Esta pesquisa tern por finalidade uma breve abordagem sobre alguns conceitos da teoria da imputação objetiva, que tern se difundido bastante em várias partes do mundo, sendo elogiada por alguns, e de outros recebido críticas ferrenhas, sempre sob o argumento de que esta veio a abordar teorias já existentes, como a naturalista, finalista teoria social, etc. A razão do tema escolhido baseou-se em critérios unicamente normativos, e em substituição ao “dogma causal”, ainda sustentado por muitos dos Tribunais de nosso país, objetivando a aplicação desta teoria nova como solução apta do juízo da imputação - em verdade, como veremos, de não imputaşão.
Para uma maior abrangência do assunto em tela, passaremos pela abordagem de alguns adeptos no Brasil, da teoria da imputação objetiva no direito penal, começando por uma breve noção de sua parte histórica e conceituações básicas da nova teoria.
Abordaremos alguns aspectos da Imputação objetiva do comportamento, enfocando, ainda, o seu resultado lesivo e o fator causal. 0 tema da imputação objetiva no direito penal veio no sentido de ratificar a teoria de Roxin, de que o resultado somente pode ser imputado objetivamente ao agente quando tiver incrementado, indevidamente, um risco para o bem jurídico tutelado pelo tipo penal, e somente se este “incremento do risco" implicar o resultado típico. Por isso, procurou-se abordar o tema paralelamente ao concurso de pessoas, com seus conceitos e teorias respectivas. Somando-se a isso, abordamos, também, os conceitos de autoria delituosa, co-autoria e participação, até chegarmos ás bases das teorias da culpabilidade, tendo o dolo como elemento integrante da ação. Finalizamos, então, o presente estudo com as causas supervenientes.
Utilizou-se a metodologia não-experimental, ou seja. O método racional, partindo-se de premissas evidentes e aceitas, tais como a admissão da teoria unitária e do conceito restritivo de autor. Numa abordagem crítica-descritiva, o trabalho defende a necessidade de uma reprovação do autor de crimes, proporcional ao iter criminis percorrido. Utilizou-se como fonte de pesquisa a bibliográfica.
Tudo isso, para que se possa traçar um paralelo entre a teoria da imputação objetiva do comportamento com o concurso de agentes, possibilitando, com isso, uma crítica a nossos tribunais, os quais não vêm aplicando em suas decisões essa teoria já há muito tempo usada nos países europeus, em especial, Alemanha e Espanha, preferindo os tribunais pátrios utilizarem-se, ainda, das teorias mais conhecidas, como a teoria causal ou naturalista, defendida por vários autores como Nelson Hungria, Magalhães Noronha, Pietro Nervolone, Belling, entre outros. Nosso entendimento é de que não há imputação quando a extensão punitiva do tipo incriminador não abrange o gênero de risco criado pelo sujeito ao bem jurídico e nem do resultado ou das conseqüências dele advindas (do risco ou do resultado).
É o que se denomina “âmbito ou extensão da tutela penal" ou “alcance do tipo. Cabe ao intérprete, empregando os métodos sistemático, histórico e teleológico, fixar com precisão a natureza e a extensão da objetividade jurídica do crime, permitindo-lhe desprezar resultados que não se encontrem no âmbito da norma. A imputação objetiva exige um relacionamento direto entre o dever infringido pelo sujeito e o resultado.
Só há responsabilidade penal pelos danos diretos. De forma que o autor não responde pelas consequências secundárias - como por exemplo do crime de latrocínio, em que só um dos agentes quis ou assumiu o risco de produzir o resultado morte - ou seja, pelos danos indiretos os resultados que não se encontram na extensão da incriminação da figura típica. Fica isento o agente de responsabilidade pelas conseqüências e riscos secundários se o efeito jurídico da conduta que a norma queria evitar não se faz presente. São as chamadas conseqüências secundárias das lesões jurídicas que não se encontram no círculo de proteção da figura típica.
2 CONTEXTO HISTÓRICO DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA
De acordo com o brilhante processualista Carlos Ernani Constantino, em seu artigo publicado na Revista Síntese de Direito Penal e Processual Penal,
muito se tem falado, ultimamente, no Brasil, em imputação objetiva, no âmbito do Direito Penal, como se se tratasse de algo totalmente novo. Em nosso País, talvez, o tema imputação objetiva do resultado ao autor da conduta tenha ainda um certo sabor de novidade; mas, na Europa, não: lá, o assunto vem sendo debatido, desde longa data.
Segundo Larenz, a origem mais remota da imputação objetiva (Objektive Zurechnung) está na teoria da imputação de Hegel (1770/1831), portanto, no final do século XVIII e início do século XIX. Depois, a citada teoria entrou em franca decadência, a partir da segunda metade do século XIX, devido à fascinação que surgiu em torno do pensamento causal, orientado pelas Ciências Naturais, conforme lembra Claus Roxin. Somente no século XX, reiniciaram-se os estudos acerca do tema, com Larenz (1927) e Honig (1930); porém, foi da década de 60 em diante, que os penalistas começaram a dedicar especial atenção à teoria da imputação, a partir do escrito de Hardwig (Die Zurechnung: Ein Zentralproblem des Strafrechts, isto é, a imputação: um problema central do Direito Penal, de 1957); desde então, escreveram sobre ela Bockelmann, Schaffstein, Maurach, Schmidhãuser, Wessels, Escheck, Stratenwerth, Roxin e Jakobs (a maioria deles, nas décadas de 70 e 80). Para que haja um melhor entendimento do assunto sob exame, é necessário que façamos um retrospecto histórico sobre as teorias da causalidade que se sucederam, até chegarmos à da imputação objetiva do resultado (e, aqui, é necessário que fique bem claro que toda esta discussão só se justifica em função dos crimes de conduta e resultado, vale dizer, dos crimes materiais)”. Mais adiante, o citado processualista descreve com maestria todas as teorias das relações causais, até chegar à teoria da imputação objetiva:
1º). A primeira teoria é da condição ou da equivalência (Bedingungstheorie ou Ãquivalenztheorie), chamada no Brasil de teoria da equivalência dos antecedentes causais e adotada pelo nosso Código Penal (art. 13).
2º). A segunda teoria é a da adequação (Adãquanztheorie). São seus adeptos SAUER, VON HIPPEL, ENGISCH e MAURACH, entre outros. Segundo esta teoria, causa - no sentido jurídico - é tão-somente a condição adequada ao tipo e ao resultado concreto, no dizer de WESSELS.
3º). A terceira teoria é a da relevância jurídica (Relevanztheorie). Foi MEZGER o seu criador, compartilhando de seu pensamento BOCKELMANN e WESSELS.
Para esta corrente doutrinária, a determinação do nexo de causalidade deve ser feita através da teoria da conditio sine qua non, mas a imputação do resultado deve-se efetivar com base na relevância jurídica da respectiva cadeia causal, observando-se a finalidade da norma e os caracteres de cada tipo penal.
4º). Por fim, a teoria da imputação objetiva (Objektive Zurechnung) deslocou, decisivamente, o cerne da discussão, do plano da causalidade meramente mecânica ou ontológica, para o plano jurídico. Tal doutrina toma por base, para imputar o resultado ao agente, se ele criou, com sua conduta, um perigo permitido ou não permitido, para a vítima (ou se aumentou, significativamente, a incidência desse perigo ao bem jurídico protegido). Não pretende a teoria da imputação objetiva acabar com a teoria da conditio sine qua non, mas Iimitá-la e adequá-la ao plano normativo”. (LARENZ Apud BITENCOURT, 1995)
A imputação objetiva do resultado tem sido alvo de vários questionamentos e discussões em simpósios, seminários, palestras, bem como objeto de trabalhos acadêmicos (teses, dissertações e monografias), como também tem sido objeto de questões em concursos públicos. Falando-se em conceito de crime, obrigatoriamente deve-se passar pelas teorias causais, defendidas por Nelson Hungria, Magalhães Noronha, Pietro Nervolone, Bellin e outros. Há, também, a teoria finalista da ação, adotada por Hans W. Maurach, Damásio E. de Jesus; Juarez Tavares, Heleno Cláudio Fragoso e outros mais. Não podemos esquecer, também, a teoria da ação social, defendida por Jonhannes Wessels, Engils Jescheck, C. Fiore, além de Miguel Realli Júnior, Nilo Batista e Everaldo da Cunha Luna. Só assim, depois de passarmos por todas essas teorias acima, chegamos, enfim, à teoria da Imputação objetiva.
Existem escritos que mencionam a origem da teoria da imputação objetiva no Direito Grego, e ainda, segundo Damásio E. de Jesus, esta teoria teria surgido há aproximadamente 60 anos.
A teoria da imputação objetiva enfrenta ainda hoje, uma forte resistência, sendo que muitos autores a encaram não como uma inovaşão, e sim como um emaranhado das outras teorias que tratam sobre o assunto do tipo penal. Principal inovação que essa teoria nos trouxe foi mesmo o incremento do risco juridicamente permitido. Isso vem explicado por Claus Roxim, que nos ensina que, segundo esta teoria, “o injusto típico deixa de ser um acontecimento fundado no causalismo e finalismo, para buscar-se no âmbito do risco a razão de causa de algo não permitido.”
Partindo desses aspectos, explica-se, por meio da teoria da imputação objetiva, o “curso lesivo” de um delito. Na obra de Jakobs (2000, p.15), o mesmo descreve que:
Explicar-se por meio da imputação tern por significado o seguinte: o risco pelo qual deve responder um dos intervenientes (ou vários deles) é definido como causa determinante, enquanto que todas as demais condições se consideram não-determinantes, é dizer, estimam-se socialmente adequadas.
A imputação objetiva do resultado no direito penal, quando se fala em comportamento dos autores (partícipes) deve estar diretamente entrelaçada ao risco determinante, através da repartição de responsabilidades de cada agente. E isso se faz mediante as teorias adotadas sob o título previsto no artigo 29 do Código Penal brasileiro “Concurso de Pessoas", bem como em análise às diversas teorias da Autoria, Co-autoria e Culpabilidade.
2.1 CONCEITOS BÁSICOS DA TEORIA DA IMPUTAÇÃO OBJETIVA NO BRASIL
No Brasil, a teoria da imputação objetiva cada vez mais tem recebido adeptos, podemos destacar entre os diversos autores, em especial Paulo de Souza Queiroz, Wellington César Lima e Silva, Antônio Luís Chaves Camargo, Selma Pereira de Santana, Renato de Mello Jorge Silveira e José Enrique Pierangeli, onde esse afirma: “Não existe uma teoria de imputação objetiva voltada numa única direção, unívoca, constituindo um critério único que procure resolver todos os problemas da imputabilidade” (2002, p.115).
Diz ainda o citado autor: “não existe uma teoria de imputação objetiva voltada numa única direção, unívoca, constituindo um critério único que procure resolver todos os problemas da imputabilidade" (PIERANGELI, 2002, p. 115). Tudo isso leva, no seu entender, a que não se possa falar da imputação objetiva como uma teoria, mas sim, como um movimento que, como tal, deve ter suas questões remetidas à política criminal, distanciando, assim, da dogmática jurídico-penal. Não obstante as objeções, reconhece o autor a importância dos estudos desenvolvidos pelos adeptos da teoria.
A partir da doutrina de Roxin, o mundo jurídico passou a admitir a hipótese da existência de uma imputação objetiva, tudo decorrente na fundamentação do estudo da estrutura criminal em aspectos de política criminal. Para ele, antes de se pensar sistematicamente o crime, deve-se analisá-lo politicamente. Fernando Galvão diz que a imputação objetiva tem sua origem do Direito Grego, mas a sua base teórica se acentuou no início deste século. Damásio Evangelista de Jesus, ao contrário, sustenta que a teoria começou a se desenvolver há sessenta anos.
Na verdade, as bases filosóficas que, efetivamente, dão ensejo à teoria partem de Hegel, com sua filosofia subjetivista/sociológica que se inicia com Durkheim, que dizia que uma sociedade normal deve ter em seu meio o crime, desde que não haja excessos em quantidade e qualidade. O fato é que se “forçou” significativamente a filosofia dos sistemas para se chegar ao Direito Penal funcionalista. Segundo o que se prega, sendo o Direito uma parte do sistema social (subsistema de um sistema global), a adequação social passaria a ser elemento normativo do tipo. Foi com base em um funcionalismo penal que se chegou à imputação objetiva, cuja aceitação não é pacífica. Introduzida na Alemanha, migrou para a Espanha e alguns países latinos americanos. No Brasil, os penalistas têm receio quanto à cientificidade da teoria, havendo muitos julgadores favoráveis, outros, porém, receosos. A nova teoria procura conjugar elementos das teorias outrora existentes. Em síntese, não é uma nova teoria, mas uma compilação dos ensinamentos das demais, visto que dentre suas principais inovações há o enfoque de que não se fala mais em resultado naturalístico, uma vez que ele será sempre caracterizado pelo risco ao objeto jurídico. Dessa forma, desenvolveu-se a distinção entre risco permitido e risco proibido.
A conduta só será imputável objetivamente ao agente se houver plausibilidade mínima entre a conduta e o resultado final (daí, novamente, o exemplo já citado do crime de latrocínio). Na atualidade, a necessidade de uma relação de causalidade entre ação e resultado e a determinação da ação típica enfrentam uma profunda crise. Diante disso, segundo esses objetivos, a doutrina dominante (de cunho eminentemente normativista) parece inclinar-se pela absoluta impossibilidade de que uma teoria causal consiga delimitar com acerto quais ações devem ou não ser consideradas típicas. A imputação objetiva se apresenta como um complemento corretivo das teorias causais. A imputação de um fato é a relação entre acontecimento e vontade. Significa, na verdade, atribuir juridicamente a alguém a realização de uma conduta criadora de um relevante risco proibido e a produção de um resultado jurídico.
A imputação como um juízo sobre o fato não é conseqüentemente, um juízo causal, mas teleológico. O conceito de finalidade não deve ser interpretado de um ponto de vista subjetivo, mas sim objetivo - não se imputa só o que era querido e conhecido pelo agente, mas também o que era conhecido e, portanto, passível de ser abarcado pela vontade
Em síntese: o fato é a realização da vontade; a imputação, o juízo que relaciona o fato com a vontade. De acordo com a teoria da imputação objetiva, o comportamento e o resultado normativo só podem ser atribuídos ao sujeito quando a conduta criou ao bem (jurídico) um risco juridicamente desaprovado e relevante; ou quando o perigo realizou-se no resultado. O evento é considerado no sentido normativo ou jurídico e não naturalístico. O alcance do tipo incriminador abrange, ainda, o gênero do resultado produzido. A imputação objetiva pressupõe a realização de um perigo criado pelo autor e não acobertado por um risco permitido dentro da abrangência do tipo.
Pode também considerar o incremento do risco e o fim da proteção da norma. Por isso, não se põem em destaque o resultado naturalístico, próprio da doutrina causal clássica, e sim o resultado (ou evento) jurídico, que corresponde à afetação ou perigo de afetação do bem penalmente tutelado. Nesse requisito, convém observar que há também imputação objetiva quando a conduta aumenta o risco permitido com violação relevante do dever de cuidado. Sustenta Claus Roxin que só é imputável aquele resultado que pode ser finalmente previsto e dirigido pela vontade
Desse modo, os resultados que não forem previsíveis ou dirigíveis pela vontade não são típicos. Figura, portanto, como princípio geral de imputação objetiva a criação pela ação humana de um risco juridicamente desvalorado, consubstanciado em um resultado típico.
3. CONCURSO DE PESSOAS
Na maior parte dos casos, o delito é praticado por uma só pessoa, a quem se denomina como “autor”. Entretanto, esse “autor”, na maior parte das vezes não age sozinho, havendo a atuação de outros “autores”, que atuando em conjunto, através da divisão de tarefas específicas para cada um, a fim de se perfectibilizar o resultado do crime visado por esses. Daí se fala em contribuição objetiva e subjetiva dos agentes para a consumação do resultado delituoso.
Em relação à pluralidade de pessoas, muitas vezes, a denúncia imputa crimes a várias pessoas, sendo que é preciso haver coerência, ou seja, que a imputação aos denunciados seja juridicamente hábil. O artigo 29 do Código Penal trata do concurso de pessoas, sendo que, os agentes concorrem para o mesmo crime e a pena deverá ser aplicada na medida da culpabilidade de cada agente
Em ocorrendo o oposto, ou seja, as pessoas atuam isoladamente, cada uma realizando um tipo legal de crime, os respectivos delitos precisam ser descritos por imperativo do comando do disposto no artigo 41 do Código de Processo Penal. Inepta é, pois, a imputação se o fato descrito, notadamente analisado no contexto da denúncia, por exemplo, narra excludente de ilicitude. Nesse caso, em tal extensão, inepta a imputação do Ministério Público. A denominação que se dá a esses agentes é a de “partícipes”.
4 AUTORIA
Em primeiro lugar, para se conceituar a Autoria não se pode deixar de lembrar que o conceito de participação está preso, por uma relação de dependência, ao de autoria. No próprio artigo 29 do Código Penal, foi utilizado o verbo “concorrer”, cujo sentido exato é o de “juntar-se, contribuir, cooperar (para uma mesma ação comum, o que significa dizer um procedimento secundário, acessório, dependente de uma conduta principal)”. (FERREIRA, 2000, p. 360)
Autor, segundo Muñhoz Conde (1984, p. 199), “o anônimo ‘aquele que’ ou ‘quem’, que, em cada tipo da Parte Especial, se menciona”
Segundo a denominada teoria subjetiva ou subjetiva causal, o conceito de autor tem um caráter extensivo. “é autor todo aquele que gerou uma condição para a causação do resultado típico” (URZÚA, 1985, p.231). Na mesma forma, quando se fala em autor e partícipe, aduz que a distinção entre ambos, através da teoria subjetiva causal é arbitrária e conduz a conseqüências absurdas, entre as quais se destaca a de romper
por completo os limites impostos pelo tipo legal. Aquele que tem interesse no resultado será qualificado como autor ainda que não tenha executado parte alguma do fato descrito pela figura delitiva correspondente, e ainda que não disponha de controle algum sobre a conduta de quem efetivamente a realizou. (URZÚA, 1985, p.232).
Segundo a teoria formal-objetiva, Autor é somente aquele que realiza, ainda que em parte, uma figura típica. É apenas “quem comete por si mesmo a ação típica, já que a só contribuição a causação do resultado, mediante ações não típicas, não pode fundamentar nenhuma autoria” (JESCHECK, 1993, p. 892). Ocorre que essa teoria não dá respostas suficientes para certas situações concretas, as quais não se acomodam ao rigor e formalismo do esquema conceitual. Pode-se citar, como exemplo, o chefe de uma quadrilha de traficantes que ordena a seus comandados a prática de vários delitos. Ou seja, o chefe da quadrilha de traficantes segundo essa teoria seria um mero participante, quando na verdade é um autêntico autor (mandante).
As duas teorias mencionadas não têm o condão de definir de maneira convincente o conceito de autoria, nem mesmo conseguem fixar uma linha demarcatória entre a autoria e participação.
Para resolver o problema deve-se partir para a teoria objetiva-subjetiva, também denominada teoria do domínio do fato, de forte inspiração finalista. Autor, segundo essa teoria é “quem tem realmente o poder de realização do fato descrito no respectivo tipo legal”, ou ainda, “quem possui o domínio final da ação” e, por isso, “pode decidir sobre a consumação do fato típico” (RAMIREZ, 1984, p. 326). “O problema da autoria, por conseguinte, resolve-se com um critério relativo à ação, não ao resultado ou aos aspectos puramente objetivos da tipicidade” (URZÚA, 1985, p. 233-4). Por essa teoria, citando o exemplo do chefe da quadrilha de tráfico não é um mero participante, mas sim o autor, porque possui “o domínio final da ação”, ainda que não tome parte na execução material do fato criminoso. O legislador de 84, apesar de não se definir por nenhuma das posições dogmáticas relativas ao conceito de autoria e da distinção entre autoria e participação, acolheu às mais relevantes teses finalistas, o que leva à conclusão de que adotou a teoria do domínio do fato (teoria objetivo-subjetiva).
4.1 CO-AUTORIA
Co-autoria “é a realização conjunta de um delito por várias pessoas que colaboram consciente e voluntariamente” (CONDE, 1984, p. 292). Cada co-autor é um autor e, por isso, deve apresentar as características próprias de autor. Isto significa que o co-autor é:
Aquele autor que tem o domínio da realização do fato conjuntamente com outro, ou outros autores, com os quais tem o domínio da realização do fato conjuntamente com outro, ou outros autores, com os quais tem um plano em comum e uma distribuição de funções na realização de mútuo acordo (RAMIREZ, 1984, p. 331).
O legislador não distingue entre autor e co-autor, como, aliás, decorre do que expressa o próprio artigo 13 do Código Penal. Por isso, pouco importa que o acusado é autor como vale dizer que é co-autor, quando ambos praticaram o fato principal (exemplo: no crime de homicídio, o executor e o mandante). Em suma, vale dizer que a co-autoria é nada mais nada menos, a própria autoria.
5 TEORIAS DA CULPABILIDADE
Conforme José Henrique Pierangeli (2002) a palavra culpabilidade ingressou na doutrina nos fins do século XIX, quando Ihering estabeleceu uma distinção entre injusto “objetivo" e a culpabilidade "subjetiva". Daí Frederico Marques, coerente com os posicionamentos da doutrina da época, dividiu o delito em duas partes, a parte objecti e a parte subjecti, apegado que estava a esses parâmetros, com os quais, na realidade, desenvolveu-se não só a doutrina pátria, como também a de quase, senão todos, os países do mundo, durante toda a primeira metade deste século.
Com o desenvolvimento dessas idéias, e conseqüente separação de conceitos, deveu-se o processo de subjetização do direito penal que, ainda hoje, o caracteriza, e que, progressivamente, foi abandonando a objetiva responsabilidade do agente pelo fato decorrente de sua conduta – a responsabilidade penal objetiva -, para assumir indispensáveis características subjetivas, ou, por outras palavras, para assumir uma responsabilidade pessoal.
A culpabilidade, a partir de então, passa a ser a causação psíquica do resultado, pelo dolo ou pela culpa, o primeiro caracterizando-se pelo querer o resultado antijurídico e, a segunda, pelo fato de ter o causador (para muitos, agente) do resultado atuado com imprudência, negligência ou imperícia.
A culpabilidade, nos primeiros tempos da dogmática, se assentava na teoria psicológica. Perquiria-se acerca do nexo-causal (físico), questionando se a conduta havia ou não causado o resultado e de um nexo psíquico, ou seja, a existência de uma relação psicológica entre a conduta e o resultado, que nada mais é o que hoje, nós, os finalistas, denominamos de nexo de finalidade. No entanto, como no injusto não se fazia a distinção entre a antijuridicidade e a tipicidade, muitas condutas antijurídicas e culpáveis não constituíam delitos.
Como conseqüência disso, tornavase indispensável acrescentar um outro requisito ao conceito dogmático de delito, a punibilidade. Conceitualmente, pois, o delito passou a ser a conduta antijurídica, culpável e punível. A culpabilidade dentro da sua concepção psicológica era formada pelo dolo e pela culpa. Trata-se de decorrência do próprio conceito de ação que anima a teoria causal-mecanicista, também chamada de teoria naturalista. A conduta, dentro dessa concepção, caracteriza-se por um movimento muscular que produz uma modificação no mundo exterior, movimento que tem a sua origem na vontade, e cujo conteúdo, todavia, não integra a ação.
A culpabilidade, vista como liame psicológico que vincula o autor ao delito, torna este responsável pelo crime. Como conseqüência, como adverte Miguel Reale Júnior,
as duas espécies de relacionamento psíquico entre o autor e o fato, o dolo e a culpa, ficam reunidas em um único conceito: são espécies que se diferenciam pela qualidade daquele relacionamento, pela diversa intensidade na relação entre o autor e o fato delituoso. (1998, p.122).
A teoria psicológica teve um grande mérito quando questionou seriamente a responsabilidade penal objetiva, para a qual bastava um nexo de causalidade, independentemente de um nexo psicológico subjetivo que ligasse o autor ao fato, conceito que, até então dominava o direito penal. Todavia, ela se mostra incapaz para resolver o problema da culpa, pois, se esta com o dolo fundamentam parte da culpabilidade, pressupõe um atuar com conhecimento da antijuridicidade do resultado, e ambos importariam num resultado antijurídico querido, que na culpa é totalmente inadmissível. Igualmente, restaria inexplicável a culpa inconsciente ou culpa sem previsão. Queremos ressaltar, desde logo, que a culpabilidade vista na sua concepção psicológica, é o que consideramos o aspecto subjetivo do tipo. O homem é um ente capaz de autodeterminar-se, pode-se sustentar-se perfeitamente mesmo sobre uma base determinista (ZAFFARONI; PIERANGELI, 1997, p. 606).
Observa-se, pois, que o conceito de culpabilidade normativa que com Zaffaroni sustenta, é um conceito graduável, ou seja, possui graus de reprovabilidade, e quando o âmbito de autodeterminação se encontra muito reduzido que somente resta a possibilidade física, e o nível de autodeterminação se encontra tão baixo que se torna insignificante para os efeitos da exigibilidade, forçoso será reconhecer-se a inculpabilidade. "A inexigibilidade não é – como outrora pretendeu a teoria complexa da culpabilidade – uma causa de inculpabilidade, e sim a essência de todas as causas de inculpabilidade". (ZAFFARONI; PIERANGELI, 1997, p. 608).
6. CONCLUSÃO
O objetivo de nosso trabalho foi demonstrar, dentro do possível, a exata correlação existente entre os conceitos e aspectos fundamentais da teoria da imputação objetiva colocadas em confronto, através de uma singela conceituação entre as teorias existentes em nossa doutrina, delimitando-as e conceituando-as. Passamos em especial, pelas teorias do Concurso de pessoas, Autoria e Co-Autoria Delituosa, Culpabilidade.
Essas teorias e conceitos, quando se fala em concurso de pessoas, vêm entrelaçadas ao objeto da chamada participação de menor importância e participação de crime menos grave (citando-se como exemplo o delito de latrocínio em que só um dos agentes teve participação direta no crime de roubo e o outro no de latrocínio), daí a idéia de aplicar-se a teoria da imputação objetiva (culpa, e não dolo do agente que não quis e nem contribuiu para o resultado morte, como forma de substituição do nexo causal, não em análise ao dolo do agente, porque o dolo, como requisito subjetivo do tipo, é analisado dentro da imputação subjetiva - do tipo subjetivo do finalismo).
Em nosso entendimento, essa teoria nova da imputação objetiva no direito penal será adotada aos poucos, por parte de nossos Tribunais, como forma de substituição limitada do conceito de causalidade, sem deixar de englobar, ainda, a maior parte da problemática referente à tipicidade.
6. REFERÊNCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Lições de Direito Penal. Parte geral. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1995.
CONDE, Francisco Munhoz. Teoria geral do delito. Traduzido por Juarez Tavares e Luis Sérgio Prado. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 1984.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 2000.
JAKOBS, Günther. A Imputação Objetiva no Direito Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
JESCHECK, Hans-Heinrich. Tratado de Derecho Penal, Parte General, 4.ed.Traducion de José Luis Manzanares Samaniego, Granada; Comares, 1993.
PIERANGELI, José Enrique. Direito criminal. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. v.4.
QUEIROZ, Paulo de Souza. Por que aderi à teoria da imputação objetiva. Disponível em: <http://www..ibccrim.org.br/doutrina nacional>. Acesso em: 28.set.2020.
RAMIREZ, Juan Bustos. Manual de Derecho Penal Español. Madri: 1984.
REALE JÚNIOR, Miguel. Teoria do Delito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998
URZÚA, Enrique Cury, Derecho Penal. Parte general, v. II. 1985
ZAFFARONI, Eugenio Raúl, PIERANGELI, José Enrique;. Manual de Direito Penal brasileiro - Parte geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus - CEULM/ULBRA - Manaus/AM
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARAUJO, VINICIUS ALBERTO DE. A imputação objetiva no direito penal e a co-autoria delituosa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 nov 2020, 04:11. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55530/a-imputao-objetiva-no-direito-penal-e-a-co-autoria-delituosa. Acesso em: 23 dez 2024.
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