A estabilidade do servidor público constitui uma prerrogativa de índole constitucional que garante ao ocupante a permanência no cargo, só podendo, a priori, dele ser desligado em virtude de sentença judicial transitada em julgado, mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla defesa, ou em razão de não aproveitamento em procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei complementar.
A estabilidade do servidor público, em síntese, pode decorrer de duas situações:1 - do cumprimento dos requisitos legais do estágio probatório após três anos de efetivo exercício, para os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo em virtude de aprovação em concurso público, na forma do artigo 41 da Constituição Federal; 2 – ou, de forma excecional, em decorrência do artigo 19 do Atos das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT, que assegura essa garantia aos servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta, autárquica e fundacional, em exercício na data da promulgação da Constituição há pelo menos cinco anos continuados e que não tenham sido admitidos por concurso público.
Então, antes de mais nada, é preciso perceber que estabilidade e efetividade não se confundem. Enquanto a estabilidade é a garantia de permanecia no serviço público, aplicável tanto aos servidores efetivos, que se submeteram a concurso público, quanto aos que se enquadram nos requisitos do artigo 19 do ADCT, conhecidos como meramente estabilizados, a efetividade constitui atributo inerente ao cargo que permite a seu ocupante desfrutar das garantias, direitos e prerrogativas do cargo público, sendo conferida apenas aos servidores investidos através de concurso público, na forma do artigo 37, II, da Constituição Federal. Neste sentido, o próprio Supremo Tribunal Federal, atendo a esta distinção, adotou a linha conceitual no sentido de entender a efetividade como atributo do cargo, designando o funcionário desde o instante da nomeação, ao passo que estabilidade corresponde à aderência, integração no serviço público, depois de preenchidas determinadas condições fixadas em lei, e adquirida pelo decurso de tempo, conforme se vê do julgado abaixo ementado:
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO PARANÁ: § 2º DO ART. 35. LEI ESTADUAL Nº 10.219, DE 21 DE DEZEMBRO DE 1992: ART. 70, § 2º. SERVIDORES PÚBLICOS ORIUNDOS DO REGIME CELETISTA: CONTAGEM DO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO AO ESTADO: EFETIVIDADE E ESTABILIDADE: DISTINÇÃO. 1. Não afronta o princípio da iniciativa prevista no art. 61, § 1º, inciso II, alínea "c", da Constituição Federal, a norma da Carta Estadual que, exceto para fins de aposentadoria e disponibilidade, permite o cômputo do tempo de serviço prestado ao Estado para os demais efeitos legais. 2. Efetividade e estabilidade. Não há que confundir efetividade com estabilidade. Aquela é atributo do cargo, designando o funcionário desde o instante da nomeação; a estabilidade é aderência, é integração no serviço público depois de preenchidas determinadas condições fixadas em lei, que se adquire pelo decurso de tempo. Precedente: RE nº 167.635. 3. O servidor que preenchera as condições exigidas pelo art. 19 do ADCT-CF/88 é estável no cargo para o qual fora contratado pela Administração Pública, mas não é efetivo. Por isso não se equipara ao servidor público efetivo no que concerne aos efeitos legais que dependam da efetividade. 4. Pedido de liminar deferido, em parte.
(ADI 1695 MC, Relator(a): MAURÍCIO CORRÊA, Tribunal Pleno, julgado em 30/10/1997, DJ 07-08-1998 PP-00019 EMENT VOL-01917-01 PP-00098)
Nestes termos, em premissa, é preciso perceber que os servidores estabilizados na forma do artigo 19 do ADCT não são considerados servidores efetivos, embora, no que toca especificamente à estabilidade, desfrutem das mesmas garantias concedidas aos servidores efetivos, com a ressalva apenas para situação excepcional da possibilidade da perda do cargo do servidor estável para atendimento aos limites de despesa de pessoal, na forma do artigo 169 da Constituição Federal. Neste ponto, acaso as medidas de redução de gastos indicadas na Constituição não sejam suficientes para assegurar o cumprimento da determinação da Lei de Responsabilidade Fiscal, o servidor estável poderá perder o cargo, todavia, esta possibilidade volta-se apenas para o servidor estabilizado na forma do artigo 19 do ADCT, em razão do que dispõe o artigo 33 da Emenda Constitucional 19/1998, nos termos seguintes:
Art. 33. Consideram-se servidores não estáveis, para os fins do art. 169, § 3º, II, da Constituição Federal aqueles admitidos na administração direta, autárquica e fundacional sem concurso público de provas ou de provas e títulos após o dia 5 de outubro de 1983.
Entretanto, não obstante gozem de estabilidade, os servidores enquadrados na situação do artigo19 do ADCT não são detentores dos demais direitos previstos para os servidores efetivos.
Neste toar, tendo em vista que os servidores públicos detentores da estabilidade excepcional do artigo 19 do ADCT não se confundem com servidores efetivos, aprovados em concurso público, a eles não se estendem os direitos estatutários privativos dos servidores efetivos, tendo eles apenas o direito de permanecerem no serviço público nos cargos em que foram admitidos. Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal, inclusive, sedimentou entendimento no sentido de que os servidores meramente estabilizados não podem ser enquadrados nos regimes próprios de previdência social, destinados tão somente os servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações, conforme se vê do julgado abaixo ementado:
EMENTA Agravo regimental no recurso extraordinário com agravo. Administrativo. Servidores públicos detentores da estabilidade excepcional do art. 19 do ADCT. Inclusão no regime próprio de previdência social. Impossibilidade. Precedentes. 1. Os servidores abrangidos pela estabilidade excepcional prevista no art. 19 do ADCT não se equiparam aos servidores efetivos, os quais foram aprovados em concurso público. Aqueles possuem somente o direito de permanecer no serviço público nos cargos em que foram admitidos, não tendo direito aos benefícios privativos dos servidores efetivos. 2. Conforme consta do art. 40 da Constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 42/2003, pertencem ao regime próprio de previdência social tão somente os servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações. 3. Agravo regimental não provido. 4. Majoração da verba honorária em valor equivalente a 10% (dez por cento) do total daquela já fixada (art. 85, §§ 2º, 3º e 11, do CPC), observada a eventual concessão do benefício da gratuidade da justiça.
(ARE 1069876 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 27/10/2017, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-257 DIVULG 10-11-2017 PUBLIC 13-11-2017)
Na mesma linha de raciocínio, o Supremo Tribunal Federal também firmou posicionamento no sentido de que os servidores estabilizados por força do artigo 19 do ADCT não podem ser incorporados nas carreiras do funcionalismo público, não tendo direito à progressão funcional ou a desfrutar de benefícios que sejam privativos de seus integrantes, conforme se vê do julgado abaixo:
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. INTERPOSIÇÃO EM 13.9.2017. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. ESTABILIDADE. ART. 19 DO ADCT. PROGRESSÃO NA CARREIRA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. 1. O Supremo Tribunal Federal tem entendimento de que o servidor estável, nos termos do art. 19 do ADCT, não é efetivo, possuindo somente o direito de permanência no serviço público no cargo em que fora admitido, porém sem incorporação na carreira, não tendo direito a progressão funcional nela, ou a desfrutar de benefícios que sejam privativos de seus integrantes. 2. Agravo regimental a que se nega provimento, com previsão de aplicação da multa prevista no art. 1.021, § 4º, do CPC. Verba honorária majorada em ¼ (um quarto), nos termos do art. 85, § 11, do CPC, devendo ser observados os §§ 2º e 3º do referido dispositivo.
(ARE 981424 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 18/12/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-029 DIVULG 12-02-2019 PUBLIC 13-02-2019)
Nestes termos, no que tange ao funcionalismo público, é possível perceber que os conceitos de efetividade e estabilidade são distintos. Enquanto a estabilidade é a garantia de permanecia no serviço público, aplicável tanto aos servidores efetivos concursados quanto aos que se enquadram nos requisitos do artigo 19 do ADCT, conhecidos como meramente estabilizados, a efetividade constitui o atributo do cargo que permite a seu ocupante desfrutar das garantias, direitos e prerrogativas do cargo público, sendo conferida apenas aos servidores que ingressaram no serviço público através de concurso público, na forma do artigo 37, II, da Constituição Federal.
Assim, é de se concluir que os servidores detentores da estabilidade excepcional do artigo 19 do ADCT, por não serem efetivos, não compartilham do mesmo regime jurídico funcional que rege os servidores públicos ocupantes de cargos efetivos, possuindo somente o direito de permanência no serviço público nos cargos em que foram admitidos.
Referências
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29ª ed., São Paulo: Ed. Malheiros, 2004.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 17ª ed., São Paulo: Malheiros, 2004.
PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito Administrativo. 18ª ed., São Paulo: Ed. Atlas, 2005.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 23ª ed., São Paulo: Ed. Malheiros, 2004.
Procurador do Estado de Alagoas, ex-Procurador do Estado de Pernambuco, ex-Analista Judiciário do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, Pós-Graduado em Direito Público pela Universidade do Sul de Santa Cataria, Pós-Graduado em Direito Administrativo e Direito Processual Civil pela Universidade Anhanguera-Uniderp.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEDROSA, Danilo França Falcão. O regime jurídico dos servidores estabilizados na forma do artigo 19 do ADCT Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 dez 2020, 04:11. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55858/o-regime-jurdico-dos-servidores-estabilizados-na-forma-do-artigo-19-do-adct. Acesso em: 23 dez 2024.
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