O Estado existe para servir ao cidadão e não para dele se servir. Hodiernadamente, por isso, cresce a cobrança diária da população e dos órgãos de controle sobre a necessária ampliação dos serviços públicos.
Nesse contexto, a Administração Pública precisa atingir índices de alta eficiência na prestação destas tarefas em benefício dos cidadãos. E, para tanto, uma das estratégias mais comuns de que se valem os gestores públicos é a alteração do dimensionamento de pessoal.
A par disso, segundo essa acepção defendida por grande parte dos gestores públicos, para se ter uma maior presença do Estado é necessário que se amplie o quadro de servidores públicos que nele laboram, seja através de concurso público, seja mediante provimentos de cargos em comissão. Ou até via terceirização de suas atividades pela iniciativa privada.
Por óbvio que a decisão administrativa de expansão do quadro de servidores, quando efetivamente se mostrar conveniente e oportuno, merece total cabimento e estímulo. Seria inaceitável que um hospital, por exemplo, necessitasse de mais médicos com formação em obstetrícia e simplesmente o Estado não se importasse em prover as unidades de saúde com esses profissionais, causando a morte de bebês.
Por isso, em muitas situações a primeira medida a ser adotada pelo gestor público ao ser confrontado com a dificuldade na prestação do serviço público é imputar tal falha ao número insuficiente de servidores públicos.
No entanto, geralmente a falha quanto ao serviço público mal prestado não se resolverá com a contratação desmedida de novos profissionais, haja vista que, quase sempre, o ingresso dos novos servidores públicos não será precedido de um planejamento estratégico.
No tocante ao dimensionamento de pessoal caberia à Administração Pública atuar mediante um planejamento de longo prazo, sempre com cenários prospectivos. Planejar os valores, a visão e a missão da organização pública. Analisar o ambiente externo e interno. Construir os cenários a partir de uma identificação, com diagnóstico preciso da situação a ser gerida.
Essa visão estratégica necessitaria de uma concepção geradora de possíveis cenários, os quais pudessem ser interpretados e analisados, com a perspectiva de proposições a serem implantadas. Também da feitura de uma simulação da gestão futura daquele órgão público, consolidada numa versão final para fins de execução.
Para tanto a Administração Pública, indubitavelmente, necessitaria caminhar e traçar o seu processo decisório administrativo a partir de indicadores e metas de desempenho. Criar as iniciativas estratégicas, executá-las e, assim implementá-las mediante um plano de ação, gerindo os projetos específicos deste.
O que se percebe como regra na prática administrativa brasileira, no entanto, é a completa ausência de um planejamento estratégico quanto ao dimensionamento de pessoal na seara da Administração Pública.
Ao invés, por exemplo, de se elaborar o instrumento básico de uma gestão eficiente – fala-se aqui do planejamento estratégico – parte-se para uma contratação de pessoal sem qualquer dimensionamento. Por vezes, até descompromissada com o futuro e as consequências negativas que poderão advir destas medidas, como o inchaço de um órgão público com servidores públicos em demasia.
O resultado disto é a continuidade, em todo o país, de problemas graves na execução dos serviços públicos. Na gênese da dificuldade, no entanto, há uma triste realidade escondida numa cortina de fumaça, qual seja a inexistência de planejamento estratégico.
Muitas vezes, os problemas da Administração Pública poderiam ser resolvidos com a relotação de servidores públicos que estão subutilizados. Ou com a mudança de visão da instituição com relação ao enfrentamento dos desafios diários. Coisas simples como a redução da burocracia, a automação de tarefas repetitivas ou mesmo a criação de um midset empreendedor no campo do serviço público, com foco na inovação.
No âmbito do Estado de Alagoas, a título de exemplo, o legislador constituinte previu essa necessidade de realizar uma Administração Pública pautada no planejamento, conforme se vê logo abaixo:
Art. 42. A Administração Pública, estadual e municipal, observará os princípios fundamentais de prevalência do interesse público, legalidade, impessoalidade, moralidade, economicidade, publicidade, planejamento e continuidade, além de outros estabelecidos nesta Constituição. (grifou-se)
No entanto, ainda se trata de uma norma jurídica de baixa efetividade onde os sucessivos gestores públicos não possuem, em regra, a preocupação com o dimensionamento de pessoal. Em muitos casos usando a contratação de pessoal como mero capricho, interesse pessoal ou mesmo eleitoral.
Portanto, em tempos onde se discute o futuro da Administração Pública a partir de uma mudança promovida pela inteligência artificial, pela digitalização dos serviços públicos, pela reestruturação física dos órgãos públicos, pela valorização dos servidores públicos já contratados mediante políticas de reconhecimento dos seus esforços, pelo controle de ilegalidades dos chamados “servidores fantasmas” que não comparecem ao seu labor, parece ser necessário e urgente haver um planejamento estratégico prévio às contratações na Administração Pública.
A título de arremate, fica como reflexão o trecho da obra clássica de Lewis Carroll chamada “Alice no País das Maravilhas” onde a menina Alice dialoga com o Gato sobre os rumos que pretende seguir:
E prosseguiu: “Você poderia me dizer, por favor, qual o caminho para sair daqui?”
“Depende muito de onde você quer chegar”, disse o Gato.
“Não me importa muito onde...” foi dizendo Alice.
“Nesse caso não faz diferença por qual caminho você vá”, disse o Gato.
“...desde que eu chegue a algum lugar”, acrescentou Alice, explicando.
“Oh, esteja certa de que isso ocorrerá”, falou o Gato, “desde que você caminhe o bastante.”
Assim, se a Administração Pública brasileira não sabe onde quer chegar, diante da ausência de um planejamento estratégico, como dizer que existe algum caminho próspero e iminente para se sair, efetivamente, do grave problema em que se encontra no que tange à má-prestação dos serviços públicos?
Fica a pergunta.
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