentabilidade. Direito ao Futuro. Belo Horizonte: Fórum, 2011.
[13] CANOTILHO, José Joaquim Gomes. O Princípio da sustentabilidade como Princípio estruturante do Direito Constitucional. Tékhne – Revista de Estudos Politécnicos, n. 13, 2010, p. 07-18.
[14] LEFF, Enrique. Agroecologia e saber ambiental. Agroecologia e desenvolvimento rural sustentável, v. 3, n. 1, 2002, p. 36-51.
[15] BREDORIAL, Celso; VIEIRA, Liszt. Cidadania e política ambiental. Rio de Janeiro: Record, 1998.
[16] DE MEDEIROS, Fernanda Luiza Fontoura. Meio ambiente: direito e dever fundamental. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 167-168.
[17] PETERSEN, P.; VON DER WEID, Jean Marc; FERNANDES, Gabriel Bianconi. Agroecologia: reconciliando agricultura e natureza. Informe Agropecuário, Belo Horizonte, v. 30, n. 252, 2009.
[18] GUATARI, Félix. As três ecologias. São Paulo: Campinas, 1990. p. 7.
[19] “CONCEITOS de Ecologia” em Só Biologia. Virtuous Tecnologia da Informação, 2008-2020. Disponível em: https://www.sobiologia.com.br/conteudos/bio_ecologia/ecologia.php. Acesso em: 12 abr. 2020.
[20] MORIN, Edgar. O Paradigma perdido: a natureza humana. Lisboa: Europa-América, 1999.
[21] DANTAS, Marcelo Buzaglo. Direito ambiental de conflitos: o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e os casos de colisão com outros direitos fundamentais. 2012. 463 f. Tese (Doutorado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.
[22] MELO, Sandro Nahmias. Meio ambiente do trabalho, direito fundamental. 1999. 161 f. Dissertação (Mestrado em Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 1999.
Doutoranda em Direito Constitucional pela UNB. Mestre em Direito pela Universidade Federal de Goiás (2015), com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás (FAPEG). Especialista em Direito Constitucional. Advogada com experiência na área de Direito Público e de Direito Privado. Foi pesquisadora e bolsista pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) em projetos com a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA). É pesquisadora e Líder do Grupo de Pesquisas Interdisciplinares em Direito (GEPID), registrado no Diretório de Pesquisas do CNPq. É professora na Faculdade Evangélica de Goianésia (FACEG), mantida pela Associação Educativa Evangélica (AEE), onde desempenha as funções de membro do Núcleo Docente Estruturante (NDE) do curso de graduação em Direito; É coordenadora de estágio do curso de graduação em Direito; coordenadora do projeto de extensão Faculdade Aberta da Terceira Idade (FATI); e coordenadora de monitoria acadêmica do curso de Direito. É, ainda, professora na Faculdade Metropolitana de Anápolis (FAMA) na disciplina de Direito Constitucional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ASSIS, Luana Bispo de. A re(significação) de sustentabilidade pela agroecologia como novo paradigma de direito Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 abr 2020, 04:57. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54441/a-re-significao-de-sustentabilidade-pela-agroecologia-como-novo-paradigma-de-direito. Acesso em: 23 dez 2024.
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