RESUMO: Em vista deste trabalho acadêmico, demonstraremos as causas de excesso da legitima defesa no âmbito da invasão domiciliar, através dos métodos de abordagem, como a técnica de dedução, tendo esta como definição clássica partir do contexto geral para a delimitação específica, isto é, averiguação do conhecimento geral aplicáveis a conjecturas concretas. Utilizaremos também ilustres autores que abordam o assunto (relacionando as fontes primárias e secundárias) e que arrolam ser um direito fundamental a legítima defesa no âmbito da invasão domiciliar, pois o Estado não é onipresente – em decorrência desta situação peculiar o Estado através do seu ordenamento jurídico permite que todo cidadão possa proteger seu bem jurídico tutelado, referindo-se a sua vida, sua integridade física e de terceiros e estendendo-se ao resguardo de seus bens materiais. Por meio dos ofendículos, o cidadão pode proteger seu domicílio de invasores, porém, importante frisar que os ofendículos devem ser instalados de maneira a repelir a invasão domiciliar, ou seja, não é tolerada a extrapolação deste direito visto que os ofendículos são considerados apenas de caráter defensivo.
PALAVRAS CHAVES: Excesso. Legítima defesa. Ofendículos.
ABSTRACT: In view of this academic work, we will demonstrate the causes of the excess of legitimate defense in the scope of home invasion, through the methods of approach, such as the deduction technique, having this as a classic definition from the general context for the specific delimitation, i.e., investigation of general knowledge applicable to concrete conjectures. We will also use distinguished authors who approach the subject (listing the primary and secondary sources) and who list legitimate defense as a home invasion as a fundamental right, as the State is not omnipresent - due to this peculiar situation, the State through its organization legal allows every citizen to protect your tutored legal asset, referring to your life, your physical integrity and that of others and extending the protection of your material assets. Through offendicles, the citizen can protect his home from invaders, however, it is important to emphasize that the offendicles must be installed in order to repel the home invasion, that is, the extrapolation of this right is not tolerated since the offendicles are considered only of defensive character.
KEY WORDS: Excess. Self-defense. Offendicles.
O presente estudo visa abordar sobre o uso excessivo da legítima defesa no âmbito da invasão domiciliar, em que o proprietário age para proteger seu bem jurídico tutelado, visto que nem sempre o Estado está presente para proteger efetivamente este bem, deixando a autodefesa como alternativa. No caso da invasão domiciliar temos como uma das alternativas o uso de ofendículos, e é a partir daí que veremos os limites impostos para que estes cidadãos possam realizar a proteção do seu bem jurídico, sem serem penalmente punidos.
É de conhecimento geral que a busca por objetos e serviços de proteção de segurança oferecidos no mercado tem aumentado bastante, pois passaram a ser considerados uma abordagem contemporânea de segurança - ao longo da década vem se expandindo em decorrência do crescimento da criminalidade, deixando, assim, como caminho para a autodefesa a utilização de meios para que, na ausência do Estado, a vítima possa repelir a injusta agressão sua ou de terceiros.
Através da metodologia de dedução (método que parti da abordagem do conhecimento geral para limitar um assunto específico) buscaremos trazer clareza ao assunto, tirar dúvidas sobre as eventuais punições em casos de excesso, e também sobre os limites impostos para utilização destes meios. Delimitaremos o assunto, a área da invasão domiciliar e suas consequências quando há a extrapolação dos limites impostos para emprego dos ofendículos (dispositivos estes que possuem caráter defensivo e não ofensivo).
Podemos entender que em sua ausência, o Estado oferece liberdade ao cidadão para buscar a proteção mais adequada, deixando claro o dever de obedecer à legislação que rege a utilização destas opções de defesa, portanto para evitar punições por excessos eventualmente cometidos na tentativa de se autoproteger.
Atualmente, a preocupação em relação ao aumento desenfreado da criminalidade no País é imensa, visto que o Estado se tornou ineficaz em conter tamanha expansão.
O estado não dispõe de condição onipresente e consequentemente isto deixa como possibilidade a autodefesa a cada cidadão, para que em sua ausência a vítima possa repelir a injusta agressão frente ao perigo iminente, em que não há tempo de solicitar socorro às autoridades competentes. Diante disto, podemos verificar o que diz JESUS (1998, p.247) a respeito de Legítima Defesa:
A noção jurídica de legítima defesa somente surgiu quando o Estado reclamou para si o castigo do autor em face da prática de uma ofensa pública ou privada. Somente aí é que se iniciou o processo evolutivo do direito de punir e do direito de liberdade: de um lado, o magistério estatal punitivo como forma de repressão ao deleito; de outro, a legítima defesa exercida por qualquer particular injustamente vítima de agressão.
Segundo Andrade e Gregório (2008, p.70) entende-se que:
A legítima defesa é a subtração, do mundo do ilícito, da conduta do agente que, dentro dos limites do razoável, vai ofender direitos de outrem, para evitar uma lesão (...) que se encontra a ser feita por este último, seja quanto aos interesses protegidos do agente, seja quanto a interesses protegidos de terceiro, lesão essa para a qual o agente de modo algum tenha contribuído.
Devemos observar também o que é reconhecido como injusta agressão, pois a ação deve ser comprovadamente “ilícita”, a este respeito ESTEFAN (2010, p.251/252) dispõe:
Injusta é a agressão ilícita (não precisa ser criminosa). A injustiça da agressão deve ser apreciada objetivamente; significa dizer que não importa saber se o agressor tinha ou não consciência da injustiça do seu comportamento. Sendo ilícita sua conduta, contra ela caberá a defesa necessária. Assim, por exemplo, encontrar-se-á em legítima defesa aquele que agredir uma pessoa para evitar ser vítima de um crime.
É evidente que nem sempre há tempo suficiente para solicitar o socorro, sendo assim; a vítima age de forma espontânea, podendo cometer excessos na sua autodefesa, pois em muitos casos esta não possui os conhecimentos técnicos que uma autoridade competente detém. Desta forma, podemos analisar o entendimento de CARVALHO (2006, p. 185):
(...) é metodologicamente exigível que, antes da caracterização dos pressupostos ou elementos da acção de legítima defesa, se definam, com rigor, os elementos caracterizadores da situação de legítima defesa; pois que o âmbito e os limites da acção de defesa dependem da caracterização da situação de legítima defesa: esta é, digamos, a ”causa”, sendo aquela um efeito ou consequência possível.
É de entendimento geral que ninguém pode adentrar a residência alheia sem o consentimento do proprietário, caso contrário este violará o direito de propriedade. A Constituição Federal de 1988 em seu Art. 5°, reconhece que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros ou estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Segundo a compreensão de PRADO (2007), a legítima defesa é definida como:
A repulsa ou o impedimento da agressão ilegítima, atual ou iminente, pelo agredido ou terceira pessoa, contra o agressor, sem ultrapassar a necessidade de defesa e dentro do racional proporção dos meios empregados para impedi-la ou repeli-la.
No meio dessa imensa seara de estudos, Roxin (2004, p.200), destaca que:
(...) o nosso direito de legítima defesa não exige, em princípio, proporcionalidade de valores entre o dano que se pretende afastar e aquele que se provoca, autorizando também a produção de um dano não proporcional no agressor, sempre que ele seja <<necessário>> para a defesa – isto é, quando a agressão só podia afastar-se dessa maneira – baseia-se, em simultâneo, nos princípios de proteção e de defesa do direito.
Diante do conhecimento dos renomados autores citados até aqui, podemos depreender que a legítima defesa só é válida para repelir uma injusta agressão que seja atual e iminente, usando os meios necessários de forma moderada conforme explica YURI COELHO (2015, p. 205):
A agressão atual é a existente no momento em que a vítima está com uma ação agressiva sendo perpetrada contra ela, não é agressão passada nem futura, é a do momento presente e não se confunde também com a iminente, que provém de uma probabilidade forte de acontecimentos, está prestes a acontecer, mas ainda não teve seu desencadeamento, está no limiar. É o momento mais próximo da ação lesiva contra o bem jurídico sem ser o momento atual. A agressão pode ser representada por uma situação em que o agente está deferindo golpes de faca no agredido e este, em reação proporcional, golpeia o agressor com uma pedra que alcançou com as mãos, fazendo assim a ação agressiva.
1.1 Excesso na Legítima Defesa
O Excesso na Legítima Defesa, nada mais é que o exagero praticado pela vítima ao enfrentar um momento de injusta agressão, isto é, a vítima ao se defender acaba se excedendo e revidando de maneira desproporcional o injusto ataque sofrido. O excesso também previsto no Código Penal (1940) em seu art. 23, Parágrafo único – “O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo”. Vejamos também a opinião de GERRERO (1997, p. 105) a respeito do excesso:
O excesso da legítima defesa que consiste não em exceder os limites objetivos da defesa, que se consubstanciam na necessidade racional do meio de defesa, mas ser ter dado causa às circunstâncias que determinam a agressão de que o defendente é vítima.
Devemos nos atentar também sobre a existência ou não do excesso de legítima defesa e diante disso Carvalho (1995) dispõe que:
A decisão sobre a existência (ou não) de excesso não pode deixar de atender à globalidade das circunstâncias concretas em que o agredido se encontra, nomeadamente, a situação de surpresa e de perturbação que a agressão normalmente constitui, a espécie de agressor e os meios agressivos, de que dispões, bem como as capacidades e os meios de defesa de que o agredido se pode socorrer.
Diante disto, podemos entender que antes mesmo de cometer o excesso, deveremos estar de fato em uma ação de Legítima Defesa, onde a injusta agressão deve ser real e iminente e os meios utilizados para repelir esta injusta agressão devem ser usados moderadamente e o menos ofensivo possível, pois ao transcender essas limitações, poderá responder criminalmente pelo excesso cometido. Sobre isso, Hermes Guerreiro explana:
Pode-se afirmar que, no Direito Penal, o excesso é um instituto sem vida autônoma, pois é ele funcionalmente vinculado à configuração de uma situação. Na qual se identifique uma causa de justificação. Assim, surge o excesso quando o agente, ao versar numa causa de exclusão de ilicitude, viola os requisitos exigidos em lei, ultrapassando as fronteiras de permitido. (1997, p. 53).
Segundo a legislação, o Excesso na Legítima Defesa pode ser considerado na esfera penal como culposo ou doloso, podendo ainda ser classificado como excesso intensivo (ocorre no momento da injusta agressão), ou excesso extensivo (ocorre no momento em que a injusta agressão fora cessada).
Sobre este tipo de excesso, podemos considerar a excludente dada pelo próprio Código Penal (1940) em seu artigo 18, inciso II. O mesmo deve ser considerado quando a vítima age por imperícia, negligência ou imprudência, isto é, se a vítima age de maneira inconsciente, e acaba ultrapassando os limites da legítima defesa apenas por desleixo de forma não pretendida, caracteriza-se o excesso culposo:
Art. 18 - Diz-se o crime:
Crime doloso
I - doloso, quando o agente quis o resultado ou assumiu o risco de produzi-lo;
Crime culposo
II - culposo, quando o agente deu causa ao resultado por imprudência, negligência ou imperícia.
Na visão de LEITE (2013, p. 47):
O excesso culposo ocorre quando o agente queira um resultado necessário, proporcional, mas o excesso provém de sua desatenção, assim, o agente respondera por um crime culposo apenas pelo resultado ocorrido em decorrência do excesso, se previsto em lei.
Diferentemente da linha de raciocínio do autor supracitado, Zaffaroni e Pierangelli (2002, p. 597), dispõe da seguinte forma sobre o excesso culposo:
A única explicação plausível para o chamado, “excesso culposo” é o de que se trata de uma ação dolosa, mas que, aplicando-se a regra da segunda parte do §1° do artigo 20, a lei lhe impõe a pena do delito culposo. Em face da definição de dolo do artigo 18, não se pode dizer jamais que, para a nossa lei, o chamado “excesso culposo” seja uma conduta culposa, e sim que o “culposo”, no máximo, seria o excesso, mas nunca a ação que causa o resultado, posto que, a se admitir o seu caráter culposo, se estaria incorrendo numa flagrante contradição intra legem.
No caso do excesso culposo, a vítima responderá pelo excesso cometido, isto é, responde pelo que ocorreu após cessar a injusta agressão sofrida, pois o excesso não exclui a qualidade de vítima (legítima defesa).
Assim dispõe Estefam, André (2018, p.317):
b) não intencional ou involuntário, o qual se dá quando o sujeito, por erro na apreciação da situação fática, supõe que a agressão ainda persiste e, por conta disso, continua reagindo sem perceber o excesso que comete. Se o erro no qual incorreu for evitável (isto é, uma pessoa de mediana prudência e discernimento não cometeria o mesmo equívoco no caso concreto), o agente responderá pelo resultado a título de culpa, se a lei previr a forma culposa (“excesso culposo”).
O “dolo” é previsto no Código Penal (1940), no art. 18, I, e difere do culposo, pois este decorre da vontade, do querer e é praticado voluntariamente pelo agente, isto é, mesmo após a cessação da injusta agressão, a vítima decide prosseguir e ultrapassar os limites impostos e acaba por exceder-se em sua ação.
E ao contrário da culpa, o dolo pode descaracterizar a legítima defesa, podendo responder pelo crime praticado de forma mais gravosa. Todavia, o dolo passará a ser caracterizado somente após a prática do excesso, sendo os atos anteriores a ela considerados ainda legítima defesa.
Neste sentido dispõe Estefan, André (2018, p.317) da seguinte forma:
a) intencional ou voluntário, quando o agente tem plena consciência de que a agressão cessou e, mesmo assim, prossegue reagindo, visando lesar o bem do agressor; nesse caso, o agente responderá pelo resultado excessivo a título de dolo (é o chamado “excesso doloso”);
Seguindo a mesma linha de pensamento, René Ariel Dotti (2004) elucida que:
“O excesso é doloso quando o agente quer ou assume o risco de produzir o resultado contrário ao Direito, quer empregando meios desnecessários para resolver a situação de perigo ou de conflito, quer usando-os imoderadamente”.
Finalizando o raciocínio a respeito do excesso doloso, CAPEZ explica que:
Excesso doloso ou consciente ocorre quando o agente, ao se defender de uma injusta agressão, emprega meio que sabe ser desnecessário ou, mesmo tendo consciência de sua desproporcionalidade, atua com imoderação.
O excesso intensivo está devidamente ligado à legítima defesa, de forma que este ocorre no momento em que a vítima repele a injusta agressão, porém passa a agir de forma descontrolada e desproporcional, mesmo após ter atenuado a injusta agressão. Conforme CARVALHO esclarece (2006, p. 345), “(...) o defendente ultrapassa os limites da intensidade da acção de defesa (...)”.
O excesso extensivo ocorre após a cessação da injusta agressão, isto é, a vítima obteve êxito em fazer cessar a situação de perigo seguindo os parâmetros e limites estipulados pela legítima defesa, porém, após ter o controle da situação, a vítima dá continuidade à conduta, mesmo não se fazendo mais necessário, passando assim a cometer um crime (fato típico, ilícito e culpável). A este respeito TELES (1998: 254) ressalta que “a repulsa continua após cessada a agressão, quando a defesa se prolonga além da actualidade da agressão”.
A vítima que reage a injusta agressão para proteger seu patrimônio ou sua vida não necessariamente necessita ter conhecimentos técnicos específicos, porém deve ter consciência dos seus limites ao agir em legítima defesa própria ou de outrem, ciente da circunstância e tendo a certeza de que não seria possível a presença do Estado para garantir a integridade do bem jurídico ora violado. Com o célere aumento da criminalidade na atual conjuntura, são imprescindíveis as demais alternativas de serviços de proteção e segurança oferecidos por empresas privadas especializadas e também a busca por objetos que possam sanar a lacuna de proteção deixada pelo Estado. O Estado é o ente posto para dar proteção a seus cidadãos, não importando raça, cor, idade, sexo, religião e nem a nacionalidade, todavia, nem sempre há tempo suficiente para solicitar qualquer tipo de socorro de autoridades competentes, pois o Estado não consegue se fazer presente a todo momento e em todos os lugares e quando esse tipo de situação ocorre, ficam apenas alternativas ao proprietário para que este faça sua autodefesa e a partir daí, veremos os limites impostos para que estes cidadãos possam realizar a proteção do seu bem, sem serem penalmente punidos.
2 CONSEQUÊNCIAS DO EXCESSO DA LEGÍTIMA DEFESA NO AMBITO DA INVASÃO DOMICILIAR
Em nosso ordenamento jurídico, brasileiros e estrangeiros residentes no país tem direito à propriedade e a segurança, portanto as empresas de segurança patrimonial possuem agentes profissionais que dispõe de conhecimentos técnicos mais aprofundados que o cidadão comum não possui, quer seja o conhecimento de defesa pessoal básico ou avançando sobre proteção pessoal ou de propriedade particular, e nestes casos o conhecimento técnico faz toda a diferença para cessar uma situação de perigo atual ou iminente. Contudo, a maioria dos cidadãos não possui esse tipo de conhecimento, o que acarreta na extrapolação dos meios de autodefesa, de salvaguarda a serem utilizados, tornando o simples fato de se protegerem em uma transgressão da lei penal (crime), isto é, a vítima pode vir a responder pelo excesso cometido, podendo ser considerado excesso doloso, culposo, intensivo ou extensivo, conforme estudado anteriormente.
Diante disto, deveremos nos atentar aos limites impostos pela legislação local ou pela geral, para que assim possam ser evitadas consequências negativas para quem se utiliza destes meios de defesa e proteção patrimoniais empregados para repelir a invasão domiciliar.
2.1 Da Utilização de Arma de Fogo de Posse Legítima.
A utilização de arma de fogo de posse legítima com o fim de repelir uma invasão domiciliar, pode acarretar em uma série de contratempos ao possuidor da arma, pois mesmo dispondo da posse o mesmo pode vir a sofrer com processos criminais decorrentes do mal uso ou do seu uso em excesso.
Diante do assunto, podemos analisar a observação realizada por TOLEDO:
Ocorre o excesso quando o agente, ao se defender de uma injusta agressão, emprega meio desproporcionadamente desnecessário (exemplo: depois do primeiro tiro que fere e imobiliza o agressor, prossegue na reação até sua morte). Esse excesso será doloso quando o agente consciente e deliberadamente vale-se da situação vantajosa de defesa em que se encontra para, desnecessariamente, infligir ao agressor uma leão mais grave do que a necessária e possível, impelido por motivos alheios à legítima defesa (ódio, vingança, perversidade e assim por diante).
Diante deste fato, visando proporcionar segurança jurídica ao cidadão possuidor de arma de fogo, foi elaborada a PL 2.865/2019, com o intuito de excluir a ilicitude em casos que o possuidor agir em legítima defesa sua ou de terceiros, em casos de invasão domiciliar ou de propriedade.
Podemos analisar abaixo, trecho que seria modificado nos artigos 23 e 25 do Decreto-Lei n° 2.848, de 7 de dezembro de 1940 caso a proposta da PL. 2.865/2019 seja aprovada.
“Exclusão de ilicitude”
Art. 23
Excesso punível
§ 1° O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.
§ 2° O juiz poderá reduzir a pena até a metade ou deixar de aplica-la se o excesso decorrer de escusável medo, surpresa ou violenta emoção.” (NR)
“Legítima defesa”
Art. 25
Legítima defesa domestica
Parágrafo único. Considera-se ainda em legítima defesa quem, na situação prevista pelo art. 150 deste Código, desde que legitimamente presente em algum dos locais indicados, usar arma de posse legítima ou outro meio adequado de defesa para prevenir agressão:
I – à própria incolumidade ou a de outrem,
II – à própria propriedade ou a de outrem, se houver iminente risco de agressão.” (NR)
2.3 Dos Mecanismos de Defesa Predispostas
Os mecanismos de defesa predispostos, popularmente conhecidos como (armadilhas), ao contrário dos ofendículos não são facilmente notados e tem sua lesividade elevada se comparada a eles, podendo em alguns casos levar a pessoa atingida a óbito.
Assim, CAPEZ (2008, p.296) nos ensina:
Defesa mecânica predisposta são aparatos ocultos com a mesma finalidade que os ofendículos. Por se tratar de dispositivos não perceptíveis, dificilmente escaparão do excesso, configurando, quase sempre, delitos dolosos ou culposos. É o caso do sitiante que instala uma tela elétrica na piscina, de forma bastante discreta, eletrocutando as crianças que a invadem durante a semana. Responderá por homicídio doloso. É também a hipótese do pai que instala dispositivo ligando a maçaneta da porta ao gatilho de uma espingarda, objetivando proteger-se de ladrões, mas vem a matar a própria filha. Trata-se aqui de infração culposa, provavelmente beneficiária de um perdão judicial.
2.4 Ofendículos
O ordenamento jurídico brasileiro garante proteção aos seus cidadãos e na sua ausência esta proteção é respaldada pela legislação, por intermédio da utilização dos meios disponíveis para defesa do seu patrimônio e de sua vida. Estes meios, por sua vez conhecidos como ofendículos ou ofensáculas, vão desde o uso de cães de guarda, gargalos de garrafas de vidro e pontas de lanças colocadas no muro, o emprego de fio elétrico na maçaneta da porta e em cercas, cercas elétricas nos muros, alarmes que disparam e automaticamente travam as portas, cerca de concertina, etc., portanto todos estes são meios de proteção legalmente permitidos.
Conforme o artigo 5° da Constituição Federal de 1988, a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem o consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou durante o dia, por determinação judicial.
Portanto ao entrar em uma propriedade particular sem o consentimento do proprietário, o indivíduo primeiramente estará invadindo o local de maneira ilícita, portanto é este considerado invasor, estando a cometer grave violação à privacidade de terceiro, e por este motivo o uso dos recursos de defesa “ofendículos” são considerados excludente de ilicitude.
Cláber Masson (2014, p. 187) ressalta de maneira sucinta o conceito dos ofendículos e as 02 (duas) doutrinas acerca da espécie de excludentes caracterizadas pelos ofendículos:
Ofendículas: Também chamadas de ofendículos ou ofensáculas, têm origem nos práticos do Direito que utilizaram a palavra para indicar a prevenção de qualquer ordem apta para ofender. Apontam-se comumente alguns engenhos mecânicos, como o arame farpado, a cerca elétrica e cacos de vidro sobre muros. Cuida-se de meios defensivos utilizados para a proteção da propriedade e de outros bens jurídicos, tais como a segurança familiar e a inviolabilidade do domicílio. O titular do bem jurídico prepara previamente o meio de defesa, quando o perigo ainda é remoto e incerto, e o seu funcionamento somente se dá em face de uma agressão atual ou iminente. Devem ser visíveis: funcionam como meio de advertência, e não como forma oculta para ofender terceiras pessoas. Há duas posições em doutrina acerca da espécie de excludente configurada pelas ofendículas: 1) Sebastián Soler, Vicenzo Manzini, Giuseppe Bettiol e Aníbal Bruno se filiam à tese que sustenta tratar-se de exercício regular de direito. Nesse sentido, é importante destacar o art. 1.210, § 1º, do Código Civil: “O possuidor turbado, ou esbulhado, poderá manter-se ou restituir-se
por sua própria força, contanto que o faça logo; os atos de defesa, ou de desforço, não podem ir além do indispensável à manutenção, ou restituição da posse”; 2) José Frederico Marques, Magalhães Noronha e Costa e Silva situam o assunto como legítima defesa preordenada, alegando o último que, se o aparelho está disposto de modo que só funcione no momento necessário e com a proporcionalidade a que o proprietário era pessoalmente obrigado, nada impede a aplicação da legítima defesa.
No entendimento do ilustre Inellas (2001 apud DA SILVA, 2006, p.72) “defesas mecânicas ou na designação latina, offendicula, são obstáculos, impedimentos, meios preventivos, para defender o domicílio, a propriedade e o patrimônio, de ataques e de ameaças”.
Seguindo o mesmo raciocínio, PRADO (2012, p. 454) destaca:
Os meios ou obstáculos instalados para a defesa de bens jurídicos individuais, especialmente da propriedade – ofendículo (offendiculum) -, em sentido estrito, que impõem um empecilho ou resistência normal, conhecida e notória, como uma estática advertência (v.g., pregos ou cacos de vidro no muro, arame farpado, grades pontiagudas, plantas espinhosas [...].
Após qualquer instalação ou a utilização dos ofendículos para proteger a residência, o morador deve averiguar uma forma de dispor de um alerta com visibilidade suficiente para que seja informada e notada a utilização do ofendículo empregado para proteção do bem jurídico, sendo imprescindível a mensagem de perigo e o dano que o ofendículo pode causar, caso haja alguma violação domiciliar não permitida pelo proprietário.
Desta forma, Ney Moura Teles explica:
“(...) o correto é dizer que, quando da instalação e da preparação dos mecanismos de defesa, o proprietário age no exercício regular do direito de propriedade. Se o mecanismo funciona, repelindo uma agressão injusta do que tenta invadir a propriedade, trata-se, à evidencia, de legítima defesa, desde que os demais requisitos sejam observados”.
Levando em consideração o crescimento das transgressões que estão ocorrendo, entende-se que é imprescindível o aproveitamento desses ofendículos, pois além de terem a função da proteção patrimonial, podem ser utilizados para proteger a integridade física própria ou a de terceiros, sendo aplicados sempre com a finalidade de proteção e em concordância com o ordenamento jurídico brasileiro, que explana sua utilização e seus requisitos básicos após sua instalação. A instalação dos ofendículos deve, em regra, obedecer à lei municipal ou estadual que estabelece os limites para sua utilização e no caso de inexistência desta, deve-se seguir o que indica a Lei n°13.477, de 30 de agosto de 2017, in verbis, que dispõe sobre utilização e limites para o uso dos ofendículos para a proteção da integridade física, propriedade ou residência, sempre observando a moderação em sua utilização:
Art. 1º Esta Lei estabelece os cuidados e procedimentos que devem ser observados na instalação de cerca eletrificada ou energizada em zonas urbana e rural.
Art. 2º As instalações de que trata o art. 1º deverão observar as seguintes exigências:
I – o primeiro fio eletrificado deverá estar a uma altura compatível com a finalidade da cerca eletrificada;
II – em áreas urbanas, deverá ser observada uma altura mínima, a partir do solo, que minimize o risco de choque acidental em moradores e em usuários das vias públicas;
III – o equipamento instalado para energizar a cerca deverá prover choque pulsativo em corrente contínua, com amperagem que não seja mortal, em conformidade com as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT);
IV – deverão ser fixadas, em lugar visível, em ambos os lados da cerca eletrificada, placas de aviso que alertem sobre o perigo iminente de choque e que contenham símbolos que possibilitem a sua compreensão por pessoas analfabetas;
V – a instalação de cercas eletrificadas próximas a recipientes de gás liquefeito de petróleo deve obedecer às normas da ABNT.
Art. 3º Sem prejuízo de sanções penais e civis pelo descumprimento dos procedimentos definidos nesta Lei, é estabelecida a penalidade de multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para o proprietário do imóvel infrator, ou síndico, no caso de área comum de condomínio edilício, e de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para o responsável técnico pela instalação.
O presente estudo científico abordou as questões pertinentes ao excesso da legítima defesa no âmbito da invasão domiciliar. Através da pesquisa de autores renomados que discorrem sobre o assunto supracitado, a principal função deste estudo foi identificar alguns tópicos específicos em que o ordenamento jurídico brasileiro permite para que o cidadão possa, através de artefatos e objetos, fazer uso da sua autodefesa, sua e de seu patrimônio, com moderação e obedecendo os limites impostos pela legislação em sua utilização. Visto que é de conhecimento geral que o Estado deve dar proteção aos seus cidadãos, podemos verificar diante do aumento desenfreado da criminalidade que este ente se tornou ineficaz, razão pela qual permite várias possibilidades de autodefesa.
Assim, obtivemos conhecimentos das alternativas de autodefesa como a utilização dos ofendículos (os arames ásperos, cercas de ferro com pontas aguçadas, estilhaços de vidros no muro, circuito elétrico, os cães de guarda etc.), que tem caráter defensivo e podem ser utilizados de forma moderada e sempre acompanhada de mensagem visível, que deve ser disponibilizada logo após sua instalação, para que sejam informados os riscos ao serem ultrapassados. Dada importância do assunto abordado, pudemos aprender mais sobre as consequências do uso desenfreado das ações praticadas pelo cidadão para repelir a injusta agressão praticada pelo invasor e também tomar conhecimento sobre as possíveis penas que podem sem impostas ao proprietário, que responderá pelo resultado produzido a título de culpa ou dolo, respondendo apenas pelo excesso cometido em caso de culpa.
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Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário CEUNI-FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: TAVEIRA, ELIM CABRAL. Excesso da legítima defesa no âmbito da invasão domiciliar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 dez 2020, 04:10. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55832/excesso-da-legtima-defesa-no-mbito-da-invaso-domiciliar. Acesso em: 23 dez 2024.
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