ROGER RODRIGUES LIPPI[1]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo abordará o estudo bibliográfico e os Decretos de Lei nº 1.164/71 (revogado) e o Decreto de Lei nº 2.375/87, que revogou o anterior já mencionado, e seus efeitos diante da regularização fundiária na Amazônia Legal, com o foco no Estado do Tocantins. Buscando desta forma, compreender o embate entre União Federal e o Estado do Tocantins, no instituto jurídico das terras devolutas, que estão localizadas as margens da BR-153, popularmente conhecida como Belém-Brasília, a 100 km de cada lado, desde a época do Norte Goiano, até 1988 quando foi constituído o mais novo estado do Brasil, gerando com isso, algumas ações cíveis originárias até meados do século XXI.
PALAVRAS-CHAVE: Amazônia Legal; Regularização Fundiária; Rodovia Federal BR-153; Tocantins.
ABSTRACT: This article will address the bibliographic study and Law Decrees nº 1,164 / 71 (repealed) and Law Decree nº 2,375 / 87 that revoked the previous mentioned, and its effects in the face of land regularization in the Legal Amazon, with a focus on Tocantins State. In this way, seeking to understand the clash between the Federal Union and the State of Tocantins, in the legal institute of vacant lands that are located on the bank of the BR-153, popularly known as Belém-Brasília, 100 km on each side, since the time of the north Goiano, until 1988 when the newest state of Brazil was constituted, thus generating some civil lawsuits originating until the middle of the 21st century.
KEYWORDS: Legal Amazon; Land Regularization; Federal Highway BR-153; Tocantins.
SUMÁRIO: Introdução. 1. A Regularização Fundiária na Amazônia Legal. 2. Breve Análise Legislativa das Terras Devolutas na Amazônia Legal: um conflito fundiário entre o Estado e a União. 3. Análise dos Discursos e Argumentos do Supremo Tribunal Federal. 4. A Medida Provisória nº 910 e suas Inovações. 5. Considerações Finais. 6. Referências.
INTRODUÇÃO
Este artigo investiga alguns fatos históricos que ocorreram por volta de 1971, e que para muitas pessoas, esses fatos são tão presentes nos dias atuais que não parece ter um futuro diferente, mesmo com o passar de algumas décadas, pois estão interligados e vividos nos dias de hoje. A história narra os acontecimentos para que possamos ter embasamento, conhecimento da transformação da sociedade, do indivíduo, normas, e assim por diante. O presente artigo científico, compreendendo o Direito como um fato social[2], busca esclarecer as incongruências decorrentes da omissão do Estado, no que tange a regularização fundiária na Amazônia Legal, com foco na região do Estado do Tocantins, e primordialmente a partir da análise legislativa e do discurso jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal.
A propriedade rural no Brasil começa com o Tratado de Tordesilhas, com a divisão de terras em capitanias hereditárias. Essa colonização foi feita pelos donatários, e as pessoas que produziam na área, eram os sesmeiros que pagavam tributos por essas terras, com isso originou sesmaria, e quem as recebia, tinha o domínio útil; quem não pagava, teria a pena de comisso, ou seja, devolvia as terras, e aqui surgem as terras devolutas. Esse problema de domínio[3] está entranhado no contexto histórico e jurídico até hoje. Essa parte encontra-se com aprofundamento no primeiro momento desse artigo.
As terras devolutas, que enquanto objeto deste estudo, ficam localizadas dentro da Amazônia Legal, no Estado do Tocantins, as margens da rodovia federal BR-153, popularmente conhecida como Belém – Brasília, situadas a 100km tanto, da margem direita, quanto da esquerda, gerando questionamento jurídico acerca da federalização das terras amazônicas.
Esse problema fundiário vem muito antes da divisão do Estado do Goiás para Tocantins, a União e o Estado tem conflitos de competência e os particulares ficam à mercê do judiciário na decisão quanto essas terras. Diante dos fatos o presente estudo pretende compreender os dispositivos jurídicos e buscar investigar cientificamente de quem é a competência nessas áreas que ficam as margens da BR-153 no Tocantins e qual o entendimento do Supremo Tribunal Federal – STF, quanto a essa questão fundiária.
A pesquisa cientifica utilizou-se da metodologia indutivo e/ou o dedutivo que são instrumentos da pesquisa científica. A abordagem adotada é a metodologia bibliográfica das doutrinas, legislação, jurisprudência, Leis e Decretos, dissertações e artigos. Acrescenta-se ainda, a utilização da ferramenta interdisciplinar da análise do discurso, sob a doutrina do mestre Patrick Charaudeau, para compreender e demonstrar como se articula e se constrói o discurso do Supremo Tribunal Federal sobre a temática.
A narrativa desse estudo é desenvolvida por essa introdução, abordando o levantamento quanto a regularização fundiária na Amazônia Legal, breve análise legislativa das terras devolutas na Amazônia legal, análise do discurso dos argumentos do Supremo Tribunal Federal, Medida Provisória 910 e suas inovações e considerações finais e referências.
1. A REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA NA AMAZÔNIA LEGAL
Entre os anos de 1930-1945, foi realizada a colonização da região Norte do Brasil, pois o governo começou a olhar para essa região de uma forma tática, voltado ao benefício nacional. O slogan na era militar para essa região era “Integrar para não Entregar”[4], foi nessa época que foram abertas as rodovias federais em meio a mata fechada do norte Goiano até o estado do Amazonas.
Após esse desbravamento, ainda na época militar, foram feitas algumas transferências de áreas públicas para o privado, o maior detentor ainda era o Estado e a União.
Já em 1953 foi aprovada a Lei 1.806/53 que criou a Amazônia Legal e que falava da obrigatoriedade de se criar projeto de desenvolvimento e que fossem destinados recursos conforme os projetos. (LOUREIRO, 2015, p.77)
Em seu artigo 2º a Lei 1.806/1953 dispõe que:
Art. 2º A Amazônia brasileira, para efeito de planejamento econômico e execução do Plano definido nesta lei, abrange a região compreendida pelos Estados do Pará e do Amazonas, pelos territórios federais do Acre, Amapá, Guaporé e Rio Branco e ainda, a parte do Estado de Mato Grosso a norte do paralelo de 16º, a do Estado de Goiás a norte do paralelo de 13º e a do Maranhão a oeste do meridiano de 44º. (BRASIL, 1953).
Dessa forma, ficou definido os Estados que fariam parte da Amazônia Legal. As terras do Norte do Brasil foram ocupadas de forma irregulares, desde a época do império português, na Amazônia Legal não era diferente. Conforme preleciona Loureiro (2005, p.77):
Até meados dos anos de 1960, as terras amazônicas pertenciam basicamente à União e aos estados. Do total das terras registradas pelo IBGE2, 87% constituíam-se de matas e terras incultas, que eram exploradas por milhares de caboclos e ribeirinhos que viviam do extrativismo vegetal e animal; 11% constituíam-se de pastos naturais onde antigos fazendeiros haviam assentado fazendas de gado, sendo muitas delas seculares [...], cujos títulos de terra eram igualmente antigos [...]. A mata e os rios estavam preservados e eram aproveitados pelos habitantes como fonte de alimento, trabalho e vida.
Em meados de 1964, depois do golpe militar, as regiões dos Estados da Amazônia Legal obtiveram investimentos nas áreas do desenvolvimento econômico e infraestrutura, tudo isso por meio de créditos e incentivos fiscais que eram sugeridos ao ente privado, outorgados por meio da SUDAM - Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia, que estava em busca da abertura no mercado exterior e nacional para a ampliação econômica dessa região. Achava –se que as “áreas rurais disponíveis” poderia apaziguar os embates jurídicos de outras regiões, e assim atrair pessoas para os Estados e o norte goiano.
É bem verdade que na década de 70 foi instituído o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – INCRA, com o objetivo de dar a legitimidade aos posseiros e de agregar à União, as áreas devolutas e também destinar as terras sem ocupação, ou seja, sem os posseiros.
Durante o ano de 1971, o Decreto de Lei Nº 1.164/71 foi editado, fazendo com que as terras que até então eram de domínio do Estado passassem a pertencer a União Federal, ou seja, retirou dos Estados; a sua localização encontra-se as margens das estradas federais 100 km de cada lado das rodovias, que fazem parte da Amazônia Legal.
No presente caso, no Tocantins, a BR-153 conhecida como Belém-Brasília, passa do Sul do estado até a região Norte de uma ponta a outra, com isso o estado teve grande perda de suas áreas de terras para a regularização fundiária, o que sobrou, ficou para o Governo do Estado do Tocantins sob sua jurisdição. Nas terras federais, a União teve como base a Lei de Nº 6.383/76, para fazer o processo discriminatório dar destino, identificar e arrecadar as áreas das faixas de terras públicas.
Ansiava que todo esse procedimento discriminatório processual pudesse sobressair as áreas públicas devolutas e as que pertenciam ao ente privado, levando a findar todo esse procedimento discriminatório, e assim, obterem os registros dessas áreas devolutas com a discriminação pertencente à União. (LOUREIRO, 2005, p. 80)
As terras que foram arrecadadas/confiscadas pela União tiveram várias funções, tais como: colonização, agropecuária, plantações, mineração, venda e outras finalidades. Os novos detentores não respeitavam as demarcações, ampliando a extensão de terra das áreas originárias que possuíam.
Mas em 1987, o antigo Getat, que era o Grupo Executivo de Terras Araguaia-Tocantins, criado durante a ditadura para, supostamente, resolver conflitos agrários e questões fundiárias da zona situada entre os dois rios do mesmo nome, foi extinto e o Decreto de Lei Nº 1.164/71 que arrecadou as terras dos Estados da Amazônia Legal foi revogado, o que perdurou por 20 anos, mas não houve a nulidade dos atos e os óbices que foram ocasionados, ou seja, as áreas continuaram sob o poder da União, não retornando as terras para os estados originários. Sendo assim, o Governo do Estado teve, e tem até hoje, problemas de regularização fundiária nessas áreas da Amazônia Legal. (LOUREIRO, 2005, p. 87).
2. BREVE ANÁLISE LEGISLATIVA DAS TERRAS DEVOLUTAS NA AMAZÔNIA LEGAL: UM CONFLITO FUNDIÁRIO ENTRE O ESTADO E A UNIÃO
O Estado do Tocantins, desde a sua criação, vem tendo conflitos jurisdicionais com a União por meio do INCRA, devido as suas áreas de terras devolutas, que em seu entendimento, deveriam estar sob o seu domínio desde a sua criação em 1988.
Por sua vez, quando o Estado titula essas terras, o INCRA, descaracteriza a legitimidade da emissão desses títulos, entrando com ações cíveis originárias, recorrendo ao Decreto de Lei de nº 1.164/71 (revogado), e do Decreto de Lei de nº 2.375/87.
O Decreto de Lei nº 1.164/71 seria para diminuir os conflitos agrários no norte do país e declarava “indispensável à segurança e ao desenvolvimento nacional terras devolutas situadas na faixa de cem quilômetros de largura em cada lado do eixo de rodovias na Amazônia Legal”[5]. Porém, foi instituído na época da ditadura militar, confiscando áreas devolutas dos Estados e incorporando ao patrimônio da União. E isso foi feito sem qualquer indenização aos Estados atingidos pela medida, e foi praticamente todo o território das terras devolutas que ficava na Amazônia Legal, poucas áreas sobraram aos Estados, ficando assim, conhecida como “federalização das terras amazônica[6]”.
Entre os anos de 1982 e 1984 essas terras passaram a ter matrículas, pertencendo a União quem realizou esse procedimento na época foi o Getat – Grupo Executivo de Terras Araguaia-Tocantins.
Em 1987, teve o novo Decreto de Lei nº 2.375, do decorrente ano que revogou o Decreto anterior de nº 1.164/71, mas manteve as terras devolutas em nome da União, mesmo tendo sido na época militar por meio de arrecadação sumária.
No presente caso o Estado do Goiás já possuía lide em termos do conflito territorial entre as entidades, originando ações discriminatórias, mas com a divisão do Goiás/Tocantins, esses processos foram arquivados depois de 1988, ano de criação do Estado do Tocantins, aumentando mais ainda a insegurança jurídica e promovendo um maior impasse de competência entre os poderes e os particulares.
O processo nº 492/71 – arquivado na Comarca de Tocantinópolis incluía toda a região de Wanderlândia, Babaçulândia, Filadélfia e parte de Araguaína, levando em conta o memorial descritivo anexado aos autos naquela época (1963), também foi devolvido ao Estado do Tocantins, por decisão do juiz federal naqueles autos. (Biblioteca do Órgão - Estudo do Itertins das Terras Devolutas, 2007, p. 13).
Nos dias de hoje, o Estado do Tocantins entende que o INCRA interpreta de maneira favorável o decreto que legaliza as áreas da rodovia federal BR-153, devido aos § 1º e § 2º do artigo 2º do Decreto 2.375/87[7] que diz:
Art. 2º Incluir-se-ão, vigente este decreto-lei, entre os bens do Estado ou Território, no qual se situem, nos termos do artigo 5º da Constituição, as terras públicas devolutas às quais retirada, pelo artigo anterior, a qualificação de indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais.
§ 1º Permanecerá inalterada a situação jurídica das terras públicas, não devolutas, da União, existentes nas faixas a que alude o artigo 1º, caput.
§ 2º Constituirão terras públicas não devolutas, abrangidas pelo § 1º, aquelas que, na data de publicação deste decreto-lei, estejam:
I - afetadas, de modo expresso ou tácito, a uso público, comum ou especial, ou a fim de utilidade pública;
II - sob destinação de interesse social;
III - a configurar objeto de situações jurídicas, já constituídas ou em processo de formação, a favor de alguém;
IV - registradas, na forma da lei, em nome de pessoa jurídica pública.
3º Para os efeitos deste decreto-lei:
I – consideram-se afetadas a uso público, ou a fim de utilidade pública, as terras públicas sob uso ou aplicação pela União, pelos Estados, Municípios, Territórios e respectivos entes descentralizados, inclusive os que atuem por outorga ou mediante delegação do Poder Público.
Já o Estado do Tocantins interpreta o artigo 1º do mesmo decreto, entendendo que houve alteração de domínio a seu favor:
Art. 1º Deixam de ser consideradas indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacional as atuais terras públicas devolutas situadas nas faixas, de cem quilômetros de largura, em cada lado do eixo das rodovias, já construídas, em construção ou projetadas, a que se refere o Decreto-lei nº 1.164, de 1º de abril de 1971, observado o disposto neste artigo.
Parágrafo único. Persistem indispensáveis à segurança nacional e sob o domínio da União, dentre as terras públicas devolutas em referência, as que estejam:
I - incluídas, cumulativamente, na Faixa de Fronteiras;
II - contidas nos Municípios de Humaitá (AM), São Gabriel da Cachoeira (AM), Caracaraí (RR), Porto Velho (RO), Ji-Paraná (RO), Vilhena (RO}, Altamira (PA), Itaituba (PA), Marabá (PA) e Imperatriz (MA).
O Estado do Tocantins entende que o INCRA/GETAT promoveu a desapropriação de forma indireta das terras devolutas por meio do Decreto de Lei 1.164/71 e que seriam processos administrativos nulos, pois não houve o devido processo legal e do contraditório por meio de arrecadação sumária na época do governo militar. O decreto de lei nº 2.375/87 que revogou o anterior, em seu artigo 2º é inconstitucional e que o Estado sobreveio a União nas áreas de terras devolutas, ou não, em todo o seu território, a partir da sua criação em 1988. Sendo assim, o entendimento do Estado do Tocantins vem titularizando as terras, os cartórios registrando e o INCRA contestando as matrículas nas ações no Supremo Tribunal Federal, entre os órgãos e particulares.
3. ANÁLISE DOS DISCURSOS E ARGUMENTOS DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Na presente pesquisa, foram analisados os discursos jurídicos em relação aos acórdãos, e seu aspecto histórico-social da regularização fundiária e o aspecto dominical, que tiveram seus processos originários da Justiça Federal da seção judiciária do Estado do Tocantins, sendo enviados ao Supremo Tribunal Federal – STF, por se tratar de ação civil originária. Essa análise é uma ferramenta interdisciplinar que visa auxiliar na explicação dos argumentos do Supremo Tribunal Federal, compreendendo de que forma se deu o julgamento de cada acórdão a ser analisado. Omitindo o nome de particulares envolvidos na celeuma jurídica, em obediência aos princípios morais e éticos, no entanto todos os sujeitos que participaram da lide foram analisados.
No primeiro momento, tem o Supremo Tribunal Federal, fazendo o julgamento do pleno[8] e aceitando o litigio na corte, por se tratar a causa de conflito entre Estado e União, podendo ter outros e entidade da administração indireta.
EMENTA: Litígio entre autarquia federal e estado-membro sobre propriedade de terras devolutas. Questão de ordem. - Litígio dessa natureza envolve questão que diz respeito diretamente ao equilíbrio federativo, sendo, portanto, causa que inequivocamente e da competência originária desta corte na posição de tribunal da federação que lhe outorga o artigo 102, i, "f", da constituição federal. Questão de ordem que se resolve pelo reconhecimento da competência desta corte para o processo e julgamento originários da presente ação. (DJ 24-11-1995 PP-40377 EMENT VOL-01810-01 PP-00121).
O litígio em face de nulidade e cancelamento do registro sobre a propriedade de terras devolutas entre uma autarquia federal, que diz ser uma área de terras devolutas da União, e o Estado do Tocantins com o litisconsorte passivo, alega que essas áreas devolutas eram do estado-membro, referenciada na Ementa supra, corresponde à seguinte Ação Cível Ordinária nº 477[9] TO:
AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA. São da União as glebas que, anteriormente à edição do Decreto-Lei nº 2375/87, tinham sido incorporadas ao patrimônio dela pelo Decreto-Lei nº 1164/71 (cuja constitucionalidade se reconhece), e que foram excepcionadas por ele de seu âmbito de aplicação por estarem registradas, na forma da lei, em nome de pessoa jurídica pública e por configurarem objeto de situação jurídica, já constituída ou em processo de formação, a favor de alguém. Ação julgada procedente, sendo a reconvenção julgada improcedente. (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 477. Relator Ministro Moreira Alves – Pleno. DJ: 27/06/2002. Diário da Justiça, 2002).
Com relação ao processo recepcionado, o autor /INCRA alegou que área de terra de uma fazenda localizada no município de Peixe - TO, foi incorporada ao patrimônio da União em 1984 e, assim, obteve uma matrícula. E ressalta que o Governo do Estado do Tocantins, por meio de sua autarquia Itertins, expediu título definitivo e que realizou uma venda “a non domino”, ou seja, o Estado não dispõe do bem, pois não te pertence, logo, não é o proprietário, e não pode realizar a venda, e que o ato era nulo. Vale ressaltar que nessa época o código civil vigente era o de 1916.
Ainda de acordo com a decisão supratranscrita, foi pedida a nulidade dos títulos do Itertins e o cancelamento da matrícula[10]:
c) À vista dos documentos anexos e levando-se em consideração a expedição irregular dos Títulos Definitivos mencionados, comprova-se, claramente, que o órgão de terras deste Estado realizou uma venda “a non domino” e em total inobservância da legislação pertinente, o que torna o ato nulo de pleno direito.
Os réus, Itertins e particulares, que estavam na posse, contestaram em conjunto, alegando a posse ter sido mansa, pacífica e sem oposição de terceiros, estando na área há mais de um ano e um dia e que os títulos do Estado do Tocantins deveriam ser reconhecidos. O Estado do Tocantins contestou preliminarmente a ilegitimidade ativa ad causam[11], ou seja, a condição da ação, e a incompetência o Supremo Tribunal Federal devido a revogação do Decreto de Lei nº 1.164/71 por meio do 2.375/87, pois entende que com a revogação, as terras passaram para o Estado-membro[12].
O Decreto-Lei nº 1.164, de 01 de abril de 1971, declarou “indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacional terras devolutas situadas na faixa de cem quilômetros de largura em cada lado de eixo das rodovias na Amazônia Legal”.
Assim, as terras devolutas, como as do caso “sub judice”, passaram a pertencer a União por força do Decreto-Lei nº 1.164 citado, até a edição do Decreto nº 2.375/87, que revogou. (fls 04 e 05)
O Supremo Tribunal Federal já em 1995, ao analisar esse imbróglio jurídico, entendia que as terras devolutas da Amazônia Legal, no eixo de 100 km de cada lado, e que foram arrecadas pelo INCRA/GETAT, pertenciam a União. Mas se na data do Decreto Lei nº 2.375/87, ainda não tivesse sido feita a arrecadação da área pela União Federal, como autoriza o decreto 1.164/71, não poderia mais arrecadar. Portanto, na data do Decreto 2.375/87, o INCRA já havia arrecadado essas terras e registrado em cartório. Conforme retratado no retrocitado processo[13]:
19. Não foi isso, entretanto, o que ocorreu: por ocasião da edição do Decreto-lei nº 2.375, de 1987, a aludida arrecadação JÁ SE HAVIA ULTIMADO, como o comprovam os documentos de fls. 9/10 e, especialmente, a certidão do Cartório do 1º Ofício e Registro Geral de Imóveis da Comarca de Pedro Afonso, Termo de Lizardo, Estado de Goiás, lavrada em 19 de março de 1980 (fls.12).
20. Bem por isso, muito certamente fez-se NULO o registro imobiliário da transmissão feita pelo Itertins – Instituto Nacional de Terras do Estado do Tocantins já em 21 de junho de 1994.
21. Isso porque, segundo parece claro, a revogação efetuada pelo Decreto-lei nº 2.375, de 1987, não teve o condão de desconstituir os ATOS JURIDÍDICOS PERFEITOS, acabados a sombra do texto legal revogado.
22. Trata-se, aliás, de situação jurídica que o Decreto-lei revocatório nº 2.375, de 1987, cuidou explicitamente de prever, ao assim dispor, em seu art. 2º. (fl.11)
Cumpre observar, que o ato jurídico perfeito, é o princípio da segurança jurídica que guarda as conjunturas formadas na vigência da lei anterior, pois os efeitos da lei nova são para o futuro.
Portanto o Supremo Tribunal Federal – STF, entende que as terras devolutas da lide (acórdão 477), pertencem à União e declara a nulidade dos títulos expedidos pelo Governo do Estado do Tocantins e suas matrículas e condena as custas e honorários no valor de dez mil reais.
Esse é o entendimento do Supremo no ano de 1995, agora vamos analisar o entendimento em 2016, com a nova Constituição Federal e o novo Código de Processo Civil e os Decretos em questão, analisados na Ação Cível Ordinária nº 478[14]:
AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. Terras devolutas arrecadas pela União, com fundamento no Decreto-lei nº 1.164/71, revogado posteriormente pelo Decreto-lei nº 2.375/87. Ressalva às situações jurídicas já consolidadas sob a normatização anterior. Arrecadação, incorporação e registro imobiliário definitivo das terras devolutas ao patrimônio da União antes da revogação do Decreto-lei nº 1.164/71. Certificação pelo oficial do registro de imóveis competente da inexistência de registro imobiliário versado sobre as respectivas glebas. Ausência de reclamações administrativas manejadas por terceiros proprietários ou possuidora certificada pela Delegacia do Serviço de Patrimônio da União no Estado de Goiás e pelo Instituto de Desenvolvimento Agrário de Goiás (IDAGO). Não comprovação pelos réus de propriedade ou posse das terras em momento anterior ao levantamento. Precedentes. Nulidade de título translativo de domínio emitido pelo Estado do Tocantins, que, em nenhum momento, gozava da condição de proprietário do imóvel rústico. Ação julgada procedente. (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 478 TO. Relator Ministro Dias Tóffoli – Pleno. DJ: 05/08/2015. Diário da Justiça, 2015).
O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA, teve sentença favorável na Ação Originária do Acórdão 478, em que o Governo do Estado do Tocantins, por meio de sua autarquia, emitiu títulos a particulares em relação a uma área de terra localizada em Marianópolis –TO, e os particulares pretendiam que fosse declarada a nulidade da arrecadação da área, feita pelo extinto Grupo Executivo das Terras do Araguaia/Tocantins - GETAT e incorporada ao patrimônio da União, com base na Lei nº 1.164/71, que estabelecia que as terras devolutas na faixa de 100 km, às margens das Rodovias Federais, passariam a pertencer a União.
O processo tramitou inicialmente no 1ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Tocantins, e foi enviado ao Supremo Tribunal Federal no mesmo ano de 2015. Não se tem grandes novidades no pedido do autor e defesa dos réus, sempre o embate acontece devido ao Decreto de Lei nº 1.164/71 que foi revogado pelo Decreto de Lei nº 2.375/87. Conforme expresso no Acórdão 478[15]:
Na ordem jurídica anterior, era previsão do art. 4º, inciso I, da Emenda Constitucional nº 1/69, que:
“Art. 4º Incluem-se entre os bens da União: I - a porção de terras devolutas indispensável à segurança e ao desenvolvimento nacionais”.
Sob o pálio desse dispositivo, foi editado o Decreto-lei nº 1.164/71, segundo o qual:
“Art. 1º São declaradas indispensáveis à segurança e ao desenvolvimento nacionais, na região da Amazônia Legal, definida no artigo 2º, da Lei nº 5.173, de 27 de outubro de 1966, as terras devolutas situadas na faixa de cem quilômetros de largura, em cada lado do eixo das seguintes rodovias já construídas, em construção ou projetadas:
(…)
Art 2º Ficam incluídas ente os bens da União, nos termos do artigo 4º, item I da Constituição, as terras devolutas a que se refere o artigo anterior.
Art 3º As posses legítimas, manifestadas por morada habitual e cultura efetiva, sobre porções de terras devolutas situadas nas faixas de que trata o artigo 1º, serão reconhecidas pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária nos termos dos artigos 11 e 97 do Estatuto da Terra (Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964).
Parágrafo único. Continuam a reger-se pela Lei nº 2.597, 12 de setembro de 1955, as terras devolutas na zona de fronteira a que se refere o artigo 2º da mesma Lei.
(…)
Art 5º São ressalvados, nas áreas abrangidas pelo artigo 1º: a) os direitos dos silvícolas, nos termos do artigo 198 da Constituição;
b) as situações jurídicas constituídas, até a vigência deste Decreto-lei, de conformidade com a legislação estadual respectiva”. (Fls. 7 e 8). (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 478 TO. Relator Ministro Dias Tóffoli – Pleno. DJ: 05/08/2015. Diário da Justiça, 2015) .
O que consta no processo é que essa área de cerca de 3,1 hectares foi arrecada pela União/Getat, por meio da Portaria nº 787, de 21 de agosto de 1979, e não houve contestação de terceiros:
Sem qualquer impedimento, portanto, o Presidente da autarquia fundiária baixou a Portaria nº 787, de 21 de agosto de 1979, arrecadando e incorporando as mencionadas terras devolutas ao patrimônio da União (fls. 415/417), sendo levadas a registro no Cartório de Registo de Imóveis de Marianópolis em 31 de outubro de 1979, sob o nº R-1-772, Livro 2-A, conforme certidão de fl. 420/421. (fl. 10). (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 478 TO. Relator Ministro Dias Tóffoli – Pleno. DJ: 05/08/2015. Diário da Justiça, 2015)
O Estado do Tocantins emitiu título definitivo a particulares, no ano de 1993 e, assim, esse título seria nulo.
Ante o exposto, julgo procedente a ação para declarar a nulidade do Título Definitivo nº 1.449 (fl. 373/374), emitido pelo Instituto de Terras do Estado do Tocantins (ITERTINS), bem como determino o cancelamento da matrícula R-1-M-368 (fl. 375), efetuada pelo Registro de Imóveis do Município de Marianópolis do Tocantins. (fl.13). (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 478 TO. Relator Ministro Dias Tóffoli – Pleno. DJ: 05/08/2015. Diário da Justiça, 2015)
A produção de provas dessa lide foi apenas documental e levou a entidade federativa a analisar, devido ao risco à estabilidade do pacto federativo sendo um preceito Constitucional, sem nenhum impacto político. Não há o que se discutir neste caso, na questão do imóvel como bem “indispensável à segurança e ao desenvolvimento nacional”, objeto do Decreto-Lei nº 1.164/71 e que fez com que essas áreas de terras fossem arrecadadas.
O que leva essa demanda processual, que perdurou por vinte anos e seis meses entre Incra e Governo do Tocantins dessa área e que se inovou, foi a preocupação com a responsabilidade da evicção[16] que essas entidades possam ter em relação aos particulares.
[...] mesmo que na via pertinente, em virtude da possível declaração de nulidade do título dominial expedido em favor dos particulares. Ante a transcrição da propriedade em nome destes, a disputa não se dá, de forma imediata, entre Estado e União, mas entre esta e os particulares, objetivando a irresignação dos entes locais a obstar que os adquirentes da área formalizem contra si pretensão indenizatória. (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 478 TO. Relator Ministro Dias Tóffoli – Pleno. DJ: 05/08/2015. Diário da Justiça, 2015)
De acordo com o informativo do Supremo Tribunal Federal, do ano de 2015 que se deu devido a esse julgado, “não subsiste o ato de transmissão de propriedades efetuado por Estado – Membro se o imóvel rural nunca pertenceu ao ente federado.”[17]
No caso presente o Supremo Tribunal Federal ampliou o vício aos negócios jurídicos seguintes, assegurando aos réus adquirentes os direitos decorrentes da evicção, nos termos do art. 447 e seguintes do Código Civil.
Art. 447. Nos contratos onerosos, o alienante responde pela evicção. Subsiste esta garantia ainda que a aquisição se tenha realizado em hasta pública.
Sendo assim, nenhuma pessoa ou órgão poderá transmitir mais direitos do que aqueles que possui ou titulariza: “do contrário, a transmissão da propriedade constituiria típica hipótese de alienação a non domínio.” (STF. AÇÃO CÍVEL ORDINÁRIA - ACO Nº 478 TO. Relator Ministro Dias Tóffoli – Pleno. DJ: 05/08/2015. Diário da Justiça, 2015).
Com o entendimento do conceito de evicção, neste caso, o adquirente/particular e terceiro de boa-fé, está perdendo total a sua posse, devido a decisão judicial e bem explicada e fundamentada juridicamente e que foi anterior à aquisição da terra, conforme se depreende do art. 1268 do Código Civil:
Art. 1.268. Feita por quem não seja proprietário, a tradição não aliena a propriedade, exceto se a coisa, oferecida ao público, em leilão ou estabelecimento comercial, for transferida em circunstâncias tais que, ao adquirente de boa-fé, como a qualquer pessoa, o alienante se afigurar dono.
Sendo assim, a decisão do Supremo Tribunal Federal em relação ao Acórdão retrocitado[18]:
O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do Relator, julgou procedente a ação para declarar a nulidade do Título Definitivo nº 1.449, emitido pelo Instituto de Terras do Estado do Tocantins – ITERTINS em favor dos réus(...), bem como determinar o cancelamento da matrícula R-1-M-368, efetuada pelo Registro de Imóveis do Município de Marianópolis do Tocantins, estendendo-se o vício aos negócios jurídicos subsequentes, assegurados aos réus adquirentes os direitos decorrentes da evicção, nos termos do art. 447 e seguintes do Código Civil, e fixados os honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) do valor atualizado da causa, nos termos do art. 20, § 4º, do CPC, a ser rateado equitativamente pelos réus. Vencido o Ministro Marco Aurélio apenas quanto à questão da competência do Supremo Tribunal Federal para apreciar a matéria.
Conforme o ato julgado no Supremo Tribunal Federal, o título do Itertins foi cancelado assim como a matricula cartorária, sendo também assegurado aos particulares o direito de evicção.
4. A MEDIDA PROVISÓRIA Nº 910 E SUAS INOVAÇÕES
A medida provisória de nº 910, busca modificar a Lei de nº 11.952 de 2009, que trata da “regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União” e altera também outras leis.
Neste momento de pesquisa, a medida provisória passou a ser um Projeto de Lei 2.633, possui seis artigos e muda a forma que é feito a regularização fundiária nas ocupações incidentes nas terras situadas como áreas da União.
O estudo vai se atentar somente a Lei de nº 11.952/2009 que terá a maior alteração sendo aprovada. A maior discussão presente é que deixaria de ser restritas as áreas de terra da Amazônia Legal e passaria a ter abrangência de todo o território nacional, “em áreas de domínio da União ou do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – Incra” (art. 1º, 3º § P.U).
Havia outra mudança quanto a data de ocupação na MP 910, que seria as terras ocupadas até 5 de maio de 2014, com a PL não vai haver essa modificação na vigência nas ocupações, e permanece a data de 22 de julho de 2008, a posse tem que ter sido mansa e passiva e deve estar produzindo.
Na antiga MP 910, os módulos mudariam de quatro (minifúndio), para quinze, o que foi modificado na proposta da PL 2633 e passou para seis módulos fiscais. Essa medida atinge a regularização fundiária no Tocantins, que hoje é de até quatro módulos fiscais e quem a fixa é o INCRA de cada Estado.
Outra alteração é a auto declaração nos processos administrativos e o Cadastro Ambiental Rural – CAD, área verificada por sensoriamento remoto. Caso essa terra já tenha sofrido alguma infração, essa sim, terá que ter vistoria prévia dos técnicos. Hoje não tem vistoria em áreas de até 1650ha, aqui se amplia para 2.500ha.
Determina que o imóvel arrematado em leilão, seja dado em garantia do seu próprio pagamento, pois caso tenha inadimplência, se tem a restituição do bem da União. A terra também pode ser alienável para empréstimo que tenha como finalidade para o próprio bem.
Amplia-se também a forma de negociação dos contratos que não foram cumpridos nas entidades que regulamentam os órgãos fundiários, passa a competência do legislativo para o executivo e quem fica responsável é a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários (SEAF).
Essas alterações não são novidades, já que a mesma Lei teve alteração, devido a MP 759 que foi convertida em Lei de nº 13.465/2017. O entendimento do Supremo Tribunal Federal quanto a essas duas Leis é que são passíveis de questionamento.
No caso presente, se esse Projeto de Lei passar, só na Amazônia Legal serão titulados cerca de 272 mil imóveis, e no Brasil cerca de 92% das terras da União teriam seus posseiros reconhecidos. O projeto de lei vai de encontro as terras devolutas, ou “não destinadas” na Amazônia.
Manifestando-se contra o projeto, Fearnside (2020, p. 02) argumenta que:
O projeto de lei é simplesmente desnecessário por já ser tratado em leis anteriores. A inclusão destas repetições serve para permitir discursos alegando de que “necessita” da nova lei para beneficiar pequenos agricultores, apesar desta parte já ser coberta pela atual legislação. As partes novas da matéria são as que beneficiam os grandes grileiros.
O Tribunal de Contas da União - TCU tem um acórdão 727/2020[19] que diz o seguinte em relação a regularização fundiária na Amazônia Legal: “verificou a falta de providências para a recuperação de áreas irregularmente ocupadas e a ausência de medidas para retomada e destinação de áreas cujos processos de regularização foram indeferidos”.
E o INCRA deverá parar de emitir o Certificado de Cadastro de Imóvel Rural - CAR, das terras que não tem títulos de posse e também as de propriedade que são aceitos na Amazônia Legal.
Sendo assim o Tribunal de Contas da União - TCU deliberou ao Incra que retome as terras da União que foram ocupadas irregularmente e que não tende as exigências necessárias quanto a legislação da Lei 11.952/2009. Pois a ocupação foi ilegal, ocorrendo depois do indeferimento quanto à regularização dessas áreas de terras.
A medida provisória, que foi convertida em Projeto de Lei, busca diminuir as demandas administrativas quanto a regularização fundiária nas terras da União em todo o território nacional, trazendo celeridade nesse rito.
Porém, com o foco na regularização fundiária na Amazônia Legal, as terras devolutas e as lides no judiciário apreciando as reportagens, entrevista e mesas redondas, vê-se que pode piorar as demandas no judiciário devido as sobreposições que hoje já temos no Estado do Tocantins, sendo realizada a vistoria prévia dos técnicos e observando os confrontantes, os cartórios por sua vez poderiam dar entrada nas ações de suscitação nos órgãos judicias para terem uma segurança jurídica ao emitirem as matrículas das áreas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como o exposto nos capítulos anteriores, o Supremo Tribunal Federal – STF entende que as terras são da União, as que estão na Amazônia Legal situados no Estado do Tocantins, a margens da rodovia federal BR- 153, pois foram arrecadadas administrativamente ainda no ano de 1971 e que a revogação do Decreto de Lei 1.164/71 por meio do 2.375/87 não devolve as terras ao ente federado, mesmo com a criação do Tocantins em 1988.
Neste sentido, deve- se dizer que já se tem uma decisão com grande apreciação quanto essa matéria na corte sendo bem fundamentada e decidida anteriormente em outros acórdãos. Observa-se que as lides mais recentes no Supremo são para se entender se há evicção nessas ações.
No caso do objeto de estudo, uma das soluções seria estabelecer um termo de cooperação entre o Estado do Tocantins e Goiás para que possam trocar informações quanto aos títulos do Idago, Getat, os títulos paroquiais, para tentar diminuir os conflitos.
Porém, teria como se devolver essas terras ao Tocantins por meio de um mecanismo de Lei ou Decreto Federal. Pois a Constituição Federal de 1988, em seu art. 20, inciso II e no seu artigo 26, inciso IV, possibilita essa hipótese, mas o Estado tem que entrar com ação cabível e em conjunto com os demais que fazem parte da Amazônia Legal.
Recentemente, obteve a realização de transferência de algumas áreas de terra da União para os Estados de Roraima e Amapá, o projeto ainda precisa da sanção presidencial. Mas já é uma inovação quanto à matéria.
Deve ser levada em consideração a necessidade dessa inovação e parceria entre os órgãos Estaduais e Federais, para que juntos possam suprir a ineficiência da real necessidade quanto a regularização fundiária no Estado do Tocantins, como as terras devolutas, assentamentos, Arrecadação, medição, demarcação, as terras não devolutas, georeferenciamento, conflito nas divisas do Tocantins com os Estados de Goiás, Piauí e Bahia, ações discriminatórias, que essas problemáticas, quanto a regularização possam ter celeridade processual e segurança jurídica, fazendo com que as terras cumpram de fato sua função social gerando renda, trazendo aumento da produtividade ao Estado, tendo uma exploração racional da terra.
Conclui-se que é um assunto de grande relevância ao Estado do Tocantins, que tem muitos embates a frente e que é necessário difundir mais ainda a respeito desse assunto, pois quase não se acham obras que discutam tal assuntos e que possam nortear os embates fundiários.
6. REFERÊNCIAS
BRASIL. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. In: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 11 jan. 2002. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm>. Acesso em: 04 jun. 2020.
______. Supremo Tribunal Federal. Livro Informativo: Teses e Fundamentos. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoInformativoLivro/anexo/informativos2015.pdf> Acesso em: 23 abr. 2020.
______. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Acórdão de decisão que negou provimento ao recurso. Apelação Crime nº 70076016484. Ederson da Silva Rodrigues e Ministério Público. Relatora: Desembargadora Naele Ochoa Piazzeta. 31 de janeiro de 2018. Disponível em: < https://www.tjrs.jus.br/buscas/jurisprudencia/exibe_html.php> Acesso em: 06 jun. 2020.
FEARNSIDE, Philip Martin. O Perigo da Lei da Grilagem. 2020. Disponível em: < https://amazoniareal.com.br/o-perigo-da-lei-da-grilagem/> Acesso em: 27 mai. 2020.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro v. 03. São Paulo: Saraiva, 2004.
LIMA, Rui C. Pequena História Territorial do Brasil. 1ª ed. Goiás: UFG, 2002.
LOUREIRO, Violeta Refkalefsky. A Questão Fundiária na Amazônia. Dossiê Amazônia brasileira II, v.19 n.54. São Paulo maio/ago. 2005. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/ea/v19n54/04.pdf>. Acesso em: 08 abr. 2020.
MARQUES, Benedito Ferreira; MARQUES, Carla Regina Silva. Direito Agrário Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2016.
MELO, Marcelo Augusto Santana. Breves Anotações sobre Registro de Imóveis. Disponível em: < https://www.anoreg.org.br/images/arquivos/parecerrr.pdf> Acesso em: 07 abr. 2020.
SILVA, Sérgio S. Expansão Cafeeira e Origens da Indústria no Brasil. 8ª ed. São Paulo: Alfa Omega, 1995.
TOCANTINS. ITERTINS. Estudo das Terras Devolutas. Biblioteca: 2007, p. 13.
[1] LIPPI, Roger Rodrigues, Mestre em Direito Civil pela UFRJ, Professor da Graduação e Pós Graduação na Faculdade Serra do Carmo - FASECl, Pesquisador do Ineac-Lafep/UFF. E-mail: [email protected]
[2] O direito como fato social é toda maneira, de agir, fixa ou não, suscetível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior ou mais ainda, que é geral na extensão de uma sociedade dada, apresentando uma existência própria, independente das manifestações individuais que possa ter. (DURKHEIM, Emile. As Regras do Método Sociológico. São Paulo: Editora Nacional, 1982, p.128).
[3] [...] Domínio é objetivado numa coisa, num bem jurídico, do qual ressaem as faculdades de usar, gozar e dispor. (MARQUES, Benedito Ferreira. Direito Agrário Brasileiro. 12ª ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 43).
[4] O slogan “Integrar para não entregar” é título do livro: Integrar para não Entregar de Ariovaldo Umbelino de Oliveira, cujo objetivo é desvendar o que estava por trás dos planos governamentais, sobretudo no pós-segunda guerra no Brasil, para entender a lógica da atuação governamental com relação aos Estados da Amazônia. (OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino de. Políticas Públicas e Amazônia. São Paulo: Papirus, 1988, p. 26).
[5] LOUREIRO, Violeta Refkalefsky. A Questão Fundiária na Amazônia. Dossiê amazônia brasileira II, v.19 n.54. São Paulo maio/ago. 2005. Disponível em: <https://www.scielo.br/pdf/ea/v19n54/04.pdf>. Acesso em: 08 abr. 2020.
[6] Id., 2005, p. 86.
[7] BRASIL. DECRETO-LEI Nº 2.375, DE 24 de novembro de 1987. Revoga o Decreto-lei nº 1.164, de 1º de abril de 1971, dispõe sobre terras públicas, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del2375.htm> Acesso em: 20 abr. 2020.
[8] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Questão de Ordem referente à ACO 477 TO. Disponível em: <https://stf.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/14703126/questao-de-ordem-na-acao-civel-originaria-aco-477-to> Acesso em: 27 mai. 2020.
[9] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ACO 477 TO. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur97637/false> Acesso em: 23 abr. 2020.
[10] Id, ACO 477
[11] A legitimidade ad causam é requisito de admissibilidade subjetivo relacionado às partes de uma demanda, ao passo que o interesse de agir consiste em requisito objetivo extrínseco positivo. (DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. v.1. 17ª ed. Salvador: Juspodivm, 2015, p. 342.
[12] Id, ACO 477.
[13] Id, ACO 477.
[14] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ACO 478 TO. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10162732> Acesso em: 09 abr. 2020.
[15] Id., ACO 478.
[16] Evicção: é a perda da posse ou a propriedade de um bem que adquiriu, por determinação judicial, movida por outras partes. (GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro v.3. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 62).
[17]Brasil. Supremo Tribunal Federal. Livro Informativo: Teses e Fundamentos. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/publicacaoInformativoLivro/anexo/informativos2015.pdf> Acesso em: 23 abr. 2020.
[18] Id, ACO 478.
[19] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Disponível em: <https://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/incra-tera-de-buscar-a-recuperacao-de-imoveis-na-amazonia-legal.htm > Acesso em: 27 mai. 2020.
Acadêmica de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BUGANO, Karen Cristina. Regularização fundiária: a disputa dominical entre União e Estado do Tocantins Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 jun 2020, 04:19. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54746/regularizao-fundiria-a-disputa-dominical-entre-unio-e-estado-do-tocantins. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
Por: Fábio Gouveia Carneiro
Por: Juliana Melissa Lucas Vilela e Melo
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