GUILHERME AUGUSTO MARTINS SANTOS [1]
(orientador)
RESUMO: Na sociedade contemporânea onde os animais de estimação ganharam um lugar de destaque nas famílias e no mercado, é percetível o atraso no ordenamento jurídico brasileiro sobre a definição dos animais, que no código civil de 2002 são classificados como objeto móvel. A família se modernizou e teve o primeiro passo em direito dos animais com a lei 1.095/2020, entretanto em casos de dissoluções os animais ainda ficam desamparados. O projeto de lei 351/15 propõe nova classificação dos animais, deixando de serem objetos e tornando-se assim um sujeito de direito com sentimentos e necessidades. A classificação adotada pelo judiciário pode ser o caminho para desenvolvimento de leis, que possam resguardar os direitos e simplificar lides ao judiciário nos casos de dissolução conjugal. A problemática da pesquisa consiste em identificar o tratamento jurídico dispensado aos animais de estimação em casos de divórcios demonstrando o atraso do jurídico brasileiro em relação à classificação dos animais de estimação conforme código civil 2002, apresentar as Leis aprovadas em favor aos animais de estimação, evidenciando seu lugar de destaque na sociedade contemporânea e Identificar a Ausência de leis especificas nos casos de dissoluções conjugais. A metodologia apresentada será com base na Pesquisa bibliográfica e Pesquisa documental em normas, projetos de lei, doutrinadores, entendimento de tribunais e cortes e artigos que retratam sobre a a natureza jurídica dos animais em caso de dissolução conjugal. Com o crescimento das dissoluções conjugais e o tratamento conferido aos animais de estimação no que diz a sua tutela, bem como projeto de leis regulamentando o acesso de animais em shoppings e hospitais de alguns estados do brasil, torna-se notável o destaque e prioridad do tema para milhares de famílias. Assim, a pesquisa identificará o tratamento jurídico dispensado em normas, legislação e jurisprudências pertinentes ao tema.
Palavras-chave: Animais ; Divórcio ;Leis; Sociedade contemporânea ;Tratamento jurídico.
INTRODUÇÃO
O sistema jurídico brasileiro, frequentemente, se depara com variados processos de dissolução de sociedade conjugais, tornando-se comum a disputa pela tutela do animal de estimação destes casais. A Família se modernizou e a relação entre homem e animais de estimação tem sido cada vez mais profunda e em muitos casos com um grande destaque no cenário familiar.
A separação já é um momento muito difícil na vida das pessoas, e uma disputa judicial por um animal que não carrega valor físico e sim sentimental para ambos pode deixar esse momento muito mais delicado. O problema de pesquisa busca mostrar o atraso com a falta de normas nesse segmento e a falta de uma classificação mais adequada e específica da natureza jurídica destes animais no ordenamento jurídico brasileiro.
No código civil de 2002, os animais de estimação acabam sendo classificados como objeto móvel, contudo a decisões judiciais tem avançado nesta temática, mas ainda carecem de um suporte normativo específico para a lidar com esta temática. Os elementos que embasam essas decisões, levam em consideração o zelo do animal, local apropriado, tempo e afeto.
A pesquisa conta com métodos baseados em pesquisa bibliográfica e documental para mostrar a ausência de normatização específica capaz de orientar a melhor decisão em estabelecer a tutela de animais domésticos em situações de dissolução conjugal.
Portanto, necessita-se aprofundar como o magistrado brasileiro tem tomado as decisões na ausência de normas sobre essa lide e analisar leis ou projetos de leis que estão em andamento para a criação de normas específicas no intuito de proteger os direitos dos animais.
1. FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA
A família é uma das entidades mais antigas presentes até hoje na sociedade contemporânea, sendo reinventada constantemente e evoluindo com o passar dos anos tanto em sua estrutura quanto em integrantes. Com o crescimento da escolarização da mulher, a justa equiparação dos direitos, independentemente do gênero, a entrada delas no mercado de trabalho, a elevação do afeto como valor jurídico, fez com que surgisse outras arranjos familiares contemporâneos, que vem crescendo a cada dia, como mães solteiras, pais solteiros, casais homoafetivo, casais sem filhos, famílias de segunda união, e outros formados igualmente pelo afeto e com objetivo de constituição de família.
Farias e Rosenvald (2016) dizem que:
Em sua origem, pois, a família não tinha um significado idealístico, assumindo uma conotação patrimonial, dizendo respeito a propriedade, designando os escravos pertencentes a alguém, a sua casa, a sua propriedade.[...] com o passar dos tempos, porém, o conceito de família mudou significativamente até que, nos dias de hoje, assume uma concepção múltipla, plural, podendo dizer respeito a um ou mais indivíduos, ligados por traços biológicos ou sóciopsicoafetivos, com a intenção de estabelecer, eticamente, o desenvolvimento da personalidade de cada um (FARIAS; RONSENVALD, 2016, p. 39).
Com o surgimento dessas novas ligações familiares, as relações deixam de ser apenas sanguíneas, e passam a ter o afeto como fator determinante também. O matrimonio por diversos séculos foi a peça-chave para a fundação de uma família, onde era centrada em valores patrimoniais, sem a chance de dissolução desse vinculo.
O Código Civil de 2002 também tratou do assunto, não mais considerando a família como um modelo institucional, mas sim como uma família no modelo instrumental. Ou seja, as famílias começaram a ter mais autonomia para buscar seus interesses e, principalmente, desenvolver sua personalidade e afeto (LIMA, 2016).
A lei brasileira no século passado deixava registradas o reconhecimento de família, quanto o reconhecimento de filhos que fossem apenas frutos do casamento. Isto posto, “sob a égide do Código Civil de 1916, cuja estrutura era exclusivamente matrimonializada (somente admitida à formação da família pelo casamento)” (CHAVES, 2008, p. 43), qualquer outro tipo de relação era tido como imprópria e até penalizada.
Os doutrinadores Farias e Rosenvald (2016, p.34) aduz que:
Deixando de lado digressões históricas e antropológicas atinentes à origem antiga da família na pré-história e a própria admissibilidade da proibição do incesto como primeira lei universal [...], toma-se como ponto de partida o modelo patriarcal, hierarquizado e transpessoal da família, decorrente das influências da revolução francesa sobre o código civil brasileiro de 1916. Naquela ambientação familiar, necessariamente matrimonializada, imperava a regra “até que a morte nos separe’, admitindo-se o sacrifício da felicidade pessoal dos membros da família em nome da manutenção do vínculo do casamento.
A família do século XX, tratada na Constituição de 1916, era conservadora, patriarcal. Ela baseava-se nos laços consanguíneos e o pai era o chefe da casa, proprietário de todo o patrimônio, bem como dos membros da família. Qualquer união fora do casamento era considerada ilegal, ilegítima e imoral e os filhos concebidos fora do casamento eram considerados filhos adulterinos, de tal forma que quem se submetia a tais condutas ficava sem a proteção jurídica do Estado (DRESCH, 2015).
Para Seguin, Araújo e Cordeiro Neto (2016, p. 18),
O conceito jurídico de família, nas constituições anteriores a 1988, era muito fechado, certamente por influência do Código Civil de 1916, que dedicou cento e 11 quarenta e nove artigos (do 180 ao 329) ao tema e somente conferia o status família e aos núcleos originados pelo casamento, considerando legítimos ou legitimados só os produtos dessa união. Era um modelo único, sem alternativas ou desvios, onde a felicidade pessoal dos seus integrantes era legada a forma preestabelecida e pela "respeitabilidade" das aparências, sob o império dos dogmas religiosos. A hipocrisia reinava, assim, a mulher ficava infeliz dentro de casa e seu marido tinha uma "teúda e manteúda", certamente também infeliz, com seus filhos "bastardos" que, seguramente, sofriam bulling na escola. Mas, permaneciam todos infelizes até que a morte os separasse.
É perceptível que a família vem evoluindo e mudando conceitos que duraram séculos, inovando com novos costumes, integrantes e novos tipos de família, tendo como características, o afeto, busca da felicidade coletiva e ética, abrangendo não só relações sanguíneas ou afetivas, mas como qualquer pessoa importante como amigos e até mesmo os animais de estimação.
1.1. Matrimônio e a sua dissolução
No século passado, o casamento ainda estava muito influenciado pelas concepções dogmáticas da Igreja Católica, onde não seria possível a dissolução do matrimonio. No entanto na contemporaneidade, cada dia tem se tornado mais comuns divórcios, pois a igreja parou de ter tanta influência em decisões e as autoridades políticas na contemporaneidade sobrepõe a religiosa.
Garcia (2010, p. 9) cita a luta que nosso país traçou buscando defender seus direitos e garantias contra o poder dominante da igreja. Segundo o autor, essa batalha foi longa, mas trouxe ao Estado Democrático de Direito o poder de tomar decisões que antes eram controladas pela igreja. Uma dessas decisões foi sobre o divórcio, que passou por grandes transformações ao longo dos anos.
Segundo Venosa (2007, p.24), “a história do divórcio no Brasil traduz uma árdua e calorosa batalha legislativa e social, decorrente de longa e histórica tradição antidivorcista, sustentada basicamente pela Igreja, que erige o casamento em sacramento”.
Silva e Baruff (2011, p. 438), ao tratar da evolução no Código Civil, afirmam que
O Código Civil de 1916 regulou a dissolução da sociedade conjugal nos arts. 315 a 324. Já no primeiro destes dispositivos, a sociedade conjugal termina pela morte de um dos cônjuges, pela nulidade ou anulação do casamento ou pelo desquite, amigável ou judicial. Pelo parágrafo único do mesmo art. 315, o casamento válido só dissolveria pela morte de um dos cônjuges, não se lhe aplicando a presunção de morte estabelecida no seu art. 10. Mantinha-se, portanto, a indissolubilidade do vínculo conjugal do regime anterior.
Segundo Araújo (2010, online), “apenas em 1861 surgiu um pequeno sinal que demonstrou progresso em direção à desvinculação entre Igreja Católica e o Estado: o Decreto n.º 1.144 passou a autorizar o casamento entre nubentes de outras seitas”.
Bottega (2018 p. 32) cita, ainda, que o Decreto nº 3.069, de 1863, trouxe mudanças inaugurando três modalidades de casamentos: o misto, o católico e o não católico. Mas, segundo o autor, a maior mudança ocorreu no ano de 1889 quando foi proclamada a República, quando a igreja perdeu força e o Estado pôde administrar as questões relacionadas ao casamento.
No ano de 2002, o Código Civil entrou em vigor trazendo algumas alterações sobre o assunto: disposições que tratavam sobre direito material na lei do divórcio foram extintas. Para Bottega, “o Código Civil de 2002 manteve o sentido da Constituição Federal de 1988, prevendo a questão da separação judicial ou separação de fato como requisito para o pedido de divórcio” (ARAUJO, 2018, p. 33).
A mudança que ocorreu no ano de 2010, aprovada pela PEC nº 66, conhecida como a PEC do Divórcio direto, pretendendo modificar o § 6º do art. 226 da Constituição Federal, o casamento civil passou a ser dissolvido pelo divórcio, sendo suprimido o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos.( Brasil,1988)
Conforme aduz Altieri (2018), o divórcio, no Direito Brasileiro, foi introduzido por força da Lei n. º 6.515 de 1977, que regulou a dissolubilidade do vínculo matrimonial. Anteriormente a ele, o que ocorria era somente a separação dos corpos sem a dissolução do vínculo matrimonial - também conhecido como desquite - onde cônjuges paravam de conviver, mas não poderiam contrair novo casamento.
Segundo entendimento de Silva e Baruff (2011), “a Lei do Divórcio, aprovada em 1977, concedeu a possibilidade de um novo casamento, mas somente por uma vez. O ‘desquite’ passou a ser chamado de ‘separação’ e permanecia, até hoje, como um estágio intermediário até a obtenção do divórcio” (2011, p. 437).
Por sua vez, Araújo (2010) comenta que, posteriormente à Lei do Divórcio, ocorreram modificações nos institutos do divórcio e da dissolução do casamento com a Constituição de 1988, mantendo a forma dissolúvel da união como uma norma constitucional.
Com a constituição de 88 se tornou presente o dispositivo legal do divórcio:
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...] § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos (BRASIL, 1988).
Silva e Baruff (2011, p. 438) afirmam que “a Carta Magna reduziu o prazo da separação de fato para um ano, no divórcio conversão, e criou uma modalidade permanente e ordinária de divórcio direto, desde que comprovada a separação de fato por mais de dois anos”.
Altieri (2018, online), também trata do assunto, ao afirmar que:
A Constituição Federal de 1988 ampliou as hipóteses de dissolução do casamento por divórcio: uma das possibilidades é após a prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, hipótese do divórcio indireto, ou então comprovada a separação de fato por mais de dois anos, sendo o chamado divórcio direto. Ademais é oportuno ressaltar que, a ação de divórcio é de cunho personalíssimo isto quer dizer, o seu pedido somente compete aos cônjuges. Caso um dos cônjuges seja incapaz poderá defender-se ou ajuizar a ação por meio de seu curador, ascendente ou irmão.
No ano de 2002, o Código Civil entrou em vigor trazendo algumas alterações sobre o assunto: disposições que tratavam sobre direito material na lei do divórcio foram extintas (ARAUJO, 2010).
Para Bottega, “o Código Civil de 2002 manteve o sentido da Constituição Federal de 1988, prevendo a questão da separação judicial ou separação de fato como requisito para o pedido de divórcio” (BOTTEGA, 2018, p. 33).
Portanto, com essas evoluções no legislativo e o paradigma dos pós modernidade, tornou-se o divórcio mais comum pelo fato da autoridade divina não sobrepor a autoridade política nesta era, sendo comum a dissolução a cada dia da sociedade contemporânea.
2. BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE OS ANIMAIS NO DIREITO BRASILEIRO
A busca do direito fundamental dos animais tem se mostrado uma implementação complexa, pois apesar dos animais serem tratados como filhos por muitos de seus donos, eles não possuem características e estruturas iguais aos dos seres humanos. Entretanto, por não serem iguais, não significa que não merecem terem seus direitos ou serem tratados como inferiores.
Podemos ver nos dias de hoje até animais silvestres, onde podem trazer perigo ao domesticado não é empecilho para a não domesticação. Com a contemporaneidade os animais de estimação ganharam destaques dentro da grande maioria das famílias brasileiras.
Recentemente, no dia 29 de setembro de 2020, o presidente Jair Bolsonaro sancionou a lei 14.064/2020(BRASIL,2020) que aumenta as penas cominadas ao crime de maus tratos aos animais quando se tratar de cães e gatos. Assim, demonstrando um primeiro passo para a legislação de uma lei que defina os animais como seres de direitos e agrave penas para os sujeitos que cometerem esses crimes (BRASIL,2020).
Entretanto além de proteger a integridade física dos animais, é necessário o desarquivamento de leis como a lei nº 6799/2013 onde mudariam a classificação dos animais domésticos e silvestres, sendo proibido o seu tratamento como coisa (BRASIL, 2013). Com essa inovação legislativa o Brasil se juntou a um grupo de países que já mudaram suas leis em favor do direito dos animais.
O código civil brasileiro ainda os classificam como objetos móveis e sofrem com a carência de normas que defina a sua natureza jurídica.
Assim, o grande crescimento deste novo integrante das famílias, tem feito diversas mudanças no mercado consumidor, legislação e no jurídico, demostrando a cada dia a sua importância no cenário familiar.
Na classificação dos animais perante o código civil brasileiro, existe uma diferença clara entre o regime jurídico dispensado às pessoas e o dispensado aos bens. Na explicação de PEREIRA (2010), para o Código Civil de 2002, quem se enquadra no regime jurídico das pessoas são os sujeitos de direito portadores de personalidade jurídica, ou seja, o ser humano.
Então, se por um lado o ordenamento atribui ao homem e às suas entidades morais fictas uma proteção especial pautada nos direitos fundamentais da personalidade, não o faz com os demais seres vivos (PEREIRA, 2012. p.181). Seguindo tal raciocínio, conclui-se que, para o Direito Civil brasileiro, os animais não humanos, por não se encaixarem na categoria de sujeitos de direitos portadores de personalidade (pessoas), acabam por pertencer à categoria dos bens, sendo objetos do direito e não sujeitos.
Nas disposições sobre vícios redibitórios, o artigo 445, § 2°do CC/2002 faz menção à venda de "animais defeituosos", como se estes fossem objetos com vícios ocultos, os artigos 936, 1.297 e 1.313 do CC, reforçam a ideia do ser humano como proprietário do animal, e não como guardião ou tutor e os artigos 1.442, V, 1.444, 1.446 e 1.447, ao disciplinarem sobre penhor agrícola, deixam clara a ideia de que os animais, além de estarem entre os bens suscetíveis ao penhor, ainda seriam bens fungíveis, já que podem ser substituídos por outros de mesma qualidade em caso de morte (BRASIL, 2002).
No âmbito nacional, o Brasil conta com alguns projetos de leis para ser sancionados sobre a proteção dos direitos dos animais e a mudança da sua natureza jurídica perante o Código Civil. Nesse sentido, estão os seguintes diplomas normativos: a Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/98), que criminaliza atos de crueldade aos animais; a Lei nº 7.173/83(BRASIL,1983), a qual disciplina o funcionamento de zoológicos; a Lei nº 7.643/87 sobre a proteção dos cetáceos marinhos; a Lei nº 11.794/2008(BRASIL,2008) que regula as atividades científicas que envolvam animais; e a Lei nº 10.519/2002( Brasil,2002), a qual trata de normas de higiene e cuidados com os animais em rodeios e similares, além de uma série de leis estaduais e municipais sobre regras de tratamento e proteção dos animais não-humanos.
Conforme SALLES (2013, online) aduz que:
Por analogia aos Princípios Gerais do Direito, o que podemos interpretar é que tal medida protetiva que a legislação oferece aos animais é baseada numa ética humana e não em uma ética animal. Afinal, a criminalização de condutas que atentem contra a integridade física da fauna parte de um ponto de vista valorativo social. É que tais condutas vão de encontro com os princípios morais da sociedade. O posicionamento é ratificado pela própria postura antropocêntrica da lei que se destina somente ao homem, não incluindo os animais. Nesta perspectiva infere-se que o ordenamento jurídico considera os animais como objetos do direito.
Assim perceptivelmente, os animais são considerados objetos de direitos, afinal é o homem quem determina tal status jurídico deles, pois a norma é adequada conforme os interesses dos próprios homens.
Sobre o assunto determina (BECHARA; 2003, p. 72).
Por mais que esta visão tenha uma aparência egoísta, somos obrigados a reconhecer que o nosso ordenamento jurídico não confere direitos à natureza, aos bens ambientais. São eles, dessa forma, tratados como objetos de direito, não como sujeitos. São objetos que atendem a uma gama de interesses dos sujeitos – os seres humanos.
Fensterseifer (2008, p.40) ainda afirma:
O defensor dos direitos dos animais ou da vida em termos gerais é antes de qualquer coisa também um defensor dos direitos humanos, já que as consagrações, respectivas, dos direitos humanos e dos direitos dos animais tratam-se de etapas evolutivas cumulativas de um mesmo caminhar humano rumo a um horizonte moral e cultural em permanente construção.
O Código Civil não deixa expressamente entendido que os animais se encaixam na qualidade de bens suscetíveis de movimento próprio. Entretanto, conforme o entendimento doutrinário, é possível desprender que os animais entram na classificação de seres semoventes, como ensina o ilustre autor Rodrigues (2004, p.126) “os bens suscetíveis de movimento próprio, isto é, os animais, chamam-se semoventes. Os que se movem por força alheias, móveis propriamente ditas”.
Nesta mesma linha de raciocínio o autor Stolze (2012, p. 312) também entende que:
Os semoventes são os bens que se movem de um lugar para outro, por movimento próprio, como é o caso dos animais. Sua disciplina jurídica é a mesma dos bens móveis por sua própria natureza, sendo-lhes aplicáveis todas as suas regras correspondentes (art. 47 do CC-16 e art. 82 do CC-02).
É perceptível, conforme os artigos destacados acima, os animais são classificados como seres semoventes, deste modo serão tratados como bens móveis, ou seja, de bens considerados materiais.
Portanto, fica muito explícita a ausência de leis, que possam proteger o direito desses animais que presentes a cada dia na sociedade contemporânea, que possam ajudar em lides no judiciário e no próprio bem estar dos animais, para que estejam amparados pelas leis.
2.1. Reflexos jurídicos da visão atual da sociedade quanto aos animais de estimação
A experiência de ter um animal de estimação, na contemporaneidade, tem sido muito mais do que uma relação de responsabilidade ou de troca como na antiguidade. Essa ligação tem se tornado cada dia mais prazerosa pelo afeto retribuídos entre o dono e o animal, que tem transformado a sociedade ganhando novos espaços no comercio e lugares públicos.
Muitos desses animais são tratados ou até mesmo chamados de filhos em várias famílias brasileiras. Hotéis para pets, creche e pet shops tem crescido junto com a importância destes animais que cada dia, até mesmo a autorização da entrada destes em shoppings e hospitais retratam a conquista pelo seu espaço na sociedade.
A ideia de que cães e gatos fazem parte da família é um fenômeno recente que, no Brasil, remete ao final do século XX, momento em que as funções de guarda e controle de pragas, tradicionalmente atribuídas a essas espécies, perdem importância em relação à função de companhia. Esse fenômeno foi, em grande medida, resultado da popularização das raças de cães de pequeno porte no país, a partir do qual, nas classes média e alta, os animais de estimação passaram a dividir os espaços de convivência íntima e os mais variados momentos da rotina familiar (LIMA, 2018, online).
Ainda, segundo a autora, o fenômeno do desenvolvimento desse novo conceito familiar é representado por três situações relevantes:
1 – O aumento do status de animais de estimação nas famílias urbanas de classes média e alta gera a necessidade de diferenciar os animais de maior status daqueles que eram/são criados de forma distanciada;
2 – O crescimento do mercado pet impulsiona a difusão do discurso familista;
3 – No caso dos tutores cujas relações fogem ao padrão tradicional do animal como propriedade, surgem choques de sensibilidade pelo descompasso entre os valores estabelecidos e as experiências recentes de convívio íntimo (LIMA, 2018, online).
Diante das críticas sobre o fato de estarem tratando os animais como gente, há uma necessidade de legitimação social dos tutores, para a qual o uso de terminologias familistas fornece apoio. A afirmação é “meu filho” parece a forma mais rápida de responder um questionamento sobre os mimos oferecidos ao animal (Lima, 2020).
Inclusive, atualmente, segundo pesquisa realizada pelo IBGE o brasileiro possui um percentual de 44,3% de cães de companhia em seus domicílios, o que equivale a 28,9 milhões de lares no país. A população de animais dessa espécie foi contabilizada pelo instituto em 52,2 milhões, informando que em média há 1,8 cães por domicílio. Já em se tratando dos felinos, estima-se que há uma população de 22 milhões compartilhando dos lares brasileiros (BRASIL, 2013, online).
Ainda, há dados atuais de que os gastos com estes animais estão crescendo cada vez mais. Segundo a revista Exame (2018, online) uma nova pesquisa realizada pela CVA Solutions (2018,online) entrevistou 3.675 donos de cães e 2.270 donos de gatos em todo o país e as conclusões foram de que os donos de cães gastam em média R$ 294,00 por mês, sendo que desse valor R$ 121,00 são gastos com a alimentação dos animais. Já os donos de felinos gastam em média R$ 200,00, sendo que R$ 90,00 são investidos em alimentação. Além disso, os dados da pesquisa apontaram que cerca de 8,7% das pessoas entrevistadas também investem em planos de saúde para seus pets.
A pesquisa ainda aponta como os donos dos animais de estimação sentem-se em relação aos seus pets. O resultado foi que 32,5% dos donos de cachorros e 32,9% dos donos de gatos os reconhecem como se filhos fossem. Já 29,9% dos tutores de cães e 24,6% dos tutores de felinos os veem como membros da família. Ainda, há outros questionamentos feitos aos donos dos animais de estimação, como, por exemplo, quantos por cento dos donos veem seus pets somente como amigos, como companhia etc. Verifica-se que somente 1% dos donos de cães e 2% dos donos de gatos têm a visão de que são somente animais.
Segundo psicólogos, os benefícios para o bem-estar são imensos. Apesar de já terem sido feitas pesquisas e publicados seus resultados, muita gente ainda não sabe quais são os benefícios dos animais de estimação para a saúde mental.
Segundo Brotto (2020, online):
Os benefícios dos animais de estimação se estendem para as pessoas que precisam alterar o seu padrão comportamental, no processo de terapia, e também para as crianças e idosos. O envelhecimento saudável proporcionado pela companhia de animais de estimação estimula a vitalidade e o fortalecimento do sistema imunológico.
Em virtude dos aspectos abordados a sociedade são inúmeros os benefícios dos animais de estimação para o bem-estar do ser humano. E através das pesquisas mostra também o aumento significativo dos gastos com esses animais e com o passar do tempo a tendência é só aumentar. Com criação de novas leis e uma nova classificação os animais perante o Código Civil, é esperado para resolver muitas lides que se encontram no judiciário sem legislação específica.
2.2 O atraso do jurídico brasileiro em relação a classificação dos animais de estimação conforme o código civil de 2002.
Provavelmente a domesticação deve ter que ocorrido a séculos a qual, se caracterizava na relação do homem com os animais, entretanto o afeto não deveria ser característica dessa relação como é marcada na contemporaneidade, e sim os interesses; seja a proteção, o leite produzido, ovos, carne ou lã. Entretanto, nos dias de hoje, na sociedade contemporânea nos meios urbanos não há necessidade desta troca, pois os animais ganharam um lugar de destaque na sociedade, onde fazem parte da família e movimentam um mercado que cresce a cada dia, que é o dos PETS[2] e que necessitam de um estatuto para resoluções de lides.
É notável que a legislação civil brasileira se depara com um grande atraso quanto a classificação dos domésticos. Esse esquecimento do jurídico em relação a classificação dos animais, e a criação de leis que garantem direitos, demonstra que não é de interesse das autoridades a preocupação e o bem-estar dos animais.
A lei 9.605/98 é uma das poucas legislações que protege o bem-estar do animal contra os maus tratos (BRASIL, 1998), porém não garante direitos pois são classificados como objetos móveis conforme o código civil de 2002, entretanto a nova lei Lei 1.095/19(BRASIL,2019), que abrange animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos e prevê pena de reclusão de dois a cinco anos para prática de abuso e maus tratos, pode se caracterizar o início de uma atenção que está em atraso , perante os demais países desenvolvidos (BRASIL,2019).
É importante salientar que a partir do ano de 1988, começaram as primeiras manifestações em seus jurídicos para dar direitos, e definirem os animais domésticos, em algumas legislações pelo mundo, entretanto apenas em 2002, a Alemanha tornou-se o primeiro país-membro da União Europeia a garantir dignidade aos animais em sua Lei Fundamental de 1949, a chamada Constituição de Bonn. (SOUZA, 2018, online)
A Suíça, em 2003, também mudou o conceito sobre os animais o artigo 641, inciso II, do seu Código Civil, passou a considerar que os animais não são coisas. Com o passar dos anos, diversos países como Holanda, França e Portugal também mudaram o seu conceito de animais perante a sua legislação. Já no ano de 2017, a “Constitución Política de la Ciudad” do México alterou o status jurídico dos animais, tornando sua classificação mais coerente reconhecendo-os como seres sencientes e destinatários de tratamento digno e respeito à vida e à integridade física, sendo sujeitos de consideração moral (LOURENÇO, 2016, p. 821 apud SILVESTRE; et al, 2018, p. 33) que:
A Constituição suíça (Bundesverfassung – BV), por meio de processo de referendo, realizado em 1992, tornou-se a primeira nação a expressamente aludir à “dignidade das criaturas” (Würde des Tieres) em sede constitucional. Esta previsão influenciou decisivamente a legislação civil que, em 2003, modificou seu art. 641, passando com isto a determinar que os animais não são coisas (aplicando-lhes tal regime jurídico apenas na falta de legislação especial). Prevê-se igualmente, no art. 43, n.1, bis, que os tutores ou seus familiares têm direito pelo valor afetivo do animal no caso de ferimento ou morte deste (dano moral pela perda ou lesão de animal de companhia), sendo possível, por conta do art. 482-4, que os animais sejam beneficiários de disposições testamentárias. Além disto, no caso de divórcio há previsão no art. 651a que a partilha da herança deverá levar em consideração o melhor interesse do animal (averiguação que levará em conta as relações de afinidade e quem poderá promover as melhores condições de acomodação e tratamento).
Percebe-se que diversos países da Europa têm se modernizado em relação ao estatuto jurídico dos animais, pois quando ocorrem casos de dissoluções matrimoniais não tem amparo algum da lei e fica cada vez mais complicado as decisões tomadas por juízes por critérios próprios. Com a atualização da legislação sobre a classificação destes, facilitara a solução de lides e terá entendimentos maiores dos tribunais, e facilitando julgamentos de casos que abrangem este estatuto, como a tutela dos animais em caso de divórcio.
2.3 Tentativas do direito civil brasileiro para aprovar um estatuto jurídico próprio.
Neste tópico, será estudado algumas tentativas de implementações de projetos leis desenvolvidas no legislativo, que já foram discutidas em algumas áreas do legislativo, porém ainda não foi sancionada nenhuma lei a respeito de um estatuto dos animais e quanto a classificação deles perante o Código Civil.
No Brasil há alguns projetos que tramitam com propostas legislativas que tendem a mudar ao conceito dos animais perante o código civil e até a criação de um estatuto, através dessa pesquisa demonstraremos algumas tentativas de projetos que foram feitos nos últimos anos para a mudança da legislação quanto a definição da natureza jurídica dos animais e não sejam classificados como coisas.
Em 2012 surgiu o projeto de lei 3.676/12(BRASIL,2012) pelo Deputado Eliseu Padilha, onde propôs a criação de um estatuto dos animais, e o 2º artigo classifica os animais como seres sensientes, sujeitos de direitos naturais e nascem iguais perante a vida (BRASIL,2012).
O deputado federal Ricardo Izar tentou a aprovação do congresso, com o projeto de lei 6799/13(BRASIL,2013), onde citou que: “os animais domésticos e silvestres possuem natureza jurídica sui generis, sendo sujeitos de direitos despersonificados, dos quais podem gozar e obter a tutela jurisdicional em caso de violação, sendo vedado o seu tratamento como coisa” (BRASIL, 2013).
Com essa modificação, atualizaria em quanto natureza jurídica dos animais em relação ao código civil, sendo assim um grande passo para o direito dos animais.
O deputado Eliseu Padilha sugeriu a implementação do projeto de lei 7.991/14(BRASIL,2014). Neste projeto ele almejava acrescentar o Art.2-A onde diz:
“Art.2-A. Os animais gozam de personalidade jurídica sui generis que os tornam sujeitos de direitos fundamentais em reconhecimento a sua condição de seres sencientes.
Parágrafo único: São considerados direitos fundamentais a alimentação, a integridade física, a liberdade, dentre outros necessários a sobrevivência digna do animal. (Brasil,2014)
Em 2015, o Senador Antônio Anastasia formulou o projeto de lei do senado nº 351/15 que propunha que os animais não fossem mais classificados como coisas, e sim enquadrados na categoria de bens moveis (BRASIL, 2015).
É importante salientar que no ano de 2016, houve uma discussão sobre um assunto no STF que abrangia os interesses dos animais, que era o das vaquejadas, esporte onde o objetivo é derrubar o boi, que é puxado pela cauda, tendo que ser derrubado pelo montador que o puxa montado em um cavalo no lugar certo da arena.
Chegou até o STF, em outubro desse mesmo ano que julgou inconstitucional a lei cearense 15.299/13 que regulamentava a vaquejada naquele estado (BRASIL,2013), em novembro foi aprovada a lei 13.364/16 que elevou o rodeio e a vaquejada a patrimônio cultural e manifestação cultural do país (BRASIL ,2016).
Por fim, e mais recente, vale citar o projeto de lei 650/2015(BRASIL,2015), formulado pela senadora Gleisi Hoffman que sugeriu a criação de um código de proteção e defesa do bem-estar dos animais (BRASIL,2015).
São essas as tentativas de mudança da legislação que tentam mudar o status atual dos animais que são de coisas móveis, porém não foram aprovadas e vivenciadas, entretanto é importante destacar que este tema que já chegou ao superior tribunal de justiça, porém não teve julgamento concluído. Desde 1998 onde foi sancionada a lei 9.605/98(BRASIL, 1998), que protegia os animais dos maus tratos (BRASIL, 1998), foi a única lei que resguardava os animais até a nova lei 14.064/20(BRASIL,2020) sancionada esse ano pelo congresso nacional mostrando assim o esquecimento da justiça em proteger o direito dos animais que poderiam ter mais atenção aos direitos estendidos a eles pela CF como: dignidade, igualdade solidariedade e liberdade (BRASIL,2020).
2.4 Projetos de lei sobre regulamentação da tutela de animais de estimação.
A quantidade de leis que defendem o direito dos animais e que se encontram arquivadas, mostram que a luta pelo direito dos animais não interessa muito o parlamento, pois com a conquista desses direitos podem vir evoluções, que podem chocar com o mercado lucrativo do mundo dos PETS.
Foi sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro no dia 29 de setembro de 2020 a Lei 1.095/19, que aumenta a punição para quem praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais. Tem como o objetivo de impedir os maus-tratos contra animais, A legislação abrange também animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, incluindo, aí, cães e gatos, que acabam sendo os animais domésticos mais comuns e as principais vítimas desse tipo de crime (BRASIL,2019).
Vale salientar que essa nova lei pode ser um degrau a atenção das autoridades em respeito aos animais, e que tenham atenção quanto aos animais em casos de dissoluções ondem também sofrem emocionalmente pela separação de seus donos. A nova lei cria um item específico para esses animais.
O Projeto Lei 1.058/11(BRASIL,2011), de autoria do Deputado Federal Dr. Ubiali, do PSB/SP, tem como objetivo proteger a guarda de animais no fim da vida conjugal de um casal (BRASIL,2011).
Sem sucesso ainda em ser sancionado, algumas outras tentativas de outros deputados defendendo o direito dos animais tanto em casos de dissoluções e maus tratos, enfrentam dificuldades e estão arquivadas sem nenhuma manifestação próxima eminente.
Longo (2018) cita que os bichos devem perder os status de coisa diante da separação. Sendo assim, o juiz deve se valer de critérios objetivos para decidir de forma correta quem terá a guarda do animal.
Barbosa (2015) menciona que o projeto estabelece que, ao fim de um matrimônio, a guarda do animal fica com o ex-cônjuge dono do bicho, havendo dúvidas de quem é o legitimo proprietário, porém, poderá ocorrer a guarda compartilhada. Nestes casos, o juiz dará a guarda para a parte que tiver mais condições e tempo de criar o animal.
Condições do projeto: considera animal de estimação todos os pertencentes às espécies da fauna silvestre, exótica, doméstica ou domesticada, mantidos em cativeiro pelo homem, para entretenimento próprio ou de terceiros, capazes de estabelecer o convívio e a coabitação. De acordo com o texto, o juiz deverá também observar as seguintes condições: ambiente adequado para a morada do animal; disponibilidade de tempo para os cuidados com ele; condições de trato, de zelo e de sustento; grau de afinidade e afetividade entre o animal e a parte; e demais condições que considerar imprescindíveis para a sobrevivência do animal. Nesses casos, o animal doméstico é atualmente incluído no rol dos bens a serem partilhados, de acordo com o que ditar o regime de bens do casal. A visão atual dos juízes é que esse animal é um bem e, como tal, deve ser tratado como um objeto. Nós sabemos que os animais são tidos com muita afetividade, até como se fossem filhos. Portanto, este projeto de lei vai permitir que na separação ficasse bem clara a posição de cada um na relação com o animal, tempo de visita, com quem fica (GARCIA, 2018, p. 16-17).
Salles (2017, online) relata que, na Câmara dos Deputados, tramita o Projeto de Lei 1.365/15(BRASIL,2015), de autoria do Deputado Ricardo Tripoli, que, embora ainda esteja aguardando designação do relator na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, trata sobre os animais de estimação no fim do relacionamento conjugal. O projeto busca resguardar a qualidade de vida do animal tanto nos aspectos físicos e financeiros, quanto nos aspectos emocionais quando ocorre a ruptura matrimonial de um casal que possui um ou mais pets.
Segundo Cipriani (2016, online),
Pela proposta, o animal deve ficar com quem demonstrar maior vínculo afetivo com o animal e maior capacidade para exercer a posse responsável, ou seja, quem puder cumprir com os deveres e obrigações com o pet. Para conceder a guarda, o juiz observará as condições do ambiente para morada do animal, disponibilidade de tempo, zelo e sustento dele e o grau de afinidade entre o bichinho e seu tutor. Serão observadas demais condições que possam ser imprescindíveis para a sobrevivência do pet de acordo com suas características.
O Projeto de Lei nº 1.365/15, como os outros projetos citados, estão relacionados com a busca pela proteção dos animais e a garantia de que, em uma dissolução litigiosa da união estável hétero ou homoafetiva, o animal não seja tratado como um objeto, garantindo que que o animal possa ter sua guarda, observando quem tem o maior vínculo com o animal na antiga relação, estabelecendo a guarda unilateral, dando a uma das partes o poder de exercer a posse responsável e dando direito a quem não ficar com o bicho de poder fiscalizar como o animal vem sendo tratado e também podendo visitá-lo em dias marcados. O projeto também estabelece a guarda compartilhada, quando ambos os ex-cônjuges ficam responsáveis pelo animal (BRASIL,2015).
Salles (2017, online) trata sobre o assunto dizendo o seguinte: Sabendo que os animais são seres sencientes, a convivência com os seus tutores é um direito pertinente a eles, por isso em disputas judiciais, o cônjuge sem a guarda, mas que estime o seu bichinho pode solicitar ao magistrado a concessão de visitas, tudo em nome do bem-estar animal. Ainda cabe salientar da responsabilidade que os tutores de animais têm com estes, independente de deterem ou não a guarda.
Cipriani (2016) esclarece que a lei também trata dos casos em que nem o ex-marido nem a ex-mulher possuam condições de cuidar do pet, assim essa guarda poderá ser dada a um terceiro. O projeto estabelece que as partes devem tomar as decisões relevantes para a vida do animal de forma conjunta, e que, no caso de haver filhotes, os mesmos deverão ser divididos entre o ex-casal, além de citar, também, restrições à realização de cruzamentos.
Salles (2017) comenta também finalizando que: A necessidade de uma legislação faz-se urgente em relação aos animais de estimação em casos de divórcio, uma vez que muitos têm convicção de que eles devam ter o status de "sujeito de direito" e que sempre o bem-estar animal prevaleça sobre o egoísmo de alguns tutores e da irresponsabilidade de outros.
Em virtude dos fatos mencionados, assim como a lei 1.095/20(BRASIL,2020) foi um primeiro passo em atenção ao direito dos animais, são necessários os andamentos dessas leis que ainda estão em projeto, que podem ter suma importância no direito dos animais em casos de dissoluções.
3. TUTELA DE ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO EM CASOS DE DISSOLUÇÃO CONJUGAL
Como exposto nesta pesquisa, é indiscutível a importância dos animais de estimação nos lares brasileiros, e na sociedade contemporânea, tornando cada vez mais necessidade de melhor observar as relações a fim de poder garantir o bem-estar social, as concepções familiares, a vida humana e animal e buscar a melhor forma de ter uma sociedade que protege e garante o desenvolvimento familiar.
Assim analisar o animal doméstico como ser possível de direitos e como ficará sua situação em caso de dissolução da união dos donos quando não há acordo sobre quem ficará com o animal é essencial, devendo-se discutir essas situações cada dia mais presentes no judiciário a fim de alcançar o mais breve possível uma pacificação quanto ao tema evitando decisões confrontantes e injustiças.
Com a grande demanda de divórcios no pais, acabaram sobrecarregando o poder judiciário, aparecendo também novas demandas como a de tutela e guarda dos animais de estimação, que vem crescendo todos os dias.
O processo é bem parecido com a guarda de filhos, onde o Juiz é negociado um acordo entre as partes onde elas decidiriam como seria essa guarda e direitos de visita. Se não houver acordo , a guarda é confiada a quem possui o registro , entretanto devido ao animal não ter direito de escolha , é decidido com quem tiver mais provas em ser o dono. A Guarda unilateral, segundo a Lei 7.196/10(BRASIL,2010), ficaria com aquele que mostrar ter melhores condições de cuidar do animal, sendo levado em consideração o afeto com o genitor e o grupo familiar, saúde, segurança, educação, aquele que melhor dispor de um ambiente confortável para o animal e de tempo.
A tutela compartilhada é dividida as mesmas obrigações que é designada a filhos, ou seja, alimentação, transportes, remédios tendo direito de visita ou mudança da moradia conforme o tempo.
Filomeno (2017, online) aduz que:
Segundo uma pesquisa publicada pela revista Science a relação entre seu dono e o cão é mais parecida com a de pais e filhos. Quem descobriu isso foi um estudo liderado por Miho Nagasawa, da universidade japonesa Azabu. Ele comprovou como o olhar entre o cachorro e seu dono dispara nos dois os níveis de ocitocina no cérebro, hormônio relacionado a padrões sexuais e a conduta paternal e maternal.
Foi proposto na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei n° 1.365/15, que dispõe sobre a guarda dos animais de estimação nos casos de dissolução litigiosa da sociedade e do vínculo conjugal entre seus possuidores (BRASIL, 2015). Esta lei se aprovada seria própria aos casos de dissoluções, tendo assim o amparo da legislação em lides no judiciário.
O projeto de lei 1.365/15, diz:
Não são poucos os casos em que esses animais de estimação são criados quase como
Filhos pelo casal, cuja separação, sendo litigiosa, submete ao Poder Judiciário a decisão sobre as matérias em que não haja consenso. Nesses casos, o pet é incluído no rol dos bens a ser em partilhados de acordo com o que ditar o regime de bens do casal. Infelizmente nossa lei considera o animal como objeto, o que inviabiliza um acordo sobre as visitas na disputa judicial (BRASIL, 2015).
Um Projeto Lei também está em tramitação na Câmara dos Deputados que é a PL 1058/11(BRASIL,2011), que versa sobre a guarda compartilhada ou unilateral dos animais, quando não houver acordo entre as partes, devendo ser decidida pela Justiça, ficando assim, mais fácil para os magistrados decidirem sobre esse assunto (BRASIL,2011).
Com o aumento de demandas no judiciário, é imprescindível aprovação desses projetos para solucionar os conflitos de maneira que os animais estejam bem amparados.
Essas lides sobre o judiciário acaba se tornando cada vez mais difícil pelas decisões serem tomadas sem legislação legal, buscando os magistrados sempre o melhor para as partes. Com a dissolução do casamento todas as partes sofrem, portanto é necessária uma decisão coerente para que não haja mais sofrimento entre as partes.
Sobre isto ZWETSCH diz que:
Reconhecer a senciência e a sensibilidade dos animais de estimação, e aceitar – ainda que em desacordo – o apreço inestimável que seus tutores por ele guardam, revela a sensibilidade do julgador e seu alinhamento integral aos princípios e valores do Direito de Família, e por que não, também as mais recentes descobertas cientificas que demostram e atestam a natureza senciente dos animais (ZWETSCH, 2015, p. 50).
Com as dissoluções, ficam explicitas as questões de ter litigio pela tutela do animal, devendo ter uma grande atenção para a solução desta lide.
A definição da guarda de um animal de estimação que integrou uma família desfeita deve ser encarada com seriedade e sem preconceitos. Não por tratar-se de questão cada vez mais recorrente a ser dirimida pelos operadores jurídicos no âmbito dos tribunais, mas por envolver sentimentos e interesses de animais humanos e não humanos capazes de sofrer (ZWETSCH, 2015, p.38).
Portanto com o a evolução da importância do animal nas famílias em uma situação como o divórcio onde todos os integrantes sofrem, um estatuto que defina e instrua os magistrados nessas situações é imprescindível para a melhor aplicação do direito na sociedade.
3.1. Necessidade de regulamentação da tutela de animais: decisões e julgamentos.
Conforme a crescente demanda de litígios nos tribunais e a falta de disposições que regem sobre a guarda de animais, tem sido adotado como base por analogia a utilização da legislação para crianças em casos de divisão de guarda dos animais. Com a implementação desse dispositivo, a resolução de lides será baseada em seu próprio dispositivo.
Nota-se assim, que frente às demandas judiciais e a ausência de legislação especial, a analogia as crianças é o que melhor proporcionará o bem-estar ao animal de estimação e ao ex-casal, sob esse prisma Zwetsch (2015, p.43) diz que:
Considerando a senciência do animal de estimação é considerado parte integrante da família pelo casal cuja conjugabilidade está sendo litigiosamente dissolvida, e tendo em mente que as condições físicas e psíquicas de crianças são semelhantes à de determinados animais, a aplicação das regras de guarda compartilhada, nos moldes da nova lei, deve ser considerada pelo Magistrado como uma opção que melhor atende os interesses de todos os envolvidos.
O judiciário necessita resolver essas mazelas , principalmente quanto a competência ,para assim serem explorados nas varas de família. Quanto ao mérito, já existem diversos casos, por exemplo, em São Paulo, na Segunda Vara de Família e Sucessões de Jacareí, foi estabelecida a guarda alternada de um cão entre os ex-cônjuges, ficando o animal uma semana na casa de cada um. O juiz reconheceu em sua decisão que “os animais são sujeitos de direito nas ações referentes às desagregações familiares. [...]afirmou ainda que por se tratar de ser vivo, a sentença deve levar em conta critérios éticos e cabe analogia com a guarda do humano incapaz. ” (IBDFAM, 2016, online).
Em processo julgado em 2015 pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, observa-se as seguintes considerações do julgador:
[...] questão envolvendo animais de estimação cujo destino, caso dissolvida sociedade conjugal é tema que desafia o operador. Semovente que, por sua natureza e finalidade, não pode ser tratado como simples bem, a ser hermética e irrefletidamente partilhado, rompendo-se abruptamente o convívio até então mantido com um dos integrantes da família. [...] mais do que isso, verifica-se que a presente demanda versa em suas 160 páginas, sobre o cachorrinho Dully, ressaltando-se o papel que ele representava para a entidade conjugal e o manifesto sofrimento causado ao apelante em decorrente de tal desalijo. (RIO DE JANEIRO, 2015)
Por não haver uma jurisprudência legal, muitos magistrados acabam recebendo casos e decidindo sem um devido amparo jurídico.
Essa mudança de paradigma fez com que um magistrado da Vara Cível de Joinville em Santa Catarina declinasse da competência em favor de uma das varas de família para decidir o conflito de posse e propriedade de uma cadelinha de nome “Linda” (IBDFAM, 2016).
Durante a realização do X Congresso Brasileiro de Direito de Família, foram aprovados os Enunciados Programáticos do Instituto Brasileiro de Direito de Família -IBDFAM, diretrizes para a criação da nova doutrina e jurisprudência em Direito de Família no Brasil. O Enunciado 11 reza que na ação destinada a dissolver o casamento ou a união estável, pode o juiz disciplinar a custódia compartilhada do animal de estimação do casal. (IBDFAM, 2015)
Conforme se verifica, em casos, os magistrados tem tomado decisões em favor ao animal pela jurisprudência como filhos que são considerados pelos seus donos, desta forma algumas lides já resolvidas servem de jurisprudência para as outras que acabam surgindo.
Portanto, conforme o que o tribunal já vem enfrentando diversas demandas referente à guarda de animais, e a frequência de casos de guarda é tamanha que em breve se terá precedentes diversos, que mostraram a necessidade da aprovação das leis arquivadas que resguardam o direito dos animais, buscando também harmonia nas famílias entre humanos e animais.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Levando em consideração aspectos sobre a família, é perceptível a sua evolução constante, onde na antiguidade os conceitos de famílias eram baseados no matrimonio e onde o divórcio era algo inviável, pois a igreja católica era muito presente nas decisões da sociedade.
Já na sociedade contemporânea, com a normalização do divórcio e a inclusão de animais de estimação nas famílias por afinidade, mostra que esta instituição tem se reinventado com o passar do tempo.
Com a aprovação da nova lei 1.095/2019 realizada pelo congresso nacional foi um pontapé inicial para olhar voltado aos cuidados dos maus tratos dos animais, onde já beneficiam e punem com maiores penas os agressores que os tratarem com violência.
Diversos países do mundo, já mudaram a classificação dos animais de estimação perante os seus códigos, vendo em consideração ao brasil que sofre um atraso de definição onde quando ocorre casos de dissoluções, faltam leis para pegar resolver com dispositivo legal.
Em virtude do estudo mencionado, os animais de estimação têm mostrado sua constante evolução no relacionamento com o homem. Onde no início da humanidade essa relação era baseada em interesses, e hoje ocorre mutualidade entre os dois seres, ou seja uma troca de carinho recíproca que melhora as condições de vida e tratamento de diversos animais, e que ajudam muitas pessoas em tratamentos de depressão, saúde ou até mesmo uma companhia, para vencer a solidão.
Dessa forma é necessário a implementação de novas leis que redijam sobre a tutela em casos de dissoluções e a caracterização do animal perante ao código civil, para que nas lides do judiciário, os magistrados sejam amparados pelas leis, que tanto fazem falta no judiciário.
Essa evolução dos animais se teve também pela evolução da família, que hoje tem os animais de estimação como integrantes importantíssimos e presentes. O crescimento do mercado de PETS vem trazendo inovações todos os dias, sendo de brinquedos, raçoes orgânicas e educadores de “necessidades”, onde fazem a satisfação do desejo consumista dos seus donos podem ser exercidos também nos seus “filhos”. Hotéis, creches e taxis para cachorros, já são realidade em várias capitais dos países e fazem parte dessa movimentação do comercio ascendente.
Portanto, esta relação de ser humano e animais de estimação, tem uma tendência de evoluir muito mais, onde hoje achamos que os animais já estão bem amparados, daqui alguns anos, podem ter muito mais direitos e estarem presentes com muito mais proporção do que tem hoje.
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[1] Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília. Professor de Direito da Faculdade Serra do Carmo. Advogado. E-mail: [email protected].
[2] PET: Animal de estimação. Termo de pronúncia americana e britânica, segundo o MACMILLAN DICTIONARY. Expressão bastante usada em placas, anúncios de lojas.
Bacharelando no curso de Direito na Faculdade Serra do Carmo. Experiência profissional na área de Direito, com ênfase em Direito de civil de família. Atuou como Estagiário no PROCON- Palmas e no escritório de advocacia privada na área da civil e trabalhista. Atualmente é estagiário na Procuradoria geral do município.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, Danillo Barros. Tutela de animais de estimação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 dez 2020, 04:05. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55814/tutela-de-animais-de-estimao. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Medge Naeli Ribeiro Schonholzer
Por: VAGNER LUCIANO COELHO DE LIMA ANDRADE
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