Resumo: O presente artigo busca analisar, sob a perspectiva teórica da Teoria dos Sistemas desenvolvida por Niklas Luhmann, os sistemas sociais, em especial, a função do direito, o papel do Supremo Tribunal Federal e as interferências com o sistema político. Para tanto, o artigo analisa a decisão do STF no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, em conexão com o Mandado de Injunção (MI 4733) em que a Corte reconhece a omissão do Congresso em legislar sobre a criminalização da homofobia e da transfobia e determinou, assim, o enquadramento das práticas homofóbicas ao crime de racismo. Adotam-se duas abordagens metodológicas distintas: a primeira exploratória, justamente do enquadramento conceitual de cada um dos principais objetos que envolvem a questão analisada, por meio de uma pesquisa eminentemente bibliográfica; e a segunda, por sua vez, analítica, observando as razões adotadas pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADO n. 26 e do MI 4733. Nesse sentido, o artigo debateu a atuação do Supremo Tribunal Federal e propôs a reflexão sobre se ao criar um tipo penal, estaria esse tribunal transbordando seus próprios limites operativos.
Palavras-Chave: Diferenciação funcional. Niklas Luhmann. Sistema Político. Supremo Tribunal Federal.
Abstract: This article seeks to analyze the social systems from the theoretical perspective of the Systems Theory developed by Niklas Luhmann, in particular, a function of law, the role of the Supreme Court and its interferences with the political system. The article analyzes the decision of the STF in the judgment of the Direct Unconstitutionality Action by Omission (ADO) 26, in connection with the Injunction Warrant (MI 4733), in which the Supreme Court recognizes the Congress's omission in legislating on criminalization of homophobia and transphobia and thus determined the framing of homophobic practices as crime of racism. Two distinct methodological approaches are adopted: the first is exploratory, precisely of the conceptual framing of each of the main objects that involve the analyzed issue, through an eminently bibliographic research; and the second, in turn, analytical, observing the reasons adopted by the Federal Supreme Court in the judgment of ADO n. 26 and MI 4733. In this sense, the article debated the work of the Federal Supreme Court and proposed reflection on whether, by creating a criminal type, this court would be overflowing its own operational limits.
Keywords: Functional differentiation. Niklas Luhmann. Political System. Supreme Court of Brazil.
Sumário: 1. Introdução 2. Os sistemas sociais e a função do direito 3. Análise da decisão do Supremo Tribunal Federal 4. Conclusão. 5. Referência
1 Introdução
No dia 13 de junho de 2019, por oito votos contra três, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, em conexão com o Mandado de Injunção (MI 4733), os ministros do Supremo Tribunal Federal votaram pelo reconhecimento da omissão do Congresso em legislar sobre a criminalização da homofobia e da transfobia e determinaram, assim, o enquadramento das práticas homofóbicas ao crime de racismo. O racismo é um crime inafiançável e imprescritível segundo o texto constitucional, no seu art. 5o., inciso XLII [1].
A lei que criminaliza o racismo, por sua vez, é a 7.716/89 e tipifica os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor. De acordo com a opinião manifestada no Supremo Tribunal Federal (STF), a homofobia e a transfobia devem ser enquadrados no artigo 20 da referida lei, que prevê pena de um a três anos de prisão para quem praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
O caso julgado chamou a atenção ao debate sobre a legitimidade do tribunal constitucional para criar um tipo penal. Por um lado, conforme artigo 22 da Constituição Federal (BRASIL, 1988) a criação de tipos penais, por excelência, é matéria de reserva do Legislativo, de competência da União. Por outro, a Constituição Federal, enquanto norma imperativa, determina a proteção aos direitos fundamentais e, por esse motivo, a mora do Congresso Nacional para incriminar atos atentatórios aos direitos dos integrantes da comunidade LGBT seria inconstitucional, sendo papel da Corte Constitucional o controle de constitucionalidade para garantir a tutela dos direitos fundamentais.[2]
Pertinente ao caso, este artigo pretende analisar, por meio da teoria sistêmica de Niklas Luhmann, as interferências existentes entre o sistema do direito e o sistema político, a fim de analisar o papel dos tribunais e iniciar debates sobre a atuação do Supremo Tribunal Federal no julgamento da criminalização da homofobia, de modo a refletir se, ao criar um tipo penal, estaria o tribunal indo além dos seus próprios limites operativos.
A Teoria dos Sistemas proposta por Luhmann analisa a comunicação da sociedade com os demais subsistemas sociais. A forma do direito é, pois, encontrada, sobre duas modalidades: da expectativa cognitiva/expectativa normativa e da codificação lícito/ilícito. O Supremo Tribunal Federal, nesse caso concreto, ao ser demandado em razão da inoperância do legislativo, criou uma situação de frustração da expectativa normativa no subsistema jurídico.
2 Os sistemas sociais e a função do direito
Ao analisar as transformações empreendidas pela modernidade, percebe-se a evolução da complexidade das sociedades contemporâneas. A função de compreender e reduzir a complexidade do mundo é assumida por sistemas sociais. Estes são “fragmentos de mundo” e, assim, são menos complexos que o mundo. Eles medeiam a extrema e indeterminada complexidade do mundo e o escasso potencial de sentido que possuem a experiência e a ação atuais, respectivamente. Os sistemas têm a capacidade de apresentar o mundo em fragmentos acatáveis pela experiência humana, segundo Rafaelle de Giorgi (DI GIORGI, 2017).
O problema fundamental de cada sistema é sempre a sua estabilidade, ou seja, o reforço e a estabilização dos limites entre sistema e ambiente. O sistema deve sempre ter capacidade de renovação e, para isso, deve se apoiar nos problemas que aparecem dentro dele mesmo e ter capacidade de se reciclar. Portanto, a estabilidade não deve ser concebida como característica de um sistema imutável, ela se dá na relação entre sistema e ambiente, considerando que o último está em constante transformação. Essas transformações devem servir sempre de horizonte e orientação contínua em relação a outras possibilidades (DI GIORGI, 2017).
Os subsistemas surgem, então, a partir de um processo de especificação e de diferenciação funcional, formando os subsistemas sociais, cuja característica primordial será o seu fechamento operacional e sua subsequente autonomia com relação aos outros subsistemas.
Os subsistemas são capazes de absorver a complexidade por meio de um código próprio, operando, porém, de maneira fechada. Não obstante os sistemas serem fechados operativamente, há necessidade de que se mantenham abertos cognitivamente, por meio de estruturas que permitam que as “irritações” do ambiente (complexidade) sejam absorvidas e operadas por meio de código próprio.
Nesse sentido, ao analisar a função do direito enquanto subsistema, para Luhmann (1999), é possível afirmar que é função do direito promover a “generalização congruente de expectativas normativas”. A corroborar:
"Generalização” equivale a dizer que o critério para a compreensão do sistema jurídico não pode ser individual ou subjetivo. (...) Apesar das mudanças no ambiente, o sistema está imunizado contra outras possibilidades e permite a manutenção das expectativas. Isso envolve certa indiferença em relação ao ambiente e à totalidade de expectativas nele existentes e a alta sensibilidade para as expectativas estruturadas normativamente. “Congruente” significa a generalização da segurança do sistema nas três dimensões: temporal (segurança contra as desilusões, enfrentada pela positivação); social (segurança contra o dissenso, tratada pela institucionalização de procedimentos); material (segurança contra incoerências e contradições, obtida por meio de papéis, instituições, programas e valores que fixem o sentido da generalização) (CAMPILONGO (b), 2011, s/n).
Nesse ponto, vale ressaltar que, em uma sociedade complexa, surgirão a todo momento expectativas normativas. Pode-se classificá-las em expectativas cognitivas e expectativas normativas jurídicas. Por expectativas cognitivas, devemos entender aquelas que se adaptam à realidade em caso de desapontamento, ou seja, que têm capacidade de aprendizado. Já as expectativas normativas jurídicas não estão dispostas à aprendizagem, ou seja, são mantidas no tempo independentemente das frustrações. Vale dizer que são contrafáticas e, por isso, permanecem no tempo.
A característica contrafática da expectativa normativa não é e não deve ser absoluta. Ela deve ser estável, porém mutável. Luhmann (1983) chama a atenção para o cuidado que se deve ter ao analisar essa distinção, pois é preciso que se compreenda sua função. Ambas fornecem possibilidade de estratégias frente aos desapontamentos. Tem-se a opção de assimilá-los ou não, e essas possibilidades podem ser determinantes para a sequência dos acontecimentos da vida após esses desapontamentos (LUHMANN, 1983).
Com o auxílio dessa diferenciação, a sociedade pode ajustar o compromisso entre a necessidade de adaptação à realidade e de constância das expectativas. Ela institucionalizará cognitivamente expectativas comportamentais, isto é, não censurará seus membros por uma adaptação de expectativa à realidade da ação, se predominar o interesse na adaptação. Também deslocará e articulará as expectativas ao nível normativo quando forem vitais a segurança e a integração social das expectativas (LUHMANN, 1983).
Observe-se que, do relacionamento entre ambas as possibilidades, surge uma seleção compulsória por parte da sociedade em busca da solução dos seus próprios problemas, ora abandonando o comportamento por conta do desapontamento, ora institucionalizando esse comportamento na busca pela transformação da expectativa cognitiva em expectativa normativa. O desapontamento pode então levar à formação de normas através da normatização a posteriori (LUHMANN, 1983). Essa é a forma de pensar o surgimento do direito com base em desapontamentos.
O direito positivo seria, então, uma estrutura seletiva que se constitui por força de uma escolha operada entre possibilidades diversas. Isto é, o direito tem elevado potencial de redução de complexidade, pois é capaz de selecionar entre as expectativas de comportamento e de isolá-las, fixando-as normativamente. Assim, fixadas normativamente à estrutura, é então necessário imunizar as expectativas contra frustrações, por meio de processos de generalização e de institucionalização.
Nesse contexto, a positividade do direito significa decidir por normatizar parte das expectativas da sociedade, sabendo que todo o universo que está fora do escopo normativo está contingenciado, podendo ser futuramente selecionado. Pode-se dizer que o direito produz latência, e esse é o paradoxo que Rafaelle di Giorgi (2017) define como “consciência da contingência”. Dessa maneira, o direito, apresenta mecanismos para lidar tanto com os “aprendizados” de uma sociedade, quanto para lidar com a “canalização de frustrações”.
Para lidar com os “aprendizados” de uma sociedade, o direito tem as decisões programadoras, nas quais cumpre com a função de produção do direito. São decisões de altíssimo grau de indeterminação, pois tratam de selecionar para a positivação do direito normas dentre toda a complexidade de uma sociedade. Diante da ineficácia da norma, de conflitos de comportamento que geram disfunções, surge a figura do legislador, que pode reagir mostrando sua disponibilidade para corrigir as expectativas. Enquanto isso, para lidar com a “canalização de frustrações”, existem as decisões programadas, nas quais cumpre-se a função de aplicação do direito. Nesse caso, o grau de complexidade está fortemente reduzido. Isto é, para a aplicação do direito, o programa pré-estabelecido é premissa da decisão e condição para que a decisão seja justa. Assim, ela tem que estar dentro de um escopo determinado, reduzindo a complexidade significativamente.
A normatização da expectativa promove generalização, afastando a ideia de subjetividade e individualidade do sistema jurídico. O sistema não está ligado a eventos individuais ou, em outras palavras mais delimitativas, não depende de tais eventos para se manter. Apesar das constantes mudanças no ambiente, os comandos provenientes do sistema permanecem (ou deveriam permanecer) estáveis (CAMPILONGO (b), 2011).
Dessa maneira, são a previsibilidade e a segurança do sistema jurídico que garantem a possibilidade de justiça. Nessa perspectiva, é importante dizer que a justiça não é a referência de valores suprapositivos, éticos ou metajurídicos, mas a consistência adequada ao processo decisório (CAMPILONGO (b), 2011). Dessa maneira, o juiz condiciona sua atuação a partir das decisões programadas. Para Luhmann, desconhecer esse dado e introduzir elementos teleológicos ou de discricionariedade do juiz, significa bloquear a função do direito como estabilizador de expectativas e inviabilizar a redução de complexidade atingida com a divisão de tarefas entre o legislador e o aplicador de normas (CAMPILONGO (a), 2011).
Essa característica funcional do direito, porém, não exclui o fato de os tribunais poderem decidir sobre uma temática de modo diferente das decisões programadas. Considerando que as normas do sistema do direito não são capazes de prever todas as soluções e de satisfazer todas as expectativas, pode-se pensar tal sistema, quanto às decisões judiciais, como um mecanismo de imunização. Em um primeiro momento, quando um tribunal é obrigado a julgar uma questão inédita, cria-se uma insegurança jurídica. Porém, após resolvê-la, cria-se uma situação de previsibilidade futura e, portanto, de expectativa normativa, como se fosse, pois, a memória imunológica criada pelo direito para que os antígenos fossem combatidos futuramente pelos anticorpos (LUHMANN, 2016).
Para Luhmann, o papel das decisões judiciais no sistema jurídico é elemento central, uma vez que é por meio delas que o sistema se reproduz; é por meio das decisões que o direito lança base à sua existência futura, isto é, é por meio das decisões que realiza sua autopoiese. Pode-se afirmar que a decisão judicial se estabelece por contingência, considerando a memória do sentido do direito na sociedade, ao mesmo tempo em que é o espaço de mudança do direito na sociedade. Portanto, é por meio das decisões judiciais que ocorre a atualização do direito (STAMFORD, 2014).
Por fim, para entender como deve funcionar o sistema jurídico na Teoria dos Sistemas, é preciso refletir não apenas sobre a autonomia do sistema, como também sobre seus pontos de entrelaçamento. Para o presente trabalho, de modo a analisar a recente decisão do Supremo Tribunal Federal, vale ressaltar que as grandes categorias do constitucionalismo moderno constroem bases estruturais para a autonomia funcional do direito: divisão de poderes, princípio da legalidade, igualdade perante a lei, Estado de Direito, personalidade jurídica e garantia das minorias são alguns exemplos. As Constituições, por outro lado, são também o ponto de abertura do direito à política (CAMPILONGO (b), 2011).
Os problemas da política são traduzidos, deslocados e selecionados para dentro do sistema jurídico com critérios específicos do sistema. Isso significa que, enquanto a política opera num quadro de complexidade quase indeterminada, o direito atua num contexto de complexidade já reduzida e determinada por limites estruturais mais rigorosos (CAMPILONGO (b), 2011).
3 Análise da decisão do Supremo Tribunal Federal
O caso em questão, na realidade, os casos em questão tratavam de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26 e um Mandado de Injunção (MI) 4733.[3]
Antes, contudo, salientamos que a ADO 26, cuja relatoria ficou a cargo do Ministro Celso de Mello, foi proposta pelo Partido Popular Socialista em face do Congresso Nacional, com a seguinte finalidade “obter a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente (mas não exclusivamente) das ofensas (individuais e coletivas), dos homicídios, das agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de gênero, real ou suposta, da vítima”.
Em apertada síntese, o autor da ação, Partido Popular Socialista (PPS), alegava a existência de mandamento constitucional de legislar criminalmente, o que obrigaria o legislador a criminalizar a homofobia e a transfobia. Há outros tantos argumentos, mas o que destacamos é que o partido alegou que o Congresso Nacional se recusava até mesmo a votar o projeto de lei que visa efetivar tal criminalização. Portanto, diante dos argumentos apresentados, ainda analisando a ADO, a discussão pairava sobre saber se haveria ou não mora inconstitucional do Congresso Nacional na criminalização específica das figuras apontadas, bem como instaurou-se a discussão sobre a possibilidade de aplicação subsidiária da lei que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor para a criminalização da homofobia e transfobia e, ainda, se está caracterizado o dever estatal de indenizar as vítimas de todas as formas das discriminações citadasenquanto tais condutas não forem criminalizadas.
Por sua vez, no caso do Mandado de Injunção 4733, cuja relatoria ficou a cargo do Ministro Edson Fachin, a Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT) impetrou o referido remédio constitucional também em face do Congresso Nacional, com o objetivo de “obter a criminalização específica de todas as formas de homofobia e transfobia, especialmente (mas não exclusivamente) das ofensas (individuais e coletivas), dos homicídios, das agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de gênero, real ou suposta, da vítima”.
A ABGLT, entidade autora, sustentou que a Constituição Federal permitiria, e ainda permite, a impetração de mandado de injunção com o intuito de criminalizar especificamente determinadas condutas quando tal situação se configure necessária para o exercício das prerrogativas inerentes à cidadania das vítimas em questão. Logo, a alegação foi ao encontro de que existe ordem constitucional de legislar criminalmente, a obrigar o legislador a criminalizar a homofobia e a transfobia, posto que constituiriam espécies do gênero racismo e, assim, seria impositiva a elaboração de legislação criminal nesse sentido.
Em sede de análise preliminar formal, o ministro relator não conheceu da ação por entender manifesta a inviabilidade da via injuncional para o caso em comento, citando jurisprudência do Pretório Excelso com relação à necessidade de se detectar, para o cabimento do mandado de injunção, a existência inequívoca de um direito subjetivo, concreta e especificamente consagrado na Constituição Federal de 1988, direito subjetivo este que necessariamente não estaria sendo usufruído pelos seus destinatários, justamente por ausência de determinada norma que regulamentasse e que fosse exigida pela própria Constituição Federal.
Ocorre que, posteriormente, a decisão foi reconsiderada e se permitiu o cabimento do Mandado de Injunção, com alegado fundamento no artigo 5º, inciso LXXI, da Constituição Federal, com a função de se examinar a denegação ou concessão do que fora requerido, desde que demonstrada a possibilidade de suprimento judicial da lacuna apontada.
Destarte, a discussão presente no MI 4733 pairava sobre as seguintes questões: saber se presentes os pressupostos e requisitos necessários ao cabimento do mandado de injunção; se haveria mora inconstitucional do Congresso Nacional na criminalização específica da homofobia e da transfobia; se seria possível a aplicação subsidiária da lei que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor para a criminalização da homofobia e transfobia; e se estaria caracterizado o dever estatal de indenizar as vítimas de todas as formas de homofobia e transfobia enquanto tais condutas não forem criminalizadas.
Para a ADO 26, a Procuradoria-Geral da República pugnou pelo conhecimento parcial da ação e, no mérito, pela procedência do pedido na parte conhecida. Por sua vez, em relação ao MI 4733, manifestou-se pelo conhecimento parcial, uma vez que entendeu que o pedido de condenação do estado a indenizar vítimas de homofobia e transfobia, em virtude de descumprimento do dever de legislar, não se coadunaria com o objeto e o rito de mandado de injunção, mas no mérito pugnou pela procedência do pedido na parte em que fora devidamente conhecida.
Pois bem. O Plenário do Supremo, a partir das ações ora descritas, entendeu que houve omissão inconstitucional do Congresso Nacional por não editar lei que criminalizasse atos de homofobia e de transfobia, tendo sido o julgamento conjunto de ambas as ações concluído em 13 de junho de 2019. Assim, por maioria, a Corte reconheceu a mora do Congresso Nacional em incriminar atos atentatórios a direitos fundamentais dos integrantes da comunidade LGBT.
Cumpre-nos salientar que os ministros Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Cármen Lúcia e Gilmar Mendes votaram pelo enquadramento da homofobia e da transfobia como tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989), até que o Congresso Nacional edite lei sobre a matéria.
Ficaram vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, por desenvolverem o entendimento de que a conduta só poderia ser punida mediante lei aprovada pelo Poder Legislativo. Por sua vez, o ministro Marco Aurélio não reconheceu a mora legislativa.
Assim, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO), o STF, alegando aplicar a “interpretação conforme a Constituição” à Lei de Racismo n. 7.716/1988, entendeu que “práticas homofóbicas, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08/01/1989”[4]. O Supremo Tribunal Federal, na ocasião, debruçou-se sobre o conceito de “racismo social” para ampliar a tutela dos direitos fundamentais da população LGBT. Nesse sentido, vale estabelecer na sequência cada uma das teses fixadas na ocasião[5]:
1. Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social, ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08/01/1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica, por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”);
2. A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero; 3. O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito.
A Lei de Racismo, porém, é bem clara no seu artigo 20 ao tipificar o crime de racismo como “praticar, induzir ou incitar a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”. Não há, como se vê, a descrição da conduta “racismo social”, tampouco de “homofobia". A prática de homofobia, portanto, é conduta atípica de acordo com a legislação atual.
Assim, à luz do princípio da legalidade do Direito Penal, que declara que “não existe crime sem lei anterior que o defina” (artigo 5º, XXXIX, da Constituição Federal) e do disposto no artigo primeiro do Código Penal Brasileiro, pode-se afirmar que o STF, no referido julgamento, ao ampliar a interpretação, com a ampliação das condutas tipificadas pela Lei de Racismo (Lei n. 7.716, de 08/01/1989), acabou por frustrar a expectativa normativa jurídica sobre o tema da homofobia.[6]
Vale ressaltar que é odiosa qualquer conduta que crie ou estimule preconceito ou discriminação contra a população LGBT, mas entendemos que não havendo, na Lei de Racismo, qualquer conduta de homofobia ou racismo social tipificadas como tal, é inviável que os tribunais enquadrem a homofobia (carente ainda de descrição que a tipifique especificamente) como crime de racismo.
Com efeito, enquanto o Congresso não inclui adequadamente a homofobia como crime próprio ao sistema jurídico, descrevendo quais seriam as condutas que a tipificam, deverão aqueles que a cometem responder da maneira como o vinham, isto é, por injúria e difamação, bem como sofrer todos os efeitos na esfera civil. Na ocasião, o tribunal inaugurou um precedente de verdadeira afronta à garantia da legalidade, princípio fundamental de Direito Penal e fundamento basilar do Estado democrático de Direito.
A inauguração pelo STF de um tipo penal que não atende ao adequado estudo da conduta e a seu adequado enquadramento – na verdade, num arremedo para aumentar o grau de apenamento da conduta, de forma enviesada – acaba por prejudicar a persecução daqueles que o cometem.
Como citado no voto do relator (BRASIL (a), 2019, p. 72), o ministro Celso de Melo, os relatórios trazidos pelo “Grupo Gay da Bahia – GGB”, que atuou como amicus curiae no julgamento, demonstram que o Brasil é “o campeão mundial desse tipo de crime”. Segundo dados da ONG, no ano de 2017, uma pessoa LGBT foi assassinada por crime de ódio a cada 19 horas. Em 2018, um LGBT foi morto a cada 20 horas. A violência é estrutural e persistente contra esse grupo vulnerável.
É possível que o STF, ao proferir o julgamento, tenha captado um anseio social pelo enquadramento das condutas homofóbicas a um tipo penal de imputação mais gravosa do que a injúria e a difamação. No entanto, é possível, por outro lado, que ao não se atentar adequadamente ao processo legislativo para tanto, tenha fragilizado a imputação às condutas, permitindo ainda mais impunidade, pois não é papel do tribunal constitucional alargar a interpretação de um tipo penal de maneira indiscriminada para fazer ajustes aos anseios sociais e é o que podemos observar, mais detidamente, das teses extraídas do julgamento e elencadas, cada qual, alhures.
Essa atuação do STF vai além dos limites do direito e traz ao julgamento uma orientação que é exclusiva do sistema político. As decisões jurídicas passam a ser o lugar para o qual são direcionadas as expectativas normativas. Quando se tem consciência de que a decisão nem sempre é resultado de critérios previamente normatizados, não há como deixar de perceber que as expectativas que recaíam na lei transferem-se para a decisão judicial. A segurança jurídica passa a estar estritamente vinculada à decisão.
Não se nega o fato de que possa haver parcela significativa da sociedade a favor da tipificação de condutas homofóbicas ao crime de racismo. Como anteriormente citado, o próprio direito prevê mecanismos para que a sociedade selecione compulsoriamente, em busca da solução dos seus próprios problemas, o que deverá ser normatizado. Para tanto, o sistema jurídico dependerá do sistema político para que sua função seja materializada, no sentido de que é o sistema político o responsável por impor as expectativas normativas a ele.
Transferir essa responsabilidade aos tribunais é negar a função de redução de complexidade do sistema político, de selecionar entre as expectativas de comportamento e de isolá-las, fixando-as normativamente. No caso da expectativa de criminalização da homofobia, é negar a reserva legislativa e a discricionariedade da política na condução da política criminal no Brasil. Isto é, sendo a finalidade do Direito Penal a proteção dos bens essenciais e o convívio em sociedade, deverá o legislador fazer a sua seleção.
Sobre este tema:
Quando o sistema político não consegue construir e estabilizar esta autonomia em face do ambiente econômico ou político que o circunda, estamos diante de uma das seguintes situações: ou o sistema não é moderno e, consequentemente, não distingue suas funções; ou, então, atua de modo “corrompido” (...) “As estruturas do sistema jurídico são aptas para decidir entre o legal e o ilegal. Asseguram o cumprimento da lei. Poderiam, isto sim, dizer se uma decisão política é formalmente correta ou se um contrato é ilícito. Fora daí, o direito moderno não está habilitado a atuar sem perversões. Pretender mais do que sua função autoriza é o primeiro passo para desvirtuar e enfraquecer o sistema jurídico (CAMPILONGO (a), 2011, p. 86)
Não se nega que a Constituição Federal (CF/88) tem a capacidade de atuar como instrumento efetivo de transformação social sob as lentes do jurídico. Porém, essa operação tem limites, pois, do contrário, há enorme risco de se confundirem os sistemas jurídico e político. Nessa seara, reside enorme risco à democracia, pois os sistemas perdem-se de suas funções e ameaçam a salutar permanência dos papéis que a Constituição Federal se lhes atribui.
Num país como o Brasil, ainda tão carente de justiça social, a tentação de atribuir ao Judiciário um papel transformador é enorme. O grande problema é que este (o Judiciário) resta desestabilizado ao exercer um papel para o qual não foi designado e para o qual não está preparado – e nem deve estar. Pior, fragiliza as bases democráticas do País, pois coloca em xeque a capacidade política daqueles a quem o próprio sistema jurídico atribuiu condições específicas para investidura e funções. Sintetizando a ideia de judicialização da política, nos moldes da teoria luhmanniana[7], Ran Hirschl (2009, p. 142):
Esse tipo de judicialização é inseparável do fenômeno da captura das relações sociais e da cultura popular e da expropriação dos conflitos sociais por parte do direito. Origina-se da crescente complexidade e contingência das sociedades modernas, ou da criação e expansão do estado de bem-estar social moderno e suas numerosas agências reguladoras. Algumas análises do rápido crescimento da judicialização no âmbito judicial supranacional a descrevem como uma resposta institucional inevitável aos complexos problemas de coordenação gerados pela necessidade sistêmica, em uma era de mercados econômicos convergentes, de se adotar normas jurídicas e regulamentações administrativas padronizadas entre os estados-membros desses mercados.
Quando se fala em garantia dos direitos fundamentais, por sua vez, sempre nos encontramos nessa tênue linha de intersecção entre os sistemas político e jurídico. Isso acontece porque, com certeza, o sistema político ainda não se mostrou capaz de resolver questões primárias, como a que ora tratamos. Outro ponto importante para análise do voto do ministro Celso de Mello é o fundamento em que se apoia a inconstitucionalidade da omissão do legislativo. Segundo o relator:
é alcançada pela norma constitucional que preconiza a punição de “qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais” (BRASIL, 1988, art. 5º, XLI), a significar, que essa cláusula constitucional submete o Congresso Nacional à obrigação de editar o diploma legislativo necessário à incriminação dos atos e comportamentos resultantes de discriminação ou de preconceito contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou em decorrência de sua identidade de gênero (BRASIL, 2019, p. 38).
No entanto, na norma constitucional utilizada como pressuposto para a configuração da omissão, não há comando específico e determinado, mas sim um dever geral de proteção conforme a conveniência e oportunidade do legislador para selecionar aqueles bens jurídicos mais relevantes que merecem a tutela do Direito Penal.
Como já se disse, ao extrair da norma geral um comando vinculante para o Legislativo atuar de forma específica, criando um novo tipo penal sob o pretexto da proteção de um bem que os peticionários consideram relevante, ou ainda mais grave, pela via judicial, é abrir precedente para violação ao princípio da legalidade por aplicação da analogia, para se criar penalidades não mencionadas em lei.
Os acoplamentos entre os diversos sistemas parciais são normais. Nesse caso, ele advém da própria especificidade da Constituição Federal: a abertura do sistema jurídico às questões políticas. São interferências inevitáveis, que produzem mudanças no interior dos subsistemas. Sobre os acoplamentos estruturais, provenientes dos ensinamentos de Maturana[8], o sistema se mantém permanentemente adaptado ao ambiente, mas são promovidas as relações entre sistemas, ou subsistemas, distintos, não apenas com o ambiente, gerando o acoplamento estrutural (LUHMANN, 2005. pp. 31-32). Ao presente artigo, vale observar que o acoplamento estrutural[9] entre o Direito e a Política (LUHMANN, 2005, p. 51) é regulado da seguinte maneira:
O acoplamento estrutural entre direito e política é regulada pela Constituição. A constituição, por um lado, vincula o sistema político à lei, com a consequência de que comportamentos contrários à lei levam ao fracasso político. Por outro lado, a constituição permite que o sistema político - através da promulgação de leis - inunde o sistema de direito com novidades. Apesar deste acoplamento estrutural, as operações recorrentes internas de cada sistema permanecem separadas: o significado político de uma lei é diferente de sua validade legal[10].
Corroborando o exposto alhures, GUERRA FILHO (2014, p. 163):
A estrutura dos sistemas sociais fica no seu centro, sendo nele onde se determina o tipo de comunicação produzida pelo sistema. Em volta do centro, protegendo-o, tem-se a chamada periferia do sistema, através do qual ela entra em contato com o meio ambiente e demais sistemas ali existentes. Desde as fronteiras de um dado sistema até o seu centro, - em uma periferia, portanto, forma-se o que E. Munch denominou "zona de interpenetração", onde os sistemas, nos termos de Luhmann, "irritam-se" em decorrência de seu "acoplamento estrutural" com outros sistemas. Esse acoplamento necessita ser viabilizado por certos meios (media). O meio principal de acoplamento entre o sistema do direito e o sistema da política, por exemplo, segundo Luhmann são as constituições. Para entendermos isso, é necessário ter em mente que o judiciário é a organização que ocupa o centro do sistema jurídico, pois é quem determina em última instância o que é e o que não é direito. Da mesma forma; os demais poderes do Estado, legislativo e executivo, ocupam o centro do sistema político, mas, assim como o judiciário, têm na constituição as pautas mais importantes de balizamento da ação de seus componentes.
Entretanto, esses acoplamentos podem atingir um ponto tão elevado que, muitas vezes, acabam por desnaturar a forma de operação de cada sistema. Isto é, produzem a corrupção do código próprio de cada sistema.
Aqui, salientamos que a corrupção sistêmica pode gerar progressiva indistinção entre norma e exceção. Há ou pode haver um excesso de defesa, como acontece mesmo com as doenças autoimunitárias[11] [12]. A questão deve ser colocada, sob o espectro abordado no presente artigo, é no sentido de entender como deve ocorrer a sobrevivência do sistema social no qual estamos inseridos de maneira global, ou seja, como a sociedade mundial reage diante daquilo que é produzido e representa um “ataque” a ela mesma, posto que estamos a tratar de garantia de direitos fundamentais, mas tal produção, autoimune, poderia ser utilizada para outras pretensões.
Destarte, do ponto de vista jurídico o sistema (jurídico) imunológico da sociedade, como o concebe LUHMANN[13], pode ser confrontado com um problema similar ao de um organismo que sofre de uma disfunção autoimune. Indubitavelmente, a “crise” autoimunitária é considerada uma aporia, em outras palavras e corroborando o exposto acima, o que, no sistema jurídico, tem por objeto primordial a proteção pode ser o que promove (agente de) destruição. O paradoxo da autopoiese do direito terminando em autoimunidade revela o paradoxo da inevitável circularidade do Direito e suas raízes políticas nas constituições[14].
Em complementação, devemos observar que:
Na democracia, a regra básica é manter elevadas as possibilidades de escolha e abertas as alternativas de decisão. Por isso o Estado Democrático de Direito estabiliza garantias aos direitos das minorias, da oposição e da magistratura. Sem estes mecanismos reduzem-se drasticamente aquelas possibilidades e alternativas. Eliminam-se, do mesmo modo, as oportunidades de reversão das decisões. Se o Judiciário abandona os limites que lhe impõe o sistema jurídico e decide com as lógicas da política ou da economia, estará condenado a sofrer intervenções externas. Restará indiferenciado em relação aos demais sistemas e perderá sua função de vigilante da lei (CAMPILONGO (a), 2011, p. 87).
Neste ponto, há de se fazer uma observação. As Cortes Internacionais de Direitos Humanos, ao extraírem de casos concretos o atentado aos mais diversos direitos do homem, dentre os quais a atenção à diversidade de gênero, nunca faz controle substituindo os Estados e muito menos suas respectivas instituições. Ao contrário, compete a tais cortes, que mais se debruçam sobre tais direitos fundamentais e sobre sua preservação e garantia, a tarefa de orientar os Estados e agentes políticos a ações positivas e medidas concretas. Certamente se as citadas cortes interferissem indevidamente na soberania dos Estados e de suas instituições, hoje não contariam com a credibilidade que possuem como observadoras e fomentadoras de tais direitos. Ou seja, a garantia da efetivação dos direitos humanos e sociais não passa por uma subversão das funções de cada sistema.
Assim, também é necessário entender que os direitos sociais não são automaticamente garantidos quando positivados. Ao considerar os direitos fundamentais no contexto da Teoria dos Sistemas, Niklas Luhmann há muito consignou que, na sociologia, “o conceito de direitos fundamentais como instituição não indica simplesmente um complexo de normas, mas um complexo de reais expectativas de comportamento, que são atualizados no contexto de um papel social e que podem, contudo, contar sobre um consenso social” (LUHMANN, 1999, p. 45).
Não cabe ao sistema juridico, portanto, a efetivação do papel inerente ao sistema político, assim como o sistema político deve confiar aos demais sistemas a satisfação de necessidades que sejam autônomos em relação a ele. Isso porque, somente o sistema político tem meios (e assim funciona) de escolher que comunicações sociais, ou que questões públicas podem ser abordadas (considerado o tema e o que lhe permite comunicar).
Os motivos para o resguardo da diferenciação funcional, em especial aquela tratada pelo sistema político, vem bem enunciada por Niklas Luhmann:
O processo de diferenciação da ação política, como uma estrutura particular da sociedade, aumenta a possibilidade de olhar socialmente, de interpretar e, ao mesmo tempo, de questionar casos puramente políticos, levando-os a um limiar de consciência, além do qual sua repressão se torna problemática, mas seu controle social é possível. [...] A diferenciação social elimina a delimitação do poder político, primeiramente na esfera familiar, os pontos de votação para os papéis religiosos e, posteriormente, para os econômicos, e a regula, finalmente, sobre si mesma, despertando a necessidade de substituir a unidade e a generalidade da ordem social, baseada em papéis, por uma legitimação de comptências específicas que podem ser gisutificadas e compartilhadas. Tal legitimação deve se apresentar como imanente, racionalmente controlável e deve tentar dar uma base a um poder racional. (LUHMANN, 1999, p. 215)[15]
A constituição de uma ordem social, orientada para uma diferenciação funcionalmente especificada, e a crescente racionalidade das concepções de vida, bem como as ações que delas derivam, abrem escolhas relativas a um número cada vez maior de situações. A abertura para que os sistemas se imiscuam uns nos outros faz com que os sistemas subvertam a própria comunicação (orientada), de forma que se apresentam de forma absolutamente fragilizada para a sociedade.
É de se dizer que cabe aos tribunais o controle dos atos que atentam contra os direitos subjetivos dos indivíduos, mas não lhes cabe a criação de qualquer direito a estes individuos. Niklas Luhmann em obra já citada (1999, p. 304-305), ao analisar as funcões legislativa e judicial sobre a implementação dos direitos fundamentais, suscita que “os direitos fundamentais não são apenas aquisições do estado de bem-estar social”, sugere que “a fomalidade”, ou seja, a tipificação, é fundamental, uma vez que o Estado pouco se importa com sua aplicação e implementação. Por outro lado, diz o autor, “a determinação do texto constitucional necessita, sem dúvida, de conteúdo e, para esse fim, devem ser tomadas decisões políticas que não devem ser afastadas da responsabilidade política, para serem enviadas aos tribunais” (LUHMANN, 1999, pp. 304-305). Não se trata de um processo de reconhecimento, segundo o autor, que, em princípio, é independente daqueles que o implementam, mas da definição dos limites do sistema político.
4 Conclusão
A Teoria dos Sistemas, proposta por Niklas Luhmann, analisa a comunicação da sociedade com os demais subsistemas sociais. A forma do direito é, pois, encontrada, sobre duas modalidades: da expectativa cognitiva/expectativa normativa e da codificação lícito/ilícito. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) 26, ao ser demandado em razão da omissão do Congresso (sistema político), criou uma situação de frustração da expectativa normativa no subsistema jurídico, não apenas em relação à ADO 26, mas também em relação ao Mandado de Injunção (MI) 4733.
O direito se insere como um dentre os demais subsistemas e, por isso, é também capaz de desenvolver códigos próprios para desempenhar suas funções recíprocas no interior da sociedade. O direito utiliza o código “direito/não direito” ou “lícito/ ilícito” e busca a estabilização de expectativas normativas de comportamento, para que seja possível a tomada de decisões que vinculem coletivamente. Portanto, o direito opera como um sistema ao mesmo tempo "fechado normativamente", o que garante a sua manutenção e sua renovação, e "aberto cognitivamente", no sentido de que está em contínua adaptação às exigências do ambiente.
Dessa maneira, apesar de possível a mutabilidade do sistema jurídico, pode-se afirmar que, de uma forma ou de outra, esse sistema permanece, ou deveria permanecer, impermeável às peculiaridades do seu ambiente. Isso porque, de nada adiantaria um sistema jurídico que mudasse seus elementos na mesma velocidade com que mudam os elementos do seu ambiente, ou então, que tivesse de produzir regras individuais para cada participante. Isso tornaria o sistema jurídico ineficaz, visto que se tornaria tão complexo e contingente quanto o ambiente.
O que ocorreu no caso em tela foi uma politização exacerbada do judiciário ou a judicialização da política (como abordado por Ran Hirschl). O Tribunal, em busca de uma adequação social, expandiu seu peso no interior do sistema político. Dessa maneira, o sistema passa a produzir uma maior incerteza jurídica, o que sacrifica, de certa forma, o seu fechamento operacional e, consequentemente, enfraquece sua função básica de promover generalização congruente de expectativas normativas, gerando desconfiança sistêmica.
É evidente que ambos os sistemas estão abertos às interferências contínuas de um e de outro. Luhmann destaca o fato de que os programas do sistema jurídico não definem completamente as decisões dos tribunais. Consequentemente, as expectativas normativas jurídicas estão expostas às constantes “irritações” provenientes do sistema político, assim como o sistema político também é cognitivamente sensível às operações do sistema judicial, em especial, em casos de controle de constitucionalidade das leis.
No entanto, quando ocorre esse “acoplamento estrutural” entre os dois sistemas, o problema central é que ambos correm o risco de deixar de operar com seus códigos próprios caso haja alopoiese[16]. Isto é, o sistema político já não se demonstra capaz de gerar consenso, nem mesmo de promover grandes agregações de interesse, e o poder judiciário passa a ser percebido como a instância habilitada para superar a ineficácia do sistema político, enquanto no sistema jurídico o resultado são decisões que já não são embasadas na legalidade, de modo que se cria um judiciário que decide com critérios exclusivamente políticos, podendo ser gerada, a partir de então, a crise autoimunitária dentro de cada um dos sistemas, jurídico e político, mas nos cumpriu analisar especificamente o jurídico.
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[1] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível, sujeito à pena de reclusão, nos termos da lei.
[2] Não é objetivo do artigo discutir se, de fato, a tutela penal é eficiente na proteção de bens jurídicos, ou se efetivamente garantirá a proteção da população LGBTI, pois isso extrapolaria os limites da pesquisa. Não se pode deixar de pontuar, porém, que essa premissa é bastante controversa. As teorias da reação social, que passaram a influir na criminologia principalmente a partir da década de 60 do século passado, impactaram a própria ideia de legitimação do direito penal como garantidor de bens jurídicos, colocando-o, ao revés, como enviesado em sua seletividade (ANITUA, 2008, pp. 569-656). Para uma teoria jurídica do direito penal que aplica muitas dessas ideias criminológicas críticas e, como consequência, sustenta o seu uso ao mínimo, ZAFFARONI; BATISTA; ALAGIA; SLOKAR, 2003. Sustentando preocupação com a crescente faceta “criminalizante” da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que considera o uso do direito penal como essencial na proteção de direitos fundamentais, MÉGRET; CALDERÓN, 2015.
[3] Precipuamente, temos de esclarecer, inclusive por ser uma opção metodológica, que não foi possível abordar cada um dos acórdãos de maneira muito detalhada, posto que juntos somam mais de 800 (oitocentas) páginas. Assim, a análise a seguir trabalhada detidamente as teses estabelecidas no julgamento.
[4] E M E N T A: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO – EXPOSIÇÃO E SUJEIÇÃO DOS HOMOSSEXUAIS , TRANSGÊNEROS E DEMAIS INTEGRANTES DA COMUNIDADE LGBTI+ A GRAVES OFENSAS AOS SEUS DIREITOS FUNDAMENTAIS EM DECORRÊNCIA DE SUPERAÇÃO IRRAZOÁVEL DO LAPSO TEMPORAL NECESSÁRIO À IMPLEMENTAÇÃO DOS MANDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DE CRIMINALIZAÇÃO INSTITUÍDOS PELO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, art. 5º, incisos XLI e XLII) – A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO COMO INSTRUMENTO DE CONCRETIZAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONSTITUCIONAIS FRUSTRADAS, EM SUA EFICÁCIA, POR INJUSTIFICÁVEL INÉRCIA DO PODER PÚBLICO – A SITUAÇÃO DE INÉRCIA DO ESTADO EM RELAÇÃO À EDIÇÃO DE DIPLOMAS LEGISLATIVOS NECESSÁRIOS À PUNIÇÃO DOS ATOS DE DISCRIMINAÇÃO PRATICADOS EM RAZÃO DA ORIENTAÇÃO SEXUAL OU DA IDENTIDADE DE GÊNERO DA VÍTIMA – A QUESTÃO DA “IDEOLOGIA DE GÊNERO” – SOLUÇÕES POSSÍVEIS PARA A COLMATAÇÃO DO ESTADO DE MORA INCONSTITUCIONAL : ( A ) CIENTIFICAÇÃO AO CONGRESSO NACIONAL QUANTO AO SEU ESTADO DE MORA INCONSTITUCIONAL E ( B ) ENQUADRAMENTO IMEDIATO DAS PRÁTICAS DE HOMOFOBIA E DE TRANSFOBIA, MEDIANTE INTERPRETAÇÃO CONFORME (QUE NÃO SE CONFUNDE COM EXEGESE FUNDADA EM ANALOGIA “IN MALAM PARTEM”), NO CONCEITO DE RACISMO PREVISTO NA LEI Nº 7.716/89 – INVIABILIDADE DA FORMULAÇÃO, EM SEDE DE PROCESSO DE CONTROLE CONCENTRADO DE CONSTITUCIONALIDADE, DE PEDIDO DE ÍNDOLE CONDENATÓRIA FUNDADO EM ALEGADA RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO, EIS QUE, EM AÇÕES CONSTITUCIONAIS DE PERFIL OBJETIVO , NÃO SE DISCUTEM SITUAÇÕES INDIVIDUAIS OU INTERESSES SUBJETIVOS – IMPOSSIBILIDADE JURÍDICO-CONSTITUCIONAL DE O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, MEDIANTE PROVIMENTO JURISDICIONAL, TIPIFICAR DELITOS E COMINAR SANÇÕES DE DIREITO PENAL, EIS QUE REFERIDOS TEMAS SUBMETEM-SE À CLÁUSULA DE RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI EM SENTIDO FORMAL (CF, art. 5º, inciso XXXIX) – CONSIDERAÇÕES EM TORNO DOS REGISTROS HISTÓRICOS E DAS PRÁTICAS SOCIAIS CONTEMPORÂNEAS QUE REVELAM O TRATAMENTO PRECONCEITUOSO, EXCLUDENTE E DISCRIMINATÓRIO QUE TEM SIDO DISPENSADO À VIVÊNCIA HOMOERÓTICA EM NOSSO PAÍS: “ O AMOR QUE NÃO OUSA DIZER O SEU NOME” (LORD ALFRED DOUGLAS, DO POEMA “TWO LOVES”, PUBLICADO EM “THE CHAMELEON”, 1894, VERSO ERRONEAMENTE ATRIBUÍDO A OSCAR WILDE) – A VIOLÊNCIA CONTRA INTEGRANTES DA COMUNIDADE LGBTI+ OU “A BANALIDADE DO MAL HOMOFÓBICO E TRANSFÓBICO” (PAULO ROBERTO IOTTI VECCHIATTI): UMA INACEITÁVEL ( E CRUEL) REALIDADE CONTEMPORÂNEA – O PODER JUDICIÁRIO, EM SUA ATIVIDADE HERMENÊUTICA , HÁ DE TORNAR EFETIVA A REAÇÃO DO ESTADO NA PREVENÇÃO E REPRESSÃO AOS ATOS DE PRECONCEITO OU DE DISCRIMINAÇÃO PRATICADOS CONTRA PESSOAS INTEGRANTES DE GRUPOS SOCIAIS VULNERÁVEIS – A QUESTÃO DA INTOLERÂNCIA, NOTADAMENTE QUANDO DIRIGIDA CONTRA A COMUNIDADE LGBTI+ : A INADMISSIBILIDADE DO DISCURSO DE ÓDIO (CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS , ARTIGO 13, § 5º) – A NOÇÃO DE TOLERÂNCIA COMO A HARMONIA NA DIFERENÇA E O RESPEITO PELA DIVERSIDADE DAS PESSOAS E PELA MULTICULTURALIDADE DOS POVOS – LIBERDADE RELIGIOSA E REPULSA À HOMOTRANSFOBIA : CONVÍVIO CONSTITUCIONALMENTE HARMONIOSO ENTRE O DEVER ESTATAL DE REPRIMIR PRÁTICAS ILÍCITAS CONTRA MEMBROS INTEGRANTES DO GRUPO LGBTI+ E A LIBERDADE FUNDAMENTAL DE PROFESSAR, OU NÃO, QUALQUER FÉ RELIGIOSA, DE PROCLAMAR E DE VIVER SEGUNDO SEUS PRINCÍPIOS, DE CELEBRAR O CULTO E CONCERNENTES RITOS LITÚRGICOS E DE PRATICAR O PROSELITISMO (ADI 2.566/DF, Red. p/ o acórdão Min. EDSON FACHIN), SEM QUAISQUER RESTRIÇÕES OU INDEVIDAS INTERFERÊNCIAS DO PODER PÚBLICO – REPÚBLICA E LAICIDADE ESTATAL: A QUESTÃO DA NEUTRALIDADE AXIOLÓGICA DO PODER PÚBLICO EM MATÉRIA RELIGIOSA – O CARÁTER HISTÓRICO DO DECRETO Nº 119-A , DE 07/01/1890, EDITADO PELO GOVERNO PROVISÓRIO DA REPÚBLICA, QUE APROVOU PROJETO ELABORADO POR RUY BARBOSA E POR DEMÉTRIO NUNES RIBEIRO – DEMOCRACIA CONSTITUCIONAL, PROTEÇÃO DOS GRUPOS VULNERÁVEIS E FUNÇÃO CONTRAMAJORITÁRIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO EXERCÍCIO DE SUA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL – A BUSCA DA FELICIDADE COMO DERIVAÇÃO CONSTITUCIONAL IMPLÍCITA DO PRINCÍPIO FUNDAMENTAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA – UMA OBSERVAÇÃO FINAL: O SIGNIFICADO DA DEFESA DA CONSTITUIÇÃO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE POR OMISSÃO CONHECIDA, EM PARTE, E, NESSA EXTENSÃO, JULGADA PROCEDENTE, COM EFICÁCIA GERAL E EFEITO VINCULANTE – APROVAÇÃO, PELO PLENÁRIO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL , DAS TESES PROPOSTAS PELO RELATOR, MINISTRO CELSO DE MELLO . PRÁTICAS HOMOFÓBICAS E TRANSFÓBICAS CONFIGURAM ATOS DELITUOSOS PASSÍVEIS DE REPRESSÃO PENAL, POR EFEITO DE MANDADOS CONSTITUCIONAIS DE CRIMINALIZAÇÃO (CF, ART. 5º, INCISOS XLI E XLII), POR TRADUZIREM EXPRESSÕES DE RACISMO EM SUA DIMENSÃO SOCIAL – Até que sobrevenha lei emanada do Congresso Nacional destinada a implementar os mandados de criminalização definidos nos incisos XLI e XLII do art. 5º da Constituição da República, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou supostas, que envolvem aversão odiosa à orientação sexual ou à identidade de gênero de alguém, por traduzirem expressões de racismo, compreendido este em sua dimensão social , ajustam-se, por identidade de razão e mediante adequação típica, aos preceitos primários de incriminação definidos na Lei nº 7.716, de 08/01/1989, constituindo, também, na hipótese de homicídio doloso, circunstância que o qualifica , por configurar motivo torpe (Código Penal, art. 121, § 2º, I, “in fine”). NINGUÉM PODE SER PRIVADO DE DIREITOS NEM SOFRER QUAISQUER RESTRIÇÕES DE ORDEM JURÍDICA POR MOTIVO DE SUA ORIENTAÇÃO SEXUAL OU EM RAZÃO DE SUA IDENTIDADE DE GÊNERO – Os integrantes do grupo LGBTI+, como qualquer outra pessoa, nascem iguais em dignidade e direitos e possuem igual capacidade de autodeterminação quanto às suas escolhas pessoais em matéria afetiva e amorosa, especialmente no que concerne à sua vivência homoerótica . Ninguém, sob a égide de uma ordem democrática justa, pode ser privado de seus direitos (entre os quais o direito à busca da felicidade e o direito à igualdade de tratamento que a Constituição e as leis da República dispensam às pessoas em geral) ou sofrer qualquer restrição em sua esfera jurídica em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero! Garantir aos integrantes do grupo LGBTI+ a posse da cidadania plena e o integral respeito tanto à sua condição quanto às suas escolhas pessoais pode significar, nestes tempos em que as liberdades fundamentais das pessoas sofrem ataques por parte de mentes sombrias e retrógradas, a diferença essencial entre civilização e barbárie. AS VÁRIAS DIMENSÕES CONCEITUAIS DE RACISMO. O RACISMO, QUE NÃO SE RESUME A ASPECTOS ESTRITAMENTE FENOTÍPICOS, CONSTITUI MANIFESTAÇÃO DE PODER QUE, AO BUSCAR JUSTIFICAÇÃO NA DESIGUALDADE, OBJETIVA VIABILIZAR A DOMINAÇÃO DO GRUPO MAJORITÁRIO SOBRE INTEGRANTES DE GRUPOS VULNERÁVEIS (COMO A COMUNIDADE LGBTI+), FAZENDO INSTAURAR, MEDIANTE ODIOSA ( E INACEITÁVEL ) INFERIORIZAÇÃO, SITUAÇÃO DE INJUSTA EXCLUSÃO DE ORDEM POLÍTICA E DE NATUREZA JURÍDICO-SOCIAL – O conceito de racismo, compreendido em sua dimensão social, projeta-se para além de aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos, pois resulta, enquanto manifestação de poder, de uma construção de índole histórico-cultural motivada pelo objetivo de justificar a desigualdade e destinada ao controle ideológico, à dominação política, à subjugação social e à negação da alteridade, da dignidade e da humanidade daqueles que, por integrarem grupo vulnerável (LGBTI+) e por não pertencerem ao estamento que detém posição de hegemonia em uma dada estrutura social, são considerados estranhos e diferentes, degradados à condição de marginais do ordenamento jurídico, expostos, em consequência de odiosa inferiorização e de perversa estigmatização, a uma injusta e lesiva situação de exclusão do sistema geral de proteção do direito. COMPATIBILIDADE CONSTITUCIONAL ENTRE A REPRESSÃO PENAL À HOMOTRANSFOBIA E A INTANGIBILIDADE DO PLENO EXERCÍCIO DA LIBERDADE RELIGIOSA – A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero. TOLERÂNCIA COMO EXPRESSÃO DA “HARMONIA NA DIFERENÇA” E O RESPEITO PELA DIVERSIDADE DAS PESSOAS E PELA MULTICULTURALIDADE DOS POVOS. A PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL DA LIBERDADE DE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO , POR REVESTIR-SE DE CARÁTER ABRANGENTE , ESTENDE-SE, TAMBÉM, ÀS IDEIAS QUE CAUSEM PROFUNDA DISCORDÂNCIA OU QUE SUSCITEM INTENSO CLAMOR PÚBLICO OU QUE PROVOQUEM GRAVE REJEIÇÃO POR PARTE DE CORRENTES MAJORITÁRIAS OU HEGEMÔNICAS EM UMA DADA COLETIVIDADE – As ideias, nestas compreendidas as mensagens, inclusive as pregações de cunho religioso, podem ser fecundas, libertadoras, transformadoras ou, até mesmo, revolucionárias e subversivas, provocando mudanças, superando imobilismos e rompendo paradigmas até então estabelecidos nas formações sociais. O verdadeiro sentido da proteção constitucional à liberdade de expressão consiste não apenas em garantir o direito daqueles que pensam como nós , mas, igualmente, em proteger o direito dos que sustentam ideias (mesmo que se cuide de ideias ou de manifestações religiosas) que causem discordância ou que provoquem, até mesmo, o repúdio por parte da maioria existente em uma dada coletividade. O caso “United States v. Schwimmer ” (279 U.S. 644, 1929): o célebre voto vencido (“dissenting opinion”) do Justice OLIVER WENDELL HOLMES JR.. É por isso que se impõe construir espaços de liberdade, em tudo compatíveis com o sentido democrático que anima nossas instituições políticas, jurídicas e sociais, para que o pensamento – e, particularmente , o pensamento religioso – não seja reprimido e, o que se mostra fundamental, para que as ideias, especialmente as de natureza confessional , possam florescer, sem indevidas restrições, em um ambiente de plena tolerância, que, longe de sufocar opiniões divergentes, legitime a instauração do dissenso e viabilize, pelo conteúdo argumentativo do discurso fundado em convicções antagônicas, a concretização de valores essenciais à configuração do Estado Democrático de Direito: o respeito ao pluralismo e à tolerância . – O discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações e manifestações que incitem a discriminação, que estimulem a hostilidade ou que provoquem a violência (física ou moral ) contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero, não encontra amparo na liberdade constitucional de expressão nem na Convenção Americana de Direitos Humanos (Artigo 13, § 5º), que expressamente o repele . A QUESTÃO DA OMISSÃO NORMATIVA E DA SUPERAÇÃO TEMPORAL IRRAZOÁVEL NA IMPLEMENTAÇÃO DE ORDENS CONSTITUCIONAIS DE LEGISLAR. A INSTRUMENTALIDADE DA AÇÃO DIRETA POR OMISSÃO NA COLMATAÇÃO E CONCRETIZAÇÃO DAS CLÁUSULAS CONSTITUCIONAIS FRUSTRADAS, EM SUA EFICÁCIA, POR INJUSTIFICÁVEL INÉRCIA DO PODER PÚBLICO A omissão do Estado – que deixa de cumprir, em maior ou em menor extensão, a imposição ditada pelo texto constitucional (como aquela que deriva do art. 5º, XLI e XLII, de nossa Lei Fundamental) – qualifica-se como comportamento revestido de intensa gravidade político-jurídica, eis que , mediante inércia, o Poder Público também desrespeita a Constituição, também ofende direitos que nela se fundam e também impede, por ausência (ou insuficiência) de medidas concretizadoras, a própria aplicabilidade dos postulados da Lei Fundamental. Doutrina. Precedentes (ADI 1.458- -MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). – Nada mais nocivo , perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente ou, então, do que a promulgar com o intuito de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se mostrarem convenientes aos desígnios dos governantes ou de grupos majoritários, em detrimento dos interesses maiores dos cidadãos ou, muitas vezes, em frontal desrespeito aos direitos das minorias, notadamente daquelas expostas a situações de vulnerabilidade . – A ação direta de inconstitucionalidade por omissão, nesse contexto, tem por objetivo provocar legítima reação jurisdicional que, expressamente autorizada e atribuída ao Supremo Tribunal Federal pela própria Carta Política, destina-se a impedir o desprestígio da Lei Fundamental, a neutralizar gestos de desprezo pela Constituição, a outorgar proteção a princípios, direitos e garantias nela proclamados e a obstar, por extremamente grave, a erosão da consciência constitucional. Doutrina. Precedentes do STF. Plenário, 13.06.2019.
[5] Disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/tesesADO26.pdf>. Acesso em 11 jan 21.
[6] Não se ignora que flexibilização do princípio da legalidade penal, em sua faceta de irretroatividade da lei penal maléfica, tem precedentes históricos internacionais. O julgamento de Nuremberg é exemplo disso. Com o mesmo pano de fundo, o Parlamento alemão, em 1965, decidiu, com efeitos retroativos, estender a prescrição para os crimes de homicídio praticados no contexto do nazismo – e, posteriormente, viria a eliminá-los –, o que contou com o beneplácito do Tribunal Constitucional Federal alemão (COLLINGS, 2021, pp. 93-99). De notar, porém, que no primeiro caso citado, a flexibilização veio de ato político-jurídico dos vencedores, enquanto no segundo adveio do Parlamento, ambos players do campo da política pura. No caso brasileiro, o Supremo fez as vezes de ator político e, sponte sua, flexibilizou a legalidade penal em grau ainda mais elevado.
[7] Sobre a introdução da teoria: GARCIA AMADO, Juan Antonio. La filosofía del derecho de Habermas y Luhmann. Colômbia. Universidad Externado de Colombia, 2006, pp. 103-198.
[8] MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco J. A árvore do conhecimento: as bases biológicas da compreensão humana (1984). 5ª ed. trad. H. Mariotti e L. Diskin. São Paulo: Palas Athena, 2001.
[9] Não deixamos de considerar, todavia, a possibilidade de acoplamento entre outros subsistemas, como, por exemplo, a economia e nesse sentido salientamos: BACHUR, João Paulo. Distanciamento e crítica: limites e possibilidades da teoria de sistemas de Niklas Luhmann. 2009. 356 f. Tese (Doutorado em Ciência Política). Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo. Disponível em: < http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8131/tde-13102009-172653/ >.
[10] No original: El acoplamiento estructural entre Derecho y Política es regulado por médio de Ia Constitución. La constitución, por una parte, ata el sistema político ai derecho, con Ia consecuencia de que el comportamiento contrario ai derecho conduce ai fracaso político. Por otra pane, Ia constitución permite que el sistema político —mediante Ia promulgación de leyes— inunde con novidades ai sistema dei derecho. A pesar de este acoplamento estructural, Ias operaciones recursivas internas de cada sistema se mantienen separadas: el significado político de una ley es distinto a su validez jurídica.
[11] Sentido atribuído por DERRIDA, Jacques (org.). A Religião, trad.: Roberta Barni e Luciano Vieira, Florianópolis: Estação Liberdade, 2000.
[12] Sentido desenvolvido por GUERRA FILHO, Willis Santiago. “Potência crítica da ideia de direito como um sistema social autopoiético na sociedade mundial contemporânea”, in: Jurisdicização das Esferas Sociais e Fragmentação do Direito na Sociedade Contemporânea, Germano Schwartz (org.), Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2012, pp. 59 – 69; Id., “Luhmann and Derrida: Immunology and Autopoiesis”, in: Luhmann Observed: Radical Theoretical Encounters, A. La Cour e A. Philippopoulos-Mihalopoulos (eds.), Londres/Nova York: Palgrave, 2012; CANTARINI, Paola. Princípio da Proporcionalidade como Resposta à Crise Autoimunitária do Direito. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017
[13] LUHMANN, Niklas. Das Recht der Gesellschaft, Frankfurt am Main: Suhrkamp, 1993, pp. 161 e 565 ss.
[14] GUERRA FILHO, Willis Santiago. A autopoiese do direito na sociedade informacional: introdução a uma teoria social sistêmica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018.
[15] No original: Il processo di differenziazione dell’agire político, come particolare struttura della società, acresce la possibilità de guardare socialmente, d’interpretare e, insieme, anche di mettere in discussione casi puramente politici, conducendoli ad una soglia di consapevolezza, oltre da qualle diventa problemática la loro representazione, ma possibile il loro controlo sociale. [...]La differenziazione sociale elimina la delimitazione del potere politico dapprima all’ambito familiare, pois ai ruoli religiosi e, sucessivamente , a quelli economici e lo regola, infine, su se stesso, suscitando l’esigenza de sostituire l únità e la generalità dell’ordine sociale, fondato sui ruoli, con uma legitimazione di comptenze specifiche che sia gisutificabile e condivisa. Una tale legittimazione deve presentarsi come imanente, controllabile razionalmente e deve tentare di dare fondamento ad un potere razionale.
[16] João Trindade Cavalcante Filho assim explica a diferença entre a interpenetração e a alopoiese: “Nesse contexto, é natural que os sistemas autopoiéticos possuam pontos de contato e comunicação com outros sistemas (é justamente o conceito de acoplamento estrutural). Quando dois sistemas se comunicam (um remetendo dados e prestações ao outro), de forma a operar com valores iguais ou complementares, coevoluindo por meio do respectivo aumento de complexidade, tem-se o que Luhmann chama de interpenetração de sistemas. Algo que é não só salutar como pressuposto para se dizer que um sistema é autopoiético. [...] Há que se diferenciar, porém, a interpenetração (característica do acoplamento estrutural e do relacionamento do sistema autopoiético com os outros subsistemas que compõem o ambiente) da alopoiese. Esta significa a negação da autopoiese, trata-se da corrupção sistêmica, da definição de elementos de um sistema a partir da programação condicional e do código de outro sistema. Em palavras simples: a alopoiese é a ‘invasão’ de um sistema por outro, corrompendo seu código, aniquilando sua autonomia e tornando-o disfuncional” (CAVALCANTE FILHO, 2018, p. 46). Não há como dizer que a autorização constitucional inscrita nos arts. 5º, inciso LXXI, e 103, §2º seja uma abertura para que as funções do sistema político de legislar em matéria penal seja transferida ao sistema jurídico, ainda mais quando a mesma Constituição, em seu art. 62, §1º, inciso I, alínea “b”, impede que medida provisória, originada do Poder Executivo, trate de matéria penal incriminadora.
Estudante do programa de pós-graduação stricto sensu em Direito Constitucional da Puc-SP; possui pós-graduação latu senso em Direito Constitucional pela PUC-SP e é bacharel em Direito pela mesma universidade. É advogada na área de direito tributário no estado de São Paulo (OAB/SP 321-292)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LUISA VICTOR KUKUCHI D'AVOLA, . O julgamento da criminalização da homofobia pelo STF: uma análise a partir da teoria dos sistemas de Luhmann Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 fev 2021, 04:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56175/o-julgamento-da-criminalizao-da-homofobia-pelo-stf-uma-anlise-a-partir-da-teoria-dos-sistemas-de-luhmann. Acesso em: 23 dez 2024.
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