Resumo: O presente artigo busca desenvolver um conjunto de proposições às “Loterias Online da CAIXA”, com vistas à elevação dos padrões de eficiência e de jogo responsável, a partir de uma revisão bibliográfica e uma pesquisa documental, com vistas à identificação das melhores práticas de loterias virtuais no mundo, que poderiam ser adaptadas às loterias em estudo. Por sua vez, os objetivos principais do estudo são: a) atestar o bom grau de adequação dessas loterias aos parâmetros internacionais; b) aprimorar o modelo em estudo, a partir de propostas atreladas às melhores práticas de loterias virtuais; c) propor uma adaptação da exploração de loterias virtuais no Brasil, ante às especificidades locais. Nesse passo, identificou-se duas vertentes de melhorias das loterias abordadas, quais sejam, as relativas à plataforma de realização das apostas e a atinente à criação de uma modalidade de permissionário complementar ao meio de virtualização de loterias, em face do contexto econômico-social do Brasil.
Sumário: 1. Introdução. 2. Loterias Online da CAIXA. 3. Propostas de melhoria das Loterias Online da Caixa: 3.1 Incremento das solicitações para cadastramento; 3.2 A criação do “cartão do jogador” como no modelo português; 3.3 Da exclusão valor mínimo superior a uma aposta simples; 3.4 Do resgate automático de prêmios; 3.5 Da autoexclusão. 4. A proposta complementar de corretor lotérico: 4.1 Do atual sistema de permissão da CAIXA; 4.2 O contexto nacional como fundamento; 4.3 Os parâmetros conceituais do corretor lotérico; 5. Considerações finais. 6. Referências.
O ambiente de transformações econômicas dos mercados mundiais tem levado a uma substituição progressiva dos meios físicos para os eletrônicos, o que não fora diferente no âmbito das apostas lotéricas (BARBOSA, 2017, p. 37). No Brasil, a realidade não é diferente, de modo que há um processo de virtualização das apostas, como forma de adequação da evolução tecnológica do mercado (BARBOSA, 2018, p. 18).
No contexto nacional, entretanto, de acordo o regime geral da exploração de loterias federais, instituído pelo Decreto-lei nº 204/1967, as loterias federais devem ser exploradas diretamente pela Caixa Econômica Federal – CAIXA (art. 2º)[1]. Com base nisso, a mencionada instituição, no ano de 2018, implementou, em consonância com a tendência mundial de virtualização das apostas, a denominada plataforma virtual “Loterias Online da CAIXA”, a partir da qual possibilitou-se aos apostadores a realização de jogos online para as loterias federais.
No entanto, por ser o mecanismo virtual “Loterias Online da CAIXA” bastante recente e provavelmente carente de alguns aspectos necessários ao atendimento de melhores padrões globais de apostas, o presente trabalho analisará o estado da arte da plataforma para elaboração de propostas de incremento da execução virtual da atividade. Ademais, diante do contexto socioeconômico brasileiro que inviabiliza a difusão ainda maior das apostas virtuais, aventa-se a possibilidade criação de uma nova figura de intermediário, que pode complementar a tarefa dos atuais permissionários, para a realização de apostas com base na plataforma online mencionada.
As Loterias Online da CAIXA devem seguir as diretrizes internacionais sobre a atividade lotérica e, consoante as recomendações para as melhores práticas para jogos online em loterias editadas pela World Lottery Association (WLA), as loterias necessitam observar os seguintes aspectos levantados por essa instituição:
a) deve haver uma estrutura e programas que garantam o atendimento de parâmetros e requisitos regulamentares sejam garantidos por meio de processos, políticas e procedimentos de compliance, com revisões periódicas e avaliações de terceiros e, para o maior controle, podem ser aplicadas soluções de geolocalização para controle da jurisdição (WLA, 2014, p. 15)[2];
b) faz parte da política de jogo responsável a proibição de apostas de menores de idade, devendo constar tais informações em mensagens, termos e condições dos sítios eletrônicos, de modo a criar impedimentos desde o cadastramento na plataforma até a experiência de jogo do apostador (WLA, 2014, p. 15);
c) deve haver uma estratégia próativa das loterias em relação ao jogo responsável, tendo como um item bastante relevante, para qualquer estratégia de jogo responsável, o mecanismo de autoexclusão eficaz, com implementação automatizada e com efeito imediato, sem possibilidade de restabelecimento pelo jogador em períodos curtos (WLA, 2014, p. 16);
d) acerca do registro de jogador, entende-se que o procedimento deve exigir, obrigatoriamente, o nome, a idade, o endereço e os informações exclusivas de criação de nome de usuário e senha, sendo possível a abertura de apenas uma conta por jogador, que deve ter acesso ao histórico de atividades. A conta deve poder ser encerrada, com o respectivo cancelamento do registro, como também bloqueada pela loteria, caso em que deve ensejar um processo formalmente documentado (WLA, 2014, p. 16);
e) o sistema de pagamentos deve garantir um atendimento rápido e preciso de pagamentos, sujeito a verificações necessárias, em um processo documentado, seja partindo do jogador ou com destino a esse. Além disso, deve haver um prazo estabelecido para pagamento aos jogadores a contar do recebimento da solicitação e de sua respectiva verificação (WLA, 2014, p. 16);
f) deve haver um serviço de suporte ao cliente, por meio do qual os jogadores encontrem informações de contato para reclamações e resolução de disputas prontamente acessíveis nos sítios eletrônicos, com registro de todas as atividades e disputas (WLA, 2014, p. 17);
g) as loterias devem, simultaneamente, desenvolver uma estratégia de equilíbrio entre o atendimento à normatização legal e de segurança, bem como fornecer aos seus jogadores as melhores experiências possíveis (WLA, 2014, p. 17);
h) deve haver uma política de segurança e privacidade da informação, sobretudo em relação às eventuais informações de cartões de crédito do jogador armazenadas na loteria, bem como aos sistemas de detecção e combate a invasões e vírus. Ademais, os usuários devem ter a sua identidade verificada com base em, ao menos, objetos de autenticação de dois fatores, antes de ter acesso ao sistema (WLA, 2014, p. 17-18);
i) deve haver uma política de teste do produto que comprove a imparcialidade e a aleatoriedade dos jogos ou das apostas, quando estas são feitas por meio de gerador de números aleatórios (WLA, 2014, p. 18);
j) o design e a operação dos jogos devem estar estritamente em conformidade com as suas regras e qualquer alteração nestas não pode ter efeito retrospectivo (WLA, 2014, p. 19);
k) mecanismos de prevenção à lavagem de dinheiro e à fraude devem ser implementados pelas loterias, notadamente que pagamentos das contas das apostas não podem ocorrer por meio de dinheiro em espécie (ou qualquer outro pagamento não eletrônico) e os fundos das contas de usuário devem ser remetidos para o mesmo meio em que foram realizados pagamentos, exceto quando houver alterações fundamentadas nesse mecanismo (WLA, 2014, p. 19);
l) deve haver mecanismos eficazes de controle de risco em vigor, para gerenciar os eventos, volume e preços de apostas e, no caso das esportivas, procedimentos para identificação de transações e padrões suspeitos, com possibilidade de notificação as informações relevantes às entidades desportivas ou às autoridades reguladoras competentes (WLA, 2014, p. 19-20);
m) para a segurança e integridade, os procedimentos de backup e recuperação devem ser implementados, para a garantia de que dados e informações poderão ser recuperados em casos de eventualidades (WLA, 2014, p. 20).
A partir desse fundamento, deve-se, portanto, cotejar cada uma das recomendações acima com a prática das loterias da CAIXA.
Primeiramente, no tocante às alíneas “a” e “b”, percebe-se o bom nível de atendimento da instituição aos padrões internacionais de jogo responsável, diante da evidência de que, em 2017, a CAIXA (2019, sp.) obteve a certificação em jogo responsável no segundo maior padrão emitido pela WLA (nível 3), o que confirma o alinhamento à proteção e redução dos riscos potenciais aos apostadores das loterias geridas pela instituição.
As “Loterias Online da CAIXA”, por sua vez, impõem um limite máximo de gastos com apostas diárias em R$500,00 (quinhentos reais), o que, em termos de responsabilidade social, a limitação de gastos pelo sistema pode ser positiva, como visto em estudo de Griffiths e Wood (2007, p. 107 ss). Isso, sobretudo diante da verificação na pesquisa de que grande parte do vício e jogo está atrelado à fuga, para a modificação do humor, a partir de fantasias, dissociações e mudanças de estado de excitação, com vistas à “preencher vazio” ou à “evitar problema”. Há, ainda, quem entenda que o próprio jogador fixar previamente um limite diário de apostas (WLA, 2014, p. 24), mas acredita-se que o modelo da Loteria Online da Caixa segue o melhor padrão internacional de responsabilidade atrelada ao jogo. Contudo o mecanismo de autoexclusão (recomendação “c”), também relativa ao jogo responsável, não consta na plataforma em análise.
Quanto à recomendação “d” visto acima, percebe-se que o “Termo de adesão e uso ao portal de apostas das Loterias CAIXA” (2019) tem uma previsão bastante limitada acerca do cadastro de usuário no Portal Loterias Online, no seu item 1, a saber: a) necessidade de posse de número de CPF; b) ser maior de dezoito anos[3]; c) possuir endereço de e-mail válido para a criação do cadastro; d) informação de nome completo, nome da mãe, data de nascimento e CPF[4]. Logo, o usuário da plataforma “Loterias Online da CAIXA” não é obrigado a informar obrigatoriamente o endereço de seu domicílio, nem enviar digital ou presencialmente cópia de seu documento de identificação válido.
Já as recomendações “e” e “k” estão atreladas aos mecanismos de pagamentos, seja na realização de apostas ou no recebimento dos prêmios. No primeiro aspecto, sobre o atendimento rápido e preciso de pagamentos, percebe-se o pronto adimplemento na realização das apostas, as quais somente (no momento) podem ser realizadas a partir de pagamento via cartão de crédito[5], mas não há tanta rapidez no pagamento de prêmios, independentemente do valor obtido, como será visto em outro tópico. Quanto à proibição de pagamentos em meios não eletrônicos para as loterias virtuais, percebe-se claro atendimento, ante à restrição anteriormente mencionada (apenas cartão de crédito), mas os pagamentos dos prêmios não ocorrem pelos mesmos meios das apostas.
Em relação à recomendação “f”, nota-se que há um suporte tecnológico informado no rodapé da homepage, dispondo de números de contato para que os usuários possam ter um atendimento relativo a problemas técnicos que eventualmente possam ter na plataforma.
As recomendações “g”, “h”, “i”, “l” e “m” dizem respeito aos padrões de segurança, privacidade e integridade nos sistemas de apostas. Segundo informações da própria CAIXA (2019, sp.), no ano de 2012[6], a instituição foi reconhecida, por meio da certificação pela Norma de Controle de Segurança da Associação Mundial de Loterias (World Lottery Association Security Control Standard – WLA:SCS). Esse reconhecimento ratifica a adoção de práticas de governança, de gestão de segurança da informação, bem como de risco e de continuidade de negócios na execução de atividade das loterias federais.
Ademais, também no aspecto da segurança e das boas práticas, fica assegurado à CAIXA o direito de encerrar, alterar ou suspender o acesso ao portal, sem necessidade de prévio aviso ao usuário e a qualquer momento, nas hipóteses de informação fornecida de modo fraudulento, impreciso ou incompleto, violação de qualquer previsão dos procedimentos de uso do portal, necessidade de atualização ou manutenção do sistema, por qualquer outra razão justificável a critério da outorgante[7].
Enfim, quanto à recomendação “j” acerca da conformidade do design dos jogos com as regras, sem efeito retrospectivo destas, percebe-se que todas as normatizações da CAIXA estão atreladas à edição de leis ou circulares da própria instituição para o regramento das loterias que serão exploradas[8]. Nesse aspecto, a plataforma virtual de apostas acaba por seguir estritamente o quanto previsto no conjunto normativo em questão.
A despeito de um quadro geral de bom atendimento às melhores práticas internacionais de apostas virtuais, as “Loterias Online da CAIXA” carecem de algumas melhorias, com vistas à busca pela excelência na prestação do serviço, na busca pelo equilíbrio da eficiência na execução da atividade com a responsabilidade social. Por conta disso, passa-se a indicar propostas de melhoria do sistema.
3.Propostas de melhoria das Loterias Online da Caixa
Não excluindo-se eventuais outras propostas de melhoria das loterias em análise, optou-se por cinco medidas diretamente relacionadas à plataforma virtual, como forma de alcance de patamares ainda superiores de eficiência e de responsabilidade social e em consonância com as práticas de outros países[9], a saber: a) incremento das solicitações para cadastramento; b) a criação do cartão do jogador, como na sistemática portuguesa; c) a exclusão de valor mínimo superior a uma aposta simples; d) do resgate automático de alguns prêmios; e) da disponibilização da autoexclusão. Assim, passa-se a analisar cada uma das medidas propostas.
3.1 Incremento das solicitações para cadastramento
Seguindo-se os parâmetros internacionais das boas práticas em apostas virtuais, conforme visto no capítulo anterior, a plataforma das “Loterias Online da CAIXA” deverá exigir o endereço de domicílio do apostador.
Não obstante, em face da necessidade de comprovação da veracidade das informações individuais prestadas – sobretudo quanto à maioridade do jogador – entende-se que também deve ser imposta a necessidade de remessa online ou por outros meios de documentos de identificação oficial, no qual conste nome completo, data de nascimento e CPF do usuário. Neste caso, cumpre ressaltar que esse documento deve ser armazenado no mais alto padrão de segurança para garantir a privacidade do apostador, somente sendo disponibilizado às autoridades de regulação ou de combate à fraude ou à lavagem de dinheiro, em caso de investigação sobre eventual prática cometida pelo apostador.
3.2 A criação do “cartão do jogador” como no modelo português
Na realidade portuguesa, há um suporte eletrônico de multicanal integrado (internet, celular, televisão entre outros) para a realização do que aquele país denomina de “contrato de jogo”, considerado como aquele por meio do qual uma das partes, através do pagamento de uma quantia certa, adquire números ou prognósticos com os quais se habilita, em contrapartida à prestação, ao recebimento de um prêmio, de valor fixo ou variável, que será pago pela outra parte, em razão do resultado de uma operação baseada exclusiva ou fundamentalmente na sorte, conforme as regras predefinidas (n. 2, art. 3º, Decreto-Lei n. 282/2003).
Para a realização de um jogo através de meios eletrônicos, o apostador recorre a um denominado “cartão de jogador”, o qual contém a identificação por um número e um código de segurança a este atribuído e com emissão pelo Departamento de Jogos da Santa Casa de Misericórdia de Lisboa (n. 2, art. 3º, Decreto-Lei n. 282/2003), para quem foi concedida a atividade, por meio do Decreto-Lei n.º 84/85, de 28 de Março[10].
De acordo com as atuais “Condições Gerais de Utilização do Cartão de Jogador” foram estabelecidas no ano de 2019, pelo Departamento de Jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, o cartão de jogador corresponde a um suporte associado a uma conta de utilizador (gerado após a ativação desta), com número de nove dígitos e um código de segurança individual, no qual ficam associadas as apostas e os respectivos prêmios (LISBOA, 2019, p. 1), tendo como uma de suas características principais a intransmissibilidade, uma vez que o cartão tem destinação pessoal exclusiva ao seu utilizador (LISBOA, 2019, p. 2).
Logo, o utilizador é responsável pela guarda e uso do cartão de jogador, não podendo facultar a utilização deste por terceiros, sob pena de responsabilidade civil e penal (LISBOA, 2019, p. 3), bem como de suspensão ou desativação do cartão de jogador (LISBOA, 2019, p. 19). Ademais, cada utilizador apenas pode ter uma conta com um único cartão de jogador vinculado, ao mesmo tempo em que não se permite contas sem cartão vinculado e vice-versa (LISBOA, 2019, p. 3).
A criação da conta de utilizador pressupõe o cadastro no sítio eletrônico do Portal Jogos Santa Casa ou de seu respectivo aplicativo, com os seguintes dados obrigatórios: a) nome completo; b) tipo e número de documento de identificação; c) data de nascimento; d) número IBAN (número internacional de conta bancária) domiciliada em Portugal; e) conta de e-mail (LISBOA, 2019, p. 4)[11]. Após, deverá apresentar virtualmente ou presencialmente cópia de documento de identificação (LISBOA, 2019, p. 4). Encerrado o processo de cadastramento da conta de utilizador[12], por meio da criação de um nome de usuário e senha, o sistema atribui automática e aleatoriamente depois do primeiro login um número de cartão de jogador, ao qual deve ser associado um PIN (LISBOA, 2019, p. 4).
Utilizando-se desse cartão do jogador na plataforma multicanal, permite-se a aquisição de bilhetes virtuais de apostas, por meio da recepção, do registro e do pagamento dessas, para além da participação de sorteios adicionais e promocionais, bem como o recebimento eletrônico dos respectivos prêmios dos jogos identificados (n. 1, art. 5º, Decreto-Lei n. 282/2003). Nesse aspecto, o cartão de jogador, que é recarregável e permite ao jogador armazenar quantias, até determinado montante, para a utilização nos jogos, assim como creditar no próprio cartão o valor dos prêmios dos jogos que tenha sido sorteado, igualmente até determinado montante (n. 2, art. 4º, Decreto-Lei n. 282/2003)[13].
Quanto ao pagamento das apostas, este é proibido de ser realizado através de cartão de crédito e apenas pode ocorrer de modo antecipado, no cartão de jogador, com montante mínimo de cinco euros e máximo de trezentos euros diários, realizado por meio de um sistema de débito em conta ou através do homebanking (LISBOA, 2019, p. 2). O carregamento, por sua vez, sempre deve partir de contas bancárias domiciliadas em Portugal, utilizando-se de três referências: entidade de destino, número do cartão de jogador e montante dentro do mínimo e máximo (LISBOA, 2019, p. 8-9)
Tendo em vista o sistema das loterias portuguesas, sugere-se a criação de um “cartão do jogador” vinculado à conta de usuário das “Loterias Online da CAIXA”, nos moldes constantes acima, para que se possa proceder o carregamento desses para a realização de apostas. No entanto, diferentemente daquele modelo, entende-se não haver razão para que o carregamento seja vedado por meio de cartão de crédito, desde que este seja do titular do cartão de jogador.
Em todo caso, o titular do cartão do jogador deve poder realizar transferências dos montantes acumulados para conta bancária de sua titularidade, em instituição financeira brasileira, na conformidade das exigências do sistema financeiro nacional e da CAIXA, esta enquanto exploradora da atividade.
3.3 Da exclusão valor mínimo superior a uma aposta simples
Em análise de apostas na plataforma da “Loterias Online da CAIXA”, percebe-se que, para além da disponibilização apenas do meio de pagamento por cartão de crédito e do festejado valor máximo de transação diária, nota-se um ponto negativo: há um valor mínimo de apostas de R$30,00 (trinta reais), ou seja, superior a uma aposta simples de qualquer das loterias disponíveis. Dessa maneira, a imposição de um consumo mínimo destoa completamente das boas práticas, porque inclusive estimula a realização – muitas vezes – de apostas para além da necessidade do jogador, o que pode estimular, inclusive, a irresponsabilidade no jogo.
Presume-se, entretanto, que o valor mínimo para finalização da aposta deve decorrer das altas taxas das intermediadoras de operações por cartão de crédito, repita-se, único meio de pagamento disponível até então. Contudo, a partir do sistema de “cartão de jogador” este problema também pode ser resolvido e o apostador poderá realizar apenas uma aposta simples, sem necessidade de valor mínimo.
3.4 Do resgate automático de prêmios
Em relação ao recebimento de prêmios, o “Termo de adesão e uso ao portal de apostas das Loterias CAIXA” (2019), no item 4, dispõe que não há conferência automática de aposta premiada no Portal, cabendo ao usuário realizar tal conferência. O recebimento do prêmio, apenas pelo titular do CPF vinculado à conta de usuário, a seu turno, deve ser efetuado até noventa dias da realização do concurso em qualquer agência da CAIXA, unidade lotérica, ou no portal, desde que obedecendo as condições para cada forma.
A princípio, a medida acima pode ser benéfica, tendo em vista que o elevado volume de prêmios (sobretudo de vencedores secundários) que não são resgatados e que acabam sendo destinados para as causas sociais atreladas a cada loteria, respectivamente[14]. Todavia, a fidelização do apostador se torna muito maior quando este tem a garantia de que todas as suas apostas virtuais são conferidas e, acaso seja vencedor, pode ensejar o resgate automático, com a sua comunicação por e-mail. Isso cria uma sensação de possibilidade maior de sucesso nas apostas, porquanto muitos apostadores sequer conferem os bilhetes.
No modelo português, por exemplo, o pagamento dos prêmios em apostas realizadas por meio da plataforma de acesso multicanal é, em regra, automaticamente creditado na conta ou no respectivamente cartão do jogador, sem necessidade de qualquer outro procedimento por parte deste (art. 7º., Decreto-Lei n. 282/2003)[15]. No entanto, há restrições para o resgate automático.
O pagamento dos prêmios efetuados no Portal Jogos Santa Casa segue os seguintes regramentos (LISBOA, 2019, p. 13-14): a) prêmios de valor igual ou inferior a € 150 (cento e cinquenta euros) é creditado automaticamente no cartão de jogador que efetuou a aposta, sem necessidade de qualquer outro procedimento por parte deste[16]; b) para valores acima de € 150 (cento e cinquenta euros) e inferior a € 2.000 (dois mil euros), o valor é automaticamente transferido para a conta bancária domiciliada em Portugal, que foi indicada no cadastro; c) para montante igual ou superior a € 2.000 (dois mil euros) e inferior a € 5.000 (cinco mil euros), o utilizador deve preencher formulário online e apresentar documento de identificação, nos termos constantes na normatização e, após o processo de validação do documento, o prêmio é transferido para a conta bancária domiciliada em Portugal indicada no mencionado formulário; d) para valores superiores a € 5.000 (cinco mil euros), apenas será possível o requerimento presencial à Departamento de Jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, no prazo de noventa dias após a data do sorteio ou do concurso, após o preenchimento do formulário online, sempre pagos por transferência bancária do titular do cartão de jogador.
Para as “Loterias Online da CAIXA”, entende-se ser viável e necessário à maior fidelização dos apostadores a possibilidade de resgate automático de prêmios de baixo valor, seguido de devida comunicação no e-mail de cadastramento, como forma de despertar uma maior confiabilidade no sistema e de incluir o hábito responsável de aposta na rotina dos usuários.
Na realidade local, sugere-se a equiparação do resgate automático em cartão do jogador até o valor máximo aplicável ao resgate em lotérica, ou seja, de R$1.903,98 (hum mil, novecentos e três reais e noventa e oito centavos). Acima desse montante, apenas em agência da CAIXA, com posse de documento de identificação e que o resgate seja realizado com destino uma conta bancária de titularidade do apostador, para evitar fraude e lavagem de dinheiro. Todavia, independentemente da quantia do prêmio, o mecanismo de alerta de aposta premiada deve comunicar ao apostador por e-mail.
Igualmente em seguimento aos padrões das melhores práticas em loterias virtuais dispostos pelo WLA, como visto anteriormente, torna-se necessária a possibilidade de autoexclusão pelo jogador, por um período não muito curto de tempo, para o atendimento às diretrizes do jogo responsável.
No modelo português, como medida de atendimento ao programa de “Jogo Responsável”, consignou-se a possibilidade da figura da “autoexclusão”, mecanismo de suspensão da conta de utilizador solicitado por este no ambiente virtual, com efeitos imediatos de impedimento de realização de apostas por um período mínimo de cento e oitenta dias, com possibilidade de revogação da autoexclusão após o tempo mínimo determinado (item 15, LISBOA, 2019, p. 17-18).
Assim, sugere-se pela inclusão do mecanismo na plataforma das “Loterias Online da CAIXA”, com efeito imediato à solicitação, para a autoexclusão do usuário também por um período mínimo de cento e oitenta dias, igualmente com possibilidade de restabelecimento da possibilidade de realização de novas após findo esse período.
Conquanto essas propostas na plataforma sejam bastante importantes, o cenário brasileiro atrelado ao mercado de apostas virtuais enseja o desenvolvimento de uma figura de um permissionário que possa colaborar no desenvolvimento das apostas virtuais, a partir da atividade complementar do corretor lotérico, como será analisado a seguir.
4.A proposta complementar de corretor lotérico
Apesar da tendência mundial de virtualização das apostas, o mercado brasileiro dispõe de inúmeras particularidades que necessitam ser atendidas por uma figura que não seria o permissionário atualmente previsto na normatização, nem pela própria plataforma virtual isoladamente, que o presente trabalho denomina de corretor lotérico.
Para tanto, deve-se observar, inicialmente, as permissionárias dispostas na regulamentação, com vistas a verificação de que há uma lacuna de atuação no contexto brasileiro indicado, de modo a defender a criação do agente denominado “corretor lotérico”, enquanto intermediário das apostas que se utiliza da plataforma “Loterias Online da CAIXA”.
4.1 Do atual sistema de permissão da CAIXA
A exceção do caso da Loteria Instantânea Exclusiva (LOTEX), autorizada pela Lei nº 13.155, de 4 de agosto de 2015, por meio do qual se permitiu a realização de concessão do serviço lotérico, as demais hipóteses estudas no presente trabalho submetem-se, por força do art. 1º., do Decreto-lei n. 204/1967 ao regime de permissão do serviço público de loterias exploradas pela CAIXA.
Nesse sentido, a despeito de a Caixa executar diretamente das loterias federais em geral (loteria de prognósticos e loterias de bilhetes), o exercício da atividade de serviços lotéricos pode ser outorgado por esta instituição, na forma da lei (inciso II, art. 2º, Lei n. 12.869/2013), a um permissionário. Este, por sua vez, que pode ser pessoa física ou jurídica, mediante licitação, obtém a outorga a título precário da prestação de serviços públicos atinentes à comercialização das loterias federais e de produtos autorizados, assim como para atuação na prestação de serviços delegados pela CAIXA (inciso I, art. 2º, Lei n. 12.869/2013).
Os editais de licitação e os respectivos contratos deverão seguir as diretrizes de (art. 3º, da Lei n. 12.869/2013): a) admissão da conjugação da atividade de permissionário com a de outra atividade comercial, em face da aderência aos produtos de loterias, produtos conveniados e serviços, desde que expressa e previamente autorizada pela CAIXA (inciso I e art. 4º.)[17]; b) possibilidade de exigência aos permissionários de atuação em atividades acessórias com exclusividade, como de correspondente bancário, para a prestação de serviços padronizada em todo o território nacional (inciso II e art. 4º.); c) a remuneração dos permissionários se dará por meio de comissão estipulada pela CAIXA, tendo como base o preço de venda das apostas, respeitando-se o equilíbrio econômico-financeiro do produto lotérico e deduzidos os repasses legais (inciso III); d) qualquer mudança de endereço e a realização de novas permissões ou credenciamentos estarão sujeitos à autorização da CAIXA, com base em estudos técnicos, que devem considerar o potencial para vendas das loterias federais e a demanda existente para atender a população local (inciso V)[18]; e) o prazo dos contratos de permissão será de vinte anos, com renovação automática por igual período a partir do término do prazo de permissão, ressalvadas as hipóteses de rescisão, de declaração de caducidade ou de extinção previstas em lei (incisos VI e parágrafo único)[19].
Por sua vez, na busca do desenvolvimento da melhor regulamentação das permissões lotéricas, a CAIXA realizou, ao menos, três modificações normativas no ano de 2019, através das Circulares nº 816, de 03 de abril de 2019, nº 856, de 8 de abril de 2019 e nº 859, de 6 de agosto de 2019, sendo esta última a que está em vigor atualmente.
De acordo com a Circular Caixa nº 859/2019, especificamente no item 5, as permissionárias podem ser classificadas nas seguintes categorias, quais sejam: rede de unidades lotéricas (composta por casa lotérica[20], casa lotérica avançada[21] e unidade simplificada de loterias[22], item 5.1.1), com possibilidade de alteração de categoria[23], rede de venda de bilhetes (composta por fixo de bilhetes e ambulante de bilhetes, item 5.1.2), para além da comercialização de loterias em canal eletrônico (item 5.1.3). Em nenhuma modalidade, como se observa no item 21 da Circular Caixa nº 859/2019, a relação da permissionária, dos seus prepostos e dos empregados consiste em relação de emprego, representação, mandato ou congênere, sendo de exclusiva responsabilidade da permissionária os atos praticados perante a outorgante e terceiros, por seus prepostos e empregados.
A remuneração da permissionária se dará por meio de uma comissão, fixada pela Caixa, sobre o preço de venda, abatidos os montantes dos repasses legais, na seguinte forma: a) nas loterias de prognósticos numéricos, esportivos e específico (Timemania), a comissão incide sobre o montante de vendas; b) na modalidade de Loteria Federal, sobre o valor advindo da faixa compreendida entre o preço de plano (pago pela permissionária) e o preço máximo de venda ao apostador, conforme impressão no bilhete; c) quando as vendas ocorrerem em canal eletrônico de comercialização de loterias dentro do estabelecimento da permissionária, será distribuída comissão extra, conforme as vendas desta (item 9, da Circular Caixa nº 859/2019). Não obstante, as permissionárias poderão cobrar tarifa de serviço de até trinta e cinco por cento sobre o valor de cada cota de bolão, apenas quando esta for organizadora do bolão, o que não pode ocorrer se demandada por cliente (item 10, da Circular Caixa nº 859/2019).
Quanto aos equipamentos e sistemas necessários ao exercício da atividade de permissionária, estes serão fornecido pela CAIXA ou por empresa contratada por esta, em regime de comodato, podendo ser estes substituídos por falhas, defeitos ou por questões de qualidade ou nova tecnologia, mediante aviso escrito à permissionária; encerrado o contrato, os equipamentos serão restituídos à CAIXA e, se danificados, devem ser indenizados (item 19.1, da Circular Caixa nº 859/2019).
Ademais, a CAIXA deverá fornecer volantes, bobinas, formulários, para além dos equipamentos e sistemas para a captação das apostas e realização das outras transações, ao mesmo tempo que deve prestar assistência técnica e manutenção dos referidos equipamentos e sistemas, sem ônus à permissionária, desde que os serviços não tenham sido dado causa por uso inadequado, acidentes ou desgastes anormais (item 23, da Circular Caixa nº 859/2019)[24]. A Circular Caixa nº 859/2019 prevê que a utilização dos equipamentos deve ocorrer exclusivamente no estabelecimento lotérico e para as finalidades definidas pela outorgante (item 24.8.1), de modo que o transporte desses para outro endereço somente pode ser efetuado mediante autorização da CAIXA, que deverá realizar o transporte diretamente, ou através de empresa contratada por esta (item 24.8.7).
De acordo com o item 24.4.1.2, da Circular Caixa nº 859/2019, a permissionária fica obrigada a fornecer, no ato da aposta, ao apostador única e exclusivamente o comprovante original emitido pelo terminal de apostas da CAIXA.
Enfim, deve-se observar, ainda, que a permissionária deve seguir as premissas do Código de Conduta do Empresário Lotérico, do Programa de Integridade CAIXA, do Programa Jogo Responsável e Política de Relacionamento com Clientes e Usuários de Produtos e Serviços CAIXA, ou seja, a conduta do empresário lotérico deve ser pautada por elevados padrões éticos e de integridade, capazes de assegurar relações compatíveis com a legislação e o interesse público (item 24.6, da Circular Caixa nº 859/2019)
Particularmente sobre o objeto deste trabalho, torna-se importante a abordagem acurada acerca da rede de venda de bilhetes, em suas duas modalidades. A primeira, que corresponde ao fixo de bilhete, constitui uma pessoa física ou jurídica regular, que comercializa loteria federal e produtos conveniados com a autorização da CAIXA, podendo atuar em estabelecimento exclusivo ou não (conjugada) à atividade, sendo neste último caso necessária autorização prévia e expressa da CAIXA (item 8.1, da Circular Caixa nº 859/2019).
É importante salientar que o fixo de bilhetes não dispõe de equipamento capaz de captar as apostas para a modalidade de prognósticos (item 8.1.5, da Circular Caixa nº 859/2019). De outro modo, o ambulante de bilhetes é a pessoa física com inscrição no inscrita no Cadastro de Pessoas Físicas – CPF que, em locais de acesso franqueado ao público, comercializa loteria federal e produtos conveniados, não dispondo de equipamento para captação de apostas para a modalidade de prognósticos, podendo a CAIXA lhe impor o uso de uniforme (item 8.2, da Circular Caixa nº 859/2019).
Conforme o Anexo I da referida circular, a CAIXA apresenta os valores mínimos para a inscrição ou lance na licitação de ambulantes de bilhetes e fixo de bilhetes como R$20,00 (vinte reais) e R$100,00 (cem reais), respectivamente. No caso dos ambulantes de bilhetes, na seleção, terão prioridade aqueles que não tenham condições de prover a sua subsistência, assim considerados idosos, inválidos e portadores de deficiência física (item 13.9, da Circular Caixa nº 859/2019)[25]. É importante salientar como uma obrigação destacada na modalidade de rede de venda de bilhetes que as permissionárias devem apresentar garantia em forma de caução, para assegurar a sua cota de bilhetes em caso de sinistro (item 15.3.2, da Circular Caixa nº 859/2019).
Entretanto, as pessoas acima elencadas a quem são destinadas a permissão de atuação em atividade lotérica não atendem a todas as demandas nacionais, nem mesmo as constantes na rede de venda de bilhetes, ainda que sejam as de maior aproximação com a proposta a ser desenvolvida neste estudo. Isso, pois estão descontextualizadas do sistema de apostas virtuais, mesmo que este esteja elencado na circular supramencionada, especificamente no item 5.1.3, quanto à modalidade de comercialização de loterias em canal eletrônico.
Antes mesmo da análise propositiva de uma nova permissionária, deve-se observar a fundamentação contextual para o desenvolvimento da figura do corretor lotérico.
4.2 O contexto nacional como fundamento
O cenário atual do mercado de loterias no país tem um justificável direcionamento tecnológico, em atendimento às modificações globais, inclusive quanto à virtualização de apostas. Contudo, em nenhum caso das permissionárias acima indicadas – mesmo que haja a previsão normativa de permissão para a comercialização em canal eletrônico – atende-se plenamente ao contexto brasileiro, que para além de direcionado à virtualização, tem contradições importantes, como os volumes de pessoa sem acesso à internet e/ou de desbancarizados (e de possuidores de cartão de crédito). Isso, sem contar a existência de concorrência direta dos jogos de azar ilegais, preponderantemente representado pelos jogos do bicho.
Primeiramente, em relação à acessibilidade dos cidadãos brasileiros à internet (meio fundamental para a realização de apostas virtuais), estudo recente da a The Economist (2019, sp.) aponta que o Brasil fica em 31º. lugar entre 100 países pesquisados, sendo o segundo lugar geral na América Latina (atrás apenas do Chile), mas em nona posição em relação à disponibilidade e em antepenúltimo lugar em preço de acesso à internet, à frente apenas da Guatemala e Venezuela. Ou seja, o país ainda está muito aquém do acesso ideal da população à internet, o que tem clara implicação no mercado de apostas virtuais, notadamente na eventual intenção de capilaridade ao longo do território brasileiro.
Ademais, relatório do Banco Central do Brasil (2018, p. 82) baseado em levantamento internacional, demonstra que apenas 68,5% (sessenta e oito vírgula cinco por cento) dos adultos possuíam conta em 2017, o que representa um substancial crescimento em relação a 2011, quando esse índice era de 50,6% (cinquenta vírgula seis por cento), mas encontra-se em patamar abaixo do ideal. O relatório ainda aponta para profundas desigualdades na bancarização, tendo em conta a renda per capita e questões pessoais, como idade, gênero, nível educacional entre outros[26].
De qualquer sorte, independentemente da razão[27], cerca de um terço da população adulta brasileira não tem acesso à conta bancária no país, o que reduz o espectro de potenciais apostadores nas Loterias Online da CAIXA, tendo em vista que essa exige a aquisição de apostas a partir de compra com cartões de crédito.
Especificamente quanto ao cartão de crédito, de acordo com o Banco Central do Brasil (2018, p. 84), a posse desse meio de pagamento passou por uma diminuição significativa entre os anos de 2014 e 2017, de 32% (trinta e dois por cento) para 27% (vinte e sete) por cento da população adulta, enquanto que a posse de cartões de débito permaneceu inalterada, em 59% (cinquenta e nove por cento) dessa população. Portanto, esse cenário específico agrava ainda mais a possibilidade de acesso às loterias em estudo, porquanto houve uma redução de acesso ao único meio de pagamento aceito na prática, pela plataforma das “Loterias Online da CAIXA”.
Por outro lado, acrescente-se que 38,5% (trinta e oito vírgula cinco por cento) da população adulta ainda recebe salário em dinheiro no país (BACEN, 2018, p. 84).
O mercado de apostas ilegal, a seu turno, utiliza-se desses indicadores, bem como da comodidade posta à disposição dos potenciais apostadores, para além da pessoalidade das relações, para atraí-los na realização de apostas.
Nesse sentido, muito além do necessário combate às práticas de apostas ilegais, o presente trabalho tem o objetivo mais pragmático de ter esse fato como um dado presente[28], para desenhar um modelo capaz de competir com as ofertas ilegais[29]. Até porque, a atual complexidade das apostas ilegais pode ter repercussão internacional, o que dificulta ainda mais o seu combate[30].
Na seara do jogo do bicho, nota-se uma característica histórica de espraiamento de pontos de apostas[31], o que permite uma maior comodidade de acesso aos apostadores. Ademais, muitas vezes, esses pontos são operados por pessoas de convívio da comunidade local, o que eleva o fator da pessoalidade nos relacionamentos entabulados com os potenciais apostadores[32]. Nesse aspecto, a questão relacional tem um importante papel, sobretudo diante de uma cultura nacional de grande aproximação entre as pessoas.
Então, são sobre os aspectos de inclusão digital, de desbancarização, bem como de capilaridade, comodidade e pessoalidade que o novo modelo de permissão de atividade lotérica deve atuar, considerando uma visão pragmática do contexto nacional e da existência de práticas ilegais de apostas[33].
4.3 Os parâmetros conceituais do corretor lotérico
Nesse aspecto, a figura mais adequada para a obtenção de permissão para a atividade de loterias seria o que este trabalho denomina de “corretor lotérico”. Denomina-se corretor, porquanto a atividade desenvolvida representa o que o Código Civil Pátrio (Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002) considera como contrato de corretagem, ou seja, o negócio jurídico através do qual uma pessoa não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou de relação de dependência, obriga-se, mediante instruções recebidas, a obter para outra pessoa um ou mais negócios (art. 722, do Código Civil), mediante o recebimento de comissão após a efetivação do negócio, que é de obrigação de resultado[34].
Logo, o contrato de corretagem é típico e nominado, pelo fato de não se confundir com o mandato, a prestação de serviços, a comissão ou qualquer outro contrato que estabeleça vínculo de subordinação, visando aproximar as partes para satisfazer os anseios daquelas que lhe transmitiu instrução e lhe remunerará caso o negócio com terceiro seja efetuado (GONÇALVES, 2012, p. 1091)[35]. E, assim sendo, trata-se de modalidade de contrato aleatório, uma vez que o corretor assume o risco do insucesso da aproximação (GONÇALVES, 2012, p. 1095).
Em se tratando de corretor lotérico, este teria uma função de inclusão da realidade brasileira ao mundo digital, na medida em que integraria os excluídos digitais e os desbancarizados no sistema atual da “Loterias Online da CAIXA”, permitiria a mediação ativa dos produtos lotéricos da outorgante, em diversos ambientes, inclusive com pessoalidade e capilaridade semelhantes ao concorrente direto de parte das loterias federais, que é o jogo do bicho (realidade, ainda que ilegal).
Por sua vez, o contrato mediado pelos corretores lotéricos é nominado – o de jogo ou aposta[36]. Esses contratos de jogos e apostas, ainda que tenham alguma distinção doutrinária, representam contratos aleatórios de mesma natureza, que podem ser mediados por corretores lotéricos, mas que não permitem, em regra, a repetição dos valores pagos[37], como visto no caso das “Loterias Online da CAIXA”[38].
Dessa maneira, a proposta de corretor lotérico, seguiria a maioria dos ditames dos demais permissionários, hoje regulados por meio da Circular Caixa nº 859/2019, especificamente quanto ao item 21, de que a relação da permissionária, dos seus prepostos e dos empregados não corresponde em relação de emprego, representação, mandato ou congênere, de modo que atende a tal requisito do contrato.
Não obstante, podem ser aplicados aos corretores lotéricos outras normas específicas, que não as constantes no Código Civil, diante do próprio permissivo do art. 729 dessa legislação[39]. Com base nisso, a criação da figura do permissionário na modalidade de corretor lotérico deve se submeter às seguintes normas específicas, por força das especificidades da atividade ou da legislação em causa, a saber:
a) Somente pode ser corretor quem for selecionado em procedimento licitatório;
b) Há número limitado de permissões expedidas, conforme estudo técnico a ser elaborado pela CAIXA[40];
c) Não é possível a subcorretagem, para que não haja uma liberação desenfreada da figura, em desatendimento ao item anterior de projeção do estudo do mercado;
d) A mediação apenas pode dizer respeito ao contrato de apostas, não podendo este exercer qualquer outra atividade prestada por outras permissionárias da CAIXA, como correspondente bancário;
e) A função será realizada a partir de meio eletrônico, com conexão virtual, preferencialmente por meio de POS (Point of Sale ou Point of Service, comumente designada de “maquininha”), conectado ao sistema da Intranet das “Loterias Online Caixa”, mediante a impressão de via original do volante e consequente registro no cartão do jogador;
f) Os equipamentos de POS não serão vinculados a um estabelecimento fixo, podendo ser utilizados em qualquer espaço dentro do território nacional, desde que atendidas as normas da CAIXA, mas o corretor deve ter cadastro de um ponto para realização dos contatos com representantes da CAIXA, seja para reparo dos equipamentos, ou recebimento de materiais, tais como bobinas, cartucho de impressão entre outros;
g) A aposta apenas poderá ser feita por pessoa devidamente cadastrada na plataforma das “Loterias Online Caixa”, podendo o corretor ajudar no cadastramento dos interessados, para além da mediação da aposta;
h) As apostas de um cartão de jogador ficarão atreladas a uma conta de usuário, onde constará todo o histórico de transações e apostas deste, cujo acesso será restrito, mediante senha, a ser digitada no POS ou na plataforma online na rede mundial de computadores;
i) Segue-se os mesmos limites de apostas diárias por apostador, de acordo com o histórico registrado no cartão de cada jogador, independentemente da quantidade de corretores que tenham intermediado as apostas, ou mesmo de realização direta de aposta no site das “Loterias Online da CAIXA”;
j) Os pagamentos poderão ser realizados por cartão de crédito ou por meio de débito em cartão de jogador carregado, conforme proposta elencada no capítulo anterior;
k) Os equipamentos de POS serão fornecidos pela CAIXA, em comodato, nos mesmos termos dos demais equipamentos para as permissionárias, sendo da responsabilidade da instituição a manutenção desses, que deverão ser devolvidos em caso de encerramento da permissão;
l) A remuneração do corretor será com base em comissão, de acordo com os mesmos critérios vistos para os demais permissionários;
m) A mediação dos corretores deve ser realizada com diligência e prudência[41], de modo a seguir os parâmetros do jogo responsável;
n) Há necessidade de que informação completa acerca da segurança e do risco do negócio[42] seja fornecida pelo corretor, também em atendimento aos parâmetros do jogo responsável;
o) O resgate dos prêmios deve seguir as normas em vigor e as propostas em capítulo antecedente.
Logo, a função complementar do corretor lotérico acelera o processo de inclusão de inúmeros potenciais apostadores, que não realizam apostas em razão da falta de acesso tecnológico, da exclusão econômico-social, bem como pelo distanciamento dos permissionários lotéricos. Além disso, pode-se gerar uma concorrência direta – em razão do aspecto da pessoalidade e da comodidade – com as loterias ilegais, como o jogo do bicho, de modo a capturar parte do seu público-alvo.
A partir do presente estudo, buscou-se observar maneiras de incremento das “Loterias Online da CAIXA”, ainda que reconhecido o fato de que estas seguem bons padrões de práticas internacionais para o setor de apostas virtuais. Para tanto, vislumbrou-se duas vertentes de melhorias das referidas loterias, quais sejam, da própria plataforma de realização das apostas e concepção de permissionário complementar ao meio virtual, diante do contexto econômico-social brasileiro.
Nesse diapasão, em relação à primeira vertente, indicou-se que algumas novas solicitações cadastrais (endereço de domicílio e envio de documento comprobatório dos dados pessoais fornecidos) poderiam gerar maior segurança na identificação do apostador. Além disso, a criação de um cartão de jogador vinculado à conta na plataforma online, poderia permitir o desenvolvimento de novos meios de pagamento, o encerramento de limite mínimo de aposta superior a uma aposta simples e, até mesmo, o resgate mais imediato dos prêmios.
A seu turno, defende-se que o resgate deve ser automático para prêmios até o limite máximo estipulado para o resgate em agência lotérica, com a devida comunicação no e-mail de cadastramento, para maior confiabilidade no sistema e inclusão do hábito responsável de aposta na rotina dos usuários. Sob esta perspectiva da responsabilidade, ademais, sugeriu-se a implementação do mecanismo de autoexclusão, para elevação dos padrões de jogo responsável na plataforma.
Em outra vertente, ante um sistema de permissão de exercício de atividade lotérica pela CAIXA que nada se relaciona com o contexto de mercados virtuais, propôs-se uma figura de permissionário complementar à plataforma “Loterias Online da CAIXA”, que integraria no mercado os excluídos digitais e os desbancarizados, ao mesmo tempo que ampliaria a capilaridade das loterias: o chamado corretor lotérico. Estes, por sua vez, em maior presença e a partir também de vinculações pessoais, sempre dentro dos padrões éticos e regulamentares, passam a mediar as apostas virtuais (realizadas na plataforma “Loterias Online da CAIXA”) para um público ainda maior, em clara concorrência com jogos de azar pautados nas relações de proximidade física e pessoal.
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[1] Em detrimento à execução direta pela Caixa Econômica Federal, a possibilidade da concessão da Loteria Instantânea Exclusiva (LOTEX), em que a União instituiu, porém seguiu o permissivo do § 1º, do art. 28, da Lei n. 13.155, de 4 de agosto de 2015, para execução indireta do serviço, mediante concessão, a qual fora efetivada em 2019. Essa, portanto, é a exceção das loterias da União para a execução mediante concessão. Como as demais seguem a política legal de execução direta pela Caixa Econômica Federal, deverão seguir o conjunto legal e normativo nesse sentido.
[2] Em sentido contrário: Barbosa (2018, p. 59-60): “Assim sendo, tal como ocorrera com a virtualização das apostas, em que o público de apostadores se expandiu para categorias de consumidores não adeptos ao sistema tradicional, a ampliação para além das fronteiras nacionais pode ser uma alternativa. Por óbvio, como forma de manutenção da legalidade das apostas, estas somente poderão ser realizadas online, em ordenamentos jurídicos não proibitivos e que eventualmente permitam a sua atuação ativa, também com publicidade. Neste caso, entende-se que tal posicionamento de concorrência em mercados em que não haja proibição (ou que não se submete a um sistema restritivo de operadores locais) estaria condizente com àqueles do TJUE, bem como da OMC, quando da análise de outros casos.”
[3] A imposição de informação de Cadastro de Pessoa Física (CPF), como forma de individualização do apostador e, sobretudo, a verificação de sua maioridade para as práticas de atos da vida civil, como a contratação de jogo ou aposta.
[4] Para o ingresso no portal, deve-se incluir o endereço de e-mail ou CPF juntamente com senha de acesso criada pelo usuário de seis caracteres numéricos. Por sua vez, no item 8 do mencionado documento, impõe-se que a utilização do portal e as apostas serão efetuadas para uso pessoal, tendo apenas o usuário cadastrado a autorização para utilizar a conta.
[5] O “Termo de adesão e uso ao portal de apostas das Loterias CAIXA” (2019), no seu item 3, acaba por ser bastante amplo acerca do pagamento das apostas, de que “será feito pelos meios de pagamento disponíveis”. Ocorre que, na prática, apenas é viabilizado até o fechamento do presente trabalho o pagamento por meio de cartão de crédito.
[6] Isso, depois do cumprimento integral das exigências de auditorias, incluindo-se a obtenção da certificação ISO/IEC 27001.
[7] Item 5.1., do “Termo de adesão e uso ao portal de apostas das Loterias CAIXA”, 2019.
[8] Exemplificadamente, a Circular n. 847/2019 dispõe sobre: “regulação das loterias de números: loto iii - quina/ loto v - mega-sena/ loto viii - lotomania/ loto ix - dupla sena / loto xii - lotofácil/ loto xiv - dia de sorte”.
[9] No dizer de Vicenzo (2006, p. 34), “a existência da internet aumentou bastante o intercâmbio entre os países na área de loterias, quer em termos de clientes, quer em termos técnicos e administrativos”.
[10] O n. 1, do artigo 1º deste diploma legal dispõe: “O direito de promover concursos de apostas mútuas é reservado ao Estado, que concede à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa a sua organização e exploração em regime de exclusivo para todo o território nacional”. Acrescente-se que a legislação foi republicada em anexo ao Decreto-Lei n.º 317/2002, de 27 de dezembro, bem como alterado pelo Decreto-Lei n.º 37/2003, de 6 de Março.
[11] De modo facultativo, ainda pode requerer endereço completo, telefone de contato, sexo, profissão escolaridade, ao passo que pode associar um número de telefone celular ao utilizador para a realização de apostas pelo canal SMS (LISBOA, 2019, p. 19).
[12] Tem-se como o “suporte que permite ao Utilizador usufruir dos serviços disponibilizados pelo Portal Jogos Santa Casa [além do] acesso a todo o histórico de transações efetuadas pelo Utilizador, bem como aos dados pessoais associados à mesma” (LISBOA, 2019, p. 2).
[13] Esses montantes, por sua vez, serão fixados anualmente pela direção do Departamento de Jogos da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa (n. 4, art. 4º, Decreto-Lei n. 282/2003), que também estabelece as regras de utilização do cartão de jogador, as quais são entregues no momento de aquisição desse (n. 5, , art. 4º, Decreto-Lei n. 282/2003).
[14] Segundo a CAIXA (2019, sp.), apenas no primeiro semestre de 2019, esse valor foi de R$146,3 milhões.
[15] Em todo caso, os prêmios creditados em cartão de jogador podem ser utilizados para realização de apostas (LISBOA, 2019, p. 15)
[16] Quando o montante do prêmio for igual ou superior a € 25 (vinte e cinco euros), pode o utilizador solicitar a sua transferência para uma sua conta bancária domiciliada em Portugal (LISBOA, 2019, p. 14).
[17] Sobre como viabilizar a proposta de concorrência intramarcas, Taufick (2018, p. 42) elenca como uma das etapas: “alterar Lei nº 12.869, de 2013, para eliminar necessidade de prévia e expressa autorização da outorgante para que o permissionário lotérico conjugue a sua atividade lotérica com outra atividade comercial;”
[18] Os critérios para a outorga de permissões lotéricas, consoante o item 2.2. da Circular Caixa nº 859/2019 são: a) potencial de mercado, a partir dos critérios da CAIXA; b) disponibilidade de equipamentos para a captação de apostas e para a prestação de serviços; c) disponibilidade de bilhetes de loteria federal; d) possibilidade de eficiência na execução dos serviços.
[19] A extinção da permissão decorre do final do termo estabelecido, de previsão normativa, ou de encerramento amigável entre as partes, podendo a permissionária solicitar a revogação por escrito à CAIXA, com antecedência mínima de trinta dias (item 26.3, da Circular Caixa nº 859/2019). Já a revogação, em razão do caráter precário e unilateral do regime de permissão, pode ser procedida a qualquer momento, declarada unilateralmente pela CAIXA, sem direito à indenização da permissionária e, no caso de culpa, a permissionária e seus sócios terão a suspensão de dois anos para obtenção de outra permissão (item 26, da referida Circular). De todo modo, pode ser imposta uma medida de sobreaviso de suspensão temporária suspensão das atividades da permissionária, com respectiva desativação do sistema e de equipamentos, para o caso de verificação de irregularidades dispostas pela normatização, independentemente de prévia notificação à permissionária, bastando a verificação dos indícios de irregularidades (item 28, da Circular).
[20] Conforme a Circular Caixa nº 859/2019: “7.1.1 CASA LOTÉRICA é a pessoa jurídica, inscrita no Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica - CNPJ/MF, constituída na forma de uma sociedade limitada (LTDA) ou de empresa individual de responsabilidade limitada - EIRELI, destinada à atividade Lotérica, podendo ou não possuir outra atividade comercial” e “7.1.3 A CASA LOTÉRICA comercializa todas as modalidades de loterias, os produtos conveniados, presta serviços delegados e atua como Correspondente da CAIXA, a critério da CAIXA e de acordo com as normas expedidas pelo Banco Central do Brasil.”
[21] Segundo a Circular Caixa nº 859/2019: “7.2.1 A CASA LOTÉRICA AVANÇADA TEMPORÁRIA atua sempre na forma de extensão de CASA LOTÉRICA, comercializa todas as modalidades de loterias, os produtos conveniados e oferece os serviços delegados pela CAIXA”
[22] Circular Caixa nº 859/2019: “7.3.1 A UNIDADE SIMPLIFICADA DE LOTERIAS é uma modalidade de UNIDADE LOTÉRICA, que se caracteriza por ser instalada em locais cujo potencial de mercado seja considerado insuficiente para a abertura da categoria CASA LOTÉRICA, atendendo às demais exigências descritas no subitem 7.1.”
[23] Pode haver a alteração de categoria (7.4) ou a conjugação de unidades lotéricas com outra atividade comercial, desde que haja avaliação e autorização prévia da CAIXA (7.5).
[24] Enquanto outorgante dessa permissão, a Caixa, a teor do art. 5º da Lei n. 12.869/2013, deverá prestar assistência e consultora, fornecer orientações e treinamentos, bem como todas as instruções bastantes para o início e manutenção do exercício da atividade de permissionário, sem contar a implementação de inovações operacionais indispensáveis à atuação do permissionário e à melhoria na gestão e desempenho empresarial.
[25] Previsão semelhante àquela historicamente constante no Decreto-Lei n. 204/1967, a saber: “Art 21. As Caixas Econômicas Federais credenciarão os revendedores de bilhetes de preferência, entre pessoas que, por serem idosas, inválidas ou portadoras de defeito físico, não tenham outras condições de prover sua subsistência. § 1º Poderão ser credenciados, para revenda de bilhetes, pequenos comerciantes, devidamente legalizados e estabelecidos que, além de outras atividades, tenham condições para fazê-lo. § 2º Nenhuma pessoa física ou jurídica de direito privado poderá ser detentora de cotas ou comercializar bilhetes da Loteria Federal em quantidade superior a 2% (dois por cento) da respectiva emissão. § 3º Ninguém será credenciado para a revenda de bilhetes em mais de uma unidade da Federação. § 4º O credenciamento de revendedores estabelecidos dependerá de prévia comprovação da existência de local apropriado e acessível ao público para a exposição e revenda de bilhetes e pagamento de prêmios. § 5º A cessão ou transferência de cota de bilhetes de loteria entre revendedores importará na perda de credenciamento dos participantes da operação”.
[26] Banco Central do Brasil (2018, p. 83): “O caso brasileiro, ao tempo em que segue o padrão mundial em alguns aspectos da inclusão financeira, também apresenta peculiaridades consideráveis. Apesar do aumento da posse de contas pela população como um todo, houve redução em alguns grupos específicos. Entre os jovens adultos (entre 15 e 24 anos), essa diminuição foi de 6 p.p., passando de 52,6% em 2014 para 46,7% em 2017”. Justamente este grupo teria maior potencialidade de realização de apostas virtuais, pois são os menos excluídos digitais.
[27] Banco Central do Brasil (2018, p. 83-84): “Pela primeira vez, o Findex buscou investigar as razões que fazem com que pessoas permaneçam desbancarizadas, e a resposta dos brasileiros acompanhou a maioria mundial, com a maior parte dos respondentes apontando para a falta de dinheiro como o principal motivo para não ter um vínculo com o sistema financeiro (57,8% dos desbancarizados). Outras razões apontadas pelos desbancarizados foram o alto custo dos serviços financeiros (56,5%), o fato de outra pessoa na família já ter uma conta (50,8%) e a falta de confiança no sistema financeiro (25%).”
[28] Sobre o jogo do bicho, para Damatta e Soárez (1999, p. 80-81): “À medida que a repressão se torna nacional e fica mais sofisticada o bicheiro vai se organizando para obter o efeito oposto. O resultado é que a repressão [...] é a principal responsável pela organização do jogo, unindo os bicheiros e provocando uma consequente expulsão dos “amadores” [...]”.
[29] Barbosa (2018, p. 55, nota de rodapé 185): “Os chamados “jogos do bicho” não são prognósticos em competições, mas concorrem diretamente com os prognósticos de números, que igualmente são de exclusividade exploratória da CAIXA”.
[30] Barbosa (2018, p. 55): “[...] nota-se que a persecução estatal com base no disposto na Lei de Contravenções Penais – seja para a exploração de loteria ilegal, ou pela introdução de bilhete de loteria internacional para comercialização no país – tem sido falha. E mais: no atual ambiente virtual, o combate à exploração ilegal de loterias deve ser transnacional, com o apoio de ordenamentos jurídicos que são favorecidos (inclusive no aspecto de arrecadação) por serem sede de casas de apostas virtuais, em locais tidos como “paraísos fiscais”.
[31] Historicamente, como afirma Chazkel (2007, p. 545): “As the key personages in the daily operation of the jogo do bicho, these bicheiros (sellers) and banqueiros (bankers) took bets from customers and paid the day´s winners their due. The agents did not collaborate in the early years, and indeed decades, of the game´s existence. What buyers, sellers and government officials called the jogo do bicho actually denoted a variety of clandestine lotteries that coexisted in Rio de Janeiro and in cities and towns throughout the country”.
[32] Magalhães (2005, p. 81): “Como vimos, se poderia apostar nos bichos em vários e diferentes locais em seus momentos iniciais de existência. Assim, os primeiros “banqueiros” do bicho teriam sido os donos de armazéns de secos e molhados, sapateiros, donos de quiosques, book-makers, vendedores ambulantes autônomos e outros estabelecimentos comerciais”.
[33] Barbosa (2018, p. 56): “A par de qualquer esforço para a atuação estatal no combate à exploração ilegal das apostas (notadamente das apostas esportivas no Brasil), que é necessário e deve ser aprofundado, o presente trabalho visa uma percepção mais pragmática dos fatos”.
[34] Segundo Diniz (2014, p. 574): “Contém uma obrigação de resultado e não de meio, pois o corretor deve obter a formação de um negócio, logo não há vínculo entre comitente e corretor, daí diferenciar-se do mandato e da prestação de serviços”.
[35] Diniz (2014, p. 576): “Só terá direito à remuneração, não podendo cobrar despesas efetuadas no desempenho de sua atividade de intermediação. A comissão é o pagamento do resultado obtido com o trabalho do corretor: a aproximação das partes, tomando possível a conclusão do negócio”.
[36] Serpa Lopes (1999, p. 414-415), ainda sob a vigência do Código Civil de 1916, afirmara que “se por contrato dermos um sentido lato como sendo toda relação a que corresponder um acordo de vontades, então sim teremos incontestavelmente neles um contrato. Por conseguinte, o jogo e a aposta são de natureza contratual”. O atual Código Civil dispõe sobre a figura nos artigos 814 a 817.
[37] A regra geral, como leciona Diniz (2014, p. 628): “A eficácia do jogo e da aposta limita-se à impossibilidade de repetição. Assim sendo, se se pagar débito de jogo ou de aposta voluntariamente, não mais se poderá reaver o que pagou”, podendo haver repetição, quando realizado por menor de idade ou interdito. Para Gonçalves (2012, p. 1276): “Jogo e aposta são, pois, contratos aleatórios. No primeiro, o resultado decorre da participação dos contratantes. O êxito ou o insucesso dependem da atuação de cada jogador. O vencedor fará jus a uma certa soma, previamente estipulada. Jogo é, pois, a convenção em que duas ou mais pessoas se obrigam a pagar certa importância àquela que se sair vencedora na prática de determinado ato de que todas participam”.
[38] Em qualquer caso, consoante item 2.9 do referido “Termo de adesão e uso ao portal de apostas das Loterias CAIXA” (2019), não é possível realizar estorno de aposta efetivada e, conforme item 2.8, as apostas estarão disponíveis para consulta no portal, no prazo de seis meses.
[39] In verbis: “Art. 729. Os preceitos sobre corretagem constantes deste Código não excluem a aplicação de outras normas da legislação especial”. No mesmo sentido, Diniz (2014, p. 578) firma que: “O contrato de corretagem rege-se pelas normas do Código Civil, mas, havendo lei especial, esta prevalecerá sobre aquelas. Assim, p. ex., a Lei n. 6.530/78, regulamentada pelo Decreto n. 81.871/78 e alterada pela Lei n. 10.795/2003, disciplinará a profissão de corretor de imóveis (RT, 635:264; BAASP, 2050:114, 1910:88), bem como as Resoluções Cofeci”.
[40] Nessa linha de entendimento, Paes (2018, p. 37) elenca dentre os princípios para a regulação das apostas esportivas on-line no Brasil, mas com clara aplicabilidade ao presente caso, o modelo de livre mercado limitado, no qual “– O número de licenças para os operadores é fixo, com os operadores concorrendo pelo direito de ter uma licença para participar do mercado brasileiro formal”.
[41] Diniz (2014, p. 575): “O corretor tem a obrigação de executar a mediação com a diligência e prudência, requeridas pela sua atividade de intermediação negocial”. De acordo com a redação do Código Civil: “Art. 723. O corretor é obrigado a executar a mediação com diligência e prudência, e a prestar ao cliente, espontaneamente, todas as informações sobre o andamento do negócio. Parágrafo único. Sob pena de responder por perdas e danos, o corretor prestará ao cliente todos os esclarecimentos acerca da segurança ou do risco do negócio, das alterações de valores e de outros fatores que possam influir nos resultados da incumbência”.
[42] Diniz (2014, p. 575): “É dever do corretor informar, verbalmente ou por escrito, por sponte propria, o cliente sobre o andamento do negócio, esclarecendo não só sobre as condições, a: segurança ou o risco do ato negociai (p. ex.,· informando sobre documentação irregular, estado de insolvência do alienante), mas também. a respeito das alterações de valores e de todos os fatores que possam influir nos resultados da incumbência, sob pena de responder por perdas e danos”.
Mestre em Direito e Economia pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, com período na Alma Mater Studiorum – Università di Bologna. Investigador Associado ao Centro de Investigação de Direito Europeu, Económico, Financeiro e Fiscal - CIDEEF (Faculdade de Direito – Universidade de Lisboa). Participante do Comitê de Concorrência do IBRAC. Administrador. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBOSA, ALLAN FUEZI DE MOURA. Loterias Online da Caixa: propostas de melhorias e da complementaridade de corretores lotéricos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jul 2020, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54924/loterias-online-da-caixa-propostas-de-melhorias-e-da-complementaridade-de-corretores-lotricos. Acesso em: 23 dez 2024.
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