RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo apresentar a extensão da chamada imunidade tributária recíproca para entidades estatais, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, pessoas jurídicas de direito privado, quando estas forem criadas para prestação de serviços públicos de natureza exclusiva e obrigatória pelo estado, segundo recentes decisões do Supremo Tribunal Federal.
Palavras-chave: imunidade, imunidade tributária recíproca, Empresa Pública, Sociedade de Economia Mista, Supremo Tribunal Federal.
Abstract: The present work aims to present the extension of the so-called reciprocal tax immunity for state entities, Public Enterprises and Mixed Economy Societies, legal entities of private law, when these are created to provide exclusive and mandatory public service by the state, according to recent Supreme Court decisions.
Keywords: immunity, reciprocal tax immunity, Public Company, Mixed Economy Society, Supreme Federal Court.
SUMÁRIO: 1-Introdução. 2 Imunidade. 2.1 Conceito. 2.2 Considerações. 3. Imunidade Tributária recíproca. 4 Imunidade Tributária extensivas às empresas estatais. 4 Conclusão.5 Referências.
1-INTRODUÇÃO
A imunidade tributária tem previsão na Constituição Federal e constitui uma norma de não tributação sobre algumas atividades e pessoas, sendo uma verdadeira limitação ao poder estatal de exercer sua competência tributária. Dentre estas imunidades, podemos destacar a imunidade recíproca, objeto deste trabalho, o qual tem previsão no art. 150, VI, “a”, CF e estabelece que é vedada à União, o Distrito Federal, os Estados e aos Municípios cobrar impostos sobre a patrimônio, renda e serviços uns dos outros. Alude ainda o texto constitucional, que está imunidade é aplicada, de forma extensiva, às Autarquias e Fundações Públicas, desde que os serviços prestados estejam vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes, conforme art. 150, §2º, CF.
Assevera ainda o art. 150, §3º, CF, que as entidades estatais, Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas, que exploram atividades econômicas, não se aplica a imunidade, devendo sofrer tributação normal em suas atividades, pois atuam em regime concorrencial com outras pessoas jurídicas da iniciativa privada o que feriria o princípio da livre concorrência, previsto no art. 173, §2º,CF. Ocorre que, apesar de ser a regra a tributação das entidades estatais, o Pretório Excelso reconheceu que estas estatais fazem jus à imunidade recíproca, quando prestarem serviços de prestação obrigatória e exclusiva do Estado e não possuírem natureza concorrencial.
2- IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
2.1-CONCEITO
A Carta Magna fixa as competências tributárias dos Entes políticos, de modo positivo, ou seja, fixa quais tributos poderão ser instituídos. Porém, ela também, delimita, negativamente, sua exibilidade em alguns casos, são as chamadas imunidades.
A doutrina define imunidade tributária como causa de não-incidência, incompetência tributária, limitação ao poder de tributar, como exposto abaixo.
Segundo Machado, Hugo de Brito, 2008, pág. 282
“Imunidade é o obstáculo decorrente de regra da Constituição à incidência de regra jurídica de tributação. O que é imune não pode ser tributado. A imunidade impede que a lei defina hipótese de incidência tributária aquilo que é imune. É limitação da competência tributária”
Para o eminente ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco, 2009, pág.832, “A imunidade tributária, sendo uma norma de não-incidência por força de mandamento constitucional, impede a ocorrência do fato gerador, inexistindo relação jurídico-tributária não se instaura e o tributo não é devido”.
Assim, define-se imunidade como uma normal constitucional que afasta a competência do ente tributante visando proteger pessoas e atividades que são consideradas importante para a sociedade e também para o Estado.
2.2-CONSIDERAÇÕES
Importante ressaltar que, sempre que o texto constitucional afastar uma competência tributária, há uma imunidade, independentemente do termo utilizado, uma vez que, o próprio legislador, na elaboração do texto constitucional, equivocou-se fazendo uso a palavra isenção. Assim, deve ser considerada uma imunidade, toda vez que o texto da constituição afastar competências tributárias dos entes políticos.
Vale lembrar, que a imunidade afasta a obrigação principal, ou seja, ao pagamento do tributo, porém não fica o beneficiário dispensado das obrigações acessórias, como: apresentação de notas fiscais, título de propriedade, entre outras.
No julgamento do RE566622, ficou estabelecido pelo STF, que para definição dos critérios para a concessão da imunidade, pelo ente tributante, o mesmo deve definir estes critérios por Lei Complementar. “A lei complementar é forma exigível para definição de modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art.195, §7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas”
Tratando-se de imunidade tributária recíproca, o que é dispensado de cobrança, é a espécie tributária: imposto. Nada impede que um ente tributante cobre de outro ente, uma taxa. Exemplo: O imóvel que fica instalada a Receita Federal, se pertencer à União, ou seja, ser for bem da União, será imune à cobrança de IPTU pelo Município, mas nada impede que o mesmo, cobre taxa de lixo.
3-IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA
O art. 150, VI, “a”, da CF, veda aos entes federativos de cobrarem impostos sobre patrimônio, renda ou serviços uns dos outros, que tem por fundamento a proteção dos princípios federativos, da isonomia e da capacidade contributiva das pessoas políticas. Esta previsão visa proteger o pacto federativo, pois prevalece a autonomia de atuação.
O texto constitucional também prevê a extensão do benefício constitucional às Autarquias e Fundações Públicas, pessoas jurídicas de direito público, as quais são criadas e possuem seu campo de atuação a uma finalidade pública, uma atuar do estado, de prestação de serviço descentralizado. Para ter direito a este beneplácito, devem prestar serviços vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes.
A própria Constituição Federal alude, de forma expressa, que não são beneficiários da imunidade recíproca, às entidades estatais, quais sejam, Sociedades de Economia Mista e Empresas Públicas, art.150,§3º, da CF. Tal previsão, baseia-se, por estas pessoas jurídicas possuírem personalidade jurídica de direito privado e são criadas, em regra, para realizarem atividade econômica, de natureza concorrencial com outras empresas da iniciativa privada. As primeiras sendo beneficiadas com a imunidade, traria um desequilíbrio econômico perante as segundas, o que feriria o princípio da livre concorrência, art. 173, §2º, da CF.
Ocorre que, algumas entidades estatais, são criadas pelos entes políticos para prestarem serviços públicos de sua competência, serviços estes de prestação obrigatória e exclusiva do Estado, sem natureza concorrencial, Assim, algumas estatais começaram a exigir o direito de ser reconhecida a imunidade tributária. Como será exposto a seguir.
4- IMUNIDADE TRIBUTÁRIA RECÍPROCA EXTENSIVA ÀS ESTATAIS
Considerando o último parágrafo acima, começarei a expor quais entidades estatais tiveram o direito reconhecido e os requisitos que culminaram adquirir este direito.
A primeira, foi a Empresa de Correios e Telégrafos (ECT), em 2004, no julgamento do RE 407099/RS, em que o STF reconheceu o benefício por ser uma Empresa Pública, criada para dedicar-se ao serviço postal e ao correio aéreo, sendo uma competência exclusiva da União, previsto no art. 21,X, da CF.
“A Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos - ECT está abrangida pela imunidade tributária recíproca prevista no art. 150, VI, a, da CF, haja vista tratar-se de prestadora de serviço público de prestação obrigatória e exclusiva do Estado ("Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:... VI - instituir impostos sobre: a) patrimônio, renda ou serviços, uns dos outros;"). Com base nesse entendimento, a Turma reformou acórdão do TRF da 4ª Região que, em sede de embargos à execução opostos por Município, entendera que a atual Constituição não concedera tal privilégio às empresas públicas, tendo em conta não ser possível o reconhecimento de que o art. 12 do Decreto-Lei 509/69 garanta o citado benefício à ECT. Afastou-se, ainda, a invocação ao art. 102, III, b, da CF, porquanto o tribunal a quo decidira que o art. 12 do mencionado Decreto-Lei não fora, no ponto, recebido pela CF/88. Salientou-se, ademais, a distinção entre empresa pública como instrumento de participação do Estado na economia e empresa pública prestadora de serviço público. Leia o inteiro teor do voto do relator na seção de Transcrições deste Informativo. Precedente citado: RE 230072/RJ (DJU de 19.12.2002). RE 407099/RS, rel. Min. Carlos Velloso, 22.6.2004.(RE-407099)”
Em 2007, na ação cautelar nº1.550-2, a Corte Suprema concedeu a uma Sociedade de Economia Mista, a Companhia de Águas e Esgotos de Rondônia (CAERD), a imunidade perante o Município Guarajá-Mirim, pois a empresa foi criada para prestar uma atividade de munus público estatal que é o serviço de saneamento básico.
Também em 2007, no RE-AgR 363.412/BA, a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária(INFRAERO) teve concedida imunidade ao Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza(ISS), cobrado pelo Município de Salvador. Na decisão, foi reconhecida a atividade-fim da União, desempenhada pela empresa, prevista no art. 21, XII, “c”, da CF.
Outro julgado importante, foi no ano de 2013, em que também foi aplicada a benesse à Casa da Moeda Nacional, sob os mesmos fundamentos, afastando a possibilidade de cobrança do ISS, pelo Município do Rio de Janeiro. Veja:
“Casa da Moeda do Brasil (CMB). Empresa governamental delegatária de serviços públicos. Emissão de papel moeda, cunhagem de moeda metálica, fabricação de fichas telefônicas e impressão de selos postais. Regime constitucional de monopólio (CF, art. 21, VII). Outorga de delegação à CMB, mediante lei, que não descaracteriza a estatalidade do serviço público, notadamente quando constitucionalmente monopolizado pela pessoa política (a União Federal, no caso) que é dele titular. A delegação da execução de serviço público, mediante outorga legal, não implica alteração do regime jurídico de direito público, inclusive o de direito tributário, que incide sobre referida atividade. Consequente extensão, a essa empresa pública, em matéria de impostos, da proteção constitucional fundada na garantia da imunidade tributária recíproca (CF, art. 150, VI, a). O alto significado político-jurídico dessa prerrogativa constitucional, que traduz uma das projeções concretizadoras do princípio da Federação. Imunidade tributária da Casa da Moeda do Brasil, em face do ISS, quanto às atividades executadas no desempenho do encargo, que, a ela outorgado mediante delegação, foi deferido, constitucionalmente, à União Federal. Doutrina (Regina Helena Costa, inter alios). Precedentes. Recurso extraordinário improvido”. (RE610517/RJ-DJ, em17.6.2013)
Após vários outros julgados, prevaleceram os entendimentos acima.
Assim, para as empresas estatais serem beneficiárias da imunidade tributária, devem representar uma atuação pública do estado exclusiva e sem natureza concorrencial. Os julgados mais recentes foram da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), em 2017, em que o STF, na Ação Cível Originária (ACO) 2757, reconheceu o direito à imunidade e devolução dos impostos cobrados até 5 anos antes da proposição da ação. E, por fim, a Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM), em 2018, na ACO 3184, a dispensa ao pagamento do IPVA, perante o Estado do Ceará.
5-CONCLUSÃO
A imunidade tributária trata-se de uma norma constitucional que visa à proteção de pessoas e o livre exercício de algumas atividades, que por serem de grande relevância, recebem tratamento diferenciado e protetor do constituinte. Ao definir tal instituto, a doutrina a considera como uma incompetência tributária e uma limitação ao poder de tributar.
Já a denominada Imunidade Recíproca impede que um ente da federação, seja ele União, Estado, Distrito Federal ou Município, tribute com impostos outro ente federado, mantendo os, cada qual, com suas respectivas autonomias, através da divisão de competências, em respeito ao basilar princípio federativo. O texto constitucional estende, essa benesse, às Autarquias e às Fundações Públicas, desde que os serviços prestados estejam vinculados a suas finalidades essenciais ou às delas decorrentes. Porém assevera não ser possível dispensar o mesmo tratamento às Sociedades de Economia Mista e às Empresas Públicas, por serem pessoas jurídicas de direito privado, exercerem atividade econômica e em regime concorrencial com outras empresas da iniciativa privada, ferindo o princípio constitucional da livre concorrência.
Vimos que, embora o texto da Carta Magna não possuam exceções a regra acima. O STF, guardião e intérprete da constituição, reconheceu, em vários julgados, a imunidade recíproca às estatais, com um olhar para atividades e serviços que desenvolvem, a finalidade de sua criação e não meramente sua classificação em personalidade jurídica de direito privado ou público. Entendo que é o mais justo o critério usado pela Corte Suprema. O nomen iuris não pode ser o único critério definidor. E, assim, é o entendimento que prevalece do ano de 2013 até o presente momento.
6-REFERÊNCIAS
BRASIL. LEIS, DECRETOS ETC. Código Tributário; Código de Processo Civil; Constituição Federal; Legislação Tributária e Processual Tributária. São Paulo. RT, 2010. 1516p
BRASIL. LEIS, DECRETOS, ETC. Código Tributário Nacional e Constituição. 3. Ed. São Paulo: Saraiva, 2008, 683p
PLANALTO. Constituição Federativa do Brasil, de 5 de outubro de 1988.www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 12/06/2020
PLANALTO. Código Tributário Nacional. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966..http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172.htm. Acesso em: 15//06/2020
MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 29. Ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2008, 282p
ROSA JÚNIOR, Luiz Emygdio Franco da. Manual de Direito Tributário. 6.Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2009, 832p
FGV. Emenda Constitucional 03/1993-Controle de Constitucionalidade-Imunidade Tributária-http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/46416. Acesso em:17/06/2020
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. RE 566622/RIO GRANDE DO SUL..www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=2565291&numeroProcesso=566622&classeProcesso=RE&numeroTema=32. Acesso em: 17/06/2020
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.RE407099/Rio Grande do Sul. http://www.stf.jus.br/arquivo/informativo/documento/informativo353.htm. Acesso em: 17/06/2020
Graduada em Direito pela Faculdade Estácio de Sá, ano 2013.2. Aprovada no X Exame da Ordem da OAB, em 2013. Atuei como advogada, nos anos de 2013 até 2015. Possuo Pós-graduação em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera-Uniderp, concluído em 2014.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALMEIDA, Jaqueline Toledo de. Imunidade tributária: imunidade tributária recíproca extensiva às empresas estatais à luz do entendimento do Supremo Tribunal Federal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 ago 2020, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55065/imunidade-tributria-imunidade-tributria-recproca-extensiva-s-empresas-estatais-luz-do-entendimento-do-supremo-tribunal-federal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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