KELLY NOGUEIRA DA SILVA[1]
(orientadora)
RESUMO: O presente artigo visa abordar as consequências de uma adoção tardia, sendo importante levantar questões como o que esse menor deixa de receber da base familiar durante o momento de espera. Tendo por princípio norteador o do melhor interesse do menor. Trazendo o objetivo de elucidar o quão importante se faz a participação da família no desenvolvimento de um indivíduo e também seguranças jurídicas conferidas a toda criança e adolescente que estão à espera da adoção. O método a ser utilizado será o da pesquisa exploratória, que tem por escopo explorar um problema, de modo a fornecer informações para uma investigação mais precisa. Será utilizado a forma de dados qualitativos e terá como referência as pesquisas bibliográficas pelo método hipotético dedutivo, com pesquisas a jurisprudências, leis e artigos.
Palavras-chave: adoção tardia; família; melhor interesse do menor.
ABSTRACT: This article aims to address the consequences of late adoption, and it is important to raise issues such as what this child does not receive from the family base in this waiting time. Having as a guiding principle the best interest of the child. Bringing the objective to elucidate how important the participation of the family is in the development of an individual, and also legal security granted to all children and adolescents who are waiting for adoption. The method to be used will be exploratory research, which aims to explore a problem, in order to provide information for a more accurate investigation. Qualitative data will be used, and bibliographic research will be used as a hypothetical deductive method, with research on jurisprudence, laws and articles.
Keywords: late adoption; Family; best interest of the child.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Aspectos Históricos. 3. Da adoção. 3.1 Da adoção e seu conceito. 3.2 Aspectos dos adotantes e adotados. 4. As consequências da adoção tardia. 5. Conclusão. 6. Referências.
O presente trabalho tem por finalidade analisar as consequências de uma adoção tardia, mostrando o que tais consequências podem reverberar na vida do menor. O tema parte da seguinte problemática: o que o menor deixa de auferir do meio familiar enquanto permanece na espera da adoção. É conhecedor que o processo de adoção no Brasil além de demandar muito tempo, também é amplo. E em todos os aspectos deste processo o que se perquire é o melhor interesse do menor.
Partindo do pressuposto é possível notar que o instituto da adoção está inserido no meio da sociedade desde os povos mais antigos, onde se buscavam dar às suas famílias um sentido de completude e continuidade por meio dos filhos.
O caminho percorrido ao longo da história foi de muitos marcos, a adoção já era praticada por exemplo, entre os povos gregos, hindus, egípcios, entre outros, todos com a mesma finalidade, qual seja, dar continuidade à sua árvore genealógica.
Algumas alterações legais de extrema importância, também ocorreram para que nascesse o Estatuto (ECA), concedendo à criança e ao adolescente uma integral proteção. Cabe elucidar que o instituto da adoção é regido pela Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, em concordância com o Código Civil. O conceito de adoção é de ato jurídico, onde um indivíduo é considerado filho perpetuamente, por uma pessoa ou um casal, que não sendo seus pais biológicos, o receberão como se assim fosse, lhe ofertando proteção e afeto.
Nesse sentido, esta pesquisa pretende evidenciar a importância da inserção do menor no seio familiar, como o ambiente da família se faz relevante no desenvolvimento pessoal e social do indivíduo, e que com a demora do processo de adoção, bem como na espera para que essa criança ou adolescente encontre uma família que vá se encaixar pode ocasionar em consequências que a depender podem ser de demorada reparação, ainda que este menor receba proteção do Estado enquanto seu garantidor no momento de permanência dos lares e orfanatos.
A metodologia utilizada foi o da pesquisa exploratória, que tem por escopo explorar um problema, de modo a fornecer informações para uma investigação mais precisa. Sendo aplicada a forma de dados qualitativos, posto que se produziu com base em doutrinas, leis, jurisprudências e artigos científicos.
Este estudo compõe-se de três capítulos: o primeiro traz em seu corpo os aspectos históricos da adoção, mostrando que este instituto permeia as famílias há muito tempo. Detalha brevemente a evolução legal do aludido instituto, até que se chegasse na criação do Estatuto da Criança e do Adolescente.
O segundo capitulo, sendo composto por dois subtítulos explora o conceito da adoção, sendo que neste primeiro subcapitulo, é tratado de maneira rápida da sua natureza jurídica, bem como, da vasta conceituação que comporta a adoção. Já no segundo subcapitulo, analisa as características essenciais para que uma pessoa ou o casal possa realizar uma adoção. Nele, também é indicado os pressupostos do adotado, o que esse menor precisa e busca para que seja inserido no meio familiar, sendo regido pelo princípio do melhor interesse do menor.
Por fim, o terceiro capítulo irá analisar o que concerne o tema principal deste artigo, as consequências em detrimento da adoção tardia, levantando questionamentos e trazendo citações que elucidam algumas consequências, levando a reflexão da importância familiar na formação do ser humano, que é nela que se goza de afeto e proteção imprescindíveis para o seu desenvolvimento. Deixando claro que embora o Estado propicie tais elementos e ainda as garantias constitucionais asseguradas ao menor, é na família que se perpetua toda essa gama recursos.
2.ASPECTOS HISTÓRICOS
A adoção está presente na história desde a antiguidade, é sabido que vários povos praticavam este instituto do direito civil das famílias, quando as pessoas sem filhos tinham necessidade de dar continuidade na sua árvore genealógica. Povos hindus, gregos, persas e romanos, por exemplo, traziam para seu seio familiar crianças para serem tidas como seus filhos.
Há evidencias que o Código de Hamurabi elencava oito artigos para falar sobre a adoção, onde era observado que havia punições para aqueles que não se atinham com obediência as regras de seus pais adotivos.
Já na Idade Média, com a influência da igreja, a adoção veio a cair em desuso e retornou mais tarde na França, com o advento do Código Napoleônico.
No Brasil, essa prática era presente desde a Colônia até o Império, exatamente nas Ordenações Filipinas, mas de pouco valor. Era permitida duas formas de adoção, em sentido estrito, destinada aos incapazes, e a adrogatio, aos capazes, eram espécie de adoção romana. Tal instituto era amparado pelo Decreto nº 181/1890.
Com o Código Civil de 1916 esse instituto passou a ser disciplinado em 10 artigos, sendo do art. 368 ao 378, onde se passou a valorizar um pouco mais o interesse do menor e não apenas do casal, o que não era feito anteriormente. Curiosamente, maiores de 50 anos podiam o fazer, pois já era uma idade que se considerava que o casal já não teria condições de gerar um filho.
Mais tarde, ocorreu uma alteração no quesito idade, onde a idade de aceitação para o adotante estar apto para adotar seria ter mais de 30 anos. Essa mudança se deu com a Lei nº 3.133, de 8 de maio de 1957. A Lei nº 4.655/65 trouxe ao ordenamento jurídico a chamada legitimação adotiva, onde a relação entre adotante e adotado teve mais solidez; posteriormente veio Código de Menores, Lei nº 6.697, de 10 de outubro de 1979, que revoga a legitimação adotiva e o adotado passa a ser tratado como se filho biológico fosse.
Depois de percorrido todos esses caminhos, nasce o Estatuto da Criança e do Adolescente, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, e o instituto da adoção obteve relevantes mudanças, sendo uma delas que, a adoção passou a ser possível para maiores de 18 anos, e pode dar ênfase a outra importante modificação que foi priorizar o melhor interesse do menor.
3.DA ADOÇÃO
3.1 DA ADOÇÃO E SEU CONCEITO
Inúmeras são as definições a respeito do instituto da adoção, ressaltando diferentes aspectos em cada uma delas.
Segundo Carlos Alberto Gonçalves “adoção é o ato jurídico solene pelo qual alguém recebe em sua família, na qualidade de filho, pessoa a ela estranha” (GONÇALVES, 2020, p.377).
Maria Helena Diniz, por sua vez, apresenta extenso conceito baseado nas definições formuladas por diversos autores: “Adoção é o ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha”(GONÇALVES, 2020, p.377, grifou-se).
Já Sílvio Rodrigues define adoção “como o ato do adotante, que traz para sua família e na condição de filho, pessoa que lhe é estranha” (RODRIGUES, 2002, p.375).
D’outra banda, Caio Mário da Silva Pereira, elucida como adoção “o ato jurídico pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independentemente de existir entre elas qualquer relação de parentesco consanguíneo ou afim” (GONÇALVES, 2020, p.377).
“Aumentando a visão do conceito de adoção, os adotantes passam a exercer sobre o adotado, responsabilidades como se pais legítimos fossem assegurando suas necessidades. O adotado terá os mesmos direitos que uns filhos legítimos, o que nos leva a pensar que o ato da adoção deva partir do pressuposto de que há carinho e amor, por parte do adotante para com o adotado. Depreende-se ainda que a adoção proporcione a casais que não podem gerar seus próprios filhos, uma experiência de constituir uma família aderindo a ela pessoa alheia, para que receba todo amor e carinho que estes pais tem para oferecer. A adoção é um ato solene que gratifica não só o adotado, que ganha um novo lar, mas também aos adotantes, que podem exercer suas funções como pais”.
Neste diapasão, tem-se que adoção é um ato de amor onde um indivíduo traz para seu seio familiar pessoa estranha, criança ou adolescente, proporcionando carinho, proteção, educação, saúde, lazer, etc, cuidando de cada um de seus direitos.
No que tange a natureza jurídica, há algumas discussões e também divergências no Código Civil de 1916, este instituto era tido como de caráter contratual, o que tornava-o um negócio bilateral e solene, já com a CF/88, passou a ser tido como ato complexo, uma vez que, exige-se sentença judicial, ficando claro que a matéria passava a ser de interesse de ordem pública.
Encontramos na subseção IV do Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 39 e seguintes sobre o aludido instituto.
Vejamos o que traz o bojo do artigo 39 em seu parágrafo 1º:
Art. 39- A adoção de criança e de adolescente reger-se-á segundo o disposto nesta Lei.
§ 1 o A adoção é medida excepcional e irrevogável, à qual se deve recorrer apenas quando esgotados os recursos de manutenção da criança ou adolescente na família natural ou extensa, na forma do parágrafo único do art. 25 desta Lei.
A Constituição Federal de 1988 nos traz em seu artigo 277, parágrafos 5º e 6º, o seguinte ensinamento:
Art. 227 - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade e, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. [...]
§ 5º. A adoção será assistida pelo Poder Público, na forma da lei, que estabelecerá casos e condições de sua efetivação por parte de estrangeiros.
§ 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Sendo assim, o adotante não será omisso no que concerne seu dever para com o adotado, em zelar por seus direitos, dando o mesmo tratamento como de filho legítimo, sem fazer qualquer distinção entre os demais filhos, caso haja, pois, a adoção é um ato de amor e carinho.
Sabe-se da diversidade de conceitos acerca da adoção, mas cabe salientar a importância de dar ênfase ao princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, e sobre tal princípio encontramos uma importante conceituação no art. 100, inciso IV do ECA:
Art. 100. Na aplicação das medidas levar-se-ão em conta as necessidades pedagógicas, preferindo-se aquelas que visem ao fortalecimento dos vínculos familiares e comunitário.
Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas: [...]
IV - Interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; [...].
Feito todos estes apanhados sobre a conceituação da adoção, se faz necessário uma rápida abordagem sobre sua natureza jurídica.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves, sua natureza jurídica “é de uma matéria de interesse geral, ou seja, de ordem pública”. Uma vez que, que para se perpetue tal ato há toda uma complexidade, e exige uma sentença judicial, e existe ainda toda uma observação por parte do Poder Público.
Após explanar conceitos no tocante da adoção, sucederemos para as considerações que dizem respeito aos aspectos dos adotantes e adotados.
3.2 ASPECTOS DOS ADOTANTES E ADOTADOS
Com toda a evolução do Estatuto da Criança e do Adolescente, hoje a adoção é possível à toda pessoa maior de 18 anos. Estatui o art. 42 do ECA: “Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil”. (GONÇALVES, 2020, p.387).
Art. 42 ECA- Podem adotar os maiores de 18 (dezoito) anos, independentemente do estado civil § 1º Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando.
§ 2º Para adoção conjunta, é indispensável que os adotantes sejam casados civilmente ou mantenham união estável, comprovada a estabilidade da família.
§ 3º O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o adotando.
§ 4º Os divorciados, os judicialmente separados e os ex companheiros podem adotar conjuntamente, contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas e desde que o estágio de convivência tenha sido iniciado na constância do período de convivência e que seja comprovada a existência de vínculos de afinidade e afetividade com aquele não detentor da guarda, que justifiquem a excepcionalidade da concessão.
§ 5º Nos casos do § 4º deste artigo, desde que demonstrado efetivo benefício ao adotando, será assegurada a guarda compartilhada, conforme previsto no art. 1.584 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002 - Código Civil.
§ 6º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
Importante salientar, que sexo, nacionalidade e estado civil não se fazem importantes no que tange a capacidade ativa para adoção, porém, é subentendido que o adotante deve estar em condições morais e materiais, para que seja desenvolvida a função de pai/mãe.
Quando a adoção for conjunta é necessário que os adotantes sejam casados civilmente ou possuam união estável, comprovando a estabilidade da família.
O princípio norteador da adoção é o do melhor interesse da criança (artigo 43 ECA), todos os atos serão praticados de maneira que se verifique as vantagens para esse menor. Essas vantagens são auferidas no âmbito do afeto, que deve ser tratado como valor jurídico, atentando para que se resguardem fatores que lhes possibilite integral desenvolvimento como pessoas, devendo ser determinada conveniência de sua manutenção na família biológica ou inserção em família substituta.
A adoção atribui a situação de filho ao adotado (ECA, art. 41, caput), não podendo a sua eficácia estar subordinada a termo ou condição. Como assevera Washington de Barros Monteiro, “adoção é ato puro, que se realiza pura e simplesmente, não tolerando aludidas modificações dos atos” (GONÇALVES, 2020, p.393).
Há em cada comarca um registro de crianças e adolescentes a serem adotados e outro de pessoas que possuam interesse em adotar (art.50 ECA). Tal cadastro não será feito até que esse menor passe pela equipe de profissionais para que seja avaliada sua situação, prevalecendo o entendimento que adoção é medida última antes que seja realizada a inserção em sua família natural.
“Os que tiverem interesse em adotar uma criança ou adolescente devem ter cadastro junto a comarca em que vivem, para que fique registrado o seu interesse em adotar, caso venha a surgir alguma criança desprovida de carinho e afeto e que precise de um lar, sempre visando o melhor interesse aos direitos do adotando”.
“A adoção é um instituto muito delicado, o ECA visa a proteção integral da criança e do adolescente que possa vir a ser adotado, por isso, os adotantes devem preencher todos os requisitos exigidos, além de demonstrarem que tem aptidão para adotar, que possuem um bom ambiente familiar, pois a adoção visa colocar a criança em um ambiente de amor e carinho, onde esta possa se sentir bem”.
Se cadastrada e não adotada, a criança ou o adolescente abandonado é abrigado e recebe avaliação de sua situação no abrigo de 6 em 6 meses para mapear de forma eficiente a necessidade ou não de inserção em família substituta, fazendo com que o direito fundamental à convivência familiar seja assegurado.
Para a inclusão da criança e do adolescente no cadastro não é necessário que já esteja destituída do poder familiar, mas é essencial estudo de caso com parecer da equipe do juízo indicando a adoção como a melhor medida a ser tomada.
José Simão mostra em sua obra a legitimação necessária para que a criança seja adotada:
No que concerne à legitimação para ser adotado, a criança não deve se sujeitar a um poder familiar, além daquelas que tenham se tornado órfãs sem que qualquer membro da família lhes tenha reclamado por mais de um ano contado da orfandade, bem como aquelas cujos pais hajam sido destituídos do poder familiar, sem que se lhes tenha sido nomeado um tutor. Também podem ser adotadas aquelas crianças que, sujeitas a um poder familiar exercido por seus pais, por um tutor ou por parentes próximos em caso de orfandade, contem como consentimento de seus representantes legais no sentido de acordarem com a adoção. (SIMÃO, 2010, p.561)
Desta forma, cabe dizer que o Estatuto da Criança e do Adolescente visa assegurar ao adotando uma proteção integral, onde o Estado garanta seu cumprimento, em diversas formas de intervenção.
4.AS CONSEQUÊNCIAS DA ADOÇÃO TARDIA
Primeiramente, é interessante expor que o termo adoção tardio é usado quando o adotando já possui idade maior de 03 (três) anos.
A adoção é considerada tardia quando a criança a ser adotada tiver mais de dois anos. Tais crianças ou foram abandonadas tardiamente pelas mães, que, por circunstâncias pessoais ou socioeconômicas não puderam continuar se encarregando delas ou foram retiradas dos pais pelo Poder judiciário, ou, ainda foram “esquecidas” pelo estado desde muito pequenas em “orfanatos” que, na realidade, abrigam uma minoria de órfãos com já levantado anteriormente. (VARGAS, 1998,p.30)
Em leituras e pesquisas feitas a respeito do aludido tema, salienta-se que uma grande consequência da adoção tardia é a oportunidade que a criança/adolescente deixam de ter em virtude de não possuir vínculos afetivos mais profundos com sua família adotiva. Um importante ponto a ser levantado, são possíveis traumas que esse menor possa vir a ter, traumas estes advindos da negligência e do abandono.
A adoção de crianças com mais de dois anos de idade tem sido compreendida como “tardia”. Nessa linha de conceituação, parte-se do pressuposto de que a criança terá mais facilidade de reconstituir novos vínculos significativos com os pais adotivos se lhe foi possível estabelecer vínculos precoces positivos. (SILVA, 2009,p.143)
A família é o principal garantidor da proteção integral desse menor, sem a inserção no seio familiar o adotando deixa de receber o que preconiza o ECA no bojo de seu artigo 4º:
Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
Quanto mais demorado é o processo da procura de uma família em que a criança/adolescente se encaixe, mais tempo se leva para que este possa usufruir de todo afeto que necessita e pode ser proporcionado, acesso a boa educação, saúde, um bom convívio familiar e social, lazer e direitos básicos que lhe são garantidos constitucionalmente. Deixa ainda de receber proteção familiar desejada, um bom desenvolvimento físico, mental, moral, etc.
O primeiro é de curta duração, mais vivido com intensa ansiedade, e refere-se à fase em que a criança/adolescente se esforça para agradar os pais adotivos. Nesse primeiro estágio, o comportamento afetivo pode ser sutil e ocorrer tão rapidamente , que muitas vezes nem é percebido pela família [...] O segundo estágio é de longa duração, podendo ser bastante estressante e ameaçador para ambas as partes, já que é nessa fase que a criança testa sua nova família, para se proteger de possíveis sofrimentos e para perceber até que ponto ela é valorizada e amada.[...]
Por último o estágio da integração propriamente dita, que pode ser antecipado pelas intercalações de progressões e regressões no comportamento da criança (HUTZ 2007, p.30).
Cabe questionar que quando o adotando se encontra na espera, cadastro, lares ou sobre a guarda do Estado, ela pode estar deixando de gozar de uma boa estruturação familiar, tal fato, por sua vez, pode acarretar comportamentos agressivos, uma possível dificuldade de inserção no seio familiar que virá a ter, dificuldade em atender regras e limites, falta de segurança jurídica e outros tantos fatores que se ligam a experiências anteriores, ou geradas nesse abandono e demora para o encontro do tão sonhado lar e afeto.
O comportamento regressivo e a agressividade são amplamente referidos como parte do processo de adaptação, de acordo com a literatura e foram objeto de discussão na orientação aos pais, preparando-os para a possibilidade de os mesmos serem apresentados pela criança ou para trabalharem no momento da ocorrência. (VARGAS, 1998, p.146)
Os pais adotivos precisam ser flexíveis para atenderem às necessidades mais regressivas em momentos menos esperados e, ao mesmo tempo, firmes e refratários o bastante para suportarem os ataques retaliadores da criança, frequentemente dirigidos às figuras que a abandonaram, conforme apontado por vários autores. Quando a criança alcança, no novo ambiente familiar, a satisfação de suas necessidades fundamentais pra reconstruir sua trajetória a partir dos novos modelos, ela rapidamente, pode evoluir para estágios posteriores. (PESTANA,2010)
Nesse sentido, importa observar o que dispõe o art. 46 do ECA: “A adoção será precedida de estágio de convivência com a criança ou adolescente, pelo prazo máximo de 90 (noventa) dias, observadas a idade da criança ou adolescente e as peculiaridades do caso”.
Em enunciados de decisões de Tribunais de Justiça podemos ver presentes, a busca pela inserção do menor em um lar que o trará tudo o que de melhor pode ser propiciado. Vejamos:
Apelação Cível - Adoção - Melhor Interesse do Menor - Prevalência sobre a Lista de Cadastro de Adotantes - Adoção por quem detém a Guarda Provisória - Vínculo de Afinidade - Possibilidade. O comando que determina que a autoridade judiciária deverá manter em cada comarca ou foro regional, um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na adoção, art. 50 do ECA, vem para atender ao disposto no art. 34 do mesmo Estatuto, isto é, como meio facilitador para estimular a alocação dos menores em famílias substitutas, não tendo, contudo, o condão de vincular o juiz à observância de ordem de preferência ou filas de espera, porventura, existentes entre aqueles que queiram adotar, vez que tal ""ordem"" não pode se sobrepor aos interesses do menor. (TJMG - Apelação Cível 1.0637.10.008537-1/001, Relator(a): Des.(a) Dárcio Lopardi Mendes, 4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 03/05/2012, publicação da súmula em 25/05/2012).
Adoção. Menor. Guarda de fato. Cadastro de adotantes. Ordem cronológica. Observância. Princípio do Melhor interesse do menor. Cassação da decisão. A aplicação do Estatuto da Criança e do Adolescente tem por escopo conferir seriedade e idoneidade aos pedidos de adoção, com prévia e competente seleção de adotantes em procedimento de habilitação, visando, principalmente, à preservação do princípio do prioritário interesse do menor. A afeição e a afinidade são critérios legais para tornar o respectivo titular cliente preferencial da adoção. Recurso provido. (TJMG - Apelação Cível 1.0313.10.011321-3/002, Relator(a): Des.(a) Almeida Melo, 4ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 07/04/2011, publicação da súmula em 11/04/2011).
Sendo assim, cabe trazer a reflexão às consequências que o menor pode sofrer em razão de uma demorada adoção, deixando este de auferir de garantias e privilégios enquanto ser humano e cidadão, e na persecução do aludido princípio do melhor interesse do menor, quando ele passa mais tempo na fila de espera até encontrar sua almejada família. Faz mister o que diz Fonseca sobre o princípio do melhor interesse do menor.
O princípio resume-se no fato de que todos os atos relacionados à criança deverão considerar os seus melhores interesses. O Estado deverá prover proteção e cuidado adequados quando os pais ou responsáveis não o fizerem. O melhor interesse, portanto, deve ser identificado com os direitos reconhecidos e originados na Convenção (dos Direitos das Crianças), sendo que, na sua aplicação, a proteção dos direitos da criança e do adolescente sobreleva sobre qualquer outro cálculo de benefício coletivo. (FONSECA, 2012, p.12).
Dessa forma, o citado princípio deve orientar e nortear todo esse processo até que se chegue uma família, e dela se faça parte.
O Estado enquanto detentor da proteção desse menor, pode promover políticas públicas que assegure o atendimento das necessidades desse menor, conforme leciona Diácomo:
Na verdade, pela sistemática atual, as intervenções estatais na área da infância e juventude devem ocorrer no âmbito de uma política pública específica, de cunho eminentemente intersetorial (e interdisciplinar), aprovada no âmbito dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente e executada pelos mais diversos setores da administração, nos diversos níveis de governo (embora deva ser dado ênfase à “municipalização” do atendimento, com a eventual participação de entidades não governamentais, que devem desenvolver ações articuladas/integradas, a partir de “fluxos” e “protocolos de atendimento” previamente definidos entre os órgãos e agentes corresponsáveis. (DIÁCOMO, 2014).
Portanto, é de suma importância, que os menores à espera da adoção não fiquem por tanto tempo nas filas e cadastros no aguardo de seu tão desejado lar, por mais que este encontre proteção garantida pelo Estado, é no seio familiar que a criança ou o adolescente irá gozar de maior proteção, afeto, e todos os demais elementos abordados neste artigo.
5.CONCLUSÃO
Findado o estudo da presente pesquisa, foi possível observar que além de vasto o conteúdo sobre adoção, sua riqueza na parte legal é extensa, e ainda a evolução que esta sofreu e vem sofrendo constantemente é de extrema relevância.
A adoção busca acolher e assegurar direitos à criança ou adolescente, que por algum motivo, em determinado momento deixaram suas famílias naturais, e iniciaram o caminho da persecução de uma nova família que antedesse melhor os seus interesses enquanto menor.
Para atingir o objetivo foi necessário fazer análises em doutrinas e dispositivos legais que propiciassem entendimento em busca do tema proposto, uma vez que o melhor interesse da criança e do adolescente, e sua proteção devem sempre estar resguardados.
A evolução histórica entorno do instituto possibilitou que com o advento do ECA, a criança e o adolescente obtivessem uma integral proteção, gozem de todos os direitos fundamentais pertencentes à pessoa humana, e que a estes menores fosse ofertado todas as oportunidades e facilidades, para que os permita desenvolvimento em condições dignas.
Necessário ainda, elucidar que as crianças e adolescentes a espera da adoção não serão alvo de qualquer negligencia.
Verificou-se a importância dos pressupostos que a pessoa ou casal que almejam a adoção precisam possuir, devendo estes atender a todos os requisitos estatuídos pelo Estatuto (ECA), bem como sempre atender o princípio maior regedor desse instituo.
Ainda foi observado que não é levado em conta sexo, nacionalidade ou estado civil do adotante, e sim a capacidade ativa que o individuo necessita para realizar tal ato, devendo estar apto material e moralmente para desenvolver a função de pai/mãe, de acordo com o que rege a lei.
Em todos os casos o Estado sempre estará garantindo proteção até que se encontre a família ideal para o menor, e sempre observado o melhor interesse deste. Notório que o cadastro nacional de adoção é muito procurado e o Poder Judiciário procura através de mapeamento e estudo das famílias que fazem parte desse cadastro proporcionar a criança ou adolescente a garantia do direito fundamental à convivência familiar.
Foi possível concluir que, o ECA (Estatuto) regedor de todo o processo de adoção assegura proteções, e o Estado enquanto detentor da proteção, trabalha de maneira que garanta seu cumprimento.
Resta claro, que a maior necessidade desses menores é de uma família e de um lar que lhes ofereçam afeto, acolhimento, amor incondicional, independentemente de sua idade e de vínculos familiares anteriores, não deixando de garantir que todos os direitos a elas conferidos sejam garantidos.
Entendemos que tal instituto deve ser olhado com delicadeza. Pois trata-se de direitos fundamentais de crianças e adolescentes, que por alguma razão maior foram destituídos de seus lares naturais e de suas origens, e agora necessitam de possuir de um lar que os trará amor, afeto, dignidade para viver, uma família que possua idoneidade, que tenham uma estabilidade material, e que garantam todos os direitos previstos constitucionalmente, tais como educação digna, saúde e lazer. Desta forma, é inegável a necessidade de uma família na vida de um menor, pois é nela que que há elementos essenciais na formação do individuo enquanto ser humano e cidadão.
Conclui-se, portanto, que a doção tardia pode acarretar em consequências talvez irreparáveis, uma vez que o menor poderá trazer comportamentos que implicará na demora para reconstruir novos vínculos afetivos com os pais adotivos. O processo de adaptação pode vir a ser mais demorado, uma vez que a criança ou menor possa ter momentos de agressividades, reflexo de algum trauma causado em momento anterior.
Destarte, a figura familiar, portadora de boa-fé, que traga ensinamentos e princípios e oferte a garantia de direitos básicos à criança e adolescente é de extrema importância, e quanto maior o tempo de espera, mais reflexos o adotando poderá ter em ao longo de sua vida, e com a espera deixa de ser observado e aplicado o princípio do melhor interesse do menor e a proteção auferida através do núcleo de uma família.
6.REFERÊNCIAS
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[1] Professora Especialista em Direito Civil e Direito Processual civil. Bacharel em Direito pela Faculdade de Anicuns-GO. Advogada e professora da Faculdade Serra do Carmo- FASEC. Email:[email protected]
Acadêmica do 10º período de Direito, na faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOMES, Patrícia da Silva. As consequências da adoção tardia sob uma ótica sócio jurídica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 nov 2020, 04:11. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55638/as-consequncias-da-adoo-tardia-sob-uma-tica-scio-jurdica. Acesso em: 23 dez 2024.
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