INGO DIETER PIETZSCH[1]
(orientador)
RESUMO: De simples exegese, reconhece-se que a violência doméstica contra a mulher continua sendo um problema social, apesar de anos de combate a esse entrave. Todavia, não se pode ignorar as medidas legislativas que já foram editadas na vertente do mesmo tema. Por isso, resta pendente observar as causas desse tipo de violência através da análise bibliográfica. No intento de proteger a mulher, o Estado impõe uma série de medidas protetivas contra o agressor, fornece abrigo à mulher, realizou implantação de delegacias especializadas, e uma série de outras ações que coíbem atitudes violentas contra o sexo feminino. Por outro lado, deixar de abordar o tema, além de não esgotar o debate doutrinário, significaria apostar na completa ingerência das obrigações do Estado em garantir a vida e saúde das vítimas de violência doméstica, bem como dos direitos fundamentais das mulheres. O presente artigo tem o objetivo de apontar as causas da violência doméstica, apesar das diversas medidas legislativas e coercitivas contra essa violência, bem como observar as disposições doutrinárias a respeito das políticas públicas de repressão a agressão contra a mulher no ambiente doméstico.
Palavra-chave: Violência contra a Mulher; Perfil das agredidas; Politicas Publicas; Medidas Protetivas.
ABSTRACT: From simple exegesis, it is recognized that domestic violence against women remains a social problem, despite years of combating this obstacle. However, the legislative measures that have already been issued on the same subject cannot be ignored. Therefore, it remains pending to observe the causes of this type of violence through bibliographic analysis. In order to protect women, the State imposes a series of protective measures against the aggressor, provides shelter for women, has established specialized police stations, and a series of other actions that curb violent attitudes against women. On the other hand, failing to address the issue, besides not exhausting the doctrinal debate, would mean betting on the complete interference of the State's obligations to guarantee the life and health of victims of domestic violence, as well as the fundamental rights of women. This article aims to point out the causes of domestic violence, despite the various legislative and coercive measures against this violence, as well as to observe the doctrinal provisions regarding public policies to repress aggression against women in the domestic environment.
Keyword: Violence against Women; Profile of the attacked; Public policy; Protective measures.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER; 2.1 As Causas de Incidência; 2.2. O Perfil das Agredidas; 2.3. Da rescindência da Violência; 3. POLÍTICAS PÚBLICAS DE APOIO ÀS MULHERES AGREDIDAS; 3.1. Da Estrutura estatal para acolhimento das agredidas; 3.2. Das oportunidades de inclusão social da mulher vítima de violência doméstica; 4. O ATENDIMENTO AS NECESSIDADES DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA; 4.1. Das delegacias especializadas; 4.2. Medidas protetivas gerais; 4.3. Medidas protetivas de maior incidência; 4.3.1. Afastamento do Lar; 4.3.2. Proibição de Aproximação; 5. CONCLUSÃO. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A evolução da cultura nos trouxe diversos sufrágios, mas, além disso, nos trouxe a quebra de um tabu, trouxe-nos o acesso à informação, a desconsideração de um pensamento enraizado por anos, de que a mulher é o sexo frágil, é um objeto maleável nas mãos dos homens. Além disso, que o seu silêncio a frente de uma agressão que fere a sua integridade psicológica e física, é uma obrigação, por ser apenas mais uma no meio de tantas violentadas.
Finalmente, em setembro de 2006, a Lei N 11.340/2006, entrou em vigor. Foi considerada pela ONU como uma das três melhores legislações da violência de gênero. A Lei Maria da Penha não criou novos crimes ou modificou aqueles previstos no Código Penal, mas apenas auxilia o aplicador da lei no que diz respeito à definição do que seja violência doméstica e familiar contra a mulher. Deixando de ser julgada como um crime de menor potencial ofensivo, devendo seus crimes ser da competência dos Juizados Especializados de Violência Doméstica Contra a Mulher, não mais pelos Juizados Especiais Criminais. Sendo julgados, apenas nas Varas Criminais, nas cidades onde ainda não existirem os juizados especializados.
Duarte et al., (2015) relatam que a violência conjugal pode se manifestar de diversas formas, tais como: sexual, moral e a psicológica, as quais nem sempre aparecem acompanhadas de queixas físicas, demandando ainda mais habilidade por parte dos profissionais para reconhecer, tratar e preservar a saúde das mulheres agredidas.
Referente ao impacto da violência contra a mulher, 25% dos dias de trabalho perdidos por mulheres costumam ter como causa a violência, o que reduz sua renda entre 3% e 20%. Filhos de mães que sofrem algum tipo de violência têm três vezes mais chances de adoecer e 63% dessas crianças repetem pelo menos um ano na escola, abandonando os estudos, em média, aos nove anos de idade. A violência ocorrida dentro dos lares representa quase um ano perdido de vida saudável (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2005).
A violência doméstica contra a mulher enquadra-se nos termos da Lei Maria da Penha (lei 11.340/2006), quando há um vínculo afetivo, doméstico e familiar entre o autor da violência e a vítima. Esse vínculo não necessariamente precisa ser biológico, podendo ser também afetivo, ou seja, ocorre quando há uma relação de convivência entre os envolvidos (BIANCHINI, 2014).
Entre as formas mais comuns de violência está a praticada contra a mulher pelo parceiro íntimo. Segundo definição da Assembleia Geral das Nações Unidas, define-se como violência contra a mulher qualquer ato de violência de gênero que resulte, ou tenha probabilidade de resultar, em prejuízo físico, sexual ou psicológico, ou ainda em sofrimento. Inclui também a ameaça, a coerção e a privação da liberdade, seja em público ou na vida privada (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 1997).
Com base nos dados estudados este trabalho tem como objetivo relatar a partir de uma revisão da literatura quais as principais causas, efeitos e políticas públicas tangentes a violência contra a mulher. O método de abordagem adotado para esta pesquisa é o dedutivo, o qual é correspondente à extração discursiva do conhecimento a partir de afirmações e premissas gerais, as quais serão aplicáveis a hipóteses concretas. Assim, analisam-se aspectos gerais para que se possa chegar a uma conclusão específica. Portanto é o método que procede do geral para o particular. A técnica utilizada será o conjunto formado por documentações indiretas, que abrangem a pesquisa bibliográfica, legislativa e doutrinária, constituída a partir de livros, artigos científicos e decisões judiciais, cumulada com a formulação de propostas concretas para se alcançar a aplicabilidade da premissa formulada.
Desse modo, o estudo apresenta como objetivo geral levar ao leitor um resumo sobre um tema que tem sido muito discutido no nosso dia a dia, por se tratar de um fenômeno que está afligindo muitas famílias.
2. A VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER
A Lei Maria da Penha, no artigo 5º, entendeu que a violência doméstica pode ser qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial. Pode ser praticado ainda por companheiro, pai, irmão, familiares em geral, e até pessoas no convívio normal dentro de uma sociedade, independente da sua orientação sexual.
O artigo 7º da Lei 11.340/2006 determinou que as formas de violência doméstica:
Violência Física: qualquer conduta que traga sofrimento e agrida a integridade física ou a saúde da mulher. É importante salientar que a violência física não é só o espancamento, mas também pode ser sacudir, apertar, beliscar e até mesmo atirar objetos visando acertar a vítima. Neste caso, a ação penal será pública incondicionada.
Violência Psicológica: será toda ação que exponha a mulher ao ridículo, humilhando, manipulando, chantageando, submetendo-a controle extremo sobre as suas ações, sobre a sua liberdade de ir e vir perseguindo-a, restringindo suas vontades, crenças e decisões mediante ameaças. Enfim, tudo aquilo que traga alguma forma de perturbação mental e prejuízo a saúde psicológica da mulher. Neste caso será ação pública incondicionada, porém no crime de ameaça, será condicionada a representação.
Violência Sexual: É entendido como qualquer ato de intimidar, ameaçar, coagir ou usar a força para forçar você a testemunhar, manter ou participar de atos sexuais desnecessários; induzi-la a comercializar ou usar seus atos sexuais de qualquer forma para impedi-la de usar quaisquer métodos anticoncepcionais Ou por meio de coerção, chantagem, suborno ou manipulação para forçá-la a se casar, engravidar, aborto espontâneo ou prostituição, ou restringir ou cancelar o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos. Os processos criminais podem ser públicos ou privados.
Violência Patrimonial: Ser entendido como qualquer comportamento que constitua retenção, dedução, destruição parcial ou total de seus pertences, ferramentas de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo comportamentos concebidos para atender às suas necessidades. Quanto a ação penal, se os cônjuges estiverem separados, deverá haver a representação por parte da ofendida para iniciar o inquérito policial (artigo 182, inciso I, Código Penal). Se houver violência ou grave ameaça, será pública condicionada.
Violência Moral É entendido como constituindo a calúnia, difamação ou injúria. A ação penal é privada.
Ademais, de acordo com a pesquisa do Instituto Avon, realizada somente com homens, 56% dos homens admite que já cometam alguma dessas formas de agressão: xingou, empurrou, agrediu com palavras, deu tapa, deu soco impediu de sair de casa, obrigou a fazer sexo. Fonte: “Percepções do Homem sobre a Violência Contra a Mulher” (Data Popular/Instituto Avon 2018).
Porém, mesmo com o avanço da legislação e punição do agressor, os mesmos continuam a cometer os mesmos atos, e muitas das vezes assassinam as vítimas, não se importando com as consequências.
2.1. As causas de incidência
Conforme a Organização Mundial da Saúde cerca de 35% das mulheres já vivenciaram violência física e/ou moral e sexual de seus companheiros ou violência sexual de não-parceiros íntimos durante suas vidas. Ainda de acordo com a OMS o Brasil ocupa o 5.ª lugar na lista de países onde a violência doméstica se tornou crime, ficando atrás somente destes países: El Salvador, Colômbia, Guatemala e Rússia. Vale ressaltar que somente nos anos de 2013, 4. 762 mulheres foram assassinadas no Brasil e 50,3% desses crimes foram cometidos por membros da família e 33,2% deles foram cometidos pelo atual ou ex-parceiro (WAISELFISZ, 2017, p. 25).
De acordo com a BBC News Brasil (2019) somente nos últimos 12 meses em, cerca de 1,6 milhão de mulheres foram espancadas ou sofreram tentativa de estrangulamento no Brasil, ao mesmo tempo que 22 milhões (37,1%) de brasileiras passaram por algum tipo de assédio. Já no que tange a violência doméstica os casos chegam a 42% ocorrências de violência doméstico. Acontece que essas mulheres após sofrer violência, cerca de 52% dos casos não denunciou o agressor ou procuraram ajuda.
De acordo com Vinicius Lisboa, Repórter da Agência Brasil (2019) foram de 28,5% dos homicídios de mulheres, essas mortes ocorreram dentro da própria residência da vítima, de acordo com o IPEA relaciona a possíveis casos de feminicídio e violência doméstica. Já entre os anos de 2012 a 2017 o IPEA demonstra que a taxa de assassinatos de mulheres teve uma diminuída de 3/3%, no entanto, os casos de crimes cometidos dentro das residências um elevado aumento de 17,1%. Já entre 2007 e 2017, ressalta-se que ainda a taxa de homicídios de mulheres por arma de fogo dentro de suas casas que aumentou em 29,8%.
No dia 8 de março de acordo com o Portal G1 (2019, online) foram divulgados dados pelo Monitor de violência que nos dias atuais a violência contra a mulher permanece em sua lata de porcentagem cruel, demonstrando a evidente taxa de desigualdade de gênero no Brasil. O portal relata que houve apenas uma redução de 6,7% no número de homicídios do sexo feminino no Brasil entre os anos de 2017 e 2018, que de 4.558 mortes passaram para 4.254 vítimas, indicando apenas a baixa de 13% de mortes de mulheres em todo pais.
Apesar da diminuição, esse número não é nada comparado a quantidade de famílias que perdem filhas, mães e netas para a crueldade humana, muito ainda precisa ser feito.
2.2. O perfil das agredidas
De acordo com relatório publicado pela Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas, da Vara Especializada em Crimes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, no Amazonas, de acordo com a equipe do Poder Judiciário verificou que:
No período de maio a dezembro de 2007 abriu 79 processos envolvendo casos de agressão. Ao fazer um resumo do perfil das vítimas quanto à idade, Conceição Sampaio informou que a maioria das mulheres que sofrem agressão está dentro da idade produtiva, ou seja, 72% têm entre 18 e 45 anos, agravando a situação da mulher agredida que algumas vezes precisa faltar o trabalho, resultando em demissão (JUSBRASIL, 2018).
Ainda segundo o relatório divulgado pelo Poder Judiciário, as vítimas em sua maioria, têm apenas o ensino fundamental incompleto, chegando a 38% da pesquisa, no que tange ao nível de empregos, a maior parte dessas mulheres informaram que eram proibidas de trabalhar, e ao manifestarem interesse em ocupar cargos de empregos, eram agredidas por seus companheiros. De acordo com a Deputada Conceição Sampaio “O que demonstra, segundo a deputada, que muitos agressores não aceitam que a companheira trabalhe fora de casa”.
De acordo com o portal Causa Operaria (2019, online) chega a 70% a taxa de mulheres que são agredidas pelos próprios cônjuges. Conforme relatada 50% dessas mulheres possuem formação superior, enquanto apenas 45% trabalham, no entanto, por receberem menos, possuem dependência financeira com relação aos companheiros.
A maior parte delas possuem filhos e não têm família para recorrer. Sem mencionar as que sofrem de cárcere privado, violência sexual e tráfico de pessoas. Portanto, mais de 90% das mulheres agredidas no Brasil (espancadas) são vítimas dos cônjuges e são mulheres que buscam se libertar da escravidão doméstica.
De acordo com o relatório (2018, online), o maior número de casos de violência doméstica e familiar vem da zona Leste de Manaus, com 35% dos casos. Ainda na pesquisa aponta alguns “motivos” para que ocorra tal agressão de violência doméstica, sendo eles:
A agressão familiar está o uso de bebidas alcoólicas, por parte de 26% dos agressores que admitiram beber diariamente, e 27% apenas nos finais de semana. A cerveja é a bebida mais consumida por 86% dos homens que agridem suas companheiras, seguida da cachaça. Quanto ao uso de drogas, 3% das vítimas usa diariamente, 5% parou de usar e 88% afirma nunca ter usado nenhum tipo de drogas. Entre os agressores, 47% afirmam nunca ter usado drogas, 7% usa diariamente, 30% parou de usar, enquanto 13% dos agressores usa esporadicamente (JUSBRASIL, 2018).
Sendo assim, como foi relatado o perfil das agredidas na maior da parte são de mulheres submissas, com baixo grau de escolaridade, totalmente dependentes de seu companheiro. Como muitas mulheres do Estado do Amazonas vem do interior com a experiência da pobreza e fome, encontram em seus casamentos a expectativa de mudança de vida, mas a realidade é outra. Essas mulheres, sem estudo, sem esperança se veem presas a relacionamentos abusivos, tóxicos, submissos por conta de acreditarem que não irão sobreviver sem o auxílio daquele marido, ou que não vão poder sustentar seus filhos e conseguir emprego.
A cultura machista e patriarcal ajuda muito para que as mulheres continuem submissas a violência doméstica, a desigualdade de gênero ainda é presente em nosso dia-a-dia, salários baixos, assédios morais e sexuais, piadas e etc... demonstram que a cultura patriarcal de nada diminuiu, é preciso incentivar o empoderamento feminino, incentivar nossas irmãs a não aceitarem agressão de ninguém, pois, a violência não está somente presente nos relacionamento hétere, mas como também nos relacionamento entre duas mulheres (lésbico) apesar de não muito falado, a violência entre lésbicas é enorme, e também caracteriza como uma violência contra mulher.
No próximo tópico falaremos sobre a reincidência e quais motivos que levam os agressores cometerem os atos de violência por diversas vezes.
2.3. Da reincidência da violência
A maioria dos casos de violência doméstica contra a mulher denunciado aos órgãos competentes, são repetitivos, ou seja, os casos de reincidência da violência são comuns.
De acordo com o Pedro Grigori - Especial para o Correio (2018) ao entrevistarem um Especialista no assunto, foi relatado que:
Especialista em violência doméstica, a antropóloga Lia Zanotta, da UnB, acredita que o aumento no registro de feminicídios é o reflexo de uma construção histórica que colocou a mulher abaixo do homem. Para ela, a visibilidade de casos faz aumentar as denúncias e torna o processo judicial mais eficaz, mas ainda há um caminho longo a ser percorrido para desconstruir essa tradição. “A mulher é uma válvula de escape. Se o homem passa por uma crise econômica, desconta nela. Se passa por um momento difícil, bebe e bate nela. Isso vem de uma idealização lá do Brasil Colônia, em que, ao casar, a mulher passava a ser um ser totalmente submisso, obediente ao marido”, comenta, em relação a casos em que o agressor é o companheiro.
A reincidência se dá porque os homens acreditam que não há punibilidade para o crime que cometeu, assim como as mulheres acabam por perdoar as práticas do agressor, o mesmo se sente no direito de cometa-las mais uma vez, acreditando que aquela mulher irá perdoa-lo novamente.
Alguns grupos de apoio têm criado Projetos com homens agressores o intuito de reduzir a reincidência de violência doméstica, a cidade de Montes Claros é exemplo disso. Desde janeiro de 2018, cerca de 260 homens participaram de grupos temáticos, reflexivos e de responsabilização da Lei Maria da Penha, realizados pelo programa Central de Acompanhamento de Penas e Medidas Alternativas (Ceapa), da Secretaria de Estado de Segurança Pública (Sesp). Desde então, nenhum deles voltou a ter histórico de envolvimento com violência contra a mulher (Divulgação Sesp, 2019).
O programa Ceapa tem como objetivo contribuir para o fortalecimento e a consolidação das alternativas à prisão no Estado, pautando ações de responsabilização com liberdade. Nos municípios, a Ceapa se estrutura implantando Centros de Alternativas Penais compostos por profissionais com formação em Direito, Psicologia e Serviço Social, que trabalham de forma interdisciplinar (Divulgação Sesp, 2019).
3. POLÍTICAS PÚBLICAS DE APOIO ÀS MULHERES AGREDIDAS
As décadas de 70 e 80 foram marcadas pelo início de uma série de debates e mobilizações acerca da violência contra a mulher, está sendo intensamente abordada pelos movimentos feministas de diversos países e nas pautas dos organismos internacionais que discutiam o assunto (COSTA, 2008).
Essa iniciativa proporcionou a criação de dispositivos internacionais, dos quais o Brasil é signatário, tais como a Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, de 1979, sendo subscrita em 1984 pelo Brasil e a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher e a Convenção de Belém do Pará, de 1994 tendo sido ratificada pelo Brasil em 1995 (PIOVESAN, 2009).
No Brasil, o engajamento do movimento de mulheres e feministas em busca de implementações de políticas públicas, culminou na criação do Conselho Estadual da Condição Feminina – CECF, em 1983 e no Conselho Nacional dos Direitos da Mulher – CNDM, em 1985, objetivando a promoção de políticas que visam eliminar a discriminação contra a mulher. Ainda no mesmo ano instalou-se a primeira Delegacia de Defesa da Mulher – DDM do país, no Estado de São Paulo.
Nesse contexto, também foram instituídos organismos como as Secretarias e Coordenadorias de Mulheres e os Núcleos de Políticas para as Mulheres, com intuito de enfrentar a violência, assim como a transformação social acerca das relações de gênero.
De acordo com IPEA (2015, p.9):
As políticas públicas desenvolvidas pela Secretaria de Políticas para as Mulheres têm o objetivo de superar as desigualdades e combater todas as formas de preconceito e discriminação. Sua atuação desdobra-se em três linhas principais de ação: (a) Políticas do Trabalho e da Autonomia Econômica das Mulheres; (b) Enfrentamento à Violência contra as Mulheres; e (c) Programas e Ações nas áreas de Saúde, Educação, Cultura, Participação Política, Igualdade de Gênero e Diversidade.
3.1. Da Estrutura estatal para acolhimento das agredidas
O tema da violência contra a mulher é concebido como um problema de natureza complexa e multifacetado, ensejando uma demanda específica com serviços integrados, tais como, assistência jurídica e psicológica e que oferecesse atendimento especializado com tratamento digno e respeitoso às mulheres em situação de violência, uma vez que, nas delegacias em geral, apresentava sinais sexistas e preconceituosos (PASINATO e SANTOS, 2008).
Desta forma, a primeira Delegacia de Defesa da Mulher foi inaugurada em 06 de agosto de 1985, no Estado de São Paulo. O surgimento dessa especializada se justificou por dois fatores. O primeiro, em razão da pressão de movimentos feministas e de mulheres. O segundo, refere-se a mudança política que deu azo à criação de novas instituições e leis que correspondessem a um Estado de Direito Democrático.
Desse modo, a criação de delegacias especializadas no atendimento às mulheres foi considerada como uma das mais importantes políticas públicas no país, tendo expandindo-se posteriormente com diversas unidades em outros estados.
Mesmo abrangendo grande parte do território nacional, as delegacias não se revelaram suficientes para atender às mulheres, uma vez que não dispunham de recursos específicos para tratar de conflitos dessa complexidade.
Ainda de acordo com as pesquisas do IPEA (2015, p. 13), fora criado uma rede de atendimento as mulheres em situação de violência doméstica, visando oferecer apoio em diversas áreas: atendimento psicossocial, saúde, segurança e pelas instituições do sistema de Justiça. A ampliação da rede de atendimento, com a criação de novos serviços e organismos nos estados e municípios, transformou o caráter das políticas públicas direcionadas às desigualdades de gênero.
Existem também os Centros Especializados da Mulher, por meio de uma equipe interdisciplinar, atuam desenvolvendo ações e oferecendo serviços de cunho psicossocial, para auxiliar na ruptura das mulheres com a situação de violência (IPEA, 2015, p. 13).
Atuam também as casas de abrigo têm por meta dar asilo e atendimento integral a mulheres em situação de risco de vida iminente, em situação de violência doméstica. o serviço oferecido pelas casas de abrigo é totalmente sigiloso e temporário, onde as vítimas, que poderão estar acompanhadas dos filhos, buscam condições necessárias para retomar suas vidas. Durante o período de permanência na Casa, que varia de 90 a 180 dias, as usuárias têm acesso a serviços de atendimento integral (psicossocial e jurídico) (IPEA, 2015, p. 15).
3.2. Das oportunidades de inclusão social da mulher vítima de violência doméstica
A maior parte das mulheres que são vítimas de violência domesticas entram nas casas de acolhimento com medo, pois muitas não possuem emprego, ou quando tem medo de perdê-lo e ficar desamparada.
O estatuto de vítima visa acautelar, por um lado, a boa cooperação das entidades empregadoras relativamente à situação da vítima e, caso seja possível e de acordo com a dimensão e tipo da entidade empregadora, esta deverá dar prioridade aos pedidos do trabalhador VVD para a alteração do horário de trabalho de tempo completo para tempo parcial, logo que seja possível, para alterar o horário de trabalho a tempo parcial para horário completo ou para o aumento do tempo de trabalho (GUERREIRO, 2015, p. 31).
De acordo com o artigo 195º do Código do Trabalho, “o trabalhador vítima de violência doméstica tem direito a ser transferido, temporária ou definitivamente, a seu pedido, para outro estabelecimento da empresa, verificadas as seguintes condições: apresentação de queixa-crime; saída da casa de morada de família no momento em que se efetive a transferência”.
4. O ATENDIMENTO AS NECESSIDADES DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA
Os artigos 10, 11 e 12 da Lei n° 11.340/06, dispõem sobre o atendimento que deve ser realizado pela autoridade policial e questões relacionadas aos procedimentos e providências que devem ser adotadas quando a mulher sofre violência doméstica e familiar. Alguns pontos são de importante destaque, principalmente no que se refere à inaplicabilidade destes dispositivos, não por culpa da autoridade policial, não por esta deixar de realizar o seu trabalho devidamente, mas sim, pela ausência de recursos, pois não é disponibilizado pelo Estado mecanismos suficientes para o efetivo cumprimento da lei.
Nesse sentido (NUCCI, 2012, p.1270) leciona:
“[…] em determinadas situações, vislumbramos mais uma lei editada somente para servir de modelo do que seria o ideal, embora fique, na prática, distante do plano da realidade. Essa sensação de ruptura entre lei e fato concreto gera lamentavelmente, o sentimento comum a muitos brasileiros de que leis não servem para nada [...] ora, sabe-se que nem mesmo a lei de proteção às vítimas e testemunhas (Lei n° 9.807/99) vem sendo, eficientemente, aplicada, por falta de estrutura do Estado em sustentar os programas de proteção”.
No mesmo condão, destacam-se as questões inerentes ao disposto no artigo 11, da Lei nº 11.340/06, pois ele dispõe sobre as providências a serem tomados para garantir a proteção da vítima:
“Art. 11. No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências:
I. garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II. encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
III. fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
IV. se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V. informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis”.
Desta forma, o que se pode denotar é que mesmo a lei sendo protecionista e garantista da integridade física e psicológica da mulher, o Estado não subsidia profissionais suficientes para que ela seja efetivamente aplicada, pois, se por muitas vezes não há policiamento suficiente para atender ocorrências de pequeno grau de urgência, quem dirá para realizar acompanhamento, escolta e transporte da vítima de violência doméstica e familiar.
Assim, as autoridades policiais da comarca, trabalham em prol de realizar o melhor atendimento possível protegendo e zelando pela vítima, mesmo que não exatamente da maneira a qual a lei preconiza, devido à ausência de servidores suficientes para suprir a demanda. No entanto, na comarca, um ponto importante, positivo e de efetivo cumprimento é no que se refere principalmente ao disposto no artigo 12, inciso III:
“Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
[…] III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência.
[…] Desta maneira, no prazo de 48 horas a juíza, com o requerimento de medida protetiva, devidamente preenchido pela vítima, este, é remetido ao juiz que determina as providências a serem tomadas”.
4.1. Das delegacias especializadas
O tema da violência contra a mulher é concebido como um problema de natureza complexa e multifacetado, ensejando uma demanda específica com serviços integrados, tais como, assistência jurídica e psicológica e que oferecesse atendimento especializado com tratamento digno e respeitoso às mulheres em situação de violência, uma vez que, nas delegacias em geral, apresentava sinais sexistas e preconceituosos (PASINATO e SANTOS, 2008).
Desta forma, a primeira Delegacia de Defesa da Mulher foi inaugurada em 06 de agosto de 1985, no Estado de São Paulo. O surgimento dessa especializada se justificou por dois fatores. O primeiro, em razão da pressão de movimentos feministas e de mulheres. O segundo, refere-se a mudança política que deu azo à criação de novas instituições e leis que correspondessem a um Estado de Direito Democrático.
Desse modo, a criação de delegacias especializadas no atendimento às mulheres foi considerada como uma das mais importantes políticas públicas no país, tendo expandindo-se posteriormente com diversas unidades em outros estados.
Mesmo abrangendo grande parte do território nacional, as delegacias não se revelaram suficientes para atender às mulheres, uma vez que não dispunham de recursos específicos para tratar de conflitos dessa complexidade.
Conforme Télia Negrão (2004, p. 228) os seguintes problemas foram identificados: a) encontrou uma instituição judicial conservadora; b) nenhuma legislação específica contra a violência de gênero; c) falta de treinamento de pessoal para resolver o problema; d) porque não há mecanismo para garantir a segurança das mulheres que apresentam queixas E viver, porque após registrar o ocorrido, tiveram que voltar para casa com uma intimação ao agressor.
Diante disso, mesmo que com a criação das Delegacias da Mulher tenha havido aumento expressivo no número de denúncias, existe um baixo índice de condenações dos casos julgados que envolvem a violência contra a mulher, demonstrando que não foi uma solução satisfatória para o problema.
4.2. Medidas protetivas gerais
A Secretaria de Políticas para as Mulheres da Presidência da República (SPM-PR) estima que até dezembro de 2012, a Lei Maria da Penha tenha gerado mais de 350 mil medidas protetivas. Apesar de não ter os dados atualizados do Judiciário, o histórico positivo mostra que até 2011, foram contabilizadas mais de 280 mil ações de proteção. Diante da lei, a Violência doméstica contra a mulher deriva de ações ou omissões, baseadas no gênero, que causam danos tanto psicológicos, físicos e até patrimoniais.
O grande mérito da lei foi assegurar a concessão de medidas protetivas de urgência. Não houve a criação de novos tipos penais, mas foi afastada a possibilidade de os delitos reconhecidos como domésticos serem considerados de menor potencial ofensivo, a ensejar o decreto da prisão em flagrante e proibir a concessão de benefícios. (DIAS, Maria Berenice. Artigo Medidas Protetivas mais protetoras, 2016).
Na ocorrência de uma delas, são deferidas, pela autoridade (juiz), as medidas protetivas de urgência. Destinadas a resguardar a integridade da vítima, elas são concedidas de imediato, sem que seja necessária audiência entre as partes, manifestação do Ministério Público e do Poder Judiciário, entretanto, devendo ser intimados de imediato quanto a decisão. Podem ser requeridas tanto pela mulher, quanto pelo Ministério Público.
Além das medidas de assistência e proteção às mulheres, o juiz assegurará:
a) Funcionários públicos (titulares de gestão direta ou indireta) têm prioridade para destituí-los; b) Manter vínculo empregatício, podendo ser afastados do local de trabalho, se necessário, por no máximo 6 meses; nº 22 da Lei 11.340 de 2006 Os artigos 23, 24 e 24 prevêem medidas de proteção, que podem ser: afastar o agressor da casa ou residência da vítima (o mais importante). Determinar o limite mínimo de distância que proíbe o agressor de passar em relação à vítima (um dos prêmios mais recompensados), suspender a posse ou restrição de armas (se for o caso).
Nesse caso, dependendo da situação em que o agressor possa fazer uso de armas, na maioria dos casos, o juiz atuará como agente de segurança pública ou privada, comunicando ao órgão, empresa ou órgão correspondente as medidas emergenciais de proteção concedidas e determinará Medidas restritivas. De posse de armas, o superior imediato do agressor é responsável pelo cumprimento das ordens judiciais e é punido por abandono do dever ou desobediência (conforme o caso).
Após ouvir uma equipe multiprofissional de enfermagem ou serviço militar; o agressor é obrigado a pagar pensão alimentícia temporária ou pensão alimentícia temporária; se a situação for mais grave, o juiz pode ordenar que a vítima e sua família reintegrem seus empregos para participar de programas de proteção ou assistência oficiais ou comunitários. Além disso, após a deportação do agressor, fica determinado que a vítima e sua família retornem às suas casas, ou as vítimas sejam expulsas do país sem prejuízo dos direitos relativos à propriedade, guarda dos filhos e direito à alimentação; determine a separação de corpos.
Comparecimento em determinados locais a fim de manter a saúde física e mental das vítimas; a proteção também salvaguarda os direitos de propriedade das mulheres, tais como: congelamento de contas; eliminação de bens; devolução de bens indevidamente tomados pelo agressor; uso de depósitos judiciais para perdas causadas por violência doméstica E perda de material para fornecer segurança temporária. A menos que expressamente autorizado pelo tribunal, é temporariamente proibido celebrar atos e contratos de venda e arrendamento de bens comuns; suspensão da autorização da vítima ao agressor; essas medidas podem ser cumulativas ou isoladas, e podem aumentar ou reduzir a proteção a qualquer momento, pode ouvir as opiniões da procuradoria a qualquer momento.
De acordo com o relatório de pesquisa realizado pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), foram aplicadas, em pouco mais de cinco anos, 280.062 medidas protetivas, considerados os dados de todas as varas e juizados exclusivos do País, sendo Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Minas Gerais os recordistas em números absolutos. Considerando –se ao número de medidas protetivas por 100 mil mulheres, Acre, Amapá e Mato Grosso ocupam as primeiras posições.
4.3. Medidas protetivas de maior incidência
4.3.1. Afastamento do Lar
Em 2000, a Lei Nº 2.372, que propunha medidas protetivas, para a mulher vítima de violência doméstica – com o afastamento do agressor da habitação – foi totalmente vetada pelo presidente da República (Calazans e Cortes, 2011), e somente com a Lei 11.340/2006, foi adquirido esse direito. Atualmente, ao sofrer a violência, a mulher busca o mais rápido possível a sua autoproteção e a de seus filhos, consequentemente. Pois, os filhos desencadeiam comportamentos negativos ao viverem no cotidiano de agressões e desrespeito. Visando isto, o legislador criou uma medida protetiva que obrigasse o afastamento do agressor do lar e do ambiente que ocorreu o fato, objetivando a saúde mental e física da vítima, preservando também o seu patrimônio, já que estará longe do alcance do ofensor.
O afastamento do agressor do lar visa preservar a saúde física e psicológica da mulher, diminuindo o risco iminente de agressão (física e psicológica), já que o agressor não mais estará dentro da própria casa que reside a vítima.
O patrimônio da ofendida também é preservado, uma vez que os objetos do lar não poderão ser subtraídos ou destruídos. (BELLOQUE,2011, p. 311, BIANCHINI, 2013, p. 166).
Ademais, o afastamento pode ser feito pelas duas partes, tanto do homem, quanto da própria mulher, dependendo do fato concreto. Essa medida é de total importância, vez que retira as partes da convivência, resguardando a vítima fragilizada de novas agressões e futuras humilhações.
O afastamento, na maioria das vezes, é feito através do oficial de justiça, que vai até o lar das partes portando a decisão do magistrado, acompanhado ou não de força policial, que após de dada a ordem aguarda a sua saída. Depois do afastamento do agressor, a vítima e seus dependentes poderão ser reconduzidos ao lar, como previsto no artigo 23, inciso II, da Lei:
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
II - Determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor.
Podendo ser acompanhados por oficial de justiça, ou policiais. A maneira mais simples e rápida para requerer a recondução é fazer o requerimento na hora do registro da ocorrência junto a polícia, ou após a retirada do agressor do lar por ordem da justiça.
Em determinados casos, também é possível que a mulher seja afastada do lar, objetivando a cessão da violência, e a proteção de seus dependentes, sem afetar seus direitos relacionados aos seus bens, guarda dos filhos e alimentos. Desconstruindo o pensamento retrogrado que ao sair de casa, caracterizaria “abandono do lar”, levando-a a perder seus direitos. Previsto no artigo 23, inciso III, in verbis:
Art. 23. Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos.
4.3.2. Proibição de Aproximação
Outra forma que o legislador buscou para coibir a ação ofensiva do homem contra a mulher, seus parentes e das testemunhas, foi a medida protetiva de proibição de afastamento, estabelecendo um limite mínimo de distância entre as duas partes, podendo ser de 300m a 500m, de acordo com o artigo 22, inciso III, alínea “a”, da Lei:
Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor.
Propondo evitar que o agressor persiga a vítima, seus familiares e as testemunhas da causa penal, situação que evidentemente prejudicaria a colheita da prova e geraria graves riscos as pessoas que dela participam ou que tem relação familiar com a ofendida.
Esta medida tem comum objetivo com a medida que afasta o agressor do lar. Ao ficar proibido de se aproximar da vítima, de seus parentes e das testemunhas, o agressor fica, em tese, incapacitado de agir contra qualquer um destes. O legislador buscou proteger a incolumidade física e psíquica da mulher agredida” (BIANCHINI, 2013, p. 168).
Constado o risco do contato entre o agressor e os seus dependentes, juntamente com a medida de proibição de afastamento, o magistrado pode conceder a restrição ou suspensão de visitas aos dependentes, visando garantir a integridade física e psicológica dos seus descendentes. Esta medida está garantida no artigo 22, inciso IV, in verbis: Art. 22. Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras: IV – restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar.
Ademais, no caso de descumprimento das referidas medidas, o agressor pode ser preso preventivamente, conforme artigo 282, parágrafo 4, e 312, parágrafo único, e artigo 313, III do CPP:
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a: § 4o No caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas, o juiz, de ofício ou mediante requerimento do Ministério Público, de seu assistente ou do querelante, poderá substituir a medida, impor outra em cumulação, ou, em último caso, decretar a prisão preventiva.
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria. (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011). Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o). (Incluído pela Lei nº 12.403, de 2011).
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva: (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
III - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência; (Redação dada pela Lei nº 12.403, de 2011).
Portanto, é de suma importância a possibilidade de aplicação da prisão preventiva nos casos excepcionais, objetivando o cumprimento das medidas protetivas.
CONCLUSÃO
Destarte a lei Maria da Penha, foi um grande passo no Sistema Legislativo e Judiciário do País, pois contou com a participação ativa de organizações não governamentais feministas, Secretaria de Política para Mulheres, academia, operadores do direito e o Congresso Nacional. Deu nova margem de proteção às mulheres, e tornou o cenário democrático do Brasil mais humano e moderno.
Ao longo do trabalho, considerando o posicionamento de juristas, bem como de dados trazidos, verifica-se que a Lei Maria da Penha é eficaz quanto às orientações voltadas à proteção da ofendida e punição do agressor, contudo, o que se observa são entraves à sua aplicabilidade, bem como à fiscalização das medidas protetivas concedidas. Dessa forma, nota-se que os dispositivos da Lei, muitas vezes, encontram-se impossibilitados de serem atendidos em sua integralidade.
Dentre os entraves à efetividade das medidas protetivas está a morosidade em sua concessão, que se dá pela ausência de auxílio à polícia e ao Judiciário, onde o baixo efetivo, seja de agentes, servidores, juízes e promotores, não comportam a demanda volumosa de procedimentos e processos que a cada dia se acumulam nas delegacias e tribunais. Cumpre ressaltar que esses processos e procedimentos não são apenas relativos à Lei, pois a ausência ou carência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher faz com que a ofendida busque seus direitos e sua proteção em diversos órgãos do Judiciário, e, consequentemente, dificulte seu acesso à justiça, seja por causa da demora, custos, eventuais decisões contraditórias proferidas por magistrados envolvidos nas causas criminais e cíveis, acarretando, portanto, na morosidade da concessão da medida protetiva requerida. Além disso, outro impedimento à efetividade das medidas protetivas está na ausência de mecanismos necessários à concretização dessas medidas, ou seja, faltam instrumentos que possibilitem o acompanhamento efetivo do acusado, impedindo-o de aproximar-se de sua vítima, resultando, assim, no impedimento de novos delitos contra a ofendida. Conclui-se que a Lei 11.340/2006 é eficaz e competente, contudo a sua não aplicabilidade de maneira adequada acarreta em impunidade, gerando na sociedade a percepção de que a Lei é ineficaz. Trata-se de entraves à sua execução que precisam ser superados.
O dispositivo penal, considerou tanto a aplicação de penalidades ao agente violador, quanto a sua conscientização, tratando do assunto “violência doméstica” como um problema da sociedade, a ser debatido nos cenários de maior alcance de público, para que haja uma polarização de ideias e de autoproteção. Pois mesmo que os números não nos mostrem a erradicação das agressões, as vítimas possam saber os seus direitos, e que não tem mais que sofrer em silêncio. Importante ainda, é acreditar na mudança de pensamento que a nova geração está sendo criada, com respeito ao próximo e valorização dos valores, e a esperança na paz nos lares das famílias brasileiras.
REFERÊNCIAS
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DO AMAZONAS, 2017. Relatório mostra o perfil de mulheres agredidas. Disponível em: https://al-am.jusbrasil.com.br/noticias/272357/relatorio-mostra-o-perfil-de-mulheres-agredidas. Acesso em: 25/08/2020.
AANCIA. Violência doméstica no Brasil Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Viol%C3%AAncia_dom%C3%A9stica_no_Brasil#Incid%C3%. Acesso em: 25/1109/2020.
BRANDÃO, Poliane. Projeto com homens agressores reduz reincidência de violência doméstica em Montes Claros, 2019. Disponivel em: http://www.seguranca.mg.gov.br/component/gmg/story/3611-projeto-com-homens-agressores-reduz-reincidencia-de-violencia-domestica-em-montes-claros. Acesso em: 30/08/2020.
BERALDO, Lílian. Violência contra a mulher: maioria de casos é reincidente, 2018. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2018-08/maioria-de-casos-de-violencia-contra-mulher-e-reincidente. Acesso em: 30/08/2020;
BIANCHINI, Alice. Lei Maria da Penha. São Paulo – Editora: Saraiva, 2014.
BUENO, Samira e Lima, Sergio, 2019. DADOS DE VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER SÃO EVIDENCIA DA DESIGUALDADE DE GENÊRO NO BRASIL. Disponível em: https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2019/03/08/dados-de-violencia-contra-a-mulher-sao-a-evidencia-da-desigualdade-de-genero-no-brasil.ghtml. Acesso em: 25/08/2020.
BRASIL. Lei Maria da Penha. 2006. Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006 /Lei/L11340.htm>. Acesso em: 15/09/2020;
BIANCHINI, Alice. Violência doméstica e rompimento de vínculo afetivo – série novela fina estampa. Disponível em: http://atualidadesdodireito.com.br/alice bianchini/2011/11/29/violencia-domestica-e-rompimento-de-vinculo-afetivo-serie-novelafina-estampa/. Acesso em: 20/08/2020;
CNJ. Relatório do ano de 2010. Disponível em: http://www.cnj.jus.br/images/relatoriosanuais/cnj/relatorio_anual_cnj_2010.pdf. Acesso em: 05/09/2020.
COSTA, Ana Alice. Gênero, poder e empoderamento das mulheres. 2008. Disponível em: <https://pactoglobalcreapr.files.wordpress.com/2012/02/5- empoderamento-ana-alice.pdf>. Acesso em: 06/09/2020.
DIAS, Maria Berenice. A lei Maria da Penha na Justiça, São Paulo: Editora revistados Tribunais LTDA, 2007.
DIAS, Maria Berenice. Medidas protetivas mais protetoras. 2016. Disponível em: < http://www.mariaberenice.com.br/manager/arq/(cod2_13014)Medidas_protetivas_mais_protetoras.pdf >. Acesso em: 08/09/2020;
DINIZ, Normélia Maria Freire et al. Violência doméstica e institucional em serviços de saúde: experiências de mulheres. Rev. bras. enferm. [online]. 2004, vol.57, n.3.
DUARTE, M.C; FONSECA, R.M.G.S; SOUZA, V; PENA, E.D. Gênero e violência contra mulher na literatura de enfermagem: Uma revisão. Rev Bras Enferm. v. 68, n. 2, p. 325-332, 2015.
FRANCO, Luiza, Da BBC News Brasil. Violência contra a mulher: novos dados mostram que 'não há lugar seguro no Brasil. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47365503.Acesso em: 09/09/2020;
GALVÃO, Patrícia. Violência doméstica e familiar. Disponível em: https://dossies.agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/violencias/violencia-domestica-e-familiar-contra-as-mulheres/#por-que-e-tao-dificil-sair-de-uma-relacao-violenta. Acesso em: 03/09/2020.
LISBOA, Vinicius - Repórter da Agência Brasil Ipea: homicídios de mulheres cresceram acima da média nacional. 05/06/2019 - 13:26. Disponível em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2019-06/ipea-homicidios-de-mulheres-cresceram-acima-da-media-nacional. Acesso em: 10/09/2020.
MARTINS, Ana Paula Antunes; CERQUEIRA, Daniel; MATOS, Mariana Vieira Martins; A institucionalização das políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres no Brasil (versão preliminar), 2015, Brasília, IPEA.
Maria das Dores Guerreiro (organizadora) Joana Aguiar Patrício, Ana Rita Coelho e Sandra Palma Saleiro, 2015. Maria das Dores Guerreiro (org.), Joana Aguiar Patrício, Ana Rita Coelho e Sandra Palma Saleiro. Processos de Inclusão de Mulheres Vítimas de Violência Doméstica, primeira edição: março de 2015.
MINISTÉRIO DA SAÚDE (BR), Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes: norma técnica. 2ª ed. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2005.
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais comentadas. Ed. 5°. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2012.
NEGRÃO, Télia. Nós e Rupturas da Rede de Apoio às Mulheres. In Violência, Gênero e Políticas Públicas. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004.
O perfil da mulher agredida: a que quer se libertar, 2017. Disponível em: https://www.causaoperaria.org.br/acervo/blog/2017/09/29/o-perfil-da-mulher-agredida-1/#.XeQHjHvJ3IU. Acesso em: 11/09/2020;
WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2015: Homicídio de mulheres no Brasil. 1ª Ed. Brasília, 2015. Disponível em: https://www.mapadaviolencia.org.br/ pdf2015/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf. Acesso em 12/09/2020;
World Health Organization. Violence agains women: a priority health issue. Genebra:WHO; 1997. Disponível em: <http://www.who.int/violence_injury_prevention/media/ en/154.pdf > Acesso em 13/09/2020.
PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional. 10ª Ed. Rev. Atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
PASSINATO, Wânia. Oito Anos de Lei Maria da Penha. Entre Avanços, Obstáculos e Desafios. Florianópolis: Copyright, 2015. Disponível em: < http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/dossie/fontes/wania-pasinato/ >. Acesso em: 15/09/2020;
[1]Graduado em Direito pelo CEULM/ULBRA (2007). Tem experiência na advocacia e também na docência. Graduado, também, em Teologia - Seminário Concórdia IELB (1984), com especialização em Teologia Prática: Educação Popular - EST- IECLB (2004).
Graduanda em Direito no Centro Universitário Luterano de Manaus (ULBRA)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, RAQUEL DIAS DE. Análise literária sobre a violência doméstica contra a mulher Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 mar 2021, 04:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56281/anlise-literria-sobre-a-violncia-domstica-contra-a-mulher. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
Precisa estar logado para fazer comentários.