Os conselheiros de uma companhia são, em tese, independentes e devem votar sempre de acordo com sua convicção, preservando os interesses da empresa e da sociedade.
Mas, se esta afirmação parece um truísmo quando analisada sob o enfoque das boas práticas de governança, fato é que a Lei de Sociedades Anônimas é bastante vacilante sobre o tema, ao determinar, de um lado, que administrador deve exercer suas atribuições decorrentes da lei e do estatuto com a finalidade de lograr os fins e o interesse da empresa, preservados o bem público e a função social (Art. 154 da LSA) e de outro, determinar que o conselheiro deve sempre votar conforme deliberado pelos titulares de ações ordinárias, na forma do acordo de acionistas (Art. 118 §8 da LSA)
A discussão é bastante interessante, sobretudo considerando o feixe de responsabilidades que as decisões dos administradores podem gerar, para a sociedade e para eles próprios. Outrossim, há que se considerar que os administradores no direito brasileiro não são mandatários, mas órgãos da sociedade e, portanto, tem poderes e deveres decorrentes da lei e não de um mandato.
CONSELHEIRO – VOTO – ACIONISTAS
É provável que, na maior parte das decisões ordinariamente tomadas, a vontade do conselheiro não colida com a vontade dos acionistas reunidos em acordo de voto. Porém, pode haver casos em que o administrador discorde da deliberação do acordo de acionistas, por exemplo, por entender que ela é contrária aos interesses da companhia.
A resposta para tal problema acabou criando ao menos 3 respostas doutrinárias diferentes.
Parte da doutrina entende que a leitura do Art. 118 deve ser literal. Ou seja, o administrador deve sempre seguir a deliberação tomada com base no Acordo de Acionistas. Isto porque os acionistas também têm a obrigação de agir de conformidade com o interesse da companhia e respondem por abusos no direito de voto.
Logo, se o acionista, em tese, sempre age conforme o interesse da companhia, não cabe ao administrador questionar tal direcionamento. Eventuais abusos têm previsão legal de punição (o acionista é responsável pelo voto que profere) e devem nessa instância resolvidos, e não pelo administrador.
Estruturou-se também uma corrente no sentido de que o administrador deve sim seguir a deliberação do acordo de acionistas, porém desde que ela não seja ilegal ou contrária aos interesses da companhia. Essa corrente se diferencia da primeira ao reconhecer que os acionistas podem sim ter interesses contrários à companhia e que cabe ao administrador desconsiderar as deliberações do bloco quando isso ocorrer, votando de modo diverso. Essa inclusive é a corrente mais adotada pela CVM.
A terceira e última corrente, por outro lado, discorda das anteriores por entender que o administrador é independente e, portanto, não deve vincular-se as deliberações dos acordos de acionistas. Essa é, na prática, a menos utilizada das correntes doutrinárias, embora seja tida pelos defensores da governança corporativa como a que melhor preserva os interesses sociais da companhia.
Em nossa leitura, embora a questão seja bastante complexa, a teoria que melhor preserva a razão de existir do board (como elemento essencial da companhia) é aquele que outorga aos conselheiros plena independência dos acionistas, pois se assim não fosse, bastaria que os acionistas controlassem a companhia diretamente. O board deve servir de filtro para preservar os interesses da companhia, inclusive contra os acionistas, dependendo do caso, é por isso sua independência é fundamental.
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