O presente artigo tem por interesse elucidar o conceito de peculato, abordando temas referentes ao assunto tratado, busca-se elucidar as características deste crime aplicado àquele detentor de cargo público, quais as metodologias abordadas, conceitos e funções específicas do mesmo, como punição condizente com o cargo. Através de metodologias de pesquisa identificar quais são as características jurídicas que norteiam o crime de peculato, verificando a existência de peculiaridades com relação ao mesmo, demonstrando quais as características intrínsecas e que norteiam a aplicabilidade de punição aos funcionários públicos responsáveis pelos delitos cometidos, situações do cotidiano administrativo em que se aplica conceitos próprios da carreira, seja ela transitória ou definitiva decorrente de concurso público.
É o ato praticado especificamente pelo funcionário público, pelo qual o individuo para o proveito de um terceiro ou dele mesmo se apropria de um bem móvel, bem este em sua posse ou guarda devido à natureza do cargo que exerce conforme o Código Penal:
Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio:
Podemos verificar a origem do chamado peculato no direito romano, quando se subtraia pertences do império, a palavra em sua origem deriva de (pecus), palavra esta utilizada para bois e carneiros que tinham como finalidade o sacrifício aos deuses pagãos. O direito romano, para definir o crime de peculato não levou em consideração a qualidade do sujeito ativo, que podia ser funcionário público ou particular, mas sim a titularidade da res, isto é, o fato de o produto da subtração pertencer ao estado ( res publicae) ou ser sagrado ( res sacrae), considerando que bois e carneiros eram destinados aos sacrifício, em muitos casos condenando o infrator não só a penas físicas severas, como também a pena de morte.
Segundo Cezar Roberto Bitencourt:
As sanções aplicadas aos autores de peculato eram extremamente severas: trabalhos nas minas, podendo chegar, inclusive, ao extremo da pena de morte, fato ocorrido no período dos imperadores. Durante a idade média foi mantido para o crime de peculato a aplicação de penas cruéis e degradantes. O estatuto e Florença determinava que quem fugisse com o dinheiro publico fosse amarrado à cauda de um burro e arrastado pelas ruas da cidade, como exemplo[1].
Verifica-se conforme descrito, a evolução do referido crime, em síntese a classificação do mesmo tem como objetivo proteger o bem estatal, visando através de meios mais rigorosos de punição, coibir o funcionário público à pratica de delito contra a administração publica e os bens particulares sobre sua responsabilidade.
Cabe observar que a qualidade de funcionário público tanto qualifica como aumenta a pena no caso do crime de peculato, tal medida tem como objetivo proteger eventualmente o bem particular e primordialmente o estado e criar uma maior credibilidade deste junto à população, sendo este o maior bem jurídico tutelado pela legislação, a moralidade da Administração pública conforme Fernando Capez:
Tutela-se principalmente, a moralidade da Administração Pública, bem como seu patrimônio. Protege-se, eventualmente, o patrimônio do particular quando este estiver sob a guarda daquela.
Observa-se a preocupação do legislador quanto à proteção da máquina estatal, através de legislação que busca coibir atos irregulares por parte do funcionalismo público, mantendo assim o caráter de isonomia da mesma.
Conforme transcrito do art. 312, § 1º do código penal:
§ 1º Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.
Aqui descreve-se basicamente o furto cometido pelo funcionário público, através da utilização da vantagem que o mesmo possui devido ao fato de ser funcionário público, o crime poderá ocorrer em duas hipóteses, quando o próprio sujeito comete o ato ilícito ou de alguma forma contribui para que um terceiro cometa o furto. Nas duas situações fica explicito que o funcionário não possui a posse do bem, porém apesar de não possuir o mesmo, fica clara a utilização de facilidade decorrente do cargo para a prática do delito, sendo esta uma condição essencial para a caracterização.
Nas situações em que o funcionário publico através de vantagens do cargo possibilita que terceiros realizem o furto aplica-se o disposto no artigo 30 do código penal :
Art. 30 - Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime.
Tal artigo possibilita que mesmo tendo o cidadão comum cometido o crime de furto, se ficar provado que este ágil através do facilitamento de funcionário publico, tal funcionário responderá pelo crime previsto no § 1 do artigo 312, por ter como principal característica a facilidade oriunda do cargo público.
Para a caracterização do crime é primordial que tenha ocorrido o dolo, por parte do funcionário público e que o mesmo tenha se valido da vantagem do cargo para subtrair o objeto, pois o mesmo possuiria livre acesso à repartição em que trabalha.
Para esclarecer o referido crime devemos tomar como base oque está previsto no art. 312 § 2⁰ do Código Penal :
§ 2º - Se o funcionário concorre culposamente para o crime de outrem
A caracterização do referido crime leva em conta a atitude do funcionário que agiu equivocadamente, por desatenção ou imperícia, de maneira a permitir que um terceiro realizasse o furto . Segundo Bitencourt:
No caso, o funcionário negligente não concorre diretamente no fato (e para o fato) praticado por outrem, mas , com sua desatenção ou descuido, propicia ou oportuniza, involuntariamente, a que outrem pratique um crime doloso, que pode ser de outra natureza.
Para a caracterização do crime o individuo deve ter a posse do objeto em decorrência do cargo do qual exerce e o mesmo só se caracterizará com a consumação, não permitindo que ocorra a tentativa por se tratar de crime culposo.
Como pena o servidor que agiu com desídia responderá a detenção de três meses a um ano, porém caso o mesmo ressarça aos cofres públicos os prejuízos causados antes da sentença definitiva, a pena será extinta, porém será reduzida até a metade, caso a reparação ocorra posteriormente à decisão judicial, conforme art. 312 §3⁰ do Código Penal.
§ 3º - No caso do parágrafo anterior, a reparação do dano, se precede à sentença irrecorrível, extingue a punibilidade; se lhe é posterior, reduz de metade a pena imposta.
Com relação ao terceiro que participou do delito, tirando proveito da condição do funcionário público, não se estende tal benefício.
De acordo com exposto é nítido que o servidor poderá ser punido pelo seu erro, porém o mesmo poderá exercer a retratação do ocorrido, arcando com os prejuízos causados pela imperícia, neste caso permitindo que o estado tenha maiores prejuízos como por exemplo a perca de um servidor de boa conduta que cometeu um erro do qual não teve intenção .
Peculato Mediante Erro de Outrem
Para elucidar o crime a ser abordado, devemos recorrer ao descrito no art. 313 caput do Código de Processo Penal:
Art. 313 - Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem
Doutrinariamente recorre-se a tal crime também como “peculato estelionato”, o objetivo do legislador com a descrição do mesmo foi proteger a administração pública, outra observação importante é com relação aos sujeitos ativos do crime, necessariamente tal crime só pode ser cometido por funcionário público, cabe porém a participação de particular no crime, em muitos casos aconselhando que o funcionário público, que recebeu o objeto advindo de um particular não o devolva e fique com o mesmo sabendo da improcedência, para o tal caberia o enquadramento da pena conforme previsto nos artigos 29 e 30 do código penal brasileiro, porém para a equiparação é necessário que o particular tenha conhecimento da condição de funcionário público, caso desconheça da situação o mesmo responderá conforme o previsto no § 2° do art. 29 Código Penal
§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave
O estado é considerado sujeito passivo no presente crime, porém, caso o dinheiro ou o bem móvel seja de particular, este será considerado também como sujeito passivo, cabe observar que existem divergências doutrinárias sobre o particular que foi prejudicado ser considerado passivo no mesmo patamar do estado ou ser considerado sujeito passivo secundário do crime, conforme Bitencourt:
Discordamos do entendimento tradicional da doutrina que define, nessa hipótese especial, o particular como sujeito passivo secundário, pois não há razão lógica ou jurídica para coloca-lo em segundo plano, mesmo que se trate de infração penal localizada do Título (XI), que, por razões lógicas e metodológicas, cuida dos crimes contra a administração pública; com efeito, com essa infração o sujeito ativo lesa tanto bem jurídico pertencente ao erário publico (dever funcional) quanto bem jurídico pertencente ao particular (particular).
Observa-se conforme explanado que o funcionário público, seu cargo e as peculiaridades do mesmo, diferencia-se dos cargos particulares. Ao tratarmos do crime de peculato decorrente da atitude irregular do funcionário público, devemos levar em conta a diferenciação aplicada aos mesmos, estes possuem características especificas que buscam zelar pela honra administrativa e a boa aparência daqueles que lidam com verbas públicas, devendo agir dentro dos parâmetros da lei, em contrapartida o funcionário público responde de maneira mais condensada com relação à este crime cometido em função do cargo de gerencia ou de confiança por ser tutelado por vasta legislação diferenciada da legislação aplicada ao cidadão comum.
Por tratar diretamente com o dinheiro público, existe uma maior preocupação com o funcionário público e a possível atitude irregular, a este caberá punibilidade no âmbito administrativo, cível e penal, a depender da infração cometida o mesmo responderá não apenas no caráter administrativo, mas também nas outras esferas, por tratar-se de irregularidades que envolvem o dinheiro do contribuinte, tais desmandes e desleixos realizados com o dinheiro do contribuinte podem causar desgaste da máquina pública e prejuízos irreparáveis à sociedade como um todo.
Bitencourt, Cezar Roberto – Tratado de Direito Penal, 5 : parte especial, dos crimes praticados contra a administração pública, dos crimes praticados por prefeitos (Lei n. 10.028/2000) / Cesar Roberto Bitencourt – 2. Ed. rev. e atual – São Paulo : Saraiva, 2009.
Capez, Fernando - Curso de direito penal, volume 3, parte especial: dos crimes cotra a dignidade sexual a dos crimes contra a administração pública (arts. 213 a 359-h) / Fernando Capez. – 10. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2012.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm
Bacharelando do Curso de Direito do Instituto Matonense Municipal de Ensino Superior –IMMES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, GEANDRO MARCOS DA. Crime de Peculato Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 dez 2020, 04:04. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55910/crime-de-peculato. Acesso em: 23 dez 2024.
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