Resumo: A Lei Nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, mais conhecida como Estatuto do Desarmamento, foi aprovada com vistas à redução do número de armas de fogo em circulação e, consequentemente, dos elevados índices de violência decorrentes da sua comercialização. O conteúdo previsto em seu artigo 35 foi, justamente, o que motivou a alcunha de Estatuto do Desarmamento e, caso estivesse vigente, marcaria a nação pelo fim da produção e comercialização de armas no Brasil – situação que atingiria toda a população civil, exceto os CACs (Colecionadores, atiradores e caçadores registrados perante o Exército Brasileiro). No entanto, uma vez que o dispositivo em comento foi invalidado pelo Referendo Popular de 2005, as demais disposições da Lei permanecem em vigor até hoje e, apesar de não proibirem o comércio de armas de fogo, dificultam em muito os procedimentos de aquisição e registro (ou renovação de registro) e quase inviabilizam a autorização de sua posse. Diante do presente exposto, este estudo tem por escopo analisar se a política do desarmamento tem salvaguardado o direito de defesa dos interesses do cidadão civil para a posse de armas de fogo, verificando o papel do Estado regulador e a sua intervenção direta na segurança pública e na vida das pessoas, afetando o direito do cidadão à legítima defesa, tendo como base à proteção à vida, à liberdade e à segurança, amplamente assegurados na Constituição Federal e no Código Penal brasileiro, após as restrições trazidas pela promulgação da Lei Nº 10.826/2003.
Palavras-chave: Posse. Arma de fogo. Estatuto do Desarmamento.
Abstract: Law No. 10,826, of December 22, 2003, better known as the Disarmament Statute, was approved with a view to reducing the number of firearms in circulation and, consequently, the high levels of violence resulting from their commercialization. The content provided for in Article 35 was precisely what motivated the nickname of the Disarmament Statute and, if it were in force, would mark the nation for the end of arms production and commercialization in Brazil - a situation that would affect the entire civilian population, except CACs (Collectors, snipers and hunters registered with the Brazilian Army). However, since the provision under review was invalidated by the Popular Referendum of 2005, the remaining provisions of the Law remain in force today and, although they do not prohibit the trade in firearms, they make the acquisition and registration procedures very difficult. (or renewal of registration) and almost make authorization of possession impossible. In view of the foregoing, this study aims to analyze whether the disarmament policy has safeguarded the right to defend the interests of civilians for the possession of firearms, verifying the role of the regulatory State and its direct intervention in public security and in people's lives, affecting the citizen's right to self-defense, based on the protection of life, freedom and security, which are widely guaranteed in the Federal Constitution and the Brazilian Penal Code, after the restrictions brought about by the enactment of Law No. 10,826 / 2003.
Keywords: Possession. Fire Gun. Disarmament Statute.
INTRODUÇÃO
A discussão acerca da posse de armas de fogo vem se intensificando ao longo dos anos, especialmente, em decorrência dos elevados índices criminológicos relacionados a esses artefatos, ocupando um espaço significativo nos principais meios de comunicação no País.
Muito se tem questionado se é conveniente, para a população, a autorização do uso de armas de fogo para os civis sem antecedentes criminais, para fins de autodefesa pessoal e patrimonial, principalmente após as declarações proferidas pelo atual presidente em exercício, que fez do tema um dos seus carros-chefes durante o período eleitora, em um cenário em que significativa parcela da população nacional vivencia extrema sensação de insegurança e clama pelo direito de estar armado.
De um lado estão os que defendem a adoção de medidas mais rigorosas para o comércio, a posse e o porte de armas de fogo e, de outro, estão os que professam o direito do “cidadão de bem” de possuir armas de fogo como forma de garantir a defesa e segurança.
Assim, as controvérsias geradas entre maior ou menor rigidez no controle de armas e munições é fato que vem extrapolando os corredores do Congresso Nacional e opõe entidades da sociedade civil e especialistas em segurança pública. O caráter difuso dos interesses envolvidos, o lobby realizado pelas indústrias de material bélico, a disseminação de percepções tendenciosas sobre a compra e venda de armas, o aumento da violência urbana e a sensação de insegurança são alguns dos fatores que induzem a uma necessidade de análise mais aprofundada sobre a legislação de armas e munições no Brasil.
De fato, com a promulgação da Lei Nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, mais conhecida como Estatuto do Desarmamento, ou ainda, como Lei das Armas, emergiu uma nítida restrição de acesso às armas e munições no país. O governo brasileiro instituiu procedimentos burocráticos excessivamente complexos e caros para conceder permissões de compra o que, na prática, impedem que a maioria dos cidadãos adquiram legalmente armas de fogo. Não obstante a burocracia excessiva, somam-se as elevadas cargas tributárias e ausência de concorrência no comércio de armas e munições, o que acarreta, invariavelmente, no encarecimento absurdo destes artigos no mercado interno.
Outrossim, o teor do artigo 35, contido na referida lei, foi colocado em votação, em um referendo em 2005, que levou o povo brasileiro às urnas para decidir se armas de fogo, munições e acessórios deveriam ser comercializados ou deveriam ser banidas em todo território nacional.
No entanto, apesar da vitória para a continuação da comercialização das armas de fogo, por 63% dos votos, o Governo passou por cima do referendo, desconsiderando os votos dos brasileiros e instituindo, ainda que implicitamente, o fim do comércio das armas e munições, por meio das demais disposições contidas no estatuto do Desarmamento, que não estevam passíveis de votação no referendo.
Destarte, o presente estudo teve por objetivo averiguar de que formas a Lei das Armas contribuiu para o controle e regulamentação da negociação das armas de fogo, e de que modo a população tem sido privada de seus direitos e garantias fundamentais no que se refere à legítima defesa.
1 A LEGISLAÇÃO ACERCA DO USO DAS ARMAS DE FOGO NO BRASIL
1.1 CONCEITO DE ARMA DE FOGO
O Decreto Nº 3.665, de 20 de novembro de 2000, em seu artigo terceiro, traz uma gama de conceituações envolvendo as armas e suas modalidades, estando o conceito de arma, contido no inciso IX, como sendo o “artefato que tem por objetivo causar dano, permanente ou não, a seres vivos e coisas”, enquanto que arma de fogo recebe a seguinte conceituação, no inciso XIII:
[...] arma que arremessa projéteis empregando a força expansiva dos gases gerados pela combustão de um propelente confinado em uma câmara que, normalmente, está solidária a um cano que tem a função de propiciar continuidade à combustão do propelente, além de direção e estabilidade ao projétil. (Artigo 3, inciso XIII, DECRETO N. 3.665, 2000).
Observa-se que quando a propulsão do projétil se dá por outro meio que não pelos gases provenientes de explosão, como por exemplo, pressão, mola ou força mecânica, não se aplica, no Brasil, os dispositivos referentes a armas de fogo, e sim leis e dispositivos específicos.
Outra informação que será útil à última análise do artigo, referente ao uso permitido ou restrito, diz respeito ao raiamento da arma de fogo, tendo em vista que, antigamente, as armas tinham cano liso (é o que se chama de alma lisa), ou seja, não tinham "sulcos helicoidais", que são essas fissuras que parecem, em termos mais leigos, marcas de parafuso, as quais servem para fazer o projétil girar ao sair do cano, dando maior alcance e precisão.
O Decreto Nº 9.493/2018, traz em seu Anexo II, a diferença entre a arma de fogo de alma lisa e a arma de fogo de alma raiada:
Arma de fogo de alma lisa: é aquela isenta de raiamentos, com superfície absolutamente polida, como, por exemplo, nas espingardas. As armas de alma lisa têm um sistema redutor, acoplado ao extremo do cano, que tem como finalidade controlar a dispersão dos bagos de chumbo.
Arma de fogo de alma raiada: quando o interior do cano tem sulcos helicoidais dispostos no eixo longitudinal, destinados a forçar o projétil a um movimento de rotação.
(BRASIL, 2018)
Por seu turno, a chamada “alma raiada” advém do processo de raiamento, que se perfaz da introdução de raias na parte interna do cano, conforme as definições contidas no Decreto Nº 3.665/2000:
Art. 3º. (...)
LXXI - raias: sulcos feitos na parte interna (alma) dos canos ou tubos das armas de fogo, geralmente de forma helicoidal, que têm a finalidade de propiciar o movimento de rotação dos projéteis, ou granadas, que lhes garante estabilidade na trajetória; (BRASIL, 2000)
Atualmente, as armas lisas vêm caindo em desuso, somente sendo utilizadas com maior frequência, na produção de espingardas (famosas pelo espalhamento do tiro), para diminuir a dispersão exagerada das balas e, consequentemente, de seus estilhaços.
1.2 A DIFERENÇA ENTRE POSSE E PORTE DE ARMA
O Estatuto do Desarmamento diferencia posse e porte de armas de fogo, distinções estas ignoradas por parte considerável dos brasileiros. A posse confere poder, a seu titular, de possuir uma arma de fogo em sua residência ou local de trabalho, vedando seu transporte ou uso fora dos limites destes locais. Ou seja, a posse possibilita a guarda ou uso da arma somente em um lugar determinado.
Já o porte de arma de fogo, por outro lado, proporciona ao cidadão que transporte a arma, leve-a consigo, desde que de forma velada. Entretanto, a regra é a proibição do porte conforme explica César Mariano da Silva:
O porte de arma autoriza o seu titular a ter a arma consigo, mesmo que fora de sua residência e dependências, respeitando certos parâmetros exigidos pela Lei e Regulamento. A regra é a proibição do porte. Todavia, em algumas situações o Estatuto do Desarmamento possibilita o porte de arma de fogo para determinadas pessoas. (SILVA, 2007, p. 45).
Nota-se, portanto, que o porte é mais amplo que a posse, pois seu titular pode manter a arma em sua residência ou local de trabalho, bem como carrega-la para outros locais, ou mesmo no caminho entre a casa e o trabalho. Frisa-se, por fim, que a posse é uma etapa necessária que possibilita a obtenção do porte de arma de fogo, visto que não se alcança o porte, sem a anterior autorização de posse do armamento.
No entanto, tanto a posse quanto o porte ilegal de armas de fogo são crimes tipificados na Lei Nº 10.826/2003. A regulamentação acerca da posse de arma de fogo, encontra-se prevista no art. 12 do Estatuto do Desarmamento:
Art. 12. Possuir ou manter sob sua guarda arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, em desacordo com determinação legal ou regulamentar, no interior de sua residência ou dependência desta, ou, ainda no seu local de trabalho, desde que seja o titular ou o responsável legal do estabelecimento ou empresa:
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (BRASIL, 2003)
Nas Palavras de Ângelo Fernando Facciolli (2015, p. 107), a arma, deve, portanto, “permanecer depositada em local abrigado, seja ele casa ou outro local onde o proprietário, comprovadamente esteja residindo ou trabalhando”. Ou seja, a posse de arma de fogo munição ou acessório só será permitida quando o agente mantém a arma no interior da sua residência e nas dependências dela, bem como no seu local de trabalho, desde que seja proprietário do empreendimento, não é necessário ser dono do imóvel, ou ainda ser responsável jurídico do estabelecimento ou empresa.
A regulamentação acerca do porte de arma de fogo também encontra regulamentação no Estatuto do Desarmamento, em seu artigo 14, incluindo condutas como deter, adquirir, fornecer, receber, ter em depósito, transportar, ceder, ainda que gratuitamente, emprestar, remeter, empregar, manter sob guarda ou ocultar arma de fogo, acessório ou munição, de uso permitido, sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar. (BRASIL, 2003)
Desse modo, o porte de arma é residual, abrangendo tudo aquilo que não é enquadrado na posse de armas, significando, essencialmente, a prerrogativa do indivíduo de carregar a arma de fogo consigo, devidamente municiada e pronta para ser usada, em lugares que perpassem o ambiente residencial ou o local de trabalho.
De acordo com decisão do Superior Tribunal de Justiça, dada pelo Ministro Felix Fisher acerca do tema:
I - Não se pode confundir posse irregular de arma de fogo com o porte ilegal de arma de fogo. Com o advento do Estatuto do Desarmamento, tais condutas restaram bem delineadas. A posse consiste em manter no interior de residência (ou dependência desta) ou no local de trabalho a arma de fogo. O porte, por sua vez, pressupõe que a arma de fogo esteja fora da residência ou local de trabalho. (BRASIL, 2008)
Resta evidente, portanto, que, o legislador concluiu pela a distinção dos dois tipos penais que, agora separados, recebem penalidade diferenciada, sendo do crime de posse de 1 (um) a 3 (três) anos e multa e do porte de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa, devido ao grau de periculosidade das tipificações.
Isso significa que, os crimes de posse, porte e o de armas ilegais não mais se confundem, tendo ainda que ser levado em consideração a inclusão da tipificação desta conduta tão somente com o porte de munição ou acessórios, separadamente, sem necessitar estar junto à arma de fogo.
2 DO ESTATUTO DO DESARMAMENTO
A Lei Nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, mais conhecida como Estatuto do Desarmamento, versa acerca do registro, posse e comercialização de armas de fogo e munição sobre o Sistema Nacional de Armas – SINAR, sancionada como produto do Projeto de Lei Nº 292, proposto pelo Senador Gerson Camata, além do clamor da sociedade para que os legisladores endurecessem as leis para a contenção da crescente onda de violência.
Assim, tal política de controle de armas, foi instituída com o objetivo principal de reduzir a circulação de armas e estabelecer penas rigorosas e um controle mais rígido e eficiente sobre o armamento para a população civil, abrangendo ainda diversos aspectos a respeito da regulação do porte e posse das armas, bem como sua comercialização, produção e controle das fronteiras.
O referido estatuto adveio com trinta e sete artigos, sendo node de sanção imediata, ao passo que os demais dependiam de regulamentação, dando-se esta complementaridade por meio do Decreto Nº 5.123, publicado em 2 de julho de 2004, mas o artigo 35 ainda não pôde entrar em vigor por ter de aguardar aprovação mediante referendo popular, no tocante ao parágrafo primeiro, que só aconteceria em outubro de 2005.
Nos dizeres de Fabrício Rebelo (2017, 487-488) “Com raríssimas exceções, tornou-se regra a proibição da posse e do porte destes artefatos no Brasil”.
Na mesma linha de raciocínio, Ângelo Fernando Facciolli traz que:
A nova Lei do SINARM, elaborada em meio a pressões de entidades governamentais e não governamentais, não foi edificada com imparcialidade em obediência aos imperativos constitucionais de construção legislativa. Em diversas passagens cria imbróglios, obstaculizando a sua completa compreensão. Não bastasse tratar-se de lei extravagante, ultrapassou os limites admitidos da harmonia e coerência. (FACCIOLLI, 2010, pg.58)
Com efeito, o que se pode extrair do Estatuto do Desarmamento, é que o legislador optou por tipificar várias condutas, que ao todo perfaziam 18 (dezoito) núcleos penais, entre as quais estavam: possuir, deter, fabricar, vender, alugar, ocultar, emprestar, transportar, ter em depósito, entre outras, atribuindo a todas estas condutas a mesma sanção penal.
Além do mais, em seu parágrafo 1º previu outras condutas relacionadas, como omissão de cautela, utilização de simulacro de arma de fogo para cometimento de crimes, disparo em local habitado ou em suas adjacências, ou em sua direção, possuindo todas as condutas previstas no artigo a mesma reprimenda legal, qual seja, um a dois anos e multa. (CAPEZ, 2014).
Em síntese, o Estatuto não só agravou as penalidades como ignorou o princípio penal de proporcionalidade da pena, ao fixar o mesmo preceito secundário penal para o sujeito que realizasse o disparo de arma em local público ou privado.
Desse modo, com a referida Lei e o Decreto Nº 5.123 de 2004, que regulamentou os artigos que exigiam legislação ulterior, o Brasil se tornou um dos países mais difíceis de se obter legalmente uma arma de fogo, entretanto é nítida a facilidade que os criminosos encontram para usufruir destes armamentos, como pode-se extrair dos relatos de Rogério Greco:
Sempre se disse que o Complexo do Alemão era um verdadeiro paiol, onde os traficantes tinham à disposição as armas mais modernas e potentes, inclusive aquelas que tinham capacidade para perfurar blindados e derrubar aeronaves. (GRECO, 2018, p 218-219)
Nesse sentido, a supramencionada norma também fez com que os cidadãos, os quais não queriam estar em desobediência à Lei, entregassem suas armas ao Estado, ficando, desse modo, a mercê da segurança por este oferecida.
2.1 O REFERENDO DE 2005
Em seu artigo 35, o Estatuto previa a realização de um referendo, o qual foi efetivado em 2005:
Art. 35. É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6º desta Lei.
§ 1º Este dispositivo, para entrar em vigor, dependerá de aprovação mediante referendo popular, a ser realizado em outubro de 2005.
(BRASIL, 2003).
O referendo, cujo qual indagava se “O comércio de armas de fogo e munições deve ser proibido no Brasil? ”, obteve o seguinte resultado, conforme relatório do Senado Federal:
O eleitorado apto a votar foi da ordem de 122.042.825 eleitores. Compareceram 95.375.824. Houve uma abstenção, portanto, de 26.666.791 eleitores. Há uma diferença de 210 votos na soma do comparecimento e abstenção em relação ao número de eleitores aptos a votar, em razão de seção não instalada na Vila de Urucarazinho, no Estado do Amazonas, em face da impossibilidade de acesso àquela localidade. Votos apurados: 95.375.824. Votos nulos: 1.604.307. Votos em branco: 1.329.207. Votos válidos: 92.442.310. Votos na opção SIM: 33.333.045. Votos na opção NÃO: 59.109.265. Assim, Senhores Ministros, tendo em vista o relatório do eminente Ministro Marco Aurélio, aprovado pela Corte, proclamo o resultado final do Referendo de 2005 no país. Vencedora: opção NÃO, com 59.109.265 votos, contra 33.333.045 da opção SIM. Ministro Carlos Velloso, Presidente. (BRASIL, 2005, p. 1)
O resultado foi que 63,94% dos eleitores disseram NÃO à proibição do comércio de armas de fogo e munições no Brasil. Entretanto, esse resultado democrático não foi mantido. Apesar do sonoro resultado, a posse e principalmente o porte de arma de fogo terminaram inviabilizados na prática.
Assim, a Lei Nº 10.826/03, que instituiu o referendo para a proibição do comércio de armas de fogo e munições, foi projetada contando que o povo do Brasil diria SIM ao referendo, conforme observado nas exigências draconianas para a posse e o porte de armas de fogo, além do que recebeu a denominação de Estatuto do Desarmamento. Diante desse cenário, o correto, sob o viés democrático, seria a adoção de uma nova legislação que acatasse a vontade popular manifestada.
2.3 DOS REQUISITOS PARA A POSSE DE ARMA DE FOGO
A política de desarmamento imposta em 2003 acabou por dificultar o acesso do cidadão comum às armas de fogo, possibilitando-o apenas a um rol determinado de pessoas elencadas na própria lei, trazendo como um dos principais requisitos, a controversa declaração de efetiva necessidade.
Tal exigência, traz duas consequências importantes; a primeira ao possibilitar a posse de arma de fogo apenas para aqueles que já sofrem risco de vida de forma comprovada e reiterada, afastando, assim, todos os demais que desejam a posse para reprimir qualquer perigo ou ameaça futuros a sua vida. A segunda, por conferir discricionariedade acerca da avaliação de seu implemento, haja vista que não há, em lei, parâmetros objetivos que estabeleçam o que deve ser considerado efetiva necessidade, de tal forma que acaba por ocorrer uma interpretação subjetiva por parte do Policial Federal responsável.
Nesse sentido, Fabrício Rebelo dispõe:
A declaração de efetiva necessidade, originalmente prevista no estatuto, transformou-se, através do Decreto nº 5.123/04, em comprovação de necessidade. Não é mais um ato unilateral do declarante, e sim uma exigência de se convencer o delegado daquilo declarado, numa análise subjetiva, expressamente vinculada às orientações do Ministério da Justiça (art. 12, § 1º). (REBELO, 2017, p. 3020-3024)
Destarte, a tal comprovação de efetiva necessidade prevista no art. 7º da Lei 9.437/1997 foi substituída por uma declaração, com a promulgação do Estatuto do Desarmamento, conforme previsto no caput de seu artigo quarto. Além disso, para proceder com a requisição do processo de posse pessoal, o interessado deverá, ainda, comprovar capacidade técnica para o manejo e uso da arma de fogo fica condicionada à conclusão, com êxito, de curso de capacitação específica com duração mínima de 10 horas.
A única categoria que precisa COMPROVAR efetiva necessidade, é a dos caçadores de subsistência – Art. 6º, § 5º, cuja qual depende do registro do interessado junto ao Exército Brasileiro, a quem compete a emissão de autorização específica, chamada de Certificado de Registro (CR), com validade em todo o território nacional.
Quanto à decisão final ao porte ou a posse, ficou este poder nas mãos da Polícia Federal, notadamente criando uma subjetividade da norma, vez em que está no alcance desta autoridade analisar a efetiva necessidade, conforme expresso no art. 22, do Estatuto do Desarmamento, desde que atendidos os requisitos previstos nos incisos I, II e III do § 1º do art. 10 referida lei.
Deste modo, além de ser necessário atender a todos os critérios exigidos para a posse de armas, junto à realização de testes de aprovação para o porte, no intuito de detectar características violentas ou perda do controle emocional garantindo assim, que nenhuma característica será omitida no momento da avaliação, o sujeito precisará de um juízo favorável, ou seja, autorização concedida pela administração pública, este com poder discricionário para vetar ou permitir a aquisição ou renovação do registro de arma de fogo.
Cabe mencionar, nesse contexto, que, uma vez que o Estatuto do Desarmamento “nasceu” como forma de restringir a aquisição das armas de fogo pelo cidadão civil, essa autorização tende a ser indeferida com grande frequência, pelos mais diversos motivos, conforme a motivação da autoridade responsável por sua concessão.
3 O ESTATUTO DO DESARMAMENTO E SUAS IMPLICAÇÕES FRENTE AO DIREITO À LEGÍTIMA DEFESA
O discurso desarmamentista, muitas vezes, prega que o Estado deve fornecer a segurança para a população, sendo desnecessário que os civis tenham posse ou porte da arma de fogo. Entretanto, trata-se de um entendimento ilusório, considerando que o Estado não está em todos os lugares, de modo que, a polícia nem sempre conseguirá impedir uma ação criminosa e, por isso, o cidadão se vê obrigado a se defender e, em diversos casos, a arma de fogo seria a ferramenta mais eficaz para isso.
Uma das mais ferrenhas alegações dos defensores da política desarmamentista, disseminam a ideia que a restrição às armas de fogo diminuiria a criminalidade. Todavia, mesmo após a implementação do Estatuto do Desarmamento, que acarretou a queda drástica de comércio de armas legalizadas no país, o mapa da violência de 2013 demonstrou que o incremento dos índices de criminalidade e da violência persistiu.
Segundo o supracitado relatório, no ano de 2000, as mortes com uso de arma de fogo contabilizaram 34.958, enquanto em 2010 foram 38.892, havendo, assim, um aumento o aumento da população brasileira no mesmo período, o acréscimo do número de mortes foi pequeno, como esclarece Fabrício Rebelo:
No mesmo período, de acordo com os dados disponíveis junto ao IBGE, a população brasileira sofreu um incremento de 12,33%, passando de 169.799.170 para 190.732.694 habitantes. Portanto, para fins estatísticos e considerada a margem de variação inerente a qualquer pesquisa com parâmetros populacionais, os números se equivalem, não se podendo atribuir qualquer significação relevante à irrisória diferença de 1,08% entre o crescimento populacional e o de mortes por armas de fogo. O quadro pesquisado, assim, apresentou estagnação estatística. (Rebelo 2017, p. 768-771)
Além disso, diversas estimativas apontam para a existência de 13 milhões de armas ilegais em nosso país, sendo que a grande maioria está nas mãos de pessoas com intenções questionáveis. Estudos mostram que a taxa de criminalidade de um país em nada tem a ver com a facilidade que o cidadão tem de adquirir uma arma legalmente. Muito pelo contrário. Os índices de violência estão, principalmente, ligados à má distribuição de renda e a falta de políticas públicas de integração social.
3.1 DA LEGÍTIMA DEFESA
A legítima defesa, é definida como a proteção realizada por uma certa pessoa, visando garantir a segurança de sua vida, sua família, seu patrimônio, entre outras coisas, bem como os bens jurídicos de um terceiro, conforme explica Rogério Greco (2018, p. 341): "Tem-se entendido que o instituto da legitima defesa tem aplicação na proteção de qualquer bem jurídico tutelado pela lei".
O princípio da ampla defesa, contido no art. 5º, inciso LV, da Constituição Federal, vem atrelado principalmente aos litigantes e aos acusados em geral, no entanto, encontra fundamentação no Código Penal, tendo em vista que o legislador infraconstitucional regulamentou a legítima defesa, ou defesa privada, ao trazer o instituto da legítima defesa como uma das exclusões de ilicitude previstas no seu art. 23, in verbis:
Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato:
I - em estado de necessidade;
II - em legítima defesa;
III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.
(BRASIL, 1940)
A definição de legítima defesa encontra-se expressa no mesmo diploma legal, em seu art. 25:
Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo, considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a prática de crimes.
(BRASIL, 1940)
Legitima defesa, portanto, é o direito que permite que o cidadão se defenda, proteja seus iguais e seu patrimônio, sem ser imprescindível a atuação estatal, e se utilizando da força para isso, como explica Gabriel Cesar Zaccaria de Inellas:
A legitima defesa é o direito indiscutível, inalienável e irreversível, que toda pessoa possui, de se defender, defender seus entes queridos ou terceiros inocentes, de ataques violentos e irracionais, repelindo a força com força. (INELLAS, 2019, p. 60)
Assim, a conduta amoldada como legítima defesa, embora típica, ou seja, descrita em lei como crime, não será ilegal, por afastar a antijuridicidade do fato. Isto porque, para ser crime, a ação ou omissão deverá agregar os seus três elementos: ser típica, antijurídica e culpável. Leciona Nucci que:
Crime, no conceito analítico é fato típico, antijurídico e culpável. Não importando a corrente (causalista, finalista ou funcionalista), o delito tem três elementos indispensáveis à sua configuração, dando margem à condenação. Sem qualquer um deles, o juiz é obrigado a absolver. Fato típico: amolda-se o fato real ao modelo de conduta proibida previsto no tipo penal (ex.: matar alguém art. 121, CP). Antijurídico: contraria o ordenamento jurídico, causando efetiva lesão a bem jurídico tutelado Culpável: merecedor 17 de censura, pois cometido por imputável (maior de 18 e mentalmente são), com conhecimento do ilícito e possibilidade plena de atuação conforme o Direito exige. (NUCCI, 2013, p.117)
A agressão a ser combatida pela legítima defesa precisa ser atual, estar acontecendo naquele instante, ou iminente, prestes a acontecer. Em se tratando de agressão finalizada, não haverá mais legítima defesa, sendo o ato praticado a partir de então, vingança contra o autor da agressão, podendo constituir crime. (AZEVEDO; SALIM, 2015, p. 260-261)
Vale destacar, ainda, que a legítima defesa, por definição legal, visa a preservação de direito, próprio ou alheio, não sendo discriminado pelo ordenamento jurídico brasileiro, qual ou quais bens ou direitos suscetíveis à defesa privada do cidadão, levando ao entendimento que todo e qualquer bem ou interesse juridicamente assegurado pode ser posto sob a égide protetora da defesa privada.
Também não há, na legislação brasileira a exigência de uma proporcionalidade entre a agressão sofrida e a repulsa a esta, sendo exigido apenas que haja moderação no emprego dos meios defensivos. No uso moderado de meios necessários à defesa está inclusa a obrigação do agente de, mediante um meio capaz de cessar a agressão ou ameaça de agressão sofrida, escolher pelo uso do menos lesivo.
3.2 DO USO DAS ARMAS DE FOGO PARA AUTODEFESA SUBJETIVA
A Constituição prevê que é incumbência do governo garantir a segurança da população, porém, esta mesma Carta Magna afirma, também, que isto é dever de todos, de maneira que todo cidadão deve cumprir seu papel para tornar o país um lugar mais seguro.
O direito à segurança, portanto, é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço, a ser exercido em mútua cooperação com o cidadão.
Todavia, o Estado, além de não fornecer a segurança, que é seu dever, nega ao cidadão de bem o direito à defesa privada, ao restringir o uso de meios necessários para repulsa às agressões sofridas, de modo que essa ineficiente cooperação entre estado e sociedade, gera calorosos debates em razão da definição dos limites dos meios de defesa, especialmente, quando os métodos aplicados na iminente violação dos mesmos acabam por oferecer também risco à vida.
Assim, toda a discussão sobre comércio, propriedade e porte de armas de fogo que se travou até hoje esbarra exatamente neste ponto. Não há como restringir o acesso do cidadão de bem às armas de fogo sem que haja restrição no seu direito à legítima defesa.
Sendo assim, o direito à segurança evoca uma associação explícita com o direito de se defender, não sendo permitido à Administração Pública restringir o direito do cidadão ter acesso a meios necessários para que, por si, promova a defesa do seu direito em face de injusta agressão, muito menos penalizar condutas sem definição concreta da lesão ocasionada a qualquer bem jurídico.
Para Celso Antônio Bandeira de Mello,
O cidadão jamais poderá ser proibido de tentar defender sua vida, seu patrimônio, sua honra, sua dignidade ou a incolumidade física de sua mulher e filhos a fim de impedir que sejam atemorizados, agredidos, eventualmente vilipendiados e assassinados, desde que se valha de meios proporcionais aos utilizados por quem busque submetê-los a estes sofrimentos, humilhações ou eliminação de suas existências. A Constituição Brasileira, não autoriza a que seja legalmente qualificado como criminoso, e muito menos como sujeito eventual à pena de reclusão, o cidadão que tente defender a própria vida, o patrimônio, a honra, a dignidade ou incolumidade física. (MELLO, 2005, p. 1).
No entanto, no cenário atual isso não ocorre, a população não é temida pelo bandido, muito pelo contrário, é vista como um alvo fácil e indefeso, perfeito para ser vítima de algum delito, tendo em vista que devido ao Estatuto do Desarmamento tornou extremamente complicado conseguir a autorização para se ter uma arma, deixando assim, em regra, o povo desarmado. Isso seria diferente, caso o cidadão fosse autorizado a portar uma arma de fogo, haja vista que o criminoso não saberia qual vítima tem condições de se defender, qual estaria armada ou desarmada.
Reafirmando esse pensamento, Rodrigo Sergio Ferreira de Moura (2016, p. 318) dispõe:
O cidadão comum é duplamente punido pelo Estado, que não cumpre com sua função básica de garantia da vida e da segurança, em não protegê-lo, e por não permitir que este tenha o direito de optar por exercer à legítima defesa, dentro dos limites legais, com o uso da força proporcional à usada pelos criminosos.
É inegável, portanto, em decorrência de questões como logística e de contingente, que o Estado, externado na forma de polícia, não consegue executar de forma satisfatória, ou no mínimo eficaz essa atribuição, chegando na grande maioria das vezes após o crime ter sido cometido, atuando para tentar capturar o meliante, e nem sempre consegue proteger a vítima da ação daquele.
Assim, a legítima defesa, além de ser um instinto básico elementar, é também um direito natural e, principalmente, um direito constitucional explícito. Com efeito, a Constituição Federal, ao garantir a segurança, a propriedade, a incolumidade pessoal, a inviolabilidade do domicílio e a dignidade da pessoa humana, implicitamente está assegurando os meios para que todas essas garantias possam ser efetivas.
3.3 O PROJETO DE LEI Nº 3.722/2012
O projeto de lei Nº 3.722/201210 foi apresentado pelo Deputado Federal Rogério Peninha Mendonça e tem como objetivo flexibilizar as normas em vigor e estabelecer uma nova regulamentação para a aquisição, a posse, a circulação e o porte de armas no Brasil, buscando garantir ao cidadão tais direitos, independentemente de sua atividade, desde que atendidos critérios específicos e objetivamente fixados na lei.
O Projeto de Lei 3722/2012 cria várias divisões para quem optar por possuir uma arma de fogo e uma delas é o porte rural. Devido a diversas necessidades de cada função, o legislador achou necessário a regra se adaptar à realidade de cada pessoa. Além do porte rural, colocaram em pauta o porte funcional, porte pessoal, o porte para empresas de segurança e o porte para atirador desportivo, colecionador e colecionador. Mesmo a lei se adaptando ao portador a forma de aquisição e comprovação das técnicas de manuseio não mudaram, sendo a base da lei permanecendo a mesma.
O porte funcional inclui a possibilidade para as autoridades portarem armas de fogo pela função ou cargo que exercem. Para essa modalidade foram liberadas as armas de uso permitido e restrito, tendo como duração o período no qual a pessoa exercer sua função, mandato ou cargo. O porte pessoal dá ao cidadão comum a oportunidade de portar armas de fogo de uso permitido para sua proteção pessoal, familiar e patrimonial, a partir dos 25 anos.
O porte para empresa de segurança será usado para os funcionários de empresas desse setor. O porte será liberado pela Polícia Federal e poderá ter o porte até quando não estiver em serviço, desde que permitido pela empresa. O portador poderá usar uma arma de fogo de uso permitido registrada em seu nome ou em nome da empresa. O porte para atirador desportivo, colecionador e caçador fará o pedido junto ao Exército Brasileiro que irá emitir o registro de autorização específica chamado de Certificado de Registro, com validade em todo Brasil. O Certificado de Registro terá validade de 5 anos.
3.4 IMPACTOS DOS DECRETOS DE 2019 NO ESTATUTO DO DESARMAMENTO
Desde o início do ano de 2019, sete decretos sobre porte e posse de armas foram editados pelo atual presidente da república Jair Bolsonaro e os que merecem uma maior ressalva serão citados abaixo.
O primeiro decreto a ser exarado pelo chefe do poder executivo no ano de 2019 foi de Nº 9.685/19, tratando apenas acerca da posse de arma fogo. O referido decreto permitia a compra de até quatro armas por pessoas e previa o aumento do prazo de validade do registro de posse de arma de 5 para 10 anos. Posteriormente, um novo Decreto foi editado revogando o anterior.
O Decreto de Nº 9.785/19 ampliou e concedeu o porte de arma para uma série de categorias elencadas no artigo 20 do referido Decreto, como por exemplo, advogados, conselheiro tutelar, senadores, deputados, etc., que realizando a contagem, daria direito ao porte de arma a mais de 15 milhões de brasileiros, criando inúmeras discussões e uma série de debates acerca da constitucionalidade desse projeto.
Além disso, o texto também permitia a compra de um tipo de fuzil que passava a ser considerado arma de uso permitido, uma vez que, o armamento é de uso exclusivo das forças policiais. Esse decreto ainda estabelecia que em 60 dias o exército iria editar portaria listando quais armas poderiam ou não ser compradas por qualquer cidadão, vindo a ser editado o decreto Nº 9.797/19 que vetou a possibilidade de cidadão comum portar fuzil.
Em compensação, o decreto assinado em 07 de maio de 2019, pelo atual Presidente da República, Jair Messias Bolsonaro, almejava regulamentar a Lei Nº 10.826/2003 e, assim, dispor sobre a aquisição, cadastro, registro, posse, porte e a comercialização de armas de fogo e de munição e sobre o Sistema Nacional de Armas e o Sistema Nacional de Gerenciamento Militar de Armas.
Entretanto, imediatamente passou a ser questionada a constitucionalidade e a legalidade do referido decreto, uma vez que extrapolaria as previsões contidas no Estatuto do Desarmamento, já que, em vez de regular as normas aprovadas no Congresso Nacional, acabaram por ampliar e facilitar a posse e o porte de armas de fogo, inclusive de calibres antes reservados às forças de segurança pública e militares.
Um dos principais alvos de discussão diz respeito às principais mudanças almejadas pelo supramencionado decreto, outras categorias de novos profissionais, como os Advogados, agentes de trânsito, conselheiros tutelares, caminhoneiros, políticos eleitos, sem a necessidade de comprovação da tal 'efetiva necessidade' para o transporte de armas fora de casa.
Finalmente, os adolescentes não mais precisariam de autorização judicial para a prática do tiro esportivo, e sobretudo, as armas mais letais deixariam de ser de uso restrito das Forças Armadas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando-se que os princípios que regem o direito à segurança, bem como o direito de se defender, facilmente se fundamenta o paradigma desta medida ocorrer por meio de armas de fogo de uso permitido, sendo, por consequência, de suma importância a implantação de uma legislação mais permissiva que a atual em vigência no Brasil, regida pelo chamado Estatuto do Desarmamento.
Trata-se de uma política de controle de armas que está em vigor no país desde 22 de dezembro de 2003, sancionada com o objetivo de reduzir a circulação de armas e estabelecer penas rigorosas para crimes como o porte ilegal e o contrabando.
No entanto, o referido diploma legal, em nada, tem contribuído para reduzir os índices de criminalidade nem evitado que as armas de fogo cheguem em mãos indevidos, de modo que o Governo já vem procurando se revestir com os apontamentos mais avançados no tocante à matéria, porém, o avanço demanda uma uniformidade cultural no que se refere aos hábitos criados pela recorrente impunidade em todos os setores da sociedade.
A análise entre a causa e o efeito onde se abarca a arma de fogo como principal vetor de inflação da criminalidade não se verifica no comparativo com outros países que tem, inclusive, mais armas que o Brasil, porém menos homicídios em proporção populacional.
Ao dificultar o acesso de armas à população exigindo o devido registro e necessário porte e restringindo as possibilidades de adquirir as armas de fogo pelas vias legais, o legislador permitiu, por outro lado, que as armas chegassem à população por vias secundárias e através de meios ilícitos, estimulando assim o comércio ilegal de armas e de munições
A critério de elucidação sugestiva, o porte, em regra, deveria assumir o mesmo instituto da posse, evitando por todos os meios a sensação de impunidade, onde ainda que regulamentado de maneira incisiva, não continuasse a se estabelecer como uma medida proibitiva com raras exceções, mas sim como instituto permito e regulado como já é a posse. Desta forma os princípios constitucionais estariam contidos na norma que permite a qualquer um do povo se defender e gozar de uma segurança garantida pela Constituição Federal.
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Graduando em Direito, servidor público do Estado do Amazonas desde 2001 - Segurança Pública - Polícia Militar, função : CABO QPPM, tendo Curso de Operações de Choque , ano 2019, servido atualmente no Comando de Policiamento Especializado da PMAM.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBOSA, jonadabe quintela. A flexibilização da posse de arma para o cidadão civil sob a ótica do Estatuto do Desarmamento de 2003 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 dez 2020, 04:12. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55907/a-flexibilizao-da-posse-de-arma-para-o-cidado-civil-sob-a-tica-do-estatuto-do-desarmamento-de-2003. Acesso em: 23 dez 2024.
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