O fenômeno da judicialização da saúde em Alagoas vem preocupando a Fazenda Pública Estadual em função do elevado impacto que este gerou – e ainda gera – para os cofres públicos estaduais, notadamente na última década[1].
Essa realidade, aliás, motivou a Fazenda Pública Estadual a mover recentemente várias ações de ressarcimento em face da União visando à recuperação de quantias gigantescas dispendidas pelo Estado de Alagoas em tratamentos oncológicos[2].
Em função do alto grau de ativismo judicial nesta seara de ações judiciais referentes ao direito constitucional à saúde, cada vez mais os cidadãos vêm ajuizando demandas para obter medicamentos, exames, cirurgias, tratamentos, internações compulsórias, órteses e próteses, entre outros pleitos semelhantes[3].
No que tange à Procuradoria Geral do Estado de Alagoas (PGE/AL) houve a edição de 4 (quatro) Súmulas de Jurisprudência Administrativa visando a desafogar os trabalhos da defesa judicial do ente público em juízo e, ainda, a facilitar o acesso dos cidadãos ao direito à saúde, as quais se citam abaixo:
Súmula Administrativa n°11/2011, de 24 de outubro de 2011
O PROCURADOR-GERAL DO ESTADO, no uso da atribuição que lhe confere o art.11, incisos I e XII, c/c o art. 7º, inciso XIII, e art. 4º, inciso X, da Lei Complementar nº 07, de 18 de julho de 1991, edita a presente Súmula Administrativa, de caráter obrigatório a todos os órgãos jurídicos do Estado de Alagoas, a ser publicada, no órgão oficial de imprensa do Estado, por duas vezes sucessivas:
“Fica autorizado não contestar ou interpor recursos nas demandas judiciais que visam ao fornecimento de terapia medicamentosa, quando o medicamento ou insumo constarem das listagens oficiais como de dispensação pelo ente estadual, ainda que custeados com recursos do Ministério da Saúde.”
CONSIDERAÇÃO: trata-se da hipótese em que o medicamento solicitado consta no rol de medicamentos excepcionais a serem fornecidos pelo Estado de Alagoas, em que não há resistência ao pleito autoral.
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO, Procuradoria Administrativa, em Maceió, 24 de outubro de 2011.
Charles Weston Fidelis Ferreira
Procurador-Geral do Estado
Súmula Administrativa n°12/2011, de 24 de outubro de 2011
O PROCURADOR-GERAL DO ESTADO, no uso da atribuição que lhe confere o art.11, incisos I e XII, c/c o art. 7º, inciso XIII, e art. 4º, inciso X, da Lei Complementar nº 07, de 18 de julho de 1991, edita a presente Súmula Administrativa, de caráter obrigatório a todos os órgãos jurídicos do Estado de Alagoas, a ser publicada, no órgão oficial de imprensa do Estado, por duas vezes sucessivas:
“Fica autorizado não contestar ou interpor recursos nas demandas judiciais que visam a realização de exames, procedimento cirúrgico ou terapêutico, bem como fornecimento de medicamento por prazo determinado, quando o ato ou tratamento pretendido se consumar antes do ato processual a ser praticado.”
CONSIDERAÇÃO: trata-se da hipótese em que concedida medida antecipatória, satisfazendo ao pleito objeto da demanda, antes do ato processual cabível, não deve ser continuada a discussão judicial.
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO, Procuradoria Administrativa, em Maceió, 24 de outubro de 2011.
Charles Weston Fidelis Ferreira
Procurador-Geral do Estado
Súmula Administrativa n°13/2011, de 24 de outubro de 2011
O PROCURADOR-GERAL DO ESTADO, no uso da atribuição que lhe confere o art.11, incisos I e XII, c/c o art. 7º, inciso XIII, e art. 4º, inciso X, da Lei Complementar nº 07, de 18 de julho de 1991, edita a presente Súmula Administrativa, de caráter obrigatório a todos os órgãos jurídicos do Estado de Alagoas, a ser publicada, no órgão oficial de imprensa do Estado, por duas vezes sucessivas:
“Fica dispensada a interposição de recursos excepcionais (extraordinário e especial) contra decisão que, com fundamento nos artigos 196 e 198 da Constituição Federal, determina o fornecimento de medicamento, ainda que este não esteja entre os relacionados no Programa de Medicamentos Excepcionais, mas desde que o mesmo seja lícito, devidamente registrado na ANVISA ou no Ministério da Saúde.”
CONSIDERAÇÃO: trata-se da hipótese em que a decisão a ser discutida na via extraordinária, fundamentou-se no direito à saúde, dever do Estado, ou ainda, na solidariedade dos entes componentes da estrutura do SUS, em que prevalece o entendimento maciço de que há a solidariedade entre os entes, podendo a ação judicial ser ajuizada contra União, Estado, ou Município, mas desde que o medicamento seja lícito, possua registro na ANVISA ou Ministério da Saúde.
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO, Procuradoria Administrativa, em Maceió, 24 de outubro de 2011. Charles Weston Fidelis Ferreira
Procurador-Geral do Estado
Súmula Administrativa n° 40/2012, de 3 de setembro de 2012
O PROCURADOR-GERAL DO ESTADO, no uso da atribuição que lhe confere os arts. 4º, inciso X, 7º, inciso XIII, e 11, incisos I, XII e XV, todos da Lei Complementar nº 07, de 18 de julho de 1991, combinado com o art. 50 e seguintes do Decreto Estadual nº 4.804, de 24 de fevereiro de 2010, com a redação dada pelo Decreto Estadual nº 8.725, de 5 de novembro de 2010, edita a presente Súmula Administrativa, de caráter obrigatório a todos os órgãos da Administração Pública Estadual Direta e Indireta, a ser publicada, no órgão oficial de imprensa do Estado:
Fica dispensada a atuação da Procuradoria Geral do Estado nas demandas de saúde, salvo nas hipóteses excepcionalmente relevantes, assim consideradas, fundamentadamente, pela Secretaria de Estado da Saúde, conforme critérios objetivos previamente definidos pela própria Procuradoria Geral do Estado.
REFERÊNCIA: Processos nº 1204-3639/2012 e 1204-6251/2012.
PROCURADORIA GERAL DO ESTADO, Gabinete do Procurador Geral, em Maceió, 3 de setembro de 2012.
Marcelo Teixeira Cavalcante
Procurador-Geral do Estado (grifou-se)[4]
No entanto, em que pese os esforços da PGE/AL no aspecto de aperfeiçoamento das normas jurídicas e das inovações trazidas pelas orientações jurisprudenciais acima mencionadas, o volume de ações judiciais somente vem crescendo diuturnamente e não há condições humanas para se fazer frente a uma avalanche de processos com este tema e complexidade.
Essa realidade onde há um grande número de ações judiciais tramitando perante o Poder Judiciário criou, em ato reflexo, a necessidade deste também se modernizar a fim de conseguir dar vazão às pretensões dos jurisdicionados.
Nesse contexto, o Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL) vem se modernizando e apostando na tecnologia como um meio de racionalizar os serviços do Poder Judiciário e entregar ao cidadão uma decisão judicial mais efetiva e célere, a exemplo das ferramentas de inteligência artificial pelo robô Hércules, do aplicativo iAcordo e das audiências por videoconferência[5].
Especificamente quanto às demandas de saúde pública, o robô Hércules vem obtendo elevado êxito na melhoria dos trabalhos do Poder Judiciário, onde, entre outras funcionalidades, a ferramenta consegue classificar e separar as ações por tipo e objeto, ler os pleitos das partes e redigir uma minuta de decisão judicial em poucos minutos[6].
No entanto, esse cenário de elevada preocupação com os investimentos em tecnologia e inteligência artificial não vem sendo acompanhado pela PGE/AL de modo efetivo, material e real, ao contrário do que prevê a Lei Orgânica da Advocacia Geral do Estado (LCE nº 07/1991) e o seu Regimento Interno (Decreto Estadual nº 4.804/2010), a saber:
Lei Orgânica
Art. 25-A. Fica criado o Fundo de Modernização da Procuradoria-Geral do Estado – FUNPGE, destinado a custear:
I – programas de manutenção, reaparelhamento, modernização, desenvolvimento e aperfeiçoamento da Procuradoria Geral do Estado, inclusive quanto à formação e ao treinamento de recursos humanos; e
II – promoção de outras ações afins da Procuradoria Geral do Estado.
Regimento Interno
Art. 5° As normas, orientações e decisões da Procuradoria Geral do Estado, na condição de órgão central do sistema jurídico, vinculam todos os órgãos e entidades da Administração Estadual, inclusive as empresas públicas e as sociedades de economia mista, podendo avocar quaisquer decisões e processos para sua análise.
Parágrafo único. O sistema jurídico tem por finalidade assegurar a concentração e a articulação do esforço técnico para padronização, uniformização, integração, racionalização, eficiência, eficácia, efetividade, economicidade, celeridade e economia processuais, aumento da rentabilidade, combate ao desperdício, contenção e progressiva redução dos custos operacionais. [7] (grifou-se)
A par disso, é preocupante que a defesa da Fazenda Pública Estadual não esteja alinhada ao ritmo de evolução tecnológica do Poder Judiciário – e das demais Funções Essenciais à Justiça – já que cabe à Procuradoria Geral do Estado representar judicialmente e extrajudicialmente os interesses do Estado de Alagoas nas demandas de saúde.
A bem da verdade, existe uma Comissão de Inteligência Artificial criada no órgão com o objetivo de fazer o acompanhamento desse tema em especial, porém, por falta de um planejamento estratégico geral da instituição e de um investimento pesado em tecnologia, a PGE/AL está cada vez mais distante da realidade do Tribunal local[8].
Hoje, enquanto o Poder Judiciário possui um robô Hércules com elevada produtividade – o que é elogiável desde que mantidos os princípios constitucionais e processuais, a exemplo da motivação, do contraditório e da publicidade – a Fazenda Pública se mantém realizando defesas e manifestações em geral no modo arcaico e manual, onde os Procuradores de Estado necessitam atuar contra um robô.
Frente ao exposto, urgente se faz que haja uma devida estruturação da PGE/AL, garantindo-se o pleno funcionamento dessa Função Essencial à Justiça prevista no artigo 132 da Constituição Federal, bem como o princípio da eficiência administrativa insculpido no artigo 37 do mesmo texto constitucional.
Do contrário, muito em breve, a situação fazendária se tornará insustentável com imensos prejuízos ao erário diante das limitações humanas perante poderosos robôs do Poder Judiciário, podendo, inclusive, causar danos à saúde física mental dos Procuradores de Estado e, ainda, a impossibilidade de cumprimento eficaz das decisões judiciais cujos beneficiários são os próprios cidadãos.
[1] BRASIL. Procuradoria Geral do Estado de Alagoas. Disponível em: <http://www.procuradoria.al.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/2015/pge-e-sesau-buscam-reduzir-o-tempo-resposta-das-acoes-judiciais-na-saude>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[2] BRASIL. Procuradoria Geral do Estado de Alagoas. Disponível em: <http://www.procuradoria.al.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/pge-busca-ressarcimento-de-r-12-2-milhoes-da-uniao>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[3] BRASIL. Procuradoria Geral do Estado de Alagoas. Disponível em: <http://www.procuradoria.al.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/2016/nucleo-da-saude-busca-evitar-judicializacao-por-proteses-e-orteses/>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[4] BRASIL. Procuradoria Geral do Estado de Alagoas. Disponível em: <http://www.procuradoria.al.gov.br/jurisprudencia-administrativa/sumulas>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[5] BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas. Disponível em: <https://www.tjal.jus.br/noticias.php?pag=lerNoticia¬=17530>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[6] BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas. Disponível em: <https://www.tjal.jus.br/noticias.php?pag=lerNoticia¬=17433>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[7] BRASIL. Gabinete Civil. Disponível em: <http://www.gabinetecivil.al.gov.br/legislacao/>. Acesso em: 13 fev. 2021.
[8] BRASIL. Procuradoria Geral do Estado de Alagoas. Disponível em: <http://www.procuradoria.al.gov.br/sala-de-imprensa/noticias/2019/copy_of_pge-institui-comissao-de-inteligencia-artificial>. Acesso em: 13 fev. 2021.
Procurador do Estado de Alagoas. Advogado. Consultor Jurídico. Ex-Conselheiro do Conselho Estadual de Segurança Pública de Alagoas. Ex-Membro de Comissões e Cursos de Formação de Concursos Públicos em Alagoas. Ex-Membro do Grupo Estadual de Fomento, Formulação, Articulação e Monitoramento de Políticas Públicas em Alagoas. Ex-Técnico Judiciário do Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Ex-Estagiário da Justiça Federal em Alagoas. Ex-Estagiário da Procuradoria Regional do Trabalho em Alagoas. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CALHEIROS, Elder Soares da Silva. Inteligência artificial, Hércules e a judicialização da saúde: um novo desafio para a Procuradoria Geral do Estado de Alagoas (PGE/AL) Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 fev 2021, 04:56. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56192/inteligncia-artificial-hrcules-e-a-judicializao-da-sade-um-novo-desafio-para-a-procuradoria-geral-do-estado-de-alagoas-pge-al. Acesso em: 23 dez 2024.
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