RESUMO: Este artigo focaliza o instituto do prazo decadencial em matéria tributária e tem como objetivo a busca do entendimento dominante acerca do dies a quo para a contagem do prazo decadencial para a constituição de crédito tributário. É o resultado de uma pesquisa documental e qualitativa, onde se adotou como metodologia a análise da literatura pertinente, como as disposições do Código Tributário Nacional, livros e artigos de doutrinadores e a jurisprudência do STJ. Da análise, chegou-se ao entendimento de que o quinquênio decadencial tem como termo inicial para sua contagem, a data da ocorrência do fato gerador para os tributos de lançamento sujeito a homologação, quando verificada a antecipação do pagamento, desde que não ocorra dolo, fraude ou simulação. Na ausência de pagamento antecipado, ou verificada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, o termo inicial é o primeiro dia útil do exercício seguinte ao da ocorrência do fato gerador, igual ao dos tributos sujeitos a lançamento direto.
Palavras-chave: tributo; fato gerador, prazo decadencial.
Sumário: 1. Introdução; 2. O nascimento da Obrigação e do Crédito Tributários; 3. Lançamento Tributário; 3.1. Lançamento Direto; 3.2. Lançamento por Declaração; 3.3. Lançamento por Homologação; 4. Prazo Decadencial; 5. Considerações Finais; 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
As inúmeras divergências e discussões entre doutrinadores e jurisprudência acerca do instituto da decadência em matéria tributária, deram causa ao nascimento deste trabalho em busca do entendimento dominante a esse respeito.
Luciano Amaro (1999), Hugo de Brito Machado (2007) e Kiyoshi Harada (2002) entre outros, defendem a tese de que para os impostos sujeitos a lançamento por homologação o dies a quo para a contagem do prazo decadencial é a data da ocorrência do fato gerador, sempre que houver pagamento antecipado, desde que não haja dolo, fraude ou simulação. Art. 150, § 4º do CTN. Na ausência de pagamento ou verificada uma das ocorrências retrocitadas, aplica-se a disposição do artigo 173, I do CTN, qual seja, o termo inicial para a contagem do quinquênio é o primeiro dia útil do exercício seguinte ao da ocorrência do fato gerador.
Entretanto, há quem sustente, a exemplo de Carlos Mário da Silva Veloso (apud Luciano Amaro, 1999), que o prazo para o lançamento por homologação, na ausência de pagamento, teria início a partir do exercício seguinte ao término dos cinco anos contados a partir da data do fato gerador. Ou seja, na ausência de pagamento antecipado, conjugar-se-iam os prazos previstos nos artigos 150, § 4º e 173, I todos do CTN. Nessa esteira, o STJ, através de suas turmas, unificou jurisprudência até o ano de 1999.
Contudo, a partir de maio de 2000 o STJ começa a dá sinais de mudança desse entendimento, firmando a tese de que o prazo decadencial é de cinco anos contados da data do fato gerador - art. 150, § 4º -, ou do primeiro dia útil do exercício seguinte ao da ocorrência do fato gerador, na ausência de pagamento – art. 173, I. Portanto, afastando a hipótese de conjugação dos prazos previstos nos artigos supracitados.
Neste artigo fazemos uma abordagem do tema, partindo do fato gerador, passando pelo nascimento da obrigação tributária, pelo lançamento e pela consequente constituição do crédito tributário. E, por fim, detivemo-nos ao tema específico, que é o prazo decadencial, chegando, ao final, ao entendimento daquele que consideramos como entendimento predominante.
2. O NASCIMENTO DA OBRIGAÇÃO E DO CRÉDITO TRIBUTÁRIOS
Estatui o artigo 113 da Lei 5.172 de 1966 – Código Tributário Nacional, que a obrigação tributária surge com a ocorrência do Fato Gerador. E disso não há discordância. Concordam os mais renomados doutrinadores que a ocorrência de um fato descrito na norma abstrata, as hipóteses de incidência, faz nascer a obrigação tributária.
Entretanto, discussões existem acerca da relação existente entre a obrigação tributária e a constituição do crédito tributário.
Para Luciano Amaro (1.999, p.316), o crédito tributário só se constitui com a efetivação do ato formal pelo sujeito ativo, previsto em lei, que é o lançamento. Citando como exemplo o IPTU, que tem como hipótese de incidência, a propriedade de imóvel em área urbana. A propriedade do imóvel, por si só, constitui a ocorrência do fato gerador, que dá origem à obrigação tributária. Entretanto, nesse momento ainda não se pode falar na existência de crédito tributário. Este, só nasce com o lançamento, procedimento através do qual é estabelecido o quantum debeatur e o torna exigível do sujeito passivo da ralação jurídica. Nessa relação jurídica, figuram, no pólo ativo o Município, e no pólo passivo o proprietário do imóvel.
Kiyoshi Harada (2002, p.438), traz à baila que renomados tratadistas criticam a redação do art. 139 do CTN, que prescreve o crédito tributário como sendo decorrente da obrigação principal e que tem a mesma natureza dela. Para tais críticos, “o crédito tributário nasce juntamente com a obrigação tributária, subsiste e se extingue simultaneamente com ela”. Para Kiyoshi Harada, a ocorrência do fato gerador faz surgir a obrigação tributária, que instaura o vínculo jurídico entre o sujeito ativo e sujeito passivo, cabendo ao sujeito ativo, através do lançamento fiscal, previsto no artigo 142 do CTN, constituir o crédito tributário.
Assim sendo, pode-se entender o crédito tributário como sendo o resultado da formalização da obrigação tributária através do lançamento, uma vez que é através do ato/procedimento de lançar que se estabelece o valor e sua liquidez exigível, no prazo determinado pela lei. Como bem define Kiyoshi Harada, pode existir obrigação tributária sem crédito tributário, mas não haverá crédito tributário sem que tenha havido antes uma obrigação tributária. Destarte, em que pese a afinidade entre os dois eventos, não parece sustentável a tese de que ambos nascem, subsiste e se extinguem simultaneamente. Isso porque, pode haver a ocorrência de um fato gerador que dará origem à obrigação tributária e que, por falta do lançamento fiscal, decorrido um determinado lapso temporal, previsto em lei ocorre a decadência, de que trataremos mais adiante, e o sujeito ativo perde o direito de proceder ao lançamento e, consequentemente, de constituir o crédito tributário.
Em resumo de tudo que até aqui dissemos, pode-se afirmar que, ocorrido o fato gerador, nasce a obrigação tributária. Entretanto, se não for efetuado o lançamento durante o lapso temporal de 05 anos, que constitui o prazo decadencial, decai o direito de a Fazenda fazê-lo e constituir o crédito, ou seja, sem lançamento não há que se falar em crédito tributário. Essa é, portanto a razão das críticas de doutrinadores, a exemplo de Luciano Amaro, às disposições do CTN, no seu artigo 156 que classifica a decadência como sendo uma das modalidades de extinção do crédito.
Ora, se ocorreu a decadência é porque não houve lançamento, e se não houve lançamento, o crédito se quer nasceu. Se o crédito não nasceu, não se poderia falar em extinção de algo inexistente. Na verdade, o que se extingue é o direito de a Fazenda de constituir o crédito.
Este entendimento tem supedâneo nas palavras de Luciano Amaro, que chama de impropriedade semântica, o uso da decadência como sendo causa de extinção de crédito tributário.
3.LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO
Prescreve o artigo 142 do CTN que o lançamento é atividade privativa da autoridade administrativa, tendente à constituição do crédito tributário. Assevera o citado dispositivo, no seu parágrafo único, que o lançamento é atividade vinculada e obrigatória, sob pena de responsabilidade funcional.
O lançamento é, portanto, o procedimento administrativo através do qual o agente competente procede à averiguação da subsunção do evento concreto à hipótese de incidência. É o momento em que deve ser definida a base de cálculo, a alíquota a ser aplicada, previstos em lei, e a identificação do sujeito passivo, que ao final será cientificado da constituição do crédito, que deverá ser pago no tempo determinado pela lei.
Há de se ressaltar, porém, que, conforme destaca o eminente professor Eduardo Sabbag (2019, p. 949), o lançamento nos termos do sobredito artigo 142 não é mais a única maneira para a efetivação do crédito tributário, em face da já consolidada Súmula nº 436 do STJ. (A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco).
Portanto, o preenchimento e entrega da declaração pelo contribuinte, implica no reconhecimento do débito fiscal e constitui o crédito tributário, dispensando o procedimento administrativo de que trata o aludido artigo 142.
Mas o lançamento nos termos, do supracitado artigo 142 não poderá ser feito a qualquer tempo, o legislador estabeleceu que após decorrido um determinado lapso temporal, sem que a Fazenda tenha procedido ao lançamento, perderá o direito de fazê-lo e de constituir o crédito.
Prescrevem os artigos 144 e 145 do CTN que “o lançamento deve reportar-se à data da ocorrência do fato gerador da obrigação e rege-se pela lei então vigente, ainda que posteriormente modificada ou revogada”, e que “o lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só poderá ser alterado em virtude:
“I – impugnação do sujeito passivo;
II – recurso de ofício;
III – iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos em lei”.
Portanto, o lançamento só pode ser considerado definitivo, depois de decorrido o prazo legal para impugnação, sem que haja manifestação em contrário, do sujeito passivo. Não há, obviamente, lançamento provisório, mas enquanto não decorrido o prazo legal, que é, normalmente de 30 dias, para a impugnação, o lançamento permanece sujeito à modificação. Com a definitividade do lançamento, tem-se como definitiva a constituição do crédito líquido e certo exigível pela Fazenda Pública.
O Código Tributário Nacional alberga três tipos de lançamentos: o lançamento direto ou de ofício, o lançamento misto e o lançamento por homologação.
3.1 LANÇAMENTO DIRETO
ambém entendido como lançamento de ofício, o lançamento direto é efetuado pelo agente público sem que haja a participação do sujeito passivo. Nessa modalidade de lançamento, o Fisco age por conta própria, identifica o sujeito passivo, a ocorrência do fato gerador, a matéria tributária, o valor do imposto devido e promove a notificação. Art. 149 do CTN. Como exemplo de imposto de lançamento direto pode-se citar o IPTU e o IPVA.
O lançamento direto pode, ainda, ser originário de um imposto sujeito a lançamento por homologação, que a legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame do Fisco. Não havendo essa antecipação, ou procedendo o sujeito passiva em desconformidade com o que prescreve a legislação, tal lançamento deixa de ser feito por homologação passa a ser feito de ofício pela autoridade fiscal, que deve apurar o montante do imposto devido e notificar o sujeito passivo.
3.2 LANÇAMENTO POR DECLARAÇÃO
O lançamento por declaração, também compreendido com lançamento misto, tem características muito parecidas com o lançamento ex offício, sendo que o lançamento de ofício é um direito potestativo da Fazenda, ou seja, o agente fiscal age unilateralmente, efetua o lançamento independentemente de manifestação do sujeito passivo/contribuinte ou de terceiros, enquanto que no lançamento por declaração, conforme prescreve o artigo 147 do CTN “o lançamento é efetuado com base na declaração do sujeito ou de terceiro, quando um ou outro, na forma da legislação tributário, presta à autoridade administrativa informações sobre matéria de fato, indispensáveis à sua efetivação”.
Conforme leciona o ilustre professor Eduardo Sabbag (2019, p. 967), esse tipo de lançamento se configura pela conjugação entre Fisco e contribuinte, onde ao contribuinte compete apresentar as informações necessárias para o lançamento e ao Fisco a efetivação do lançamento propriamente dito.
Destaca o mestre como tributos cuja constituição do crédito se dá por esse tipo de lançamento, o IE – imposto de exportação, o II – imposto de importação, o ITBI e o ITCMD.
A declaração do contribuinte é um dever instrumental, ou obrigação acessória, conforme define o CTN no artigo 113, § 2 º, do sujeito passivo ou de terceiro, como por exemplo, o pai, o tutor, o curador ou o administrador. Mas a declaração não constitui o lançamento. Este é ato exclusivo da autoridade administrativa. Já a atividade de efetivação do lançamento praticada pelo agente público, a partir de tais informações, em nada se difere do lançamento direto.
3.3 LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO OU AUTOLANÇAMENTO
Estabelece o artigo 150 do CTN:
“O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribui ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa”.
É o lançamento por homologação a modalidade aplicável à maioria dos tributos previstos na legislação nacional, e o que mais discussões tem suscitado entre os doutrinadores e a jurisprudência.
Como frisa Luciano Amaro, há uma multiplicidade de fatos geradores, de caráter instantâneo, como por exemplo, os tributos indiretos e os tributos sujeitos à retenção na fonte, aos quais a lei dá um tratamento diferenciado dos demais, atribuindo ao contribuinte e/ou ao tomador de serviços a obrigação de, àquele, antecipar o pagamento do imposto e, a este, fazer a retenção do imposto na fonte - no caso dos tomadores de servos sujeitos por lei a este procedimento - sem prévia manifestação do Fisco, sem que o sujeito ativo proceda ao lançamento para tornar exigível a prestação tributária.
Até aqui, tem-se como compreensível essa posição do legislador, dada a grande quantidade e intangibilidade desses tributos. Se assim não o fosse, teria a Fazenda que ter um número inimaginável de agentes fiscais para alcançar todos esses contribuintes e proceder aos respectivos lançamentos e consequentemente à constituição dos créditos, tornando-os exigíveis.
Entretanto, não havendo antecipação ou retenção na fonte, ou ainda, procedendo o sujeito passivo ou terceiro responsável em desconformidade como o que prescreve a legislação, tal lançamento deixa de ser feito por homologação e passa a ser efetuado de ofício pela autoridade fiscal, que após apurar montante do imposto notificará o sujeito passivo. Havendo, contudo, pagamento antecipado com
valor menor que o apurado pelo Fisco, o lançamento direto será procedido apenas da diferença a recolher. Relativamente à parte em que o valor foi antecipado, o lançamento permanece por homologação, ou seja, o Fisco homologa a atividade relativa à parte antecipada e lança de ofício a diferença a recolher.
Na hipótese de não haver manifestação do Fisco durante o lapso temporal de 05 anos, considera-se tacitamente homologada a atividade de apuração e recolhimento do imposto feita pelo contribuinte.
Quanto às discussões suscitadas, Luciano Amaro diz que o Código Tributário Nacional “teve de construir, com enorme dose de artificialismo, a idéia do lançamento por homologação”, para Hugo de Brito Machado, trata-se de “ficção científica”, já que o próprio CTN prescreve que o lançamento é atividade privativa da autoridade administrativa. Para Luciano Amaro, melhor seria considerar a hipótese de pagamento antecipado, como de lançamento desnecessário.
Para Eduardo Sabbag (2019, p. 1116), no lançamento por homologação, havendo uma antecipação de pagamento, o Fisco tem um prazo decadencial de 5 anos contados a partir da data da ocorrência do fato gerador para homologá-lo. Transcorrendo in albis o lustro decadencial, sem que se faça uma conferência expressa, ocorrerá o procedimento homologatório tácito, “segundo o qual perde o Fisco o direito de cobrar uma possível diferença”.
Assevera o professor que “Nesse ponto, transborda o instituto da decadência nos lançamentos por homologação.” E que após os 5 anos, havendo a homologação tácita, nas palavras do mestre, “vem a reboque” a perda do direito de lançar de ofício eventuais diferenças que venham a ser posteriormente identificadas.
Não obstante a importância dessa discussão, não nos aprofundaremos nela, uma vez que o objeto específico de estudo deste artigo é o instituto do prazo decadencial, o que passaremos a estudar.
4.PRAZO DECADENCIAL
Parta que não perdure ad infinitum o direito de a Fazenda constituir o crédito tributário e por imposição do princípio da segurança jurídica, o legislador estabeleceu limites temporais para a Fazenda constituir o crédito tributário, findo esses prazos, fenece o direito do poder público. Na dicção de Hugo de Brito Machado Segundo, “tais prazos foram batizados de decadenciais, que não se suspendem nem se interrompem”.
O eminente professor Eurico de Santi (2000, p. 39) assim define a decadência:
“A decadência do direito do Fisco corresponde à perda da competência administrativa do Fisco para efetuar o lançamento tributário, e a decadência do direito do contribuinte corresponde à perda do direito de o contribuinte pleitear administrativamente o débito do Fisco.”
Os prazos decadenciais estão definidos especificamente em dois artigos do Código Tributário Nacional: 150, §§ 1º e 4º e 173, I e II.
Devendo-se ressaltar, contudo, que, conforme aduz Leandro Paulsen (apud Sabbag, 2019, p.992) “a regra do § 4º é especial relativamente à do art. 173, I, deste mesmo Código. E, em havendo regra especial, prefere à regra geral. Não havendo que se falar em aplicação cumulativa de ambos os artigos (...)”. “Ou é o caso de aplicação da regra especial ou da regra geral, jamais aplicando-se as duas no mesmo caso.” (PAULSEN, 2017, p.1198). Portanto, a regra especial e a regra geral se opõem.
Não obstante a aparência de um tema simples, diante de uma análise não criteriosa dos supracitados dispositivos legais, na verdade, a interpretação mais detida desses dispositivos e sua correlação com instituto do prazo decadencial têm suscitado muitas discussões entre os doutrinadores e o judiciário.
Preceitua o artigo 150, § 4º, in verbis:
“Art. 150. O lançamento por homologação, que ocorre quanto aos tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa, opera-se pelo ato em que a referida autoridade, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologa.
§ 1º O pagamento antecipado pelo obrigado nos termos deste artigo extingue o crédito, sob condição resolutória da ulterior homologação do lançamento.
(...)
§ 4 º Se a lei não fixar prazo à homologação, será ele de cinco anos, a contar da data da ocorrência do fato gerador; expirado esse prazo sem que a Fazenda Pública se tenha pronunciado, considera-se homologado o lançamento e definitivamente, extinto o crédito, salvo se comprovada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação.”
Procedendo-se a uma análise mais acurada desses dispositivos, correlacionando-os ao artigo 142 do mesmo diploma legal, que prescreve que somente a autoridade administrativa pode constituir o crédito tributário através do lançamento, perceber-se-á o descompasso entre eles. Primeiro, porque o caput do artigo 150 fala em homologação expressa da atividade exercida pelo obrigado, qual seja, apurar o valor do imposto e efetuar o pagamento, por sua conta e risco. Segundo, porque o § 4º do mesmo artigo diz que, diante do silêncio da Fazenda, considera-se homologado definitivamente o lançamento. Ora, diante da ausência de manifestação da autoridade administrativa, não se poderia falar em lançamento nem homologação tácita, uma vez que não haveria lançamento, já que só a autoridade administrativa pode fazê-lo. Pode-se desde logo depreender que nesses casos há impropriedade semântica de termos. Mas esses não constituem os problemas mais relevantes levantados acerca de sua interpretação. As discussões são concernentes ao dies a quo para a contagem do prazo decadencial. Quanto à possibilidade de a lei fixar outro prazo, de que dispõe o § 4º supracitado, o entendimento de Hugo de Brito Machado e de Luciano Amaro, entre outros, é que, em se tratando de prazo diferente de cinco anos, esse prazo teria que ser sempre menor.
Vale ainda destacar que, como dito alhures no título Lançamento Tributário, o lançamento nos termos do sobredito artigo 142 não é mais a única maneira para a efetivação do crédito tributário, em face da já consolidada Súmula nº 436 do STJ. (A entrega de declaração pelo contribuinte reconhecendo débito fiscal constitui o crédito tributário, dispensada qualquer outra providência por parte do fisco).
Uma vez que o preenchimento e entrega da declaração pelo contribuinte, implica no reconhecimento do débito fiscal e constitui o crédito tributário, dispensando o procedimento administrativo de que trata o aludido artigo 142.
De forma mais genérica, determina o artigo 173:
“Art. 173. O direito de a Fazenda Pública constituir o crédito extingue-se após cinco anos contados:
I – do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado;
II – da data em que se tornar definitiva a decisão que houver anulado, por vício formal, o lançamento anteriormente efetuado.”
A partir daqui surgem duas interpretações distintas, a da doutrina majoritária e a do Superior Tribunal de Justiça.
Para doutrinadores como Luciano Amaro, Hugo de Brito Machado e Kiyoshi Harada, aplicam-se os dispositivos do artigo 150 do CTN nas hipóteses de impostos sujeitos à homologação, quando houver a antecipação do pagamento, em não havendo pagamento, aplica-se a regra geral estabelecida pelo artigo 173 do mesmo diploma legal, que é mais abrangente e aplicada aos tributos sujeitos aos lançamentos de ofício e por declaração. Isso porque na ausência de pagamento ou pagamento a menor, ou ainda, ocorrendo dolo, fraude ou simulação, o lançamento será feito de ofício.
Para esses autores, o prazo decadencial para os tributos sujeitos à homologação é de cinco anos contados a partir da data do fato gerador para os casos em que haja antecipação do pagamento. Não havendo pagamento, aplica-se a regra geral aplicada aos tributos sujeitos ao lançamento de ofício e por declaração, que é de cinco anos contados a partir do primeiro dia útil do exercício seguinte ao da ocorrência do fato gerador. Art. 173. I do CTN. Mais a coisa não é tão simples como parece ser, ainda há muita controvérsia entre os juristas.
Exemplificando, conforme o fizeram, na mesma linha de raciocínio Luciano Amaro e Sacha Calmon Navarro Coelho, imaginemos as seguintes hipótese:
I – Um fato gerador ocorrido em 10 março de 2012, de um tributo sujeito a lançamento direto ou por declaração, o dies a quo para a contagem do prazo decadencial é 1º de janeiro de 2013. Portanto, neste caso o Fisco tem até 31 de dezembro de 2017 para constituir o crédito tributário, não o fazendo, em 1º de janeiro de 2018, decai o direito de fazê-lo. Art. 173, I do CTN.
II – Se, contudo, esse mesmo fato gerador for de um tributo sujeito a lançamento por homologação, aplicam-se as disposições do caput e § 4º do artigo 150 do mesmo diploma legal. Neste caso, o dies a quo para a contagem do prazo decadencial é a data do fato gerador, ou seja, 10 de março de 2012, decaindo, portanto, o direito de o Fisco constituir o crédito em março de 2017. Salve se constatada a ausência de pagamento ou verificada a ocorrência de dolo, fraude ou simulação, hipótese em que se aplica a regra do art. 173, I supracitado.
Hugo de Brito Machado (2007) afirma que há inúmeras controvérsias entre os tributaristas acerca do que dispõe o inciso I do artigo 173 do Código tributário Nacional, mas acredita ser predominante, o entendimento pelo qual o prazo decadencial se inicial no primeiro dia útil do exercício seguinte àquele em que o tributo poderia ter sido lançado. Desde que o sujeito passivo não tenha sido notificado de alguma medida preparatória indispensável ao lançamento, nesse caso o início do prazo decadencial é antecipado à data da notificação. Se, contudo, a notificação for feita após o início do prazo decadencial, “não o interrompe, nem o suspende”.
Em outras palavras, se o contribuinte for notificado da apuração e do lançamento do quantum, ainda no exercício em que tenha ocorrido o fato gerador, não havendo impugnação por parte do contribuinte, considera-se definitivamente constituído o crédito tributário e dá início a partir de então a contagem do prazo prescricional.
Uma outra discussão destacada pelo autor, diz respeito ao momento em que se deve considerar exercido o direito de constituir o crédito tributário. E destaca que “segundo algumas correntes doutrinárias, esse momento seria:”
“a) aquele em que o fisco determinasse o montante a ser pago e intimasse o sujeito passivo para fazê-lo;”
“b) a decisão, pela procedência da ação fiscal, em primeira instância administrativa;”
“c) a decisão definitiva em esfera administrativa;”
“d) a inscrição do crédito tributário em dívida ativa.”
Hugo de Brito segue a sua análise a cada um dos casos aqui elencados. Para ele, a alternativa “a” estaria considerando um simples auto de infração, como lançamento. Esse entendimento não se sustenta, haja vista a possibilidade de interposição de ato impugnativo formulado pelo sujeito passivo.
Para os que se colocam na posição “b” “o auto de infração ainda não seria um lançamento, por lhe faltar o pronunciamento da autoridade administrativa com poder decisório e não tendo sido assegurado ao sujeito passivo, o direito de defender-se”. Portanto, não parece ter sustentação.
Como destaca e defende o ilustre professor, a posição “c” é a que parece mais coerente e sustentável. Na dicção do mestre, “somente quando a Administração, que é parte no procedimento e é quem efetua o lançamento, não mais admite discuti-lo pode-se considerar consumado o lançamento.”
E, por fim, a posição “d”, a inscrição em dívida ativa. Aqui não se trata de procedimento tributário, mas sim de ato tendente a dar ao crédito tributário a condição de exequibilidade, com a emissão da respectiva certidão de inscrição, que tem o condão de título executivo.
O STJ, por sua vez, editou jurisprudência, que durou até o ano de 1999, data maxima venia, absurda, em que, para os tributos sujeitos ao lançamento por homologação, define como termo inicial o primeiro dia do exercício seguinte àquele em que se extinguir o direito de a Fazenda Pública rever ou homologar o lançamento. Ou seja, somou-se o prazo previsto pelo artigo 150, § 4º com o prazo previsto no artigo 173, I, perfazendo um total de dez anos.
De acordo com esse entendimento, a Fazenda Pública teria um prazo de até quinze anos contados a partir da ocorrência do fato gerador, para constituir e exigir os seus créditos. São dez anos relativos ao prazo decadencial, que é o prazo para efetuar o lançamento e constituir o crédito, mais cinco anos relativos ao prazo prescricional, que é tempo que a Fazenda tem para exigir do contribuinte, o cumprimento da obrigação pecuniária, contados a partir da constituição do crédito.
Vejamos o que chegou a decidir o STJ em junho de 1999:
“Estabelece o artigo 173, inciso I do CTN que o direito da Fazenda de constituir o crédito tributário extingue-se em 5 (cinco) anos, contados do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento por homologação poderia ter sido efetuado. Se não houver pagamento, inexiste a homologação tácita. Com o encerramento do prazo para a homologação (5 anos), inicia-se o prazo para a constituição do crédito tributário. Conclui-se que, quando se tratar de tributos a serem constituídos por lançamento por homologação, inexistindo pagamento, tem o fisco o prazo de 10 anos, após a ocorrência do fato gerador, para constituir o crédito tributário. Embargos recebidos.” (STJ, 1ª S, AREsp 132329/SP, Rel. Min. Garcia Vieira, DJ de 7/6/99, p. 38, JSTJ 7/25182).
Já não era sem tempo, a partir maio de 2000, o STJ recobra o bom senso e dá sinais de mudança desse entendimento, firmando a tese de que o prazo decadencial é de cinco anos, contados a partir da ocorrência do fato gerador, para os tributos sujeitos a lançamento por homologação. (Embargos de Divergência em Resp. nº 101.407-SP. Rel. Min. Ari Pargendler, DJ, de 8-5-00, p.53).
Posteriormente outras decisões foram tomadas, pelas duas Turma de Direito Público do STJ, em que abandonam o esdrúxulo entendimento de antes:
“Processual e Tributário. ICM. Execução Fiscal. Embargos do Devedor.
Decadência. Procedente. 1. A caducidade opera-se em relação ao direito material de constituir o crédito tributário. 2. transcorridos mais de cinco anos do fato gerador até a constituição do crédito tributário, extingue-se definitivamente o direito do fisco de cobrá-lo. 3. Recurso especial improvido. (STJ, 1ª, T, REsp 178.4333/SP, Rel. Min. Peçanha Martins, DJ 21/8/2000).
“TRIBUTÁRIO – DECADÊNCIA – LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO (ART. 150 § 4º E 173 DO CTN). 1. Nas exações cujo lançamento se faz por homologação, havendo pagamento antecipado, conta-se o prazo decadencial a partir da ocorrência do fato gerador (art. 150, § 4º, do CTN). 2. somente quando não há pagamento antecipado, ou a prova de fraudes, dolo ou simulação é que se implica o disposto no art. 173, I, do CTN. 3. Em normais circunstâncias, não se conjugam os dispositivos legais. 4. Recurso especial improvido.”(STJ, 2ª T, REsp 395. 059/RS, Rel. Min. Eliane Calmon, DJ, 21/10/2002. No mesmo sentido: REsp 279.473/SP, DJ 8.04.2002, p. 177; REsp 183.606/SP, DJ13.08.2001, p. 88)
Pelo exposto, pode-se depreender que o STJ no que tange à interpretação dos artigos 150, § 4º e 173, I, concernente ao dies a quo para a contagem do prazo decadencial para a constituição de crédito tributário, dos tributos sujeitos a lançamento por homologação, tendeu a partir de 2000, a unificar jurisprudência, o que o fez finalmente, pela impossibilidade de conjugação dos prazos de tratam os artigos 150, § 4º e 173, I do Código Tributário Nacional.
O novo entendimento do STJ trouxe mais tranquilidade às empresas e aos contadores que se viam na obrigação de manter os documentos em arquivo por 10 anos e não por 05 anos como o faziam tradicionalmente.
Entendemos, portanto, por justo e conveniente esse novo entendimento do STJ, que vem se coadunar, finalmente, com o pensamento majoritário da doutrina. Qual seja, o prazo decadência em matéria tributária é de cinco anos contados a partir da data da ocorrência do fato gerador, quando se tratar de tributo de lançamento sujeito à homologação, nos termos do art. 150, § 4º do CTN, desde que haja a antecipação do pagamento e sem ocorrência de dolo, fraude ou simulação. Ausente a antecipação do pagamento e/ou ocorrendo dolo, fraude ou simulação, o termo inicial passa a ser o primeiro dia útil do exercício seguinte ao da ocorrência do fato gerado, como ocorre com os tributos de lançamento direto ou de lançamento por declaração, nos termos do art. 173, I do CTN. Decorrido o lustro decadencial de tratam os supracitados artigos 150, § 4º e 173, I, sem que o Fisco se manifeste, extingue-se o direito da Administração de efetuar o lançamento e constituir o crédito tributário.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A ocorrência do fato gerador enseja o nascimento da obrigação tributária que, após a efetivação do lançamento pela Fazenda Pública dá origem ao crédito tributário.
Os tributos de lançamento sujeito à homologação têm como dies a quo para a contagem do prazo decadencial o dia da ocorrência do fato gerado. Salvo quando verificada a ausência da antecipação do pagamento, de que trata o artigo 150, § 4º do CTN, ou ainda nos casos em que ocorrer dolo, fraude ou simulação, hipóteses em se aplicam o disposto no artigo 173, I do CTM,
A 1ª e a 2ª Turma de Direito Público do STJ firmaram jurisprudência que afasta o entendimento jurisprudencial anterior daquela Corte, de se poder conjugar os prazos decadenciais de que tratam os artigos 150, § 4º e 173, I do CTN, perfazendo um total de 10 anos.
Considera-se exercido o direito de constituição do crédito, o momento em que for proferida a decisão definitiva em esfera administrativa.
A decadência é a perda do direto do Fisco de efetuar o lançamento, com a consequente constituição do crédito tributário. Decorrido o prazo de cinco anos a partir da data do fato gerador, quando se tratar de tributo de lançamento sujeito à homologação, atendidas as exigências prescritas pelo art. 150, § 4º do CTN, quais sejam, a antecipação do pagamento e inocorrência de dolo, fraude ou simulação, e também de cinco anos contados a partir do primeiro dia útil do exercício seguinte ao da ocorrência do fato gerado, para os tributos de lançamento direto ou de lançamento por declaração, conforme prescreve o art. 173, I do CTN. Decorrido o lapso temporal de cinco anos, sem que o Fisco se manifeste, extingue-se o direito da Administração de efetuar o lançamento e constituir o crédito tributário.
6. REFERÊNCIAS
AMARO, Luciano, Direito Tributário Brasileiro, 4ª ed. São Paulo: Saraiva,1999.
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de direito tributário, 4 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.
HARADA, Kiyoshi. Direito Financeiro e Tributário. Atualizada de acordo com a lei de responsabilidade fiscal. 10 ed. São Paulo: Atlas S.A, 2002.
MACHADO, Hugo de Brito, Curso de direito tributário. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2007.
PAULSEN, Leandro. Constituição e código tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência. 18 ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 11 ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019.
SANTI, Eurico Marcos Diniz de. Decadência e prescrição no direito tributário: aspectos teóricos, práticos e análises das decisões do STJ. Revista Dialética de Direito Tributário. São Paulo:é, n. 62: 34 – 46, novembro/2000.
SEGUNDO, Hugo de Brito Machado.
Fonte: http://www.hugosegundo.adv.br/conteudo?dpublicacao=32
É professor, graduado em Letras pela UPE - Universidade de Pernambuco, graduando em Direito pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina - FACAPE, pós-graduado em Práticas de Ensino em Língua Portuguesa pela UPE e em Direito Tributário pela UNAMA - Universidade da Amazônia, Auditor Fiscal do município de Juazeiro-BA, ex-secretário da Fazenda do Município, ex-Diretor Presidente do Instituto de Previdência do Município e ex-membro do Comitê Gestor do Simples Nacional, indicado pela CNM - Confederação dos Municípios.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FILHO, Raimundo Francisco. Prazo decadencial em matéria tributária Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 ago 2020, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55001/prazo-decadencial-em-matria-tributria. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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