OSNILSON RODRIGUES SILVA
(orientador)[1]
RESUMO: O presente artigo tem como objetivo discutir sobre a aplicação da Convenção de Haia de 1980 em casos de subtração internacional de menores, demonstrando sua eficácia na manutenção do direito de guarda e visita e esclarecer se o Estado Brasileiro efetivamente aplica a Convenção de forma a solucionar os casos de subtração internacional de menores. A problemática dessa pesquisa foi inspirada no dispositivo normativo ora retratado, que assegura a resolução dos casos de subtração internacional de menores de forma mais simples e rápida e a sua utilização pelo Brasil. Para dar embasamento teórico a esta pesquisa utilizou-se a abordagem de estudo qualitativa. O levantamento de dados se deu por análise documental, literatura tendo como base livros físicos e virtuais, artigos, leis como a Constituição Federal de 1988, a própria Convenção de Haia de 1980, o Código Civil Brasileiro etc. Teses de doutorado, a fim de dar maior base teórica para a pesquisa. Examinou-se a atuação do Estado Brasileiro na aplicação efetiva da Convenção de Haia de 1980 na manutenção do direito de guarda e visita, exemplificando com o caso de Sean Goldman amplamente noticiado e debatido até os dias de hoje, concluindo assim que o Estado está muito longe ainda de solucionar o problema da subtração internacional de crianças.
Palavras-chaves: residência habitual, guarda, visita, direitos humanos dos menores.
1. INTRODUÇÃO
É dever da família, da sociedade e do estado, conforme o Estatuto da Criança e do Adolescente, assegurar a criança e ao adolescente o direito à vida, saúde, dignidade colocando-os de toda forma de violência, crueldade e opressão.
Para Daniela Sallet e Christina Krueger Marx (2001, p. 109) “o rompimento de um núcleo familiar pré-estabelecido e formado pode acarretar vários problemas psicológicos futuros para a criança retirada abruptamente desse núcleo”.
Em um mundo em que os relacionamentos internacionais são possibilitados pela tecnologia, pessoas de diferentes nacionalidades se conhecem, constroem um relacionamento e famílias que, também, acabam por se separar.
Esses conflitos familiares favorecem os casos de sequestros internacionais de menores. As principais vítimas desses conflitos são os filhos que muitas vezes são privados do convívio e relacionamento afetivo com um dos pais.
Ao longo dos anos foram sendo criadas legislações com o intuito de combater este o sequestro internacional. No plano nacional, o ordenamento jurídico brasileiro, utilizando-se da Constituição Federal, criou mecanismos a proteção do bem-estar da criança e do adolescente. O artigo 227 da Constituição trata do bem estar e proteção da criança e do adolescente.
No plano internacional, por meio do Direito Internacional, utilizando-se da cooperação entre os diversos países ao redor do mundo, se encontrou melhores resultados visando a resolução dos conflitos relativos ao sequestro internacional de menores.
Será apresentado a consignação do Brasil na convenção de Haia de 1980. Essa convenção visa criar meios para que toda criança que se encontre em situação de subtração internacional tenha o apoio dos países contratantes da convenção, de forma a fazer com que este menor, seja realocado a sua residência habitual.
Levando em conta o fato de a subtração internacional de menores ser uma realidade foi criada uma legislação específica para casos relacionados à subtração de menores, com o intuito de extinguir essa prática hedionda, imoral e irresponsável.
Assim, ao criarem este dispositivo normativo facilitaram a devolução/ restituição do menor ao seu país de origem resultando na diminuição do impacto que tal fato causa na vida da criança.
Discorre-se sobra a subtração internacional gerar uma afronta ao direito da criança e do adolescente assim como ao direito de guarda e visita, direito este assegurado pelo ordenamento jurídico brasileiro.
No Brasil a Convenção de Haia de 1980 foi sancionada pelo decreto-lei 79 em 15 de setembro de 1999, entrando em vigor somente no ano de 2000, vinte anos após a afirmação da Convenção.
Antes da Convenção ser adotada pelos países membros, não havia uma lei específica para estes casos. Havia legislações não condizentes com a gravidade do problema e as decisões tomadas prejudicavam tanto os pais como as próprias crianças. Era o resultado da não consolidação de um tratamento de cooperação da comunidade internacional.
A subtração internacional abordada por esse estudo é o deslocamento ilegal da criança para um país diferente daquele no qual está residia habitualmente ou sua retenção indevida em território estrangeiro, transgredindo o direito a guarda ou visita do pai privado do convívio com o filho que foi subtraído, ferindo não só os direitos do genitor mas também o bem-estar e segurança da criança.
A subtração é provocada, em regra, por um dos pais ou familiar próximo, violando o direito de guarda ou poder familiar, que é decidido pela lei do país em que a criança ou adolescente residia antes de sua realocação em país distinto. Portanto, diante desses casos, cabe ao país de residência habitual do menor tomar decisões conforme o direito a guarda e visita. O direito a guarda e visita é uma das mudanças positivas trazidas pela convenção.
Observa-se que a falta de orçamento, o número reduzido de agentes públicos ativos e a grande demanda que Órgãos como a Autoridade Central Administrativa Federal (ACAF), Advocacia Geral da União (AGU) e Defensoria Pública provocam uma lentidão na tramitação dos processos de retorno do menor para o seu país de origem. Isso resulta no Brasil, baixos índices nos deferimentos de pedidos de retorno de menores subtraídos. Destacando outro fator, que burocratiza a colaboração do Brasil com a comunidade internacional é a lentidão do judiciário, que leva o nosso país a sofrer sérias sanções jurídicas pelo tribunal internacional de direitos humanos e condenações morais pela comunidade internacional de países membros.
Apresenta-se neste estudo a evolução histórica que aborda se o Estado atua corretamente com os ditames da convenção de maneira a proteger o direito a guarda e visita, ressaltando as limitações que o Estado tem para resolver realmente o problema da subtração internacional de menores e ainda os pontos positivos trazidos pela Convenção de Haia de 1980.
2. A EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA MANUTENÇÃO DO DIREITO DE GUARDA E VISITA EM CASOS DE SUBTRAÇÃO INTERNACIONAL DE MENORES
A legislação Brasileira é bem ampla e enfática sobre o direito de guarda e visita e sua proteção, dentro do ordenamento jurídico a diversos artigos que tratam sobre os direitos dos pais sobre os filhos menores. O direito de guarda foi criado visando prejudicar o mínimo possível a criança advinda de um relacionamento falido e proporcionar mesmo com o fim do relacionamento que os pais tivessem acesso aos filhos.
Alguns exemplos fáticos são os artigos 1.583 e 1.584 do Código Civil, que tratam do direito a guarda e demonstram como se desenrola o processo de guarda e as modalidades de guarda presentes na lei brasileira.
O artigo 1.589 do Código Civil Brasileiro nos traz clareza quanto a garantia do direito de visita para o genitor que não é detentor da guarda, nos diz também que este pode opinar na educação e criação dos filhos, nos mostra a importância do direito a visita na legislação Brasileira. Mostra-se claro que o Ordenamento Jurídico Brasileiro considera como essencial a proteção ao direito de guarda e visita.
No artigo 1.634 da lei n 10.406 de 10 de janeiro de 2002 em seu inciso VIII traz: “Compete aos pais, qualquer que seja a situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, consiste em, quanto aos filhos; VIII- reclamá-los de quem ilegalmente detenha.”
Tal artigo demonstra que a legislação resguarda o direito dos pais de reclamar seu filho de quem o detenha ilegalmente, fazendo assim com que o detentor ilegal tenha obrigação de devolver a criança ao seu responsável por direito.
A preocupação da legislação com o menor e com os direitos básicos dos pais, que sejam, o direito a guarda e visita, o poder de educar, criar e ter convívio com o filho menor, se mostra clara. Nota-se ainda esta preocupação no artigo 249 do Código Penal, onde fica evidente que a subtração de menores é crime passível de punição jurídica.
A subtração internacional é uma forma cruel de amostra do poder familiar quando ocorre conflito entre um casal de diferentes nacionalidades, seria um castigo ao outro pelo término do relacionamento ou até mesmo por não conseguir a guarda da criança de maneira legal.
Segundo o escritor Garcia Cano (2004) a cooperação internacional é o método mais eficaz para a resolução dos casos de subtração internacional de menores, sendo o que dá mais resultado positivos e gera menos riscos para o menor.
Antes da Convenção de Haia de 1980 não se tinha uma resolução sobre o que deveria ser feito em caso de uma criança ser subtraída e levada para outro pais, então os países debatiam entre si e muitas vezes decidiam deixar o menor com o genitor subtrator no pais para qual foi subtraído, pois era a opção menos trabalhosa, o que transgredia o direito do outro genitor possuidor legal da guarda, fazendo com que este se encontrasse de mãos atadas e por muitas vezes sem conseguir rever o filho.
O direito de visita é amplamente assegurado pela convenção o que faz com que o genitor que possui direito de visita ainda que more em pais diverso do que o pai que tem a guarda fática, ainda possa ter acesso ao filho, nem que seja em período de férias escolares, de modo a resguardar e garantir que seu direito de visita seja respeitado.
A convenção não busca regular direito de guarda e visita e sim assegurar o retorno do menor fazendo-se respeitar o direito de guarda e visita já pré-estabelecido pelo país originário da criança.
No Brasil de 2016 a 2018 foram apenas 10% de taxa de negociações feitas para a manutenção do direito de visita, 29% dos processos foram negados o retorno ao Brasil, apesar de os dados de acordos de visitação não serem altos, conforme o passar dos anos o Brasil tem tido mais sucesso em seus pedidos de retorno, mas ainda assim há muitos casos que pela demora do pedido torna difícil sua aceitabilidade, fazendo com que a criança não volte para o Brasil.
Com base em dados e estatísticas nota-se que o Brasil tem uma média de sucesso em relação aos seus pedidos de retorno de crianças subtraídas do território nacional de menos da metade e mesmo assim no ano de 2018 somente 15 de seus pedidos ativos foram deferidos, 21 foram negados.
A ACAF (Autoridade Central Administrativa Federal) finalizou o ano de 2018 com 98 pedidos de cooperação internacional, pode parecer pouco porém o processo é longo e complexo devido as diversas consequências que podem ser ocasionadas ao psicológico da criança, mas isso demonstra que conforme os anos cada vez mais o Brasil age de forma a tentar proteger a manutenção do direito de guarda e visita, fazendo-se valer da Convenção de Haia tendo uma taxa significativa de sucesso em seus anseios, fazendo com que muitas crianças que foram levadas de forma ilícita voltem ao território nacional e as suas famílias, seguras e protegidas.
Apesar dessa taxa de sucesso obtida pelo Brasil com o passar dos ano, ainda se está muito aquém da maioria dos países contratantes da convenção, mostrando ser necessário uma melhora muito grande no processo de retorno, tornando o processo mais célere e eficaz para o bem do menor subtraído fazendo com que o risco seja mínimo para essa criança.
Um exemplo da falta de competência do Brasil sobre essa questão é o caso, que foi amplamente noticiado, do menor Sean Goldman que teve grande repercussão internacional, o menor foi trazido dos Estados Unidos onde residia ao Brasil por sua mãe Bruna Bianchi autorizada pelo seu então marido David Goldman para fazer uma visita aos familiares desta, chegando aqui a mãe de Sean informou ao pai que não mais voltaria aos Estados Unidos retendo assim ilicitamente o menor conforme dita a convenção, separou-se então de David que entrou com uma ação de guarda onde obteve êxito, porém Bruna casou-se novamente e acabou por falecer, David já havia entrado com uma ação agora postulada no Brasil pra a devolução de Sean aos Estados Unidos mas tendo a ré, ou seja Bruna, falecido a ação perdeu uma de suas condições necessárias.
A União então adentrou com uma ação de busca, apreensão e restituição do menor em desfavor do padrasto perante a Justiça Federal do Rio de Janeiro, obtendo deferimento de seu pedido, porém o Partido Progressista entrou em desfavor desse deferimento junto ao Supremo Tribunal Federal fazendo com que este não fosse reconhecido. Só após cinco anos de extensa batalha judicial, Sean Goldman foi devolvido aos Estados Unidos onde voltou a residir com o pai, centenas de crianças estão em situação similar à de Sean a diferença é que o fato só foi amplamente noticiado devido a intervenção dos Estados Unidos e da mídia mundial.
O caso acima exposto demonstra a inadaptabilidade do Brasil de fazer valer corretamente os ditames da convenção, por termos um processo legislativo demorado e muitas vezes até mesmo irresponsável torna-se difícil agir em conformidade com a Convenção de Haia, o Brasil precisa reformar seu processo judicial como nos reafirma Calmon (2014), tornando-o mais rápido e eficaz na luta contra a subtração internacional.
3. AS LIMITAÇÕES QUE O ESTADO TEM SOBRE A RESOLUÇÃO DO PROBLEMA SUBTRAÇÃO INTERNACIONAL DE MENORES
Como já explanado o Brasil aderiu a Convenção de Haia de 1980 em 1999 e só realmente começou a aplicá-la em 2000, vinte anos mais tarde que os primeiros países signatários, isso por si só já demonstra a lentidão do país.
Desde a adesão da convenção o Brasil tem sofrido altas críticas por parte de vários países estrangeiros pela demora dos procedimentos judiciais brasileiros e alta burocratização do judiciário. Dentre os fatores que atuam para a demora do processo, o emblema da Competência entre a Justiça Estadual e a Justiça Federal é um dos principais.
Segundo Nádia de Araújo (2016), esse conflito tem desnorteado diversos casos da convenção, pois sabe-se que a Justiça Federal é competente para julgar processos oriundos de convenções em que a União faça parte, enquanto a Justiça Estadual tem competência para julgar os processos sobre direito de família, por conta desse problema de competência acaba que mesmo já tendo sido decidido que a justiça Federal é quem deve julgar os casos de subtração internacional, muitos pais não sabendo deste fato acabam protocolando o pedido de retorno na Justiça Estadual, fazendo com que o mesmo processo se encontre em mãos das duas justiças o que faz a lentidão para o julgamento ser ainda maior. Pois a Justiça Estadual não tem competência para julgar esses casos.
Nota-se ser indispensável uma reforma constitucional visando estabelecer a competência para um tribunal especializado em casos de subtração internacional de menores para que o julgamento dos pedidos de retorno sejam mais rápidos fazendo com que o processo ocorra de forma mais célere, vários doutrinadores apoiam o estabelecimento do Supremo Tribunal Federal como detentor da competência para julgar os pedidos de retorno e afirmam que assim não haveria tanta demora e burocratização no julgamento das ações de busca e apreensão realizada por outros países e postuladas no Brasil.
Além disso o fato do Brasil ser um país subdesenvolvido e envolto em corrupção, o que faz com que o dinheiro destinado a uma determinada coisa nunca seja totalmente entregue, prejudique ainda mais a celeridade e aceitabilidade dos processos de retorno. O que torna ainda pior sua imagem internacional e faz com que este seja motivo de chacota pela comunidade internacional de países desenvolvidos.
Há também necessidade de revisão doutrinária quanto a ação de busca e apreensão e restituição do menor, pois por falta de pistas muitas vezes se torna quase impossível encontrar a criança subtraída, essa ação é promovida pela AGU sendo uma ação própria e autônoma, o Brasil deve melhor legislar sobre essa ação para facilitar o trabalho da AGU, tornando mais fácil a localização da criança e seu retorno. A demora no pedido de retorno torna mais complicado a localização e mais baixas as chances de deferimento do pedido, o papel do Estado é atuar o mais rápido possível visando o retorno imediato do menor.
Além disso é muito importante o apoio da mídia internacional para facilitar a obtenção de informações sobre o menor subtraído. Fazendo com que os casos sejam amplamente divulgados através dos mais diversos meios de comunicações o que torna mais fácil e rápido a localização e retorno da criança, fazendo com que o processo seja mais lépido e eficiente.
O Brasil não possui estrutura suficientemente preparada para lidar com casos de subtração internacional, além da falta de orçamento, pessoal, problemas com corrupção, nosso país não possui juízes federais suficientemente preparados para atuar em casos de subtração internacional, ademais de não se ter órgão competente para julgamento de ações de repatriamento.
O procedimento de aplicabilidade da convenção de Haia sobre subtração internacional de menores, segundo o artigo 2° da dita convenção deve tramitar em regime de urgência, porém no caso do Brasil, mesmo tendo se passado 20 anos da contratação da convenção, ainda não se tem uma lei interna para regulamentar o procedimento de aplicabilidade da convenção, o rito utilizado é o da busca e apreensão que não é suficiente para resolver o problema, diante disso há uma adaptação de um rito para esses casos o que gera extrema insegurança jurídica. O Congresso Nacional já deveria editado uma lei sobre a aplicação procedimental da convenção para sanar essa insegurança jurídica.
A convenção deixa claro que o prazo máximo para localização, busca, apreensão e retorno da criança para o Estado requerente é de seis semanas, mas não há um precedente jurídico brasileiro que demonstra que esse prazo foi respeitado e seguido. O Judiciário brasileiro é extremamente lento e isso prejudica a aplicação correta e eficiente dos ditames da convenção.
A partir de 2005 a Secretaria Especial de Políticas para Mulheres da Presidência da República ( SPM) começou a receber relatos de mulheres que sofriam com a violência doméstica advinda de seus parceiros, essa mulheres muitas vezes conheciam um estrangeiro se apaixonavam e tinham filhos no exterior e após anos de violência, já não suportando mais, voltavam ao Brasil com seus filhos em buscando fugir de seus violentadores, porém eram acusadas por seus ex-maridos de terem sequestrado seus próprios filhos, isso se tornou cada vez mais comum e um problema de grande proporção.
Após vigorar a lei Maria da Penha pensou-se que o Brasil reforçaria o sistema de proteção ao direito da mulher, especialmente no que se refere as relações de mães brasileiras e seus filhos. vítimas de violência familiar. A Convenção de Haia deveria começar a ser interpretada em sentido mais amplo não apenas em reação a proteção do menor mas também a respeito dos direitos humanos em si, de assistência as mães que passaram por violência doméstica e familiar e ainda serem acusadas de ‘sequestrar” o próprio filho ao tentar fugir de tal violência.
Apesar dos casos relatados de subtração internacional de menores trazidos para o Brasil devido a violência doméstica serem minoria, não se pode menosprezar essa realidade fática e trágica, a restituição dessa criança ao pai agressor pode acarretar sérios riscos físicos e psicológicos, além de expor a mãe novamente ao assedio psicológico muitas vezes praticados por estes agressores, a primeira notícia que se tem de um caso de repatriação de uma criança vítima de violência doméstica data de 2005 apesar de desde 2003 serem retratados casos de pedidos de repatriação junto a SPM.
Em casos de violência doméstica ficou decidido que a SPM ao receber denúncias de violência contra mulher no âmbito da Convenção de Haia de 1980 passaria as informações necessárias a Autoridade Central Administrativa Federal (ACAF) que lidaria com a situação, quando o contrário acontecer a SPM tem o direito de opinar no processo, no estado a dificuldade de cumprir o acordado tem duas ordens, práticas e legais, não a pratica tanto a ACAF quanto a AGU tem dificuldades materiais e formais para lidar com os casos que vem se apresentando, pois não há um procedimento administrativo para lidar com estes casos.
Sob o ponto de vista legal a coisa se torna mais complicada pois a imensa incompetência da Justiça Federal para análise dos casos, sem que antes sejam homologadas sentenças que tratem da guarda e visita perante o Superior Tribunal de Justiça, fazendo com que os princípios jurisdicionais da análise que deveria ser feita pela justiça federal não sejam adequadamente observados fazendo com que esses casos não sejam solucionados de maneira correta.
Outro ponto de extrema importância é que não há previsão na convenção sobre a violência doméstica o que faz com a decisão pelo pedido de retorno feita pelo pai agressor em face da mãe que só queria fugir das agressões e viver em paz com seu filho se torne extremamente difícil e lenta, a violência doméstica e familiar transgrede os direitos humanos e deveria assim ser regulamenta pela convenção de maneira que comprovada essa violência a mulher não sofresse nenhuma punição e ela e seu filho fossem protegidos pela convenção de forma a não mais terem que voltar ao pais do qual fugiram.
A Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente assim como os tratados internacionais de proteção ao menor demonstram o interesse do Estado Brasileiro pela tutela e proteção aos direitos das crianças, a lei Maria da Penha também é uma lei de proteção não só a mulher mas também aos filhos, portanto para que os aspectos da convenção seja, respeitados e cumpridos é necessário que seja tratada com a importância destes outros dispositivos legislativos e ser levada em conta quando se for aplicar a convenção.
Com base neste problema foi criado por meio do decreto-lei nº 3.951/2001 para que os pedidos recebidos pelo o Brasil e os enviados por este para o exterior pudessem passar por um conselho para serem acompanhados e direcionados de forma legal e transparente, a implementação fática desse conselho ajudaria a resolver questões éticas e legais, que são extremamente importantes para a Convenção de Haia de 1980 para que a convenção possa ser totalmente e realmente praticada pelo Brasil principalmente se referindo a sua constitucionalidade.
Em se tratando de casos de denúncias relacionadas a violência doméstica caberia a SPM fazer parte deste conselho, pois foi sua ação de repassar as denúncias que recebia que tornou os casos de violência doméstica e familiar relacionados a subtração internacional de menores conhecidos e debatidos dando maior importância a esta quebra dos direitos humanos. Há muito a ser feito para tornar a convenção hábil e eficiente como deveria e só cabe ao Estado Brasileiro fazê-lo.
4. DADOS EFETIVOS QUE COMPROVAM A APLICAÇÃO DA CONVENÇÃO DE HAIA DE 1980
A Convenção de Haia de 1980 busca por meio da cooperação jurídica internacional localizar e realocar a criança subtraída, fazendo com que está volte ao seu país de origem, busca também proteger os interesses dos menores lhes garantindo dignidade como ser humano. A convenção de Haia por se tratar de um tratado internacional de direitos humanos tem hierarquia normativa supralegal, ou seja, está abaixo da Constituição Federal, mas acima das leis ordinárias e complementares, mostrando a importância e relevância da Convenção de Haia de 1980.
Para a autora Nádia Araújo (Renovar, 2011) a Convenção é inovadora pois foge dos modelos tradicionais ao não se concentrar somente na lei aplicável, mas também no caráter administrativo e judicial da legislação.
Atualmente são cerca de 115 países signatários da Convenção de Haia de 1980 sobre os aspectos cíveis da subtração internacional de menores. A Convenção aborda somente os aspectos cíveis da subtração internacional de menores, ela não visa punir o genitor subtrator e sim conservar o direito de ambos os pais assim como o direito da criança subtraída.
A convenção não veio para afastar o pai subtrator da criança e sim para fazer com que ambos os genitores tivessem um relacionamento de convivência com os filhos e resguardar o direito de guarda e visita pertencentes a esses pais visando o bem maior do menor.
De acordo com Elisa-Peréz Vera (1980) a Convenção de Haia de 1980 é: “acima de tudo uma Convenção que procura evitar a transferência internacional de uma criança mediante a criação de um sistema de estreita cooperação entre as autoridades judiciais e administrativas dos Estados Contratantes”.
As primeiras tentativas de cooperação internacional começaram a chegar ao Brasil por volta de 2002, o primeiro caso vivenciado pelo Brasil de cooperação internacional foi o de uma mãe Argentina que teve o filho trazido ao Brasil ilegalmente pelo pai brasileiro, que não havia conseguido a guarda do filho.
Desde o ano de 2003 até 2013 a AGU havia atuado em aproximadamente 290 casos, são atualmente cento e quinze países que compõe a Convenção de Haia, no ano de 2016 a 2018 foram 60% de pedidos ativos, o que significa que um determinado Estado entrou com uma ação de retorno de uma criança subtraída.
Nota-se que após a Convenção a resolução do problema da subtração internacional de menores não só se tornou mais fácil como também aproximou e estreitou a relação de diversos países, o que auxilia na economia, na imagem internacional, na exportação e importação etc. A Convenção trouxe diversos benefícios não só para os pais e crianças que se encontravam em situação desesperadora e de difícil resolução, mas também para os países se conectarem e se desenvolverem.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante de todo o exposto é evidente que a Convenção de Haia de 1980 é um grande avanço em relação ao ordenamento jurídico internacional comum, trouxe diversos benefícios para os países signatários assim como para os direitos da criança e do adolescente, como também para o de guarda e visita, uma vez que a subtração internacional de menores é uma afronta gravíssima para esses ditos direitos, tornando mais fácil a atuação dos países e a resolução dos casos de subtração internacional de menores.
Observa-se que além da demora de consignação do Brasil na Convenção, o País não tem os melhores índices de deferimento de pedidos de retorno e nem de efetiva cooperação internacional, fazendo com que sua imagem seja mal vista e este seja extremamente criticado na comunidade internacional.
O Brasil tem diversos problemas que torna o processo de busca, apreensão e devolução do menor mais lento, entre eles falta de orçamento e agentes qualificados para a função que exercem, deficiência legislativa e doutrinária e alta burocratização da ação de busca, apreensão e retorno, o que torna o processo altamente demorado e dificilmente deferimento desses processos, Tudo isso faz com que o Brasil não atue corretamente nos ditames da Convenção de Haia de 1980.
Há também a pouca importância e a falta de agir do Brasil aos casos de violência doméstica e familiar advindas de relacionamentos entre casais de diferentes nacionalidades o que faz com que a mãe que sofre essa violência busque voltar ao Brasil para fugir de seu violentador, porém a convenção não especifica o que deve ser feito nestes casos e a mãe acaba sendo descrita como a sequestradora do filho, o retorno para este violentador pode trazer sérios riscos físicos e psicológicos para a criança e sua mãe e cabe ao Brasil fazer com que isto não aconteça não só por uma interpretação favorável da convenção neste quesito como também legislando essa proteção a essa mãe e filho vítimas da violência doméstica.
Portanto, faz-se necessário uma revisão legislativa e doutrinária, assim como uma reforma constitucional visando estabelecer a competência para julgamento dos pedidos de retorno fazendo com que o processo ocorra de forma mais célere, estabelecendo a competência legislativa ao Supremo Tribunal Federal para julgar os pedidos de retorno, diminuindo a demora e burocracia no julgamento das ações de busca e apreensão realizadas por outros países e postuladas no Brasil. Melhorando a cooperação internacional e consequentemente a imagem do Brasil diante da comunidade internacional. Uma legislação eficiente visando proteger a mãe e o filho que fogem da violência doméstica e familiar e uma melhor interpretação da convenção a esse favor, assim como um conselho adequado para julgar estes casos e proteger essas vítimas de seu violentador.
Concluindo tudo isso nos mostra que apesar do avanço já feito para o combate da subtração internacional de menores, o Brasil apesar de já ter uma melhora significativa em relação a sua atuação nos casos de subtração internacional ainda deve melhorar muito a legislação brasileira, a cooperação e desburocratização, para ter uma taxa alta de sucesso na sua atuação em casos de subtração internacional de menores, tanto nos pedidos ativos quanto nos passivos.
REFERÊNCIAS
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[1] Professor do Centro Universitário Católica do Tocantins. [email protected]
Bacharelanda do curso de Direito do Centro Universitário Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VIANA, Jackeline Maximiano. A aplicação da Convenção de Haia de 1980 em casos de subtração internacional de menores na manutenção do direito de guarda e visita Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 dez 2020, 04:31. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55985/a-aplicao-da-conveno-de-haia-de-1980-em-casos-de-subtrao-internacional-de-menores-na-manuteno-do-direito-de-guarda-e-visita. Acesso em: 23 dez 2024.
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