RESUMO: O presente trabalho analisará as hipóteses de exclusão da responsabilidade civil dos genitores em razão de prejuízos causados pelos filhos. Primeiramente, será demonstrado que a responsabilidade civil no ordenamento jurídico brasileiro é, via de regra, subjetiva (depende da comprovação de dolo ou culpa) e individual (apenas o autor do dano por ele é responsabilizado). Excepcionalmente, o Código Civil prevê hipóteses em que indivíduos serão solidariamente e objetivamente responsabilizados por danos de terceiros, como é o caso dos pais perante os filhos. Apesar disso, será explicado que os filhos apenas respondem subsidiariamente e equitativamente, de maneira que seus genitores deverão ser preferencialmente responsabilizados. Após, serão exploradas as hipóteses de exclusão da responsabilidade dos pais, sendo a primeira a emancipação legal dos filhos, diferenciando-a da voluntária, que não exclui a responsabilidade. Ao fim, será analisado julgado do Superior Tribunal de Justiça, no qual se entendeu que a ausência de autoridade de fato dos genitores exclui sua responsabilidade. Concluir-se-á pelo acerto da decisão, destacando-se que a mera ausência de vigilância imediata não implica a ausência de autoridade, conforme julgado anterior do STJ.
PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade dos guardiães. Ausência de autoridade. Responsabilidade solidária dos pais.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Da responsabilidade civil em geral. 3. Da responsabilidade dos genitores pelos filhos. 3.1. Da exclusão da responsabilidade dos genitores. 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como objetivo analisar possibilidade de exclusão da responsabilidade dos pais pelos atos praticados pelos seus filhos.
Para tanto, primeiramente, será exposta a forma pela qual se dá a responsabilidade dos pais perante os filhos, evidenciando que se trata de responsabilidade de natureza solidária. Será demonstrado, ainda, que os filhos podem ser responsabilizados pelos próprios atos, desde que subsidiariamente e equitativamente.
Posteriormente, analisar-se-á as hipóteses legais de exclusão da responsabilidade. Nesse sentido, será exposto que a emancipação legal dos filhos implica a extinção da responsabilidade, ao oposto do que ocorre com sua emancipação voluntária, que a mantém.
Por fim, será demonstrado que, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), admite-se a exclusão da responsabilidade dos pais quando demonstrado que já não exercem qualquer autoridade de fato sobre os filhos, ainda que não juridicamente emancipados. Concluir-se-á pelo acerto da decisão, desde que não se confunda a ausência de autoridade de fato com a mera ausência de vigilância imediata por questão de distância física, que, conforme a jurisprudência do STJ, não tem o condão de excluir a responsabilidade dos filhos.
2. DA RESPONSABILIDADE CIVIL EM GERAL.
O ordenamento jurídico brasileiro apresenta, como regra geral, que o violador de direito ou o causador de dano a bem jurídico de outrem comete ato ilícito. É isso que prevê o art. 186 do Código Civil (CC):
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito. (Brasil, 2020).
Destaca-se que o dispositivo legal abarca tanto as condutas dolosas (comitivas ou omissivas), como as condutas culposas, considerando como tal as que advém de comportamento não intencional, desde que negligente ou imprudente.
Mais adiante, o art. 927 do CC estabelece que o autor de atos ilícitos fica, via de regra, obrigado a repará-los:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. (Brasil, 2020).
Importante notar que o art. 186 estabelece o dever de indenização ainda que o dano causado seja “exclusivamente moral”, sem definir, contudo, em que se consiste isso. Segundo a doutrina, dano moral puro seria aquele que não atinge nenhum bem jurídico patrimonial.
Nesse sentido, esclarece TARTUCE (2018):
A segunda é que a disposição atual permite a reparação do dano moral puro, sem repercussão patrimonial (“dano exclusivamente moral”). (TARTUCE, 2018, p. 371).
É essa, portanto, a distinção entre os tipos de dano: o dano material, que decorre da lesão a bens jurídicos patrimoniais, e o dano moral, que decorre da lesão a bens jurídicos não patrimoniais. Não há óbice, inclusive, na cumulação de indenização pelos dois tipos de dano, desde que demonstrado que um mesmo fato causou, simultaneamente, a ocorrência de lesão a bem patrimonial e a bem não patrimonial.
Esse entendimento já se encontra pacificado pela súmula nº 37 do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato (Súmula 37, CORTE ESPECIAL, julgado em 12/03/1992, DJ 17/03/1992).
Isso posto, cumpre destacar que a responsabilidade civil é, em regra, individual, e não solidária. Isso significa que, a princípio, apenas é possível responsabilizar por um ato ilícito aquele quem o cometeu diretamente.
É o que dispõem os artigos 264 a 266 do Código Civil (CC):
Art. 264. Há solidariedade, quando na mesma obrigação concorre mais de um credor, ou mais de um devedor, cada um com direito, ou obrigado, à dívida toda.
Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.
Art. 266. A obrigação solidária pode ser pura e simples para um dos co-credores ou co-devedores, e condicional, ou a prazo, ou pagável em lugar diferente, para o outro.
(Brasil, 2020).
Após o exposto, cabe se expor algumas das hipóteses legais de responsabilidade solidária previstas na lei, entre elas, a responsabilidade dos genitores em razão dos atos praticados pelos seus filhos.
3. DA RESPONSABILIDADE DOS GENITORES PELOS FILHOS.
O art. 932 do CC prevê as hipóteses genéricas em que um indivíduo responde pelos atos causados por um terceiro, como no caso dos pais pelos atos praticados pelos filhos (inciso I):
Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil:
I - os pais, pelos filhos menores que estiverem sob sua autoridade e em sua companhia;
II - o tutor e o curador, pelos pupilos e curatelados, que se acharem nas mesmas condições;
III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele;
IV - os donos de hotéis, hospedarias, casas ou estabelecimentos onde se albergue por dinheiro, mesmo para fins de educação, pelos seus hóspedes, moradores e educandos;
V - os que gratuitamente houverem participado nos produtos do crime, até a concorrente quantia. (Brasil, 2020).
Trata-se de hipóteses de responsabilidade solidária. É o que dispõe o parágrafo único do art. 942 do CC:
rt. 942. Os bens do responsável pela ofensa ou violação do direito de outrem ficam sujeitos à reparação do dano causado; e, se a ofensa tiver mais de um autor, todos responderão solidariamente pela reparação.
Parágrafo único. São solidariamente responsáveis com os autores os co-autores e as pessoas designadas no art. 932. (Brasil, 2020).
Em outras palavras, aquele a quem cabe receber a reparação civil pode optar por ajuizar ação em face de qualquer um dos responsáveis previstos no art. 932 do CC, isoladamente ou cumulativamente. Exceção é, nesse quesito, a responsabilidade dos pais em face dos filhos. Isso porque o art. 928 do CC estabelece que a responsabilidade dos incapazes pelos seus prejuízos será, via de regra, subsidiária e equitativa, não podendo privá-los do necessário para sobreviverem:
Art. 928. O incapaz responde pelos prejuízos que causar, se as pessoas por ele responsáveis não tiverem obrigação de fazê-lo ou não dispuserem de meios suficientes.
Parágrafo único. A indenização prevista neste artigo, que deverá ser eqüitativa, não terá lugar se privar do necessário o incapaz ou as pessoas que dele dependem. (Brasil, 2020).
Sobre esse tema, aprofundando-se na interpretação do art. 928 do CC, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já estabeleceu que a responsabilidade dos menores de idade pelos prejuízos por eles causados é subsidiária, equitativa e mitigada:
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL POR FATO DE OUTREM - PAIS PELOS ATOS PRATICADOS PELOS FILHOS MENORES. ATO ILÍCITO COMETIDO POR MENOR. RESPONSABILIDADE CIVIL MITIGADA E SUBSIDIÁRIA DO INCAPAZ PELOS SEUS ATOS (CC, ART. 928). LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO.
INOCORRÊNCIA.
1. A responsabilidade civil do incapaz pela reparação dos danos é subsidiária e mitigada (CC, art. 928).
2. É subsidiária porque apenas ocorrerá quando os seus genitores não tiverem meios para ressarcir a vítima; é condicional e mitigada porque não poderá ultrapassar o limite humanitário do patrimônio mínimo do infante (CC, art. 928, par. único e En. 39/CJF); e deve ser equitativa, tendo em vista que a indenização deverá ser equânime, sem a privação do mínimo necessário para a sobrevivência digna do incapaz (CC, art. 928, par. único e En. 449/CJF).
3. Não há litisconsórcio passivo necessário, pois não há obrigação - nem legal, nem por força da relação jurídica (unitária) - da vítima lesada em litigar contra o responsável e o incapaz. É possível, no entanto, que o autor, por sua opção e liberalidade, tendo em conta que os direitos ou obrigações derivem do mesmo fundamento de fato ou de direito (CPC,73, art. 46, II) intente ação contra ambos - pai e filho -, formando-se um litisconsórcio facultativo e simples.
4. O art. 932, I do CC ao se referir a autoridade e companhia dos pais em relação aos filhos, quis explicitar o poder familiar (a autoridade parental não se esgota na guarda), compreendendo um plexo de deveres como, proteção, cuidado, educação, informação, afeto, dentre outros, independentemente da vigilância investigativa e diária, sendo irrelevante a proximidade física no momento em que os menores venham a causar danos.
5. Recurso especial não provido.
(REsp 1436401/MG, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 02/02/2017, DJe 16/03/2017).
Extrai-se do julgado, ainda, que, em decorrência da subsidiariedade da responsabilidade do filho, não há litisconsórcio passivo necessário entre ele e seu pai. Isso significa que a vítima do prejuízo pode optar por ajuizar a ação civil em face do filho e dos genitores ou apenas em face dos genitores, sem necessidade de que o incapaz figure no polo passivo.
Importante destacar, por fim, a finalidade de tal proteção legal aos filhos incapazes. Segundo CAVALLIERI (2014):
Essa espécie de responsabilidade tem por fundamento o vínculo jurídico legal existente entre pais e filhos menores, o poder familiar, que impõe aos pais obrigações várias, entre as quais a de assistência material e moral (alimentos, educação, instrução) e de vigilância, sendo esta nada mais que um comportamento da obra educativa. (CAVALIERI FILHO, 2014, p. 239).
Em outras palavras, a ratio legislandi da referida normativa reside no poder familiar dos pais, do qual se extrai que é complementar à educação dos pais assistência material e a orientação aos seus filhos, sendo natural sua responsabilização pelos atos que eles pratiquem:
Após o exposto, cumpre analisar quais as possibilidades de que os pais se isentem da responsabilidade dos filhos.
3.1. Da exclusão da responsabilidade dos genitores.
Embora seja objetiva e solidária, há mais de uma situação em que os genitores não responderão pelos prejuízos causados pelos filhos. Nesse sentido, a primeira hipótese legal é a emancipação legal do filho. Isso ocorre porque, uma vez legalmente emancipado, cessa sua incapacidade civil, cessando, simultaneamente, o poder familiar que legitimava a responsabilização paterna. Assim prevê o inciso II do art. 1.635 do CC:
Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar:
I - pela morte dos pais ou do filho;
II - pela emancipação, nos termos do art. 5 o , parágrafo único;
III - pela maioridade;
IV - pela adoção;
V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638. (Brasil, 2020).
Cabe salientar, contudo, que existem duas espécies de emancipação dos incapazes menores de idade: as que decorrem de comando legislativo (emancipação legal) e as que decorrem de mera liberalidade dos genitores (emancipação voluntária). É o que prevê o parágrafo único do art. 5º do CC:
Art. 5 o A menoridade cessa aos dezoito anos completos, quando a pessoa fica habilitada à prática de todos os atos da vida civil.
Parágrafo único. Cessará, para os menores, a incapacidade:
I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver dezesseis anos completos;
II - pelo casamento;
III - pelo exercício de emprego público efetivo;
IV - pela colação de grau em curso de ensino superior;
V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com dezesseis anos completos tenha economia própria. (Brasil, 2020).
Nesse sentido, os incisos II, III, IV e V são hipóteses de emancipação legal, enquanto o inciso I é a hipótese de emancipação voluntária. Após exposto, cumpre enunciar que apenas as hipóteses de emancipação legal afastam a responsabilidade dos genitores, não o fazendo a emancipação do tipo voluntária.
Sobre o tema, já decidiu o STJ:
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. ATROPELAMENTO. LESÕES CORPORAIS. INCAPACIDADE. DEVER DE INDENIZAR. REEXA,E DE MATÉRIA DE FATO. REVISÃO DO VALOR DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. PENSÃO MENSAL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. CUVMULAÇÃO. POSSIBILIDADE. JULGAMENTO ULTRA PETITA. OCORRÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL DOS PAIS. EMANCIPAÇÃO.
1. Não cabe recurso especial por alegada ofensa a dispositivos constitucionais.
2. A emancipação voluntária, diversamente da operada por força de lei, não exclui a responsabilidade civil dos pais pelos praticados por seus filhos menores.
(...)
Agravo regimental parcialmente provido.
(STJ – AgRg: 1239557 RJ 2009/0195859-0, Relator: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Julgamento: 09/10/2012, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/10/2012).
Essa distinção se justifica em razão de a emancipação voluntária não depender, em tese, de manifestação de vontade do incapaz. Assim, permitir que esse tipo de emancipação exclua a responsabilidade dos pais favoreceria a realização de fraudes, nas quais os genitores poderiam, maliciosamente, eximir-se da responsabilidade, sem que qualquer circunstância fática a justifique, unicamente com o propósito de fraudar a lei.
Outra hipótese legal de exclusão da responsabilidade dos genitores verifica quando estes já não possuem autoridade de fato sobre o filho. Sobre o tema, já decidiu o STJ:
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DE TRÂNSITO ENVOLVENDO MENOR. INDENIZAÇÃO AOS PAIS DO MENOR FALECIDO.
ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. REVISÃO. ART. 932, I, DO CÓDIGO CIVIL.
1. A responsabilidade dos pais por filho menor - responsabilidade por ato ou fato de terceiro -, a partir do advento do Código Civil de 2002, passou a embasar-se na teoria do risco para efeitos de indenização, de forma que as pessoas elencadas no art. 932 do Código Civil respondem objetivamente, devendo-se comprovar apenas a culpa na prática do ato ilícito daquele pelo qual são os pais responsáveis legalmente.
Contudo, há uma exceção: a de que os pais respondem pelo filho incapaz que esteja sob sua autoridade e em sua companhia; assim, os pais, ou responsável, que não exercem autoridade de fato sobre o filho, embora ainda detenham o poder familiar, não respondem por ele, nos termos do inciso I do art. 932 do Código Civil.
2. Na hipótese de atropelamento seguido de morte por culpa do condutor do veículo, sendo a vítima menor e de família de baixa renda, é devida indenização por danos materiais consistente em pensionamento mensal aos genitores do menor falecido, ainda que este não exercesse atividade remunerada, visto que se presume haver ajuda mútua entre os integrantes dessas famílias.
3. Recurso especial conhecido parcialmente e, nessa parte, provido também parcialmente.
(REsp 1232011/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/12/2015, DJe 04/02/2016, grifos nossos).
Nota-se que, no caso em tela, não havia sido rompido juridicamente o poder familiar dos pais com os filhos, de modo que o menor de idade ainda era, nos termos do art. 5º do CC, um incapaz. Entretanto, excepcionalmente, entendeu o STJ que a mãe do adolescente não poderia ser mais responsabilizada, uma vez que não mais exercia qualquer espécie de autoridade sobre o adolescente. Efetivamente, no caso em análise, o adolescente já residia permanentemente em local distinto dos pais, e não dependia deles economicamente, não se reportando a eles para a realização de seus atos.
Observa-se que o inciso I do art. 932 do CC, que estipula a responsabilidade solidária e objetiva dos pais pelos filhos, estipula que essa ocorre quando estiverem “sob sua autoridade e e em sua companhia”. Assim, se os pais já não exercem qualquer autoridade sobre os adolescentes (ausência de autoridade de fato), não há responsabilidade legal, por exclusão dos requisitos previstos no próprio dispositivo legal.
Isso não significa, contudo, que os pais se ausentarão de responsabilidade sempre que não tiverem vigilância imediata sobre eles (estiverem fisicamente distantes). Sobre o tema, pede-se releitura do item 4 do julgado citado acima (Recurso Especial nº 1436401/MG), no qual a corte destacou que a falta de proximidade entre genitor e menor, por si só, não é suficiente para a exclusão da responsabilidade do primeiro.
Isso ocorre porque, embora o art. 932 do CC empregue a conjunção “e”, sua interpretação não pode ser gramaticalmente literal, ao ponto de se pretender que o incapaz esteja sempre na companhia do pai, sob pena de ser perder, por completo, o conteúdo normativo do dispositivo legal.
Ademais, não e vislumbra contradição entre esse julgado e o anterior, em que se admitiu a exclusão da responsabilidade dos genitores por ausência de autoridade de fato. Evidentemente, as duas variáveis não se confundem. A autoridade dos pais sobre os filhos não se extingue com o mero afastamento destes, que permanecem, em tese, se reportando e dependendo dos genitores, mesmo que temporariamente distantes. O que exclui a responsabilidade, nesse sentido, é, apenas, a perda completa da autoridade, tal como salientado.
4. CONCLUSÃO.
O presente trabalho conclui que, via de regra, a responsabilidade civil pelos prejuízos causados por um indivíduo é subjetiva (depende da comprovação de dolo ou culpa) e não solidária (apenas o indivíduo que causou o dano pode ser responsabilizado por ele). Excepcionalmente, a lei estipula casos em que terceiro, não causador do dano, poderá ser objetivamente e solidariamente responsável pelo autor do prejuízo.
Os pais, nessa perspectiva, são solidariamente e objetivamente responsáveis pelos prejuízos causados pelos seus filhos incapazes. Há, contudo, causas excludentes dessa responsabilidade, precipuamente: a emancipação e a perda completa de autoridade em face do filho.
No que tange à emancipação, apenas as emancipações do tipo legal causariam a extinção da responsabilidade, sob pena de se permitir que genitores, maliciosamente e fraudulosamente, busquem eximir-se da responsabilidade legal, sem qualquer justificativa para tanto. Já em relação à exclusão da responsabilidade por exclusão da autoridade de fato, concluiu-se que a mera ausência de vigilância imediata (distância física) entre genitor e menor não a implicam, sob pena de esvaziamento absoluto do conteúdo normativo do inciso I do art. 932 do CC.
Espera-se que o tema seja mais bem aprofundado em trabalhos posteriores, de maneira a se esmiuçar as variáveis que, em tese, poderiam permitir ao magistrado a visualização de cenários em que a autoridade de fato é absolutamente perdida.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL, Conselho Administrativo de Defesa Econômica, Processo Administrativo nº 08012.00484/2005-51, Conselheiro Relator Fernando de Magalhães Furnal, 2010.
BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Brasília, DF: Congresso Nacional.
Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em 20/08/2020.
BRASIL, Lei nº 10.046 de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil). Brasília, DF: Presidência da República.
Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em: 20/08/2020.
BRASIL, Lei nº 13.105 de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil). Brasília, DF: Presidência da República.
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BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Quarta Turma). Recurso Especial 1239557/RJ. Relatora: Ministra Maria Isabel Gallotti, 09 out. 2012, Diário de Justiça Eletrônico: 17/10/2012.
Disponível em:
<https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/549846060/recurso-especial-resp-1327773-mg-2011-0122337-1/inteiro-teor-549846069>.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A responsabilidade civil do incapaz pela reparação dos danos é subsidiária, condicional, mitigada e equitativa. Buscador Dizer o Direito, Manaus.
Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/9ac5a6d86e8924182271bd820acbce0e>. Acesso em: 03/11/2020.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. A vítima de um ato ilícito praticado por menor pode propor a ação somente contra o pai do garoto, não sendo necessário incluir o adolescente no polo passivo. Buscador Dizer o Direito, Manaus.
Disponível em: <https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/f5e647292cc4e1064968ca62bebe7e47>. Acesso em: 03/11/2020.
CAVALCANTE, Márcio André Lopes. Não há como afastar a responsabilização do pai do filho menor simplesmente pelo fato de que ele não estava fisicamente ao lado de seu filho no momento da conduta. Buscador Dizer o Direito, Manaus.
Disponível em:
<https://www.buscadordizerodireito.com.br/jurisprudencia/detalhes/20cf775fa6b5dfe621ade096f5d85d52>. Acesso em: 03/11/2020.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 11ª ed. São Paulo: Atlas S. A., 2014.
Jornadas de Direito Civil I, II, III, IV E V : enunciados aprovados / coordenador científico Ministro Ruy Rosado de Aguiar Júnior. – Brasília : Conselho da Justiça Federal, Centro de Estudos Judiciários, 2012. 135 p. ISBN 978-85-85572-93-8
Pós-graduado em Ciências Criminais pela Faculdade Damásio, graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG), advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AMARAL, Guilherme Francisco Souza. A exclusão da responsabilidade dos pais por prejuízo causado pelos filhos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 fev 2021, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56129/a-excluso-da-responsabilidade-dos-pais-por-prejuzo-causado-pelos-filhos. Acesso em: 23 dez 2024.
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