RUBENS ALVES DA SILVA[1]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo aborda o tema audiência de custódia, de acordo com o Pacto de São José a audiência de custódia é um instrumento jurídico que serve de amparo á pessoa presa, detida ou retida, para que em um período de até 24 horas ter sua causa analisada e julgada por um juiz ou outra autoridade autorizada judicialmente para exercer a função. Antes da audiência de custódia, muitos processos se acumulavam e os detentos esperavam por um longo período até que sua causa fosse analisada. Com a nova modalidade diminuiu a superlotação nos presídios e diminui, o juiz analisa qual a gravidade de cada caso e define se o existe a necessidade de manter a pessoa em regime fechado, aberto ou até mesmo se fica detido. O sistema carcerário está em decadência há muitos anos, muitas rebeliões desastrosas aconteceram e centenas de vidas foram ceifadas, apesar de inúmeros ajustes no âmbito jurídico, ainda há casos de rebeliões e muitos detentos morrem sem ter sua causa analisada e julgada.
PALAVRAS – CHAVE: Audiência de Custódia. Direitos Humanos. Reintegração na Sociedade.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Audiência de custódia. 2.1 Consequências da superlotação. 3. Violações dos direitos humanos. 4. Ressocialização. 5. Considerações finais. 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O objetivo geral deste trabalho é descrever o que é, e como atualmente se aplica a audiência de custódia. Diariamente acompanhamos nos noticiários muitos casos de pessoas que cometeram algum delito, passaram pela audiência de custódia e são liberados para responder o crime em liberdade. E muitas pessoas que desconhecem as leis, julgam erroneamente que a justiça brasileira não está mais punindo quem comete crimes, e por esta razão o índice de criminalidade aumenta cada vez mais. Não é bem assim, nem todo crime é doloso, e apenas uma autoridade autorizada judicialmente pode afirmar quem deve ou não pagar a pena em regime fechado, aberto ou responder em liberdade.
Nesta temática reverbera a necessidade de esmiuçar quem são beneficiados com esta lei, e porque só foi sancionada no Brasil recentemente. Sabe-se que o sistema carcerário sempre foi precário, e como consequência, muitas vidas foram ceifadas sem o réu sequer ter sua causa analisada. Apesar da audiência de custódia ser alvo de críticas, esta medida reduziu de forma plausível a superlotação no sistema carcerário em todo país.
2. AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA
A audiência de custódia consiste no direito da pessoa que é presa em flagrante de ser apresentada a uma autoridade autorizada judicialmente para exercer a função, e em um prazo de até 24 horas, analisar a necessidade de manter a pessoa presa ou optar pelo relaxamento da prisão. Esta modalidade jurídica existe em duas convenções internacionais no ornamento jurídico em que o Brasil é signatário, o Pacto de São José da Costa Rica de 1969 e o Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos de 1966. Ambas as convenções entraram no direito interno apenas no ano de 1992, foi quando o Brasil internalizou por meio de decreto as convenções internacionais, ou seja, tornou-se observância obrigatória no âmbito de direito interno, podendo aplicar ambos os pactos internacionais.
Na convenção da Costa Rica do Pacto de São José descreve:
“Artigo. 7º.,5, Toda pessoa presa, detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada por lei a exercer funções judiciais e tem o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade, sem prejuízo de que prossiga o processo. Sua liberdade pode ser condicionada a garantias que assegurem o seu comparecimento em juízo." (CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (1969).
Em paralelo temos o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos que asseguram:
“Artigo 9°.,3, Qualquer pessoa presa ou encarcerada em virtude de infração penal deverá ser conduzida, sem demora, à presença do juiz ou de outra autoridade habilitada por lei a exercer funções judiciais e terá o direito de ser julgada em prazo razoável ou de ser posta em liberdade. A prisão preventiva de pessoas que aguardam julgamento não deverá constituir a regra geral, mas a soltura poderá estar condicionada a garantias que assegurem o comparecimento da pessoa em questão à audiência, a todos os atos do processo e, se necessário for, para a execução da sentença” (CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (1969).
As duas normas reforçam que a pessoa presa em flagrante precisa passar por um juiz, ou outra autoridade habilitada que exerça a função judicial, assim, possa analisar e julgar o caso do réu em um curto prazo, determinando se haverá a necessidade de prisão preventiva ou se poderá responder em liberdade. Sabe-se que a demora na implementação, tanto do Pacto de São José, quanto o Pacto Internacional dos Direitos Civis no Brasil contribuiu no aumento de forma exorbitante o número de encarcerados em todo o país. No mês de fevereiro de 2015, o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) lançou um projeto para que fosse realizada a audiência de custódia, e dia 01 de fevereiro de 2016, vigorou a resolução regulamentando as audiências no Poder Judiciário. E ainda estipulou um prazo de três meses para os tribunais se adequarem ao novo procedimento.
Desde então, em vários estados as audiências estão sendo realizadas, diminuindo o número de presos nas penitenciárias, pois em muitos casos o juiz ou outra autoridade que analisa o caso entende que não se faz necessário o encarceramento para todos os casos julgados.
2.1 CONSEQUÊNCIAS DA SUPERLOTAÇÃO
Antes da audiência de custódia entrar em vigor, muitas pessoas que cometiam delito passavam meses para ter seu caso analisado e julgado, o juiz não tinha contato direto com o réu, apenas analisava os processos pela ficha criminal, e isso contribuiu para o Brasil ser o terceiro país com maior número de encarcerados, depois dos Estados Unidos e da China. O excesso nas cadeias pode trazer consequências graves, em São Paulo, no dia 02 de outubro de 1992, em uma intervenção militar desastrosa no sistema penitenciário em Carandiru causou 111 mortes. Logo após este massacre, dia 25 de setembro de 1992 foi implementado no Brasil o Pacto de São José da Costa Rica, contudo, o país não tinha estrutura para se adequar e realizar as audiências, por esta razão as cadeias ficaram cada vez mais lotadas e com mais conflitos entre os detentos. Em Manaus, no mês de janeiro de 2017 após uma rebelião causada por facções rivais houve um massacre, 65 detentos foram mortos e 40% eram presos provisórios aguardando julgamento. Nos primeiros meses do ano de 2020 a epidemia repentina do Coronavírus se espalhou pelo mundo, e como forma de evitar a propagação dentro dos presídios superlotados e sem a possibilidade de manter distancia, muitos detentos tiveram a opção de aguardar o julgamento em casa.
3. VIOLAÇÕES DOS DIREITOS HUMANOS
No Brasil, as violações dos direitos humanos nos presídios são diversas, na prática esses direitos não existem e ainda parece intangível se ter. O que vemos nos noticiários são celas com superlotação, e no meio de tantos detentos estão aqueles que ainda estão aguardando que seu caso seja julgado, não existe mais condições de separar os presos, em todo país falta espaço, os mais lotados são os masculinos. As inúmeras manifestações feitas por detentos sempre é para reivindicar algo que não está sendo cumprido, como: as más condições de higiene nas selas, a superlotação, as comidas, as vestimentas, não conseguem se acomodar corretamente para dormir. A maioria dos encarcerados depende dos seus familiares para suprir com as necessidades básicas usadas em um presídio, é comum nos períodos de visita ver várias sacolas transparentes com alimentos, material de higiene pessoal e roupas limpas prontas para serem entregues.
Na Constituição Federal de 88 assegura em seu artigo 5° que:
“Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”
Sabe-se que na prática este enunciado da constituição deixa a desejar, e faz muito tempo. A confirmação das violações são as tragédias que acontecem continuamente e centenas de vidas foram ceifadas sem terem sequer a oportunidade de desfrutarem de algum direito. Muitos que estão presos não fazem ideia que esses direitos existem, enquanto as melhorias não chegam, muitos humanos estão amontoados dentro de celas.
4. RESSOCIALIZAÇÃO
Para quem desconhece as leis, raramente vai entender o direito de liberdade de quem cometeu algum ato criminoso, está cada vez mais cristalizado no enunciado da sociedade que “bandido tem que apodrecer na cadeia”, ou “bandido não tem pena de ninguém”, mas a maioria das pessoas que falam, não tem conhecimento jurídico e pensam que uma pessoa ao cometer um crime jamais pode ser inserida na sociedade novamente. Deixa de ser analisado que o preso deixou do lado de fora á sua espera: uma mãe, um pai, esposa, esposo, filhos, e em alguns casos deixou também seu emprego, que na maioria das vezes perde a vaga. Uma vez fichado na lista criminal, para a ótica de muitos da sociedade o “João que vendia ideias” será mais conhecido como ex-presidiário do que o “vendedor de ideais”. É muito complicado para quem sai de um presídio e tenta restaurar a vaga de emprego, principalmente para os que possuem menos poder aquisitivo, e a melhor forma de tentar ganhar dinheiro para suprir suas necessidades e da família é optar pelo trabalho informal. Alguns passam a vender frutas, objetos e água nos sinais, trabalham como flanelinha, e mesmo assim o lucro é pouquíssimo. O mercado de trabalho está cada vez mais escasso, exigindo mais estudos e algumas empresas exigem os antecedentes criminais, e é nesse processo que a maioria fica de fora. Alguns estados não possui condições para dar oportunidades de trabalho para o detento, não existe sequer condições de manter as necessidades básicas para cada detento, muito menos projetos de ressocialização. Infelizmente o sistema carcerário praticamente em todo o país está decadente há muitos anos, e isso contribuiu para inúmeras rebeliões violentas.
De acordo com o Coordenador nacional da Pastoral Carcerária, Padre Valdir João Silveira, relatou alguns dos direitos que são violados:
“É a instituição [prisão] na qual se garantem as violações de diretos básicos da pessoa. Então, tudo o que vai a favor do direito de alguém é quebrado. A regra está ali para quebrar os direitos básicos da pessoa. A pessoa é presa para lhe ser retirada a liberdade de ir e vir. Todos os demais direitos são garantidos pela lei, porém todos acabam violados por essa instituição.”
A prisão não serve como reciclagem cognitiva, a dor física pode passar ingerindo algum remédio, mas a psicológica permanece. O sistema carcerário não tem condições de reter um detendo e garantir a ele todos os direitos que foram impostos pela constituição e pelos tratados internacionais ratificados pelo Brasil. Muitos quando ganham a liberdade dão de cara com a rejeição e as portas fechadas para o emprego, e infelizmente comentem crimes novamente.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluímos que a audiência de custódia foi ratificada pelo Brasil para que a pessoa presa possa ter um tratamento mais humanizado, antes desta modalidade muitos presos passavam meses, e até anos para terem seus casos analisados e julgados por um juiz. Assim contribuía para a superlotação carcerária, com o excesso de presos e a situação desumana que acontecem nos presídios de todo o país, muitas rebeliões terminaram em tragédias. Sabe-se que em todos os presídios as facções criminosas estão presentes e recrutam mais pessoas para o mundo do crime, com isso, muitos saem e não querem tentar reconstruir a vida de forma honesta, preferem a criminalidade onde conseguem dinheiro mais fácil.
Torna-se cada vez mais difícil combater o crime, na maioria dos estados os presídios não possuem estrutura para oferecer aos detentos trabalhos que sirva como um preparo para a reintegração na sociedade, sendo assim, quando ganham a liberdade, as oportunidades de emprego são menores. O trabalho dignifica o homem, e para suprir as necessidades é necessário dinheiro, sem oportunidade de trabalho e frustrados, muitos voltam a praticar algum tipo de delito.
6. REFERÊNCIAS
1) A AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA DÁ LIBERDADE IRRESTRITA A MENOS DE 1% DOS PRESOS – disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/justica/noticia/2019-08/audiencia-de-custodia-da-irrestrita-menos-de-1-dos-presos-0
2) AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA: O QUE É E COMO FUNCIONA – disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/239559/audiencia-de-custodia-o-que-e-e-como-funciona
4) A APLICAÇÃO DO PACTO DE SAN JOSE DA COSTA RICA em julgados do STJ. Disponível em: http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/A-aplicacao-do-Pacto-de-San-Jose-da-Costa-Rica-em-julgados-do-STJ.aspx
5) COMO FUNCIONA UMA AUDIÊNCIA DE CUSTÓDIA? – disponível em: https://audienciabrasil.jusbrasil.com.br/noticias/590013936/como-funciona-uma-audiencia-de-custodia
6)MASSACRE DE CARANDIRU – disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Massacre_do_Carandiru
7) PASTORAL CARCERÁRIA. Disponível em: https://carceraria.org.br/tag/padre-valdir-joao-silveira
Acadêmico do curso de Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus – ULBRA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ALVES, JEAN ALEX MARQUES. A audiência de custódia de acordo com o Tratado Internacional Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 13 out 2020, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55318/a-audincia-de-custdia-de-acordo-com-o-tratado-internacional. Acesso em: 23 dez 2024.
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