RAIMUNDO FILOMENO DA ROCHA NETTO[1]
(coautor)
JULIANO DE OLIVEIRA LEONEL [2]
(orientador)
RESUMO: O presente estudo visa analisar o benefício da legalização da cannabis, popularmente conhecida como maconha, utilizando como exemplo os países que legalizaram o entorpecente, ressaltando-se o impacto da legalização da maconha no tráfico ilícito de entorpecentes. A questão é tratada como uma forma alternativa do combate ao crime organizado, vez que, o atual modelo de guerra ao ópio demonstrou-se ineficaz. Serão confrontados os dados obtidos em países nos quais a maconha é legalizada, com os dados obtidos no sistema atual brasileiro, que atualmente adota o proibicionismo, concomitantemente com a despenalização da utilização de quaisquer entorpecentes quando para consumo pessoal.
Palavras-chave: Cannabis. Legalização. Benefícios. Tráfico.
ABSTRACT: The present study aims to analyze the benefit of legalizing cannabis, popularly known as marijuana, using as an example the countries that legalized the narcotic, highlighting the impact of the legalization of marijuana on illicit drug trafficking. The issue is treated as an alternative way of fighting organized crime, since the current model of war on opium has proved ineffective. The data obtained in countries where marijuana is legalized will be compared with the data obtained in the current Brazilian system, which currently adopts prohibitionism, concomitantly with the decriminalization of the use of any narcotics when for personal consumption.
Keywords: Cannabis. Legalization. Benefits. Traffic.
Sumário: 1 introdução. 2 A criminalização das drogas. 2.1 Do surgimento das drogas.2.2 A guerra contra as drogas.2.3 As drogas no ordenamento jurídico brasileiro. 3 O consumo da maconha. 3.1 O uso medicinal da maconha. 3.2 O uso recreativo da maconha pelo mundo. 3.3 A descriminalização da maconha. 4 Viabilidade da legalização no brasil. 4.1 O tráfico de drogas. 4.2 Os benefícios da descriminalização .5 Conclusão. Referências.
O presente estudo aborda um sério problema, que está ligado ao tráfico de drogas e à legalização da Maconha no Brasil, um assunto que vem gerando grandes discussões ao seu redor, porém é sabido que desde os tempos da antiguidade já se consumiam vários tipos de ervas, que continham substâncias químicas utilizadas tanto para a alimentação como para tratamentos de doenças.
Desta forma, com a evolução da humanidade e consequentemente, da tecnologia, viu-se surgir as chamadas drogas sintéticas, produzidas em larga escala para venda ilegal, muitas dessas substâncias incluindo a Cannabis. No ordenamento jurídico brasileiro a comercialização e o uso desta, configura infração penal passível de punição, sendo que, para o comércio tem-se uma pena mais severa, enquanto para o consumo são aplicadas penas mais brandas.
O uso da maconha é bastante conturbado, porém o estudo mostra que não é somente para fins recreativos, mas sim para o uso medicinal combatendo determinadas doenças, deve-se destacar que o uso recreativo da maconha fora legalizado por alguns países pelo mundo, os quais anteriormente adotavam a teoria proibicionista. Os benefícios da legalização da maconha no Brasil podem ser os melhores possíveis, tal como ocorreu nos países que decidiram acerca da legalização da cannabis.
Muito se tem discutido, recentemente, acerca do tema, e o presente estudo visa buscar meios e formas para analisar o problema em questão, compreendendo o método descritivo de pesquisa, sendo feito e realizando o levantamento bibliográfico por meio de artigos de diversas revistas, doutrinas e sites, buscando descrever características de determinada população que neste caso se encontra no território brasileiro.
O estudo tem como objetivo explicitar como se deu o início da criminalização das drogas, fazendo assim, uma análise com o ordenamento jurídico brasileiro que em dias atuais é considerado crime portar e consumir certas substâncias, analisando, ainda, o contexto atual sobre a criminalização da maconha, a política proibicionista e analisar a possibilidade da legalização da maconha no Brasil, utilizando como embasamento os dados obtidos dos países que já a adotaram.
É considerada droga qualquer substância química, seja ela natural ou sintética lícita ou ilícita, que é capaz de mudar o estado físico ou mental de quem usa, sendo ela consumida tanto para fins medidos como remédios ou para de fato se drogar, de acordo com a Portaria n. 344, 12 de maio de 1998, da ANVISA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária:
Droga - Substância ou matéria-prima que tenha finalidade medicamentosa ou sanitária.
Entorpecente - Substância que pode determinar dependência física ou psíquica relacionada, como tal, nas listas aprovadas pela Convenção Única sobre Entorpecentes, reproduzidas nos anexos deste Regulamento Técnico.
Ao longo da história, com o surgimento e evolução do homem, estes já as consumiam, não como nos tempos modernos mais nas condições da época. Sendo assim um fato histórico presentes em várias civilizações pelo mundo, com uso direcionado a diversas finalidades. Segundo MacRae (2003): “desde a pré-história, diferentes substâncias psicoativas vêm sendo usadas para um grande leque de finalidade que se estendem do seu emprego lúdico, com fins estritamente prazerosos, até o desencadeamento de estados de êxtase místico/religioso”.
No Brasil tem sua aparição associado aos índios, que conforme levantamentos de estudos históricos, eles descobriram plantas com substâncias toxicas e as utilizavam em suas manifestações religiosas, diversos rituais e confraternizações. Dessa forma descreve Albuquerque (2014):
É utilizada tanto por grupos indígenas quanto pela população mestiça ou cabocla da Amazônia, bem como por diversos sujeitos dos centros urbanos, com diferentes finalidades: práticas, medicinais, religiosas, divinatórias, pedagógicas, dentre outras.1 Ressalto neste artigo a dimensão pedagógica da ayahuasca, uma vez que é considerada pelos grupos usuários como uma planta professora portadora de inteligência com a qual é possível travar contato e obter conhecimentos.
A primeira droga a chegar ao Brasil foi à popularmente conhecida como maconha, trazida por escravos angolanos que vinham em caravanas portuguesas, que foram os colonizadores do Brasil. Almeida (2013) descreve: “a maconha chegou ao país através dos colonizadores no século XVI, onde era cultivada no Brasil, pois era incentivada pela coroa portuguesa que tinha muito interesse nos lucros da venda da maconha, atitude que para muitos da época deveria ser contra”.
O uso de drogas ou psicoativos existem em quase toda sociedade, pois como mencionado, começou como forma de cultura de determinada sociedade, por exemplo: a cultura indígena do Brasil desenvolveu o cauim que foi derivado da mandioca. Portanto, em todo o mundo se consome drogas lícitas àquelas destinadas para tratamentos médicos conhecidos como remédios, ocorrendo da mesma forma com as ilícitas. A princípio havia um consumo moderado das drogas, porém com o avanço da tecnologia, tendo como marco principal a chegada da revolução industrial na Inglaterra, onde se passou a produzir as substâncias puras, os princípios ativos extraídos das plantas em laboratório, sendo a morfina do ópio a cocaína da coca e a cafeína do café. Tal evento proporcionou o aumento de dependentes químicos dessas substancias na sociedade, ocasionando um aumento súbito no consumo de drogas à nível mundial. Em levantamento realizado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC, 2019) estimou-se que: “em 2017, estima-se que 271 milhões de pessoas - ou 5,5% da população mundial entre 15 e 64 anos - usaram drogas no ano anterior”.
No tocante a criminalização do consumo de drogas, este vem ocasionando violência pelo consumo e, também, traz consigo o comércio irregular sobre controle dos traficantes. No mais, demonstra o descumprimento com direitos e garantias constitucionais dos cidadãos que sofrem com os métodos arbitrários de poder usado pelo o Estado, cessando-lhes a liberdade que as pertencem. A teoria do Garantismo Penal se fundamenta como um modelo normativo de direito, bem como um sistema de limites de poder de punição do Estado, não abrangendo somente a liberdade, mas também todos os demais direitos fundamentais que um cidadão possua, ou seja, é uma democracia de poderes, funcionando como uma forma de jogo, onde as regras não podem constranger a liberdade do individuo, sendo assim democrático, pois tem como finalidade moldar as regras no âmbito penal, para o garantismo, direito e garantias fundamentais são o que sustenta o lado mais fraco da relação, como se sabe no direito penal as partes não está em uma situação de igualde.
Nos dizeres de Ferrajoli (2002, p.694): “ser um projeto de democracia social, que se constitui em um Estado Social de Direitos dos cidadãos e como consequência gerando deveres ao Estado, elevando ao máximo a liberdade e diminuindo os poderes arbitrários do Estado”.
Neste ponto de vista a teoria pode ser aplicada no âmbito do direito penal, pois tem como finalidade garantir as pessoas uma convivência pacífica entre-se, possuindo meios para alcançar esse fim, sendo a proteção dos bens jurídicos mais importantes para um indivíduo, porém o direito penal com sua política de repressão ao uso de certas substâncias, esta indo de contra ponto a liberdade individual que garante ao indivíduo exprimir sua vontade a frente de um grupo, sociedade ou Estado.
A historio dos Estados Unidos contra as drogas, teve se início no comercio lucrativo do ópio, relação que mantinham com a china, comercio esse que alavancou a economia Americana dessa forma era vista com bons olhos por pessoas que tinham influência no Brasil, dessa forma descreve Valois (2017, p.48) “foi o lucrativo comercio de ópio a base da fortuna de diversas famílias Norte-americanas ligadas ao comercio e política, possibilitando a desenvolvimento da infraestrutura de transporte e informação daquele pais”, foi também nos Estados unidos que surgiram os primeiros sistemas penitenciários com a intenção de retirar de dentro da sociedade pessoas consideras viciadas para os padrões de comportamento consideradas corretos na época, após serem detidas nesses sistemas eram submetidas a medidas de resocialização pelo crimes cometidos, entre os vários motivos das prisões estavam relacionadas ao uso de drogas.
Este período foi marcado pela participação da igreja que tinha um viés de bons costumes e moral para que haja uma convivência em sociedade, deste modo os cidadãos tinham que seguir esses conceitos impostos pela a igreja, caso contrário à sociedade ficaria a cheias de indivíduos sem valores morais.
Foram, portanto, os esforços dos movimentos religiosos norte-americanos os primeiros a estimular legislações estaduais e federais de proibição das drogas nos Estados Unidos, como também a criação de um regime global de proibição das convenções internacionais e de agencias para controle de drogas das organizações internacionais. Valois (2017, p.52)
Medidas que ocasionaram um grande aumento da criminalidade devido à proibição do uso de certas substâncias, por exemplo, o álcool, dando margem para o aparecimento do narcotráfico e do crime organizado que comercializavam de forma clandestina esses produtos, contudo se intensifica a politica de repressão tendo como consequência o aumento da violência por parte do Estado em usar a força para reprimir o uso de produtos considerados ilícitos, o trafico ilegal torna muito mais caro essas substancias, assim gerando lucros exorbitantes para esses traficantes, consequentemente intensificando ainda mais esses comércios ilegais.
Apesar de tanta repressão, em vários Estados Americanos foi aprovado o uso medicinal, também o uso recreativo da maconha. É notório que a guerra contra as drogas não tem eficácia absoluta, por exemplo, o Brasil, que em sua legislação domina a política de repressão que incrimina até mesmo aqueles que somente fazem uso para consumo próprio, não obteve êxito contra o trafico de drogas, assim intensificando conflitos entre policia e traficantes, ocasionando medo, violência aos cidadãos que vivem as margens desse caos que a tempos assola a sociedade. Como pode ser travada uma guerra simplesmente pelo fato de uma lei impor condutas a um indivíduo para que o mesmo não faça o que deseja, impondo regras de como usar o próprio corpo.
2.3 As drogas no ordenamento jurídico brasileiro
A realidade do Brasil em se tratando do consumo de entorpecentes, está ligada tanto com consumo dos seus usuários como também ao tráfico desses entorpecentes, onde no Brasil pelo fato dos seus grandes centros urbano, surgem as aglomerações de pessoas que vivem em locais não apropriados para se morar, que são conhecidas por favelas, locais propícios para a venda de certas substancias, motivado pela ineficaz atuação por parte do estado no que se refere à segurança pública, contribuindo para uma política de marginalização de todos que tenho o mínimo de contato com qualquer substancia que para o sistema seja considerada ilícita, ocasionando em uma policia de repressão.
Para o direito penal brasileiro, as drogas podem estar sobre manipulação de qualquer indivíduo, sendo consumida por qualquer pessoa, ou seja, pode-se tipificar qualquer indivíduo que esteja na posse de algum entorpecente considerado ilícito. No que se refere ao crime de uso próprio de drogas, a lei nº11. 343 exemplifica no “art. 28. Quem adquirir guardar tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar será submetido às seguintes penas”.
No Brasil tanto a polícia como a política relacionada a esse tema é no sentido de impor políticas de repressão ao tráfico e consumo próprio, sendo mais severa a punição para quem trafica no que se refere ao crime de tráfico, a Lei nº11. 343, explicita:
Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
É claro que ordenamento jurídico do Brasil tomou uma posição proibicionista, indo contra a liberdade individual e consciência própria do cidadão, o direito penal busca promover uma convivência plena em sociedade, onde todos possam atuar conforme sua consciência sem que prejudique direito de outrem, assim o indivíduo ao usar droga considerada para o direito ilícito vai prejudica exclusivamente a quem usar não atingindo a esfera de outra pessoa, não se justificando toda essa repressão em torno de uma pessoa que deseja fazer uso de determinado produto.
3.1 O uso medicinal da maconha
No Brasil, o uso medicinal de produtos à base de Canabidiol em associação com outros canabinóides foi autorizado para pessoa física, desde que seja para uso próprio, mediante prescrição de profissional legalmente habilitado, para tratamento de saúde. A autorização advém da Resolução da Diretoria Colegiada número 17 (dezessete), de 06 de maio de 2015 (RDC 17/2015), que posteriormente foi substituída pela RDC 335/2020, ambas editadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA. As substâncias citadas podem ser encontradas na Cannabis sativa Linnaeus, que vulgarmente é conhecida como maconha.
A princípio, com o advento da RDC 17/2015, tais componentes passaram da lista de substâncias proibidas para lista C1 do controle especial. Diante de tal resolução, o Brasil autoriza a prescrição por neurocirurgiões, neurologistas e psiquiatras. Dentre os benefícios da substância, tem-se: os efeitos anticonvulsionantes, neuros protetores, anti-inflamatórios, antitumorais, antipsicóticos e ansiolíticos.
A resolução supramencionada, disciplina acerca da qualidade do produto a ser importado, devendo este ser constituído de derivado vegetal, possuir teor de tetrahidrocanabidiol (THC) inferior ao de Canabidiol, ser produzido e distribuído por estabelecimentos devidamente regularizados pelas autoridades competentes em seus países de origem e, por fim, conter certificado de análise, com especificação e teor de Canabidiol e THC, que atendam às exigências das autoridades competentes em seus países de origem.
Para que o brasileiro tenha acesso a medicamentos à base de Canabidiol e outros canabinóides, é necessário que realize o cadastro junto a ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), necessitando ainda, da aprovação da agência reguladora a depender de sua avaliação. Caso seja aprovado, o cadastro será válido pelo período de 1 (um) ano.
A ANVISA (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) publicou em 27 de janeiro de 2020, a RDC (Resolução da Diretoria Colegiada) 335/2020, revogando a RDC 17/2015, entretanto mantendo os mesmos procedimentos burocráticos de cadastro. Ampliou a validade do registro para 2 (dois) anos e, ainda, deixou de impor o controle do teor de tetrahidrocanabidiol (THC), que anteriormente deveria ser inferior ao de Canabidiol.
Com base nas mudanças recentes, a tendência mundial é a legalização do uso medicinal da maconha, dessa forma, o Brasil, tão somente acompanhou a legislação de países como a Argentina, Austrália, Bélgica, Canadá, Chile, Colômbia, dentre outros (WORLDPOPULATIONREVIEW, 2020).
3.2 O uso recreativo da maconha pelo mundo
Dos países que autorizam o uso recreativo da cannabis, o Canadá foi o primeiro pertencente ao G-20 que permitiu a utilização da erva de forma não medicinal (EL PAÍS, 2018). A legislação impõe idade mínima de 18 anos, restringiu, ainda, o cultivo a 4 (quatro) pés de maconha, entretanto, existe a possibilidade de adquirir o entorpecente em varejo, da mesma forma que o cigarro de tabaco no Brasil, desde que contenha os avisos quanto aos riscos à saúde (WORLDPOPULATIONREVIEW, 2020). O uso medicinal é autorizado desde 2001 e em julho de 2018 foi aprovada pelo Senado canadense a legalização do uso recreativo, entrando em vigor em 17 de outubro do mesmo ano. A justificativa para tanto, foi a de combater o mercado do tráfico e ter um maior controle quanto à saúde pública.
A princípio, os resultados da legalização no Canadá mostraram-se promissores, principalmente a arrecadação de fundos provenientes dos impostos sobre a erva, que incidem tanto na forma medicinal quanto na forma recreativa. Conforme apresentado na revista Época Negócios (2018):
Relatório do Statistics Canada divulgado em janeiro mostra que, em 2017, os canadenses gastaram US$ 5,7 milhões em maconha (prioritariamente para uso recreativo). Segundo o Quartz, a demanda por maconha medicinal e recreativa no país alcançará 575 toneladas em 2021 - o que representaria US$ 4,5 bilhões em vendas. Já o ministro de finanças canadense disse que o governo espera arrecadar, no mínimo, 300 milhões de dólares canadenses em impostos incididos no comércio de Cannabis.
No Brasil, conforme explicitado por Silva, Lima e Teixeira (2016), a projeção para uma possível legalização no território nacional alcançaria uma arrecadação tributária no patamar de R$ 5 (cinco) bilhões de reais, valendo ressaltar ainda que, haveria uma diminuição de custos com manutenção de presidiários, tratamento de saúde e custos judiciais.
Para Honório, Arroio e Silva (2006), em relação aos malefícios do uso da maconha, existem duas categorias, os que advêm do fumo da planta e os provenientes das substâncias. O hábito de fumar a erva pode causar alterações nas células do trato digestivo e, ainda, há a possibilidade de aumentar a incidência de câncer de pulmão, sendo importante salientar que os números são inferiores ao dos usuários de tabaco. Quanto aos psicoativos, à exposição em longo prazo destes, pode causar à dependência psicológica, entretanto, as pesquisas demonstraram que os princípios ativos não causam dependência física ou abstinência após a suspensão.
Em estudo realizado pela universidade de Oxford (CAMCHONG; LIM; KUMRA, 2019), nos Estados Unidos da América, foi observados que adolescentes os quais utilizaram a erva por um intervalo de 18 meses consecutivos, tiveram efeitos adversos dos supramencionados, os principais foram: a diminuição no quociente de inteligência e diminuição nas funções executivas do cérebro. Frisa-se que o estudo foi feito com intuito de ratificar uma hipótese proposta por Nora Volkow, psiquiatra diretora do Instituto Nacional de Abuso de Drogas dos Estados Unidos. No mais, os pesquisadores consideraram que para ter conclusões mais assertivas, é necessário que o estudo seja realizado em escala maior.
3.3 A descriminalização da maconha
No cenário atual, o Brasil adota a despenalização da maconha. Como mencionado anteriormente, não é penalizado o porte de entorpecentes para consumo próprio, tendo como sanção para os usuários somente advertências sobre o uso, dentre outras. Entretanto, existe uma linha tênue entre o usuário e o traficante, vez que, não é especificado em lei a quantidade exata que uma pessoa pode portar, sendo decidido subjetivamente por cada magistrado. Já em outros países, como a Bélgica, a distinção é feita na própria legislação, a qual especifica que um adulto pode portar até 3 gramas de cannabis para consumo próprio, caso exceda tal quantidade, é considerado tráfico (WORLDPOPULATIONREVIEW, 2020).
No tocante aos problemas da despenalização, existe o tráfico de entorpecentes, que além de aumentar os índices de criminalidade, diminui a qualidade do produto final, pois, por ser uma atividade ilegal e ter como único objetivo o lucro, as pessoas que manipulam o produto misturam-no com outras substâncias, visando baratear o custo de produção, para compensar o risco da traficância.
No relatório mais recente emitido pelo Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – Infopen (2020), correspondente ao período entre julho e dezembro de 2019, foram registrados um total de 989.263 presos no âmbito estadual, sendo que 200.583 destes foram encarcerados pela prática de crimes previstos na lei 11.343/2006, a lei de drogas. Na base de dados pesquisados não há informações sobre os crimes cometidos, também não há a descrição de qual entorpecente foi objeto para a prática do delito o qual deu causa à prisão.
A descriminalização da maconha, por si só, não conseguiria diminuir subitamente tais números, entretanto, diminuiria os custos consideravelmente. Em estudo realizado por Silva, Lima e Teixeira (2016), estima-se que o custo dos presos custodiados somente por crimes relacionados à maconha, atinge o patamar de R$ 997.300.000 (novecentos e noventa e sete milhões e trezentos mil reais). Vale ressaltar que, para tal estimativa, os autores utilizaram uma média de custo mensal de R$ 1.824,44 (mil oitocentos e vinte e quatro reais e quarenta e quatro centavos), entretanto, o Conselho Nacional de Justiça (2017) estimou por meio da presidente na época Cármem Lúcia, que cada pessoa custodiada no sistema prisional brasileiro custa em média R$2.400,00 (dois mil e quatrocentos reais). E mais, na época da estimativa, haviam 151.843 presos por crimes relacionados a entorpecentes, no momento atual, conforme mencionado anteriormente, os números chegaram a 200.583 encarcerados. Desta forma, os números atualizados certamente ultrapassam a quantia de um bilhão de reais para a manutenção dos presidiários que cometeram crimes com porte ou tráfico de cannabis.
4 VIABILIDADE DA LEGALIZAÇÃO NO BRASIL
A problemática advinda do tráfico de drogas não se exaure na comercialização de entorpecentes ilegais, vez que, também, difunde diversos outros crimes previstos em lei, o que poderia ser combatido com uma possível legalização, vez que, o tráfico é uma instituição que somente existe para suprir a demanda dos usuários (ANDOS; SANCHES, 2014).
Tomando como exemplo países em que houve a legalização da cannabis, vale citar os Estados Unidos da América, no qual alguns estados normatizaram acerca da liberação do uso recreativo, com isso, a quantidade de maconha traficada diminuiu absolutamente, conforme levantamento realizado pela Ilisp (2017), os dados oficiais da Patrulha de Fronteira dos Estados Unidos da América mostraram que a quantidade de maconha apreendida nas fronteiras americanas chegara ao número de 1147 toneladas em 2011. Em 2014 começaram as legalizações, e diminuiu a quantidade, para 870 toneladas. Conforme levantamento mais recente, o ano de 2019 alcançou a marca de 121 toneladas, uma diminuição súbita, quando comparado com os anos anteriores (STATISTA, 2020).
Ou seja, no caso dos Estados Unidos, a diminuição da demanda consequentemente diminuiu o tráfico, entretanto, não conseguiu extinguir. Segundo um agricultor de cannabis mexicano, o quilo que costumava ser vendido entre U$ 60,00 e U$ 90,00, agora está sendo vendido entre U$ 30,00 e U$ 40,00 dólares (NPR,2014). A relação entre a queda do valor venal e a diminuição da quantidade apreendida parece lógica, vez que o lucro dos traficantes foi reduzido abruptamente, fazendo com que o risco não seja compensado pela vantagem econômica.
O ministro do Supremo Tribunal Federal, Luís Roberto Barroso, entende que não é suficiente a descriminalização, sendo a legalização das drogas a medida mais sensata, pois esta poderia diminuir o poder do tráfico, que advém da ilegalidade. A opinião tem como fundamento a falha do método atual, qual seja a guerra contra as drogas, mostrando-se então a legalização uma maneira alternativa de lidar com os problemas, devendo ser realizada a princípio pela maconha, posteriormente estendendo-se às demais drogas (O GLOBO, 2017).
As estatísticas alcançadas nos Estados Unidos da América têm total convergência com a opinião explicitada por Luís Roberto Barroso, vez que, em 9 anos a quantidade apreendida pelas autoridades de repressão ao tráfico americanas decresceu de 1147 toneladas para 121 toneladas. A justificativa também se mostra convergente, pois houve a diminuição do valor venal da maconha traficada, o que desencadeou na diminuição da venda, pois não há uma compensação monetária suficiente pelo risco da atividade no mercado clandestino.
4.2 Os benefícios da descriminalização
Quanto aos benefícios, pode-se discutir acerca da perda do monopólio do comércio por parte dos capitalistas do narcotráfico de drogas, assim descreve Sírtoli, Filho e Schaedler (2019, p.8): “A diminuição do tráfico. Como já esclarecido acima, a venda ilegal cairia drasticamente, graças a uma melhor qualidade do produto, e a conscientização do cidadão de adquirir um produto legal”. Com a legalização da maconha, pode o governo iniciar a cobrança de impostos sobre esse produto, que antes somente ocasionavam problemas para o Estado, tanto na área de saúde pública, quanto segurança pública.
Em Portugal, com o advento da descriminalização da maconha, foram obtidos bons retornos à sociedade portuguesa, quais sejam, a diminuição do consumo de drogas e o aumento da procura para o tratamento de dependência a essas substâncias. Na análise de Annan et al. (2016), Portugal pode ser o país mais bem-sucedido nessa prática, pois após a descriminalização de toda substancia ilícita foram obtidos resultados positivos, como a própria redução ao consumo de drogas em determinados setores de pessoas vulneráveis e houve aumento na procura de tratamento.
Ademais, a legalização pode diminuir um grande problema existente no Brasil, o sistema carcerário, que se encontra em uma situação de superlotação por faltas de vagas e falta de investimento. Além disso, um grande numero de prisões relacionadas à maconha, pelo simples fato da marginalização por parte da sociedade contra quem faz o uso de alguma substância considerada proibida, dessa forma entende-se que existe uma seleção para a realização de prisões relacionadas ao uso de drogas. Da mesma forma entende Oliveira (2018, p.59):
O direito penal pune de forma seletiva e desigual, desde o momento em que determinadas condutas são classificadas como crime e outras não, até o momento da aplicação da norma em que os indivíduos são escolhidos seletivamente para se submeterem as normas penais.
Por fim, a legalização pode trazer resultados positivos diversos, como a diminuição do consumo desse entorpecente, o aumento na procura de tratamento médico, necessitando, ainda, ser tratada de forma similar ao do álcool e ao cigarro de tabaco, com proibição de consumo para menores de 18 anos e advertências acerca da sua utilização (DE AZEVEDO; DA CRUZ, 2015).
A legalização da maconha como meio de combate ao tráfico, mostrou-se promissora nos países que adotaram tal medida. Apesar dos bons resultados, a implementação não garantiria a extinção do tráfico, vez que, diferentemente dos países comparados, no Brasil o mercado ilícito de drogas é uma entidade forte, o que torna mais dificultoso o embate. Como benefícios colaterais, foram identificados principalmente os econômicos, advindos da diminuição da sobrecarga do sistema penitenciário e da arrecadação de tributos sobre a cannabis. Portanto, a legalização pode ser estudada como um meio alternativo para o conflito com o crime organizado.
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[1] Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho UNIFSA. E-mail: [email protected].
[2] Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho. Mestre em Direito pela Universidade Católica de Brasília - UCB. E-mail: [email protected].
Graduando em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Amadeu Neto Lopes de. Os benefícios da legalização da maconha no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 maio 2020, 04:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54543/os-benefcios-da-legalizao-da-maconha-no-brasil. Acesso em: 23 dez 2024.
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