ELTA MARIA DE ARAÚJO[1]
(coautora)
CLÉA MARA COUTINHO[2]
(orientadora)
RESUMO: O influenciador digital exerce um papel importante na formação de opinião dos seguidores, capaz de modificar comportamentos e impulsionar o consumismo. As empresas estão cada vez mais interessadas em novas formas de interação com o consumidor, para isso, têm recorrido aos influenciadores digitais, a fim de obter clientes e gerar lucros. Este artigo tem como escopo analisar a responsabilidade civil dos influenciadores digitais em seus trabalhos de marketing, pela ótica da legislação consumerista, bem como avaliar a aplicação da legislação brasileira nas publicidades realizadas por intermédio da rede social Instagram. Propõe-se, ainda, avaliar a possibilidade de equiparação do influenciador digital aos fornecedores, quando inseridos na relação de consumo. A análise pretendida ancora-se nos estudos da doutrina, na jurisprudência e nas decisões do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR). Para tanto, a metodologia utilizada é de natureza qualitativa, através de uma revisão bibliográfica. Conclui-se que o influenciador digital ao anunciar um produto ou serviço na plataforma Instagram, integra a cadeia publicitária, pois agrega ao anúncio uma confiabilidade preexistente na sua relação com os seguidores e, portanto, essa relação de prestação de serviços não pode se dar sem observar as diretrizes básicas que regulamentam a publicidade e as normas protetivas do consumidor.
Palavras-chave: Publicidade. Marketing de influência. Instagram. Influenciador digital. Responsabilidade.
ABSTRACT: The digital influencer exercises an important role in forming the opinion of followers, able of modify behaviors and boost consumerism. Companies are increasingly interested in new forms of interaction with the consumer, for this reason, they have resorted to digital influencers in order to obtain customers and generate profits. This article aims to analyze the civil responsibility of digital influencers in their marketing efforts, from the perspective of consumer legislation, as well as evaluating the application of Brazilian legislation in advertising carried out through the social network Instagram. It is also proposed to evaluate the possibility of matching the digital influencer to the suppliers, when inserted on the consumption relationship. The intended analysis is anchored in the studies of the doctrine, jurisprudence and in the decisions of the National Advertising Self-Regulation Council (CONAR). Therefore, the methodology used is of a qualitative nature, through a bibliographic review. It is concluded that the digital influencer when advertising a product or service on the Instagram platform, integrates the advertising chain, because it adds to the advertising a pre-existing reliability in its relationship with the followers and therefore, this service provision relationship cannot happen without observing the basic guidelines that regulate advertising and consumer protection standards.
Keywords: Advertising. Influence Marketing. Instagram. Digital influencer. Responsibility.
Sumário: 1. Introdução. 2. O Influencer Digital. 2.1 A ampliação de plataformas e aplicativos com enfoque no Instagram. 2.2 O papel do influenciador digital nos efeitos que a publicidade produz. 3. A publicidade no Instagram. 3.1 A regulamentação da publicidade digital no ordenamento jurídico brasileiro. 3.2 Marketing de influência e a publicidade no Instagram. 3.3 Publicidade ilícita nas plataformas digitais. 4. A responsabilização do Influenciador Digital. 4.1 A Responsabilização frente aos prejuízos causados aos consumidores. 4.2 Decisões do CONAR referente à responsabilização de influenciadores digitais. 5. Considerações Finais. 6. Referências.
1 INTRODUÇÃO
As transformações advindas do desenvolvimento tecnológico pelo qual a internet tem passado ao longo dessas cinco décadas trouxeram diversas mudanças para a sociedade, através de novas possibilidades de interações virtuais que aproximam cada vez mais as pessoas, principalmente com o crescente uso das redes sociais.
Em meio à difusão de tantas informações movimentadas na era da conectividade, é certo que as reformulações ocorridas no mercado trouxeram grandes avanços na área do marketing, gerando a necessidade de uma adaptação do marketing de conteúdo, com vistas a atender um mercado inclusivo e ao mesmo tempo competitivo.
Diante disso, graças a essas novas formas de interação no ambiente digital, o comércio vem conquistando um espaço cada vez mais amplo no mundo, trazendo novas possibilidades tanto para os consumidores, quanto para os fornecedores.
Nesse ínterim, indivíduos dotados de informações, engajamento, com um alto poder de convencimento e capazes de influenciar a opinião e o comportamento de milhões de seguidores, por intermédio da exposição rotineira do seu cotidiano, têm sido amplamente utilizados como ferramentas nas mais diversas parcerias comerciais, caracterizando-se como uma das principais tendências de marketing e comunicação da atualidade. Nesse âmbito, surgem os influenciadores digitais, que, através dessas parcerias, passaram a trabalhar na divulgação de produtos e serviços nas variadas plataformas digitais, fazendo com que a publicidade realizada ganhasse novas perspectivas e, por conseguinte, trazendo à tona um processo de profissionalização desses influenciadores.
Diante do exposto, o presente artigo possui como objetivo principal analisar a possibilidade de responsabilização do influenciador digital que cria, produz ou divulga conteúdos, no aplicativo Instagram. Faz-se imperativo, também, avaliar a aplicação da legislação brasileira nas publicidades realizadas no Instagram, sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor, e a possibilidade de equiparação do influenciador digital aos fornecedores, quando inseridos na relação de consumo.
O tema do presente artigo é de suma relevância, pelo fato de que os influenciadores digitais estão intimamente relacionados à ascensão das redes sociais nas diversas áreas das nossas vidas, principalmente no mercado digital. Trata-se de figuras que estão cada vez mais presentes na divulgação de produtos e serviços, impulsionando marcas, serviços e profissionais, graças ao seu grande alcance nas redes sociais, que se caracterizam como espaços virtuais que, atualmente, constituem-se como relevantes e principais meios de informação, interação e comércio.
Em relação à metodologia aplicada, foi utilizado o método de abordagem dedutivo, analisando a principiologia das normas consumeristas, buscando demonstrar a possibilidade de responsabilização dos influenciadores digitais sob a ótica do Código de Defesa do Consumidor. O trabalho baseia-se na análise de pesquisa bibliográfica realizada a partir de livros, artigos publicados em revistas especializadas, da legislação brasileira sobre a espécie, além dos veículos virtuais compatíveis.
O trabalho será desenvolvido em três capítulos, a saber: no primeiro, será feita uma análise sobre a figura do influenciador digital e sua maneira de operar nas plataformas e aplicativos; no segundo, tratar-se-á da legislação aplicada à publicidade na plataforma digital Instagram e no terceiro, será abordada a questão da responsabilização do Influenciador Digital, quando inserido na relação de consumo.
2 O INFLUENCIADOR DIGITAL
De antemão, insta salientar que devemos tecer alguns comentários para que assim fixe-se a conceituação mais técnica possível do influenciador digital, para viabilizar a compreensão da temática ora abordada, objetivando uma melhor compreensão do tema.
Em um primeiro momento, verifica-se que o nicho do influenciador digital são as redes sociais, visto que seu perfil de usuário é seguido por várias pessoas que procuram as publicações no intuito de informar-se acerca do que é postado. Assim podemos concluir que o influenciador digital é uma pessoa famosa nas redes sociais, possuindo vários seguidores que diariamente acompanham e consomem aquilo que é postado.
Outro ponto importante a ser levantado é a necessidade de aceitação do público quanto às informações veiculadas pelos influenciadores. Para isso, faz-se necessário que esses influencers ganhem a confiança desse público de seguidores, através da criação de conteúdos aleatórios. Quando consolidada essa relação entre influenciador e seguidores, surge a fidelidade desse público, com o surgimento da credibilidade em suas publicações, nas suas. Por conseguinte, estabelece-se uma verdadeira interação entre quem veicula a informação e quem a absorve. Como visto, trata-se de estratégias a serem executadas, cujo objetivo colimado é o consumo do serviço e produto veiculados pela figura do influenciador digital.
De certa forma, isso ocorre em decorrência da personalidade e outros atributos pessoais do influenciador digital que faz com que o seguidor se identifique, criando assim essa confiança outrora já mencionada. Além do consumo do produto e serviços veiculados, outra consequência dessa simbiose é o crescente número de seguidores que passam a consumir o que é publicado e também a divulgar, o que eleva o potencial de marketing e alcance daquele influencer em especial. Com isso, os influenciadores digitais se tornam figuras lucrativas e vantajosas para os potenciais clientes/contratantes de sua imagem e de tudo aquilo que ela agrega.
No intuito de melhor esclarecer sobre o assunto, importa mencionar que:
O termo influenciador digital, derivado do inglês “digital influencer” passou a ser usado mais comumente, no Brasil, a partir de 2015. Um dos principais motivos pode estar atrelado a entrada de novos aplicativos na esfera de produção desses profissionais que deixaram de se restringir a apenas uma plataforma – só o YouTube, no caso dos vlogueiros; ou só o blog, no caso dos blogueiros (KARHAWI, 2017, p. 7).
Desse modo, pode-se inferir que o engajamento dos influenciadores digitais nas mídias sociais, sobretudo na plataforma Instagram, produz seguidores, contudo, há necessidade de se estabelecer uma relação de confiança para que o seguidor se identifique e acredite o suficiente para consumir o que está sendo publicado. Por conta disso, muitos influenciadores acabam criando um perfil e até mesmo um estilo de vida que agregue não só a sua imagem, mas também aos produtos relacionados com suas divulgações, para que, dessa forma, eles possam atribuir verdade e consistência àquilo que se quer vender.
Explicamos: se um influencer faz propagandas de produtos estéticos, é interessante e coerente que o mesmo tenha os resultados que o produto promete, pois, esse profissional se caracteriza como a vitrine do que é anunciado e isso vai agregar confiança àqueles produtos e torná-los mais fidedignos.
Diante do exposto, percebe-se que o influenciador, assim como o próprio nome diz, desempenha um importante papel no marketing atual e na comercialização de produtos em geral, uma vez que é o mais novo e atual vetor de propaganda existente, veiculando produtos e informações na internet e, com isso, influenciando uma gama inestimável de pessoas diferentes.
Ser um influencer (ou blogueiro), como é comumente chamado, significa ter um efeito direto nas decisões daqueles que o seguem, sendo responsáveis pela mudança no estilo de vida, nas opiniões, no comportamento e no aumento do consumismo de seus fiéis seguidores (ALVES, 2019).
Essas pessoas que se destacam nas redes socais, possuem a capacidade de mobilizar um grande número de seguidores, pautando opiniões e comportamentos e até mesmo criando conteúdos que sejam exclusivos.
Nesse ponto, entendemos ser oportuno destacar o posicionamento de Messa (2016) a respeito do conceito técnico de influenciador digital para que possamos entender melhor a pessoa prestadora desse tipo de serviço:
O fato é que todo influenciador digital não deixa de ser um formador de opinião, mas gostaria de reservar esse novo termo para destacar determinadas pessoas que mereciam mais atenção daqueles que trabalham com comunicação. Penso que influenciador digital é um termo que caberia melhor para identificar aquelas pessoas que fazem parte de um nicho muito específico e, dentro deste grupo, possuem um volume de conexões superior à média das pessoas que pertencem a esse nicho.
Quanto às especialidades de influenciadores digitais, podemos vislumbrar que estes trabalham com um público-alvo em um nicho de mercado, como por exemplo, o mercado da moda, mercado dos games e o mercado dos esportes.
2.1 A ampliação de plataformas e aplicativos com enfoque no Instagram
Em decorrência do mundo globalizado em que estamos inseridos e diante da facilidade dos mecanismos que vêm sendo desenvolvidos através da ampla difusão das redes de internet no mundo, as demandas cotidianas se tornaram mais acessíveis à vida das pessoas e das empresas, inclusive no setor de vendas. Diante disso, o Instagram surge como uma das maiores redes comerciais, constituindo-se como uma verdadeira "vitrine virtual" que cada vez mais conquista os consumidores por conta da celeridade.
O Instagram é uma rede social recente, que tem como função originária o compartilhamento de fotos e vídeos, no feed e stories entre os usuários da rede. Essa rede social foi criada em outubro de 2010, desenvolvida pelo norte-americano Kevin Systrom e pelo brasileiro Mike Krieger, atualmente possui mais de 500 milhões de contas ativas que desfrutam o serviço de compartilhar fotos e vídeos, em sua maioria, para retratar o cotidiano (SILVESTRE, 2017).
Vários acontecimentos até mesmo imprevisíveis são transmitidos simultaneamente pelos usuários dessa plataforma, levando estes fatos ao conhecimento de todo o mundo conectado pelo Instagram. O aplicativo torna-se atrativo tanto para o entretenimento quanto para a propaganda, considerando que essas características exclusivas da rede social permitem uma melhor publicização dos produtos e serviços dos fornecedores.
Nesse sentido, o Instagram é uma rede social que funciona como um grande mural para expor fotos e vídeos, diariamente inúmeras pessoas publicam, curtem, compartilham o conteúdo com outros usuários, sendo possível ainda, gravar pequenos vídeos em sequência (stories) que ficam disponíveis por um tempo determinado de 24 (vinte e quatro) horas e logo depois são automaticamente apagados (SILVESTRE, 2017).
Podemos perceber, em suma, com essa extensa lista de funções e possibilidades, que é uma rede social criada para permitir a conexão imediata, a interação entre as pessoas e a veiculação, numa velocidade extraordinária, de informações com a exposição de fotos, vídeos textos, dentre outros. Devido a isso, é possível perceber que as pessoas estão cada vez mais voltadas para informações disponibilizadas nas mídias sociais, através da Internet, dada a maior praticidade e facilidade de interação entre os usuários e as informações que são publicadas em tempo real.
Porém, apesar da presença cada vez mais incisiva do influenciador digital, não há atualmente no ordenamento jurídico brasileiro norma legal que venha a regulamentar a profissão. Neste ponto, é salutar expor que tramita no Poder Legislativo Federal o Projeto de Lei – PL nº 10937/2018, de autoria do Deputado Federal Eduardo da Fonte do PP/PE, que visa regulamentar o ofício do influenciador digital, assegurar e facilitar o trabalho das novas gerações, sem dúvidas é um avanço do ponto de vista do Legislativo.
Em razão da estrutura do Projeto de Lei em comento, a transcrição dos dispositivos candidatos à positivação se torna viável e interessante neste caso, haja vista que poderá nos esclarecer como se dará a relação jurídica desses profissionais. Vejamos:
O referido Projeto de Lei se encontra sujeito a apreciação conclusiva das comissões desde 16 de março de 2020. Conforme podemos vislumbrar, a regulamentação da profissão de influenciador digital está na iminência de ser positivado pelo Poder Legislativo Federal, a quem cabe legislar sobre assuntos dessa estirpe, conforme comando constitucional.
2.2 O Papel do influenciador digital nos efeitos que a publicidade produz
Segundo Silvestre (2017), o influenciador digital é importante para a publicidade de produtos e serviços, dada a sua notoriedade nas redes sociais, já que esta nova forma de publicizar mercadorias e atingir novos públicos consiste nas empresas ou marcas utilizarem os influenciadores para se comunicar com seu público-alvo, através do prestígio social conquistado neste micro meio, e assim “chancelar” e dar credibilidade aos produtos anunciados.
Neste sentido, é evidente que esta publicidade abrange o mercado dos usuários de redes socais, que possui como base o influenciador digital. Sem dúvidas ele é o vetor entre o produto e o consumidor, haja vista que os mesmos apresentam aos seguidores nas redes sociais o produto ou serviço que se pretende comercializar.
Esta relação deve sempre guardar laços com a boa-fé, probidade e obediência aos ditames da legislação consumerista visto que estes são os fundamentos norteadores para as relações de consumo nas redes sociais. A observância destes preceitos juntamente com uma boa postura traduz uma imagem positiva deste influenciador nas redes sociais, trazendo inegáveis benefícios e rentabilidade ao fornecedor.
Caso o influenciador acabe por envolver-se em polêmicas, principalmente com relação a temas sensíveis, expondo opiniões contrárias ao da massa de consumidores/seguidores, poderá ter suas parcerias prejudicadas, tendo em vista que na era da exposição as empresas optam por não vincular sua marca a um influenciador que causa repulsa nas redes sociais.
Nesse viés, cita-se o exemplo da influenciadora digital Mariana Saad e sua ex-patrocinadora, a empresa Seara. In casu, em meio à pandemia mundial causada pelo COVID-19 (patógeno gripal que para seu combate exige o distanciamento social) a influenciadora Mariana Saad foi vista em uma festa particular, violando as medidas de distanciamento social impostas pelo Governo para evitar o contágio. O fato levou a empresa Seara, ao tomar conhecimento dos fatos, exibir repúdio à conduta da influenciadora e possível rompimento de contrato (VOGUE, 2020).
Outra situação de influenciadores digitais que se envolveram em polêmicas no período da pandemia, é o caso da influenciadora digital Gabriele Pugliese que, a exemplo de Mariana Saad, também perdeu patrocinadores após promover uma festa na sua residência. A repercussão negativa do episódio levou as empresas com as quais a influenciadora mantinha parcerias a anunciarem que estariam rompendo ou não renovando contratos (VOGUE, 2020).
Tais situações fáticas demonstram a potencialidade das manifestações expostas pelos influenciadores digitais nas plataformas de mídia social, bem como os reflexos de seus posicionamentos na confiabilidade de uma marca ou empresa.
Por isso, diante do exposto, percebemos como o influenciador digital tem uma grande responsabilidade quanto aos conteúdos que criam, bem como com as informações que veiculam com sua própria imagem, que hoje é considerada sua marca de divulgação e o cerne de todo marketing e publicidade.
3 A PUBLICIDADE NO INSTAGRAM
Conforme tratado anteriormente, o Instagram é uma das plataformas digitais mais utilizadas na atualidade e, em virtude do seu elevado alcance de pessoas, tem se tornado palco de grandes veiculações publicitárias por empresas e marcas dos mais variados ramos. Oportuno, então, discorrer preliminarmente sobre algumas definições de publicidade e sua regulamentação no Brasil.
3.1 A regulamentação da publicidade digital no ordenamento jurídico brasileiro
O Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CBAP), regulamento promovido pelo Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (CONAR) na Seção 2, que trata dos objetivos do código, apresenta a seguinte definição para a publicidade:
Artigo 8º O principal objetivo deste Código é a regulamentação das normas éticas aplicáveis à publicidade e propaganda, assim entendidas como atividades destinadas a estimular o consumo de bens e serviços, bem como promover instituições, conceitos ou ideias (CONAR, 1980).
Nessa mesma direção, Bolzan (2019, p. 547) enfatiza que a publicidade tem natureza comercial, definindo-a:
Como a informação veiculada ao público consumidor com objetivo de promover comercialmente e, ainda que indiretamente, produto ou serviço disponibilizado ao mercado de consumo.
Nesse contexto, o Código de Defesa do Consumidor (CDC), Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990 (Brasil, 1990), não trouxe um conceito jurídico para publicidade, atentando-se às definições de publicidade abusiva e enganosa e estabelecendo os princípios que regulamentam a atividade consumerista, como convém citar, o principio da identificação fácil e imediata, da lealdade publicitária, da vinculação e da oferta, da transparência e da proibição da publicidade ilícita.
Consubstanciando as diretrizes principiológicas do CDC sobre o princípio da vinculação da oferta e da transparência, Tartuce e Neves (2020, p.369) enunciam que “O conteúdo relativo à oferta deve ser completo, de modo que o consumidor seja devidamente informado a respeito daquilo que estar sendo adquirido”.
A respeito do principio da identificação publicitária, o CDC estabelece que a publicidade seja veiculada de forma que seja fácil e imediatamente identificável pelo consumidor. No tocante ao princípio da transparência de campanhas perante o público, a legislação consumerista proíbe a realização de publicidade nas modalidades tidas como enganosa ou abusiva, definindo tais modalidades nos termos do artigo abaixo transcrito:
Artigo 37, § 1.º É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. § 2.º é abusiva dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança (BRASIL, 1990).
O Código Consumerista prevê ainda que a publicidade enganosa pode vir a ser caracterizada por uma omissão, quando for veiculada sem informar dado essencial do produto ou serviço.
Quanto ao CONAR, trata-se de uma organização não-governamental, constituída por publicitários e profissionais de diversas áreas. O Conselho é o organismo responsável pela auto-regulamentação do mercado publicitário através do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária. Foi fundado em 1950, pela Associação Brasileira de Agências de Publicidade e tem a missão de impedir que a publicidade enganosa ou abusiva cause constrangimento ao consumidor ou a empresas e defender a liberdade de expressão comercial (CONAR, 1980).
A regulamentação feita da publicidade no nosso ordenamento jurídico brasileiro está constituída sob um sistema misto de normas, em que estão presentes normas de ordem pública da legislação nacional e normas aplicadas pelo setor privado, através do CONAR.
Ressalta-se, ainda, que, apesar da ausência de legislação específica sobre a publicidade realizada pelo influenciador digital, o CDC e o CONAR estabelecem princípios que devem ser aplicados aos anúncios feitos pelos influenciadores nas redes sociais e, portanto, os anúncios devem ser respeitosos, honestos e verdadeiros. Vejamos:
Art. 1º - todo anúncio deve ser respeitador e conformar-se às leis do país; deve, ainda, ser honesto e verdadeiro.
Art. 23 - Os anúncios devem ser realizados de forma a não abusar da confiança do consumidor, não explorar sua falta de experiência ou de conhecimento e não se beneficiar de sua credulidade.
Art. 28 - O anúncio deve ser claramente distinguido como tal, seja qual for a sua forma ou meio de veiculação (CONAR, 1980)
3.2 Marketing de influência e a publicidade no Instagram
Antes de adentrarmos ao estudo de marketing de influência no Instagram, cabe trazer à baila breves definições sobre marketing e marketing de conteúdo. Nesse contexto, Pride (2015, p.3) define marketing como sendo:
O processo de criação, distribuição, promoção e precificação de bens, serviços e ideias para facilitar a satisfação nas relações de troca com clientes e desenvolver, e manter relações favoráveis com stakeholders em um ambiente dinâmico.
Por outro lado, o marketing de conteúdo seria um desdobramento desse processo de criação, distribuição, promoção e precificação que o marketing representa:
[...] uma abordagem que envolve criar, selecionar, distribuir e ampliar conteúdo que seja interessante, relevante e útil para um público claramente definido com o objetivo de gerar conversas sobre esse conteúdo (KOTLER, 2017, p. 173).
O ilustre Phillp Kotler (2017) relata em sua obra que o marketing de conteúdo tem ganhado popularidade com a transparência da internet e a conectividade que existe atualmente entre os consumidores.
Outra definição importante para a compreensão do universo da publicidade nas mídias sociais diz respeito à técnica de marketing de influência que é definida por Politi (2017) como sendo:
Uma abordagem de marketing que consiste em praticar ações focadas em indivíduos que exerçam influência ou liderança sobre potenciais compradores. Como benefício, os influenciadores interferem nas decisões de compra dos clientes a favor de uma determinada marca. Isso ocorre porque estabeleceram com ela uma relação de confiança legítima.
A esse respeito, Kotler sustenta que a divulgação de marcas por meio de conversas espontâneas tem maior credibilidade do que as campanhas publicitárias e que isso ocorre em decorrência da confiabilidade construída com base nos círculos sociais das comunidades de consumidores (KOTLER, 2017).
Diante desse cenário, pode-se verificar claramente que o marketing de influência é uma das maiores estratégias de comunicação utilizadas no mercado da atualidade. As marcas e empresas têm se unido cada vez mais às pessoas que mantêm uma relação de influência sobre determinados públicos e segmentos que pretendem alcançar.
Nesse sentido, conforme destacado anteriormente, o Instagram tem se mostrado como uma das plataformas midiáticas de maior volume no mundo inteiro, exatamente por ser uma rede social de compartilhamento de fotos e vídeos facilmente manuseável e estar interligada a outras plataformas como o Facebook e Twitter. No Instagram, os anúncios são, na maioria das vezes, feitos pelo próprio influenciador digital, com o uso de design e linguagens livres, de acordo com o perfil dos seus seguidores e normalmente exibindo conteúdo através de fotos ou vídeos acompanhados de texto em linguagem simples e de uso comum, usando as hastags “publicidade”, “publi” e “ad”. Atualmente, a plataforma disponibiliza vários formatos de anúncios, e os mais comuns são os anúncios no Instagram stories e do feed, desenvolvidos no formato de imagens, vídeos ou da combinação destes.
Pelo exposto verifica-se que a plataforma do Instagram ao mesmo tempo em que é muito dinâmica, mostra-se simples de ser executada e compreendida, tendo em vista que todas as funcionalidades utilizadas na criação de conteúdos publicitários são normalmente utilizadas para manifestações comuns de todos os possuidores de uma conta na rede, o que possibilita ao influenciador digital desmistificar a velha ideia de publicidade e propaganda.
3.3 Publicidade ilícita nas plataformas digitais
Conforme explicitado acima, o Código de Defesa do Consumidor- CDC (Brasil, 1990), no art. 37, proíbe expressamente a publicidade enganosa e abusiva, posto que um dos princípios norteadores da norma consumerista é a transparência na publicidade. O consumidor precisa sentir-se livre para escolher e só um mercado desenvolvido de forma transparente possibilitará a escolha livre e consciente.
Com base no princípio da transparência e da identificação fácil e imediata, dispostos no art. 36, do Código de Defesa do Consumidor- CDC (Brasil, 1990), são consideradas ilícitas, a publicidade subliminar, a dissimulada e a clandestina.
Nessa esteira, Bolzan (2019, p. 552) conceitua a publicidade dissimulada, subliminar e clandestina (merchandising), respectivamente, como sendo:
Mensagem com conotação jornalística, de cunho redacional. Nela geralmente ocorre uma entrevista ou pesquisa em que o ator principal da publicidade se passa por um jornalista, mas o motivo comercial de promover um produto ou um serviço é o enfoque principal.
É a mensagem que não é percebida pelo consciente, mas é captada pelo inconsciente do consumidor.
É a técnica de veiculação indireta de produtos ou serviços por meio por meio da respectiva inserção no cotidiano da vida de personagens de novelas, filmes, programas de radio e TV, dentre outros. É o caso do galã da novela que aparece em determinada cena, sentando a uma mesa de bar, tomando certa marca de refrigerante que aparece com seu rótulo no plano central da imagem.
Corroborando as definições do ilustre doutrinador, o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária, no Art. 30, dispõe que a publicidade jornalística ou qualquer outro meio veiculado mediante pagamento, deverá ser apropriadamente identificada. Não obstante o Código não se ocupar explicitamente da publicidade subliminar, o regulamento condena qualquer tentativa de publicidade e propaganda que tenha o objetivo de produzir efeitos subliminares (CONAR, 1980).
Como bem enfatizado nos tópicos anteriores, os avanços tecnológicos, trouxeram à publicidade para o mundo virtual, precisamente para as redes sociais, mais especificamente para o Instagram e essa veiculação publicitária não pode ser feita violando o principio da transparência e da fácil e imediata identificação.
4 A RESPONSABILIZAÇÃO DO INFLUENCIADOR DIGITAL
Antecedendo a análise da responsabilização do influenciador digital, importante trazer ao estudo uma abordagem sobre a responsabilidade civil e responsabilidade objetiva e subjetiva.
O instituto da responsabilidade civil integra o Direito das Obrigações e encontra-se regulamentado no Código Civil brasileiro, de 10 de janeiro de 2002. O Código Civil (CC), no art. 186, nos apresenta o conceito de ato ilícito, definindo-o como “aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”. Na mesma direção, o art. 927 preceitua que “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187 do Código Civil), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo” (BRASIL, 2002).
Para o ilustre doutrinador Gonçalves (2016, p. 47) “a responsabilidade é um fenômeno social”, tendo em vista que o instituto funciona como regra para manter o equilíbrio social, ao tempo em que é assegurado o dever de indenizar, como consequência para quem pratique ato ou omissão de que resulte dano ou prejuízo a outrem.
A legislação brasileira prevê situações especificas em que a responsabilidade civil restará configurada sem a necessária presença de todos os elementos imprescindíveis da teoria subjetiva. Vejamos algumas considerações de Gonçalves (2016, p. 60), sobre a responsabilidade objetiva:
Essa teoria, dita objetiva, ou de risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele se liga, por um nexo de causalidade, independentemente de culpa.
Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano. Ele é de todo prescindível, porque a responsabilidade se funda no risco.
Nessa esteira, a presente classificação doutrinária denomina que a responsabilidade é objetiva quando ela independe da existência do elemento culpa, pois se funda no risco assumido pelo agente.
4.1 A Responsabilização frente aos prejuízos causados aos consumidores
Sobre a responsabilização à luz da norma consumerista, o Código de Defesa do Consumidor regulamenta a proteção e defesa do consumidor, consoante determinação constitucional, prevista no art. 5º, XXXII, da Constituição Federal da República (Brasil, 1988), in verbis: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. E em que pese a necessária regulação das relações de consumo, preceitua o art. 4º, dispõe, que a legislação consumerista tem como objetivos:
Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios:
I – Reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo; [...]
Dentre os princípios consagrados pelo CDC, o protecionismo tem como meta a proteção e a defesa do consumidor e, a partir dele, se desdobram os demais princípios como a vulnerabilidade do consumidor, a hipossuficiência do consumidor, a transparência, a boa-fé objetiva, a função social do contrato, a equivalência negocial e a reparação integral dos danos.
No tocante ao princípio da vulnerabilidade, Nunes (2018, p.177) nos ensina que, apontar o consumidor como um ser vulnerável significa que “o consumidor é a parte fraca da relação de consumo”. Essa vulnerabilidade pode ser constatada na medida em que o consumidor necessita enfrentar empresas e o próprio Estado para obter o ressarcimento pelos danos sofridos.
Em uma reafirmação do protecionismo estendido ao consumidor, o CDC (Brasil, 1990), em regra, adota a teoria da responsabilidade objetiva nas relações de consumo, conforme evidenciam os arts. 12, 14, 18 e 20, através do princípio da reparação dos danos. Os citados dispositivos preceituam que haverá responsabilização independentemente de culpa, pelos danos causados por vícios e defeitos. Sobre essa temática, Gonçalves (2016, p. 66) preleciona que:
No referido sistema codificado, tanto a responsabilidade pelo fato do produto ou serviço como a oriunda do vício do produto ou serviço são de natureza objetiva, prescindindo do elemento culpa a obrigação de indenizar atribuída ao fornecedor.
Consoante à legislação consumerista, independentemente da existência de culpa, o fabricante, o produtor, o construtor e o importador, têm o dever de reparar os danos causados aos consumidores pelos defeitos e vícios de seus produtos e serviços, e, ainda, pelas informações insuficientes ou inadequadas a utilização e riscos.
Considerando a evolução das relações de consumo dentro do ambiente virtual, inclusive com a presença de novos agentes que não estão literalmente abarcados pelo conceito legal de fornecedor, previsto no art. 3º do CDC (Brasil, 1990), vejamos posicionamento a respeito da ideia constituída pela doutrina sobre “fornecedor equiparado”, Marques (2010, p. 105) apud Tartuce e Neves (2020, p.65), sobre o estipulante profissional ou empregador dos seguros de vida, leciona que:
A figura do fornecedor equiparado, aquele que não é fornecedor do contato principal de consumo, mas é intermediário, antigo terceiro, ou estipulante, hoje é o “dono” da relação conexa (e principal) de consumo, por deter uma posição de poder na relação outra com o consumidor. É realmente uma interessante teoria, que será muito usada no futuro, ampliando – e com justiça - o campo de aplicação do CDC.
Nessa mesma linha, o Superior Tribunal de Justiça, no ano de 2019, adotando a teoria da aparência, usando o termo “fornecedor aparente”, julgou o Recurso Especial 1.580.432/SP, nos termos da ementa:
RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - DANOS MATERIAL E MORAL - RELAÇÃO DE CONSUMO - DEFEITO DO PRODUTO - FORNECEDOR APARENTE - MARCA DE RENOME GLOBAL – LEGITIMIDADE PASSIVA – RECURSO ESPECIAL DESPROVIDO. INSURGÊNCIA RECURSAL DA EMPRESA RÉ.
Hipótese: A presente controvérsia cinge-se a definir o alcance da interpretação do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, a fim de aferir se na exegese de referido dispositivo contempla-se a figura do fornecedor aparente - e, consequentemente, sua responsabilidade, entendido como aquele que, sem ser o fabricante direto do bem defeituoso, compartilha a mesma marca de renome mundial para comercialização de seus produtos.
1. A adoção da teoria da aparência pela legislação consumerista conduz à conclusão de que o conceito legal do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor abrange também a figura do fornecedor aparente, compreendendo aquele que, embora não tendo participado diretamente do processo de fabricação, apresenta-se como tal por ostentar nome, marca ou outro sinal de identificação em comum com o bem que foi fabricado por um terceiro, assumindo a posição de real fabricante do produto perante o mercado consumidor [...]. (STJ - Resp. 1.580.432/SP – Quarta Turma – Rel. Min. Marco Buzzi – j. 06.12.2018 – DJe 04.02.2019).
Tartuce, Neves (2020, p. 378), à luz do conceito de “fornecedor equiparado”, exposto acima, se posiciona pela possibilidade de responsabilidade solidária quando:
Havendo uma publicidade ou oferta que causou dano aos consumidores, em regra e sem qualquer distinção, respondem solidariamente o veículo de comunicação, a empresa que a patrocinou e todos os responsáveis pelo seu conteúdo (agência de publicidade e seus profissionais).
Nessa mesma vertente, o caput do art. 45, do Código de Autorregulamentação Publicitária (CONAR, 1980), dispõe que serão responsabilizados pela inobservância das normas regulamentadoras, o Anunciante e a sua Agência, bem como o Veículo, ressalvado o veículo nas circunstâncias específicas no mesmo artigo.
Defendendo a tese da responsabilização de celebridades, artistas e outras pessoas com notoriedade, Tartuce e Neves (2020, p. 382) prelecionam que:
A premissa teórica igualmente conta com o meu apoio doutrinário, pois a tese representa outra importante aplicação da teoria da aparência, valorizando-se mais uma vez a boa-fé objetiva nas relações de consumo, em prol dos consumidores. Não se olvide que, muitas vezes, os vulneráveis adquirem produtos e serviços diante da confiança depositada em tais artistas ou celebridades.
Nesse contexto, o influenciador digital, ao integrar a cadeia de consumo, à medida que se torna responsável pela oferta e veiculação de publicidades dentro da sua rede social, assumindo papel de mediador entre o fornecedor e o consumidor, deverá observar as determinações da norma consumerista, respeitando os princípios e os direitos básicos do consumidor, em razão inclusive da confiança pré-constituída com os seus seguidores.
4.2 Decisões do CONAR referente à responsabilização de influenciadores digitais
Conforme explanado em tópico anterior, o CONAR é órgão responsável pela publicidade no Brasil, tendo como missão fiscalizar e aplicar sanções administrativas àqueles que desrespeitarem as normas atinentes à publicidade e propaganda. Por este motivo, é órgão competente para fiscalizar as ações dos influenciadores digitais com relação ao trabalho publicitário que estes desenvolvem em seus perfis nas redes sociais.
Neste sentido, após prospecção de dados relativos a influenciadores digitais e ao CONAR, vislumbramos que pela primeira vez em 40 (quarenta) anos, a liderança das condenações aplicadas pelo CONAR não foram de marcas famosas do mercado nacional, mas sim condenações de influenciadores, principalmente pelo descumprimento da identificação publicitária, caracterizada quando um influenciador faz uma divulgação de um produto, local ou serviço de uma marca sem sinalizar que se trata de uma parceria comercial.
Para melhor entendimento, trazermos à baila decisão do CONAR em julgamento feito à influenciadora digital Emily Araujo, vencedora da 17a edição do Big Brother Brasil, no que tange à publicidade sem a devida identificação publicitária. Vejamos:
Mês/Ano Julgamento: SETEMBRO/2017, Representação n° 15° 158/17. Autor (a): Conar mediante queixa do consumidor. Anunciante: Emilly Araujo e Johnson & Jhonson. Câmara: Sexta Câmara. Relator (a): Conselheira Leticia Linerberg de Azevedo, Decisão: Alteração. Fundamentos: artigos 1º, 3º, 6º, 9º, 27, 28, 30 e 50, letra "b" do Código. Resumo: Consumidora porto-alegrense enviou e-mail ao CONAR, considerando dúbia a apresentação publicitária de postagem em rede social, divulgando produto da Johnson & Johnson. A anunciante informou, em defesa enviada ao Conar, ter apenas enviado como brinde o produto à autora do post, sendo este espontâneo. Não houve manifestação da autora da postagem. A relatora não acolheu os argumentos de defesa e contrapôs: a Johnson & Johnson teria enviado brinde a alguém que tem poucos seguidores nas redes sociais e não os 2,8 milhões de seguidores da autora do post? Para a relatora, o fato de não haver contrato entre as partes "não retira a intenção do anunciante de vincular o seu produto a um canal de visibilidade. São subterfúgios que se valem dos tempos modernos para repetir uma prática condenada pelo Conar: a propaganda disfarçada, que usa da ingenuidade dos consumidores para alcançar seus objetivos", escreveu ela em seu voto, pela alteração, de forma a deixar claro que se trata de publicidade. Ela foi acompanhada por maioria de votos (CONAR, 2017).
Conforme podemos vislumbrar, o julgado demonstra a existência de corresponsabilidade entre o fornecedor e o anunciante pelo produto que está sendo objeto de publicidade uma vez que é evidente que houve a vontade de realizar a publicidade.
Acerca do enfoque deste artigo que é a rede social Instagram também podemos visualizar os casos das influenciadoras digitais Thassia Naves e Gabriele Pugliese, respectivamente, que figuraram como partes em representações apreciadas pelo CONAR, mediante queixa de consumidores sobre anúncios publicitários. Vejamos as decisões do Órgão na integra:
Mês/Ano julgamento: JULHO/2018. Representação n° 153/18, Autor: Conar mediante queixa de consumidor, Anunciante: J.C.F e Thassia Naves. Relator (a) Conselheira Tânia Pavlovsky, Câmara: Segunda Câmara. Decisão: Alteração e Advertência, Fundamentos: Artigos 1°, 3°, 6°, 26 e 50, letra “a” e “b” do Código. Resumo: Consumidora residente em Nova Odessa (SP) considerou ter havido omissão de natureza publicitária de postagem em rede social. Por isso enviou denúncia ao Conar. Não houve defesa por parte da Jogê Lingerie e Thassia Naves. A relatora deus razão à consumidora e propôs a alteração agravada por advertência à anunciante, por considerar que as empresas que adotam este tipo de divulgação publicitária são responsáveis pelo conteúdo das peças. Seu voto foi aceito por unanimidade (CONAR, 2018).
Mês/Ano julgamento: FEVEREIRO/2019. Representação n° 294/18, Autor: Conar mediante queixa de consumidor, Anunciante: Desinchá e Gabriela Pugliesi. Relator (a) Conselheira Milena Seabra. Câmara: Sexta Câmara. Decisão: Advertência. Fundamentos: artigos 1°, 3°, 6°, 23, 27 e 50, letra “a” do Código e seu Anexo H. Resumo: Consumidora paulistana enviou e-mail ao Conar denunciando publicidade em redes sociais do produto denominado Desinchá. Segundo a denunciante, a peça publicitária pode levar o consumidor ao engano, levando-o a crer que não há risco no consumo do produto, que conteria diuréticos em sua fórmula.
A Desinchá negou em sua defesa tratar-se de publicidade; a blogueira teria agido espontaneamente, depois de ter recebido amostras do produto. A defesa considerou este fato sinal de que o produto surte os resultados prometidos. Juntou laudos que demonstrariam os benefícios do produto. Já a blogueira Gabriela Pugliesi comprometeu-se em futuras postagens a empregar linguagem adequada, recomendando a seus seguidores que consultem profissionais especializados sobre o consumo do produto.
A relatora não aceitou os argumentos da anunciante, considerando ser publicitária a postagem. Levando em conta que, pelo seu formato, ela já não mais está em exibição, propôs a advertência à Desinchá e Gabriela Pugliesi, sendo acompanhada por unanimidade (CONAR, 2019).
Depreende-se das decisões colecionadas, que mesmo postagens simples na rede do Instagram como os tradicionais recebidos, podem implicar em propaganda irregular sujeitas a sanções por parte do CONAR, dentre as penalidades mais aplicadas, advertência e alteração ou correção do anúncio.
Reitera-se o já explanado neste tópico, o CONAR responsabiliza os influenciadores digitais pelas veiculações realizadas em seus perfis a fim de promover a publicidade de produtos ou serviços de modo a incutir nos consumidores e seguidores a necessidade de consumo consciente por aquilo que foi exposto.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O Código de Defesa do Consumidor, à luz da Constituição Federal da República/1988, juntamente com o Código de Autorregulamentação Publicitária, do CONAR, cria um aparato protecionista sobre o consumidor, em decorrência da sua condição de vulnerabilidade dentro das relações de consumo. Esse aparato protecionista se consubstancia nos princípios basilares da transparência, da veiculação da publicidade e oferta, dentre outros e, ao direito a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais.
Diante do avanço exponencial da tecnologia e o eminente mercado inclusivo, a veiculação de conteúdo publicitário circula muito além das tradicionais mídias (TV, rádios, revistas, jornais), e o desenvolvimento e a disseminação acelerada de conteúdos e informações nas plataformas digitais refletem mudanças nas formas e técnicas de publicidade. No âmbito dessa dinâmica de mercado, verifica-se o surgimento da figura do influenciador digital, responsável pela veiculação de anúncios, utilizando-se da sua capacidade persuasiva para mobilizar um grande número de seguidores, pautando opiniões e comportamentos e ditando tendências de consumo.
Evidenciou-se no presente estudo que o influenciador digital ao anunciar um produto ou serviço na plataforma do Instagram, integra a cadeia publicitária, pois agrega ao anúncio uma confiabilidade preexistente na sua relação com os seguidores e, portanto, essa relação de prestação de serviços não pode se dar com ausência de acuidade, sem observar as diretrizes básicas que regulamentam a publicidade e as normas protetivas do consumidor.
Neste ensejo, o CONAR tem aplicado as penalidades previstas no seu regulamento publicitário, tanto aos fornecedores de produtos ou serviços, como aos influenciadores digitais que veiculam a propaganda no Instagram, considerando a existência de liame objetivo da responsabilidade em concurso entre fornecedor e o influenciador digital, uma vez que tal relação possui o mesmo objetivo mercantil, qual seja, a venda de produtos ou serviços.
Nesse contexto, o influenciador digital tem o dever de observar todas as normas protecionistas do consumidor e de regulamentação publicitária, de forma a possibilitar aos seus seguidores a escolha livre e consciente para o consumo. Considerando a definição de “fornecedor equiparado”, na inobservância dos princípios da boa-fé, da transparência, da vinculação da oferta, da vulnerabilidade do consumidor e de todos os demais princípios que resguardam os direitos básicos do consumidor, o influenciador digital ao causar algum dano aos consumidores, por ação, ou omissão, estará obrigado a indenização pelos danos causados.
Por fim, considerando tratar-se de uma figura nova, ou até mesmo em construção nessa área da publicidade, não se registra, até o presente momento, um despertar dos consumidores/seguidores para a possibilidade de recorrer ao poder judiciário, quando da ocorrência de lesão aos seus direitos enquanto consumidores lesados.
REFERÊNCIAS
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Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário UNINOVAFAPI
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Pamela Veloso. A responsabilização civil do influenciador digital sob a ótica da legislação consumerista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 jul 2020, 04:29. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54877/a-responsabilizao-civil-do-influenciador-digital-sob-a-tica-da-legislao-consumerista. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: PATRICIA GONZAGA DE SIQUEIRA
Por: Eduarda Vitorino Ferreira Costa
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: Adriano Henrique Baptista
Por: Alan Carlos Moises
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