JANAÍNA GUIMARÃES MANSILHA
(orientadora)
RESUMO: A assistência judiciária gratuita é considerada uma conquista da cidadania, pois garante ao cidadão que não poderia arcar com custas processuais, uma forma de acessar a justiça e pleitear seus direitos. O objetivo deste trabalho foi analisar as modificações trazidas pela reforma trabalhista a partir da Lei nº 13.467/2017, no tocante a gratuidade de justiça e acesso do cidadão hipossuficiente a justiça integral. A metodologia utilizada neste trabalho foi a exploratória, com consulta à legislação brasileira, doutrinas, coleta de dados em artigos, dissertações e revisões bibliográficas em meio eletrônico. O ordenamento jurídico brasileiro sempre previu a gratuidade da justiça, porém, seu acesso efetivo vai além da excisão de obstáculos que impeçam o exercício da jurisdição, como custos processuais, taxas, honorários advocatícios, periciais e outros itens que se cobrados impediriam o cidadão ingressar na justiça sem comprometer seu sustento e ou de sua família. Apesar das mudanças trazidas com a nova redação estenderem o benefício da justiça gratuita às pessoas jurídicas naturais que comprovem sua hipossuficiência, ela tem representado um gravame ao acesso à justiça. Principalmente quando se refere a necessidade do pagamento de honorários periciais e advocatícios da parte que sucumbir ao processo mesmo que esta seja beneficiária da justiça gratuita.
Palavras-chave: Direito do trabalhador. CLT. Acesso gratuito à justiça.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO 1 GRATUIDADE DE JUSTIÇA. 2 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA E O BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA. 2.1 Assistência Jurídica Gratuita No Direito Brasileiro E Na Justiça Do Trabalho. 3 MUDANÇAS NO ACESSO À JUSTIÇA GRATUITA APÓS A REFORMA TRABALHISTA. 4 ANÁLISE JURISPRUDENCIAL. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS. 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.
INTRODUÇÃO
O Direito do Trabalho está vinculado às necessidades do trabalhador e se constituí como ferramenta importante na resolução de conflitos entre empregados e empregadores.
A Reforma Trabalhista, regulamentada pela Lei n.13.467/2017 ocasionou profundas alterações na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), principalmente no que tange ao direito processual do trabalho e controles constitucionais. Essas alterações violam os princípios contidos no art. 5° da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) referentes a assistência judiciária gratuita à população carente, bem como conflitam com a legislação trazida pelo novo CPC.
A partir desta constatação e da existência de diversos questionamentos em função da nova redação da CLT, este estudo tem como objetivo discutir a gratuidade da justiça, após a Reforma trabalhista, suas mudanças e principalmente os impactos sobre esse instituto que podem apresentar-se como barreira ao acesso à Justiça por parte dos trabalhadores.
Ao longo da evolução da sociedade é normal que todos os indivíduos não convivam de modo pacífico, ou que se sintam lesados diante de alguma situação, ocasionando situações conflituosas. Nestes casos, o Estado, deve garantir que o direito seja aplicado em conformidade com ordenamento jurídico e, o acesso à gratuidade é uma das formas que permite ao cidadão economicamente insuficiente pleitear os seus direitos junto à justiça. As mudanças advindas com a Reforma Trabalhista podem dificultar a efetivação deste acesso e, são esses questionamentos, tão relevantes para manutenção do direito do trabalhador que são discutidos nesse trabalho.
Para o alcance dos objetivos, foi aplicado o método da pesquisa exploratória por intermédio da consulta à legislação brasileira, doutrinas, coleta de dados em artigos, dissertações e revisões bibliográficas em meio eletrônico relacionados ao tema.
Inicialmente são detalhados o ordenamento jurídico de gratuidade à justiça no direito brasileiro e na justiça do trabalho e os contornos de assistência judiciária gratuita e o benefício da justiça gratuita. Num segundo momento, delimita-se as mudanças estabelecidas pós reforma trabalhista no tocante a isenção de custos sobre despesas processuais relacionadas a honorários periciais e advocatícios, departamento recursal. Por fim, serão discutidos os impactos da nova legislação vigente ao acesso à justiça integral e gratuita à parte que apresente hipossuficiência econômica.
Todo governo democrático tem como um de seus desafios assegurar o acesso à Justiça por toda a população. Nesse sentido, ao longo da evolução da sociedade diversos métodos foram desenvolvidos para garantir tal direito, a exemplo do benefício da gratuidade, que favoreceu principalmente a parte mais carente.
O acesso à justiça se firma como uma forma de participação aos bens e serviços de uma sociedade (SADEK, 2009). O ordenamento jurídico brasileiro sempre previu a gratuidade da Justiça, e anteriormente a forma de resolver os conflitos era fundamentada na autotutela, em que as partes atuavam na responsabilidade de cumprir o Direito, e ao Estado cabia a função de interferir nos conflitos dos cidadãos, regular e aplicar a doutrina (LÖBLEIN, 2019).
Pode-se entender que primeira onda renovatória ocorreu em virtude da concessão da assistência judiciária gratuita e pela positivação expressa de tal garantia no ordenamento jurídico, por meio da Lei nº 1.060/50 (PERINAZZO, 2019).
Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CF/88) o benefício da gratuidade de justiça passou a ser assegurado a partir do art. 5º, inc. LXXIV, tendo o Estado o dever em oferecer auxílio judicial gratuito ao enquadrados como hipossuficientes, com ausência de recursos para subsidiar seu processo, de modo a não lesar o provento de sua família.
Ainda sobre o acesso à justiça, Sadek (2009, p.170) ressalta:
Quaisquer iniciativas que tenham por meta o combate à exclusão estarão fadadas ao fracasso se não levarem em conta garantias e direitos individuais e coletivos. Pois, não há possibilidade real de inclusão se, de fato, não houver condições efetivas de acesso à justiça. Sem o direito de recorrer à justiça, todos os demais direitos são letras mortas, garantias idealizadas e sem possibilidades de concretização.
É importante reforçar a força que a promulgação da Constituição Federal nesse quesito efetivou a fundação das Defensoria Públicas e conferiu ao Ministério Público responsabilidades (PERINAZZO, 2019).
Deste modo, o Estado deve assumir mais que administrar a justiça, editar e controlar a aplicação das leis, deve ter como obrigação prover assistência judiciária gratuita a fim de que todo cidadão, mesmo o mais humilde possa acessar ao Poder Judiciário, exercendo o direito de ação e defesa (GAIA, 2019).
2 ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA E O BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA
Apesar dos termos existência da assistência judiciaria gratuita e justiça gratuita parecer sinônimos, não são.
A assistência judiciária, pressupõe o direito de a parte ser amparada gratuitamente em juízo, sendo o Estado seu prestador. Se, caso este serviço não estiver em funcionamento, o Estado deverá mantê-lo, sendo de responsabilidade da Ordem dos Advogados por suas seções estaduais, ou subseções municipais a indicação (BRASIL, 1950).
O exercício da assistência judiciária é oferecido por intermédio da Defensoria Pública instalada no âmbito dos entes federativos, ou por ação de advogados nomeados pelo órgão judicial (GAIA, 2019). Para sua exigibilidade não há necessidade de deferimento do juiz, ou de processo em tramitação (COUCEIRO, 2019).
A assistência jurídica, foi estabelecida na emenda constitucional nº 1/69, que foi ampliada a partir da Carta Magna de 1988 para uma assistência jurídica integral e gratuita. Além da indicação gratuita de profissional que represente administrativamente e judicialmente a parte hipossuficiente econômica, a assistência jurídica gratuita abrange à isenção de custas, emolumentos, atos notariais, informações e consultas e demais despesas processuais, que a parte arcaria no decorrer da tramitação dos processos (COUCEIRO, 2019; GAIA, 2019).
Na esfera da justiça do trabalho, a assistência judiciária gratuita foi instituída pela Lei n. 5.584 de 1970, que assegura a prestação do serviço pelo sindicato da categoria profissional a qual fazer parte o trabalhador, sendo ele hipossuficiente econômico ou quando as custas coloquem em prejuízo o seu sustento ou de sua família. Deste modo, a responsabilidade em representar em juízo, o trabalhador passa ser da categoria que o defende (GASPAR, 2018).
Em resumo, a assistência judiciária gratuita assegura gratuidade aos serviços prestados por um advogado, podendo ser indicado pela Defensoria Pública, sindicato ou categoria a qual pertence, ou designado pelo Estado-juiz.
O termo gratuidade da justiça, foi mencionado inicialmente no Código de Processo Civil de 1939 e se caracteriza pela de despesas processuais que estariam acarretados a parte interessada para promover a ação judicial ou o requerimento administrativo (GAIA, 2019). Contudo, para sua concessão há necessidade de requerimento da parte e o deferimento por um juiz, conforme atendimento das condições estabelecidas em Lei (COUCEIRO, 2019).
2.1 Assistência Jurídica Gratuita No Direito Brasileiro E Na Justiça Do Trabalho Antes Da Lei N°13.467/2017
A assistência judiciária gratuita está presente no Brasil desde os tempos em que o Brasil era colônia, pela ação das Ordenações Manuelinas, e posteriormente até 1916, pelas Ordenações Filipinas, que garantiam ao cidadão hipossuficiente a isenção em arcar com os custos processuais (RODRIGUES JUNIOR, 2018).
O livro III, título LXXXIV, item 1, das Ordenações Filipinas trazia a seguinte redação:
E sendo o aggravante tão pobre, que jure que não tem bens móveis, nem de raiz; nem por onde pague o agravo, e dizendo na audiência huma vez o Pater noster pola alma delRey Dom Diniz, se-lhe-ha havido, como que pagasse os novecentos reis, com tanto que tire de tudo certidão dentro no tempo, em que havia de pagar o agravo. Ordenações Filipinas on-line. Disponível em: http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l3p695.htm
Contudo, tal concessão não representava uma consciência social e democrática para acesso ao direito por todos, mas estava pautada à princípios cristãos.
A gratuidade de justiça foi mencionada em uma Constituição apenas em 1934, no Capítulo que tratava dos direitos e das garantias individuais, com a seguinte redação: “art. 113 [...] 32) A União e os Estados concederão aos necessitados assistência judiciária, criando, para esse efeito, órgãos especiais e assegurando a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos”.
A Constituição promulgada em 1937 excluiu qualquer texto voltado a assistência judiciária, atribuindo a cada Estado-membro a aplicação do benefício a seu critério, mas acatando as delimitações existentes no Código de Processo Civil (PERINAZZO, 2019).
As lacunas constitucionais referentes a assistência judiciária gratuita foram preenchidas pela Lei nº 1.060/1950, que serviu como uma fonte padronizada e direta para facilitar o acesso à justiça. A Constituição Federal de 1988, regularizou o surgimento das defensorias públicas o que firmou e fortaleceu o acesso à proteção jurídica a população hipossuficiente.
Contudo, a aplicação da assistência judiciária gratuita foi modificada a partir do novo Código de Processo Civil (CPC) (Lei n. 13105/15), que estabeleceu no artigo 98 a quem se destina o direito, e quais as condições para o deferimento da gratuidade da justiça:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios, tem direito à gratuidade de justiça, na forma da lei.
Deste modo, o direito à gratuidade de justiça passou a ser outorgado para pessoas naturais e também jurídicas (se estas provarem sua vulnerabilidade econômica para deferimento do benefício) além de pessoas estrangeiras que não precisam obrigatoriamente comprovar residência no país para usufruir do benefício.
Em relação as despesas processuais que são abrangidas pela gratuidade da justiça qual a redação diz do novo CPC inclui:
[...] I - as taxas ou as custas judiciais;
III - as despesas com publicação na imprensa oficial, dispensando-se a publicação em outros meios;
IV - a indenização devida à testemunha que, quando empregada, receberá do empregador salário integral, como se em serviço estivesse;
V - as despesas com a realização de exame de código genético - DNA e de outros exames considerados essenciais;
VI - os honorários do advogado e do perito e a remuneração do intérprete ou do tradutor nomeado para apresentação de versão em português de documento redigido em língua estrangeira;
VII - o custo com a elaboração de memória de cálculo, quando exigida para instauração da execução;
VIII - os depósitos previstos em lei para interposição de recurso, para propositura de ação e para a prática de outros atos processuais inerentes ao exercício da ampla defesa e do contraditório;
IX - os emolumentos devidos a notários ou registradores em decorrência da prática de registro, averbação ou qualquer outro ato notarial necessário à efetivação de decisão judicial ou à continuidade de processo judicial no qual o benefício tenha sido concedido. (BRASIL. Art. 98, § 1º, Lei n. 13105/15).
Deste modo, o CPC passou definir critérios sobre os encargos do Estado com o beneficiário, como passou a citar quais as formas de aplicação em virtude dos diferentes atos processuais e dos meios probatórios em Direito que seriam acolhidos. Assim, de forma subsidiária e supletiva as mudanças do CPC, passou a regulamentar também sobre o processo do trabalho.
No tocante ao direito do trabalho, a Lei nº 5.584, de 1970 regulamentou que além da isenção de custas e despesas fosse incluído na assistência jurídica integral e gratuita no processo do trabalho, o amparo prestado pelo sindicato da categoria, que deveria indicar ou recrutar um advogado, cuja a remuneração pelos honorários assistenciais seria determinada por juiz. Caso a parte não fosse sindicalizada, mas contribuísse compulsoriamente para sustentação da entidade, a assistência jurídica deveria ser prestada pelo sindicato da categoria, inclusive se as partes demandassem por intermédio de advogado particular. Caso houvesse ausência do profissional indicado pelo sindicato, de forma complementar, caberia a atuação da Defensoria Pública e de escritórios modelo ligados a estabelecimentos de ensino superior jurídico (MOLINA, 2019).
A partir de 2002, com a promulgação da Lei n° 10.537, e a alteração do art. 789 da CLT, novas diretrizes estabeleceram que:
§ 1o As custas serão pagas pelo vencido, após o trânsito em julgado da decisão. No caso de recurso, as custas serão pagas e comprovado o recolhimento dentro do prazo recursal. § 2o Não sendo líquida a condenação, o juízo arbitrar-lhe-á o valor e fixará o montante das custas processuais. § 3o Sempre que houver acordo, se de outra forma não for convencionado, o pagamento das custas caberá em partes iguais aos litigantes. § 4o Nos dissídios coletivos, as partes vencidas responderão solidariamente pelo pagamento das custas, calculadas sobre o valor arbitrado na decisão, ou pelo Presidente do Tribunal." (BRASIL, Art. 789, Lei no 10.537/2002).
O acesso à gratuidade de justiça, antes da reforma, era mencionado no § 3° do artigo 790 da Consolidação Das Leis Do Trabalho (CLT). A redação assegurava ao trabalhador esse benefício se o mesmo tivesse rendimento igual ou inferior a 2 (dois) salários-mínimos, ou caso não apresentasse condições financeiras para arcar com as custas processuais, sem que isso representasse detrimento do seu sustento, como também o de sua família. Com a alteração do texto da reforma em 2017, o § 3° do artigo 790 foi revogado.
O art. 790 da mesma norma, facultou aos juízes a concessão, a requerimento ou de ofício, da gratuidade da justiça, incluindo tal benefício a traslados e instrumentos, às pessoas com rendimento salarial igual ou inferior ao dobro do mínimo legal, ou que declarassem não possuir condições de pagar as custas, sem causar prejuízo do sustento próprio ou da família.
3 MUDANÇAS NO ACESSO À JUSTIÇA GRATUITA APÓS A REFORMA TRABALHISTA
O acesso efetivo à justiça vai além da excisão de obstáculos que impeçam o exercício da jurisdição. Ele está relacionado ao acesso a outros mecanismos que por ventura dificultem a efetividade da tutela jurisdicional, a exemplo de custos processuais, honorários advocatícios e periciais e outros itens que impossibilitariam ao cidadão sem recursos financeiros o ingresso na justiça ou manutenção de um processo já iniciado (GUIMARÃES, 2018).
Com a promulgação da Lei nº 13.467/2017 instalou-se novo regime, no tocante ao benefício da gratuidade à justiça trabalhista, que passou a utilizar como regra para estabelecimento da condição de hipossuficiência econômica, um teto, com salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) regime geral da previdência social.
A nova redação trabalhista, a partir do artigo 790-B trouxe também modificações quanto ao pagamento de honorários advocatícios e periciais. Segundo a exposição de motivos, essas alterações objetivam a redução do número de demandas trabalhistas, muitas vezes representadas por ações manifestadamente infundadas, que acabam por onerar a União com o pagamento por honorários periciais desnecessários (GAIA, 2019).
Em relação aos honorários periciais, as alterações na CLT regem que a responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão do objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita, conforme artigo 790-B:
Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.
§ 1º. Ao fixar o valor dos honorários periciais, o juízo deverá respeitar o limite máximo estabelecido pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho.
§ 2º. O juízo poderá deferir parcelamento dos honorários periciais.
§ 3º. O juízo não poderá exigir adiantamento de valores para realizar perícias.
§ 4º. Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro processo, a União responderá pelo encargo.
Deste modo, ainda que beneficiado pela Justiça gratuita, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais, caso seja sucumbente na pretensão objeto da perícia não está extinguida. A União arcará com o encargo apenas em casos cujo beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em juízo créditos suficientes para custear a despesa referentes aos honorários.
No tocante aos honorários advocatícios, o artigo 791-A, § 4º, da CLT, traz a possibilidade da suspensão da necessidade de remuneração dos honorários do advogado da parte contrária, caso o sucumbente apresente hipossuficiência de recursos:
Vencido o beneficiário da justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais obrigações do beneficiário. (BRASIL, Art. 791-A, Lei no 13.467/2017).
Mesmo que a parte vencida, total ou parcialmente tenha o benefício da gratuidade de justiça, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários advocatícios sucumbenciais persiste. Se a parte não possuir créditos que suportem esse custo, seja no mesmo processo ou em outro, a obrigatoriedade do pagamento dos honorários advocatícios será suspensa e somente será executada se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão, o credor evidenciar que deixou a condição de hipossuficiência de recursos. Após dois anos, a obrigatoriedade se extingue (GAIA, 2019).
Tratando da gratuidade de traslados e os instrumentos, a nova CLT manteve o que já dizia a redação anterior.
O momento da concessão da justiça se dá com base no § 3° do artigo 790:
§ 3° É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017).
Vale ressaltar que CPC, em seu artigo 98, § 1º, elencam, num sentido mais amplo outros itens que são aplicáveis ao acesso à justiça e da assistência jurídica integral, como os honorários do intérprete, às despesas de postagem, de imprensa, de indenização a testemunhas, as taxas ou custas judiciais, tradutor e contador, os emolumentos etc. Em resumo, isenta todas as despesas processuais ou extrajudiciais que se relacionem ao curso da ação (MOLINA, 2019).
O direito fundamental é amplo, e por isso em determinadas circunstâncias, podem ocorrer divergências de interpretação quanto a constitucionalidade da nova redação trazida pela Reforma Trabalhista, a exemplo das que definiram a questão da justiça gratuita.
As disposições normativas do CPC atuam como fonte subsidiária para regulamentação deste importante benefício. A partir desta premissa, alguns pontos trazidos pelos dois dispositivos merecem atenção especial, e são eles: a gratuidade da justiça referente ao depósito recursal e, quanto ao pagamento dos honorários do perito e dos advogados, conhecidos como honorários sucumbenciais.
Antes da reforma, apenas os empregados, autores da ação, usufruíam dos benefícios da gratuidade de justiça, e deste modo, não se discutia à dispensa do recolhimento do depósito recursal (MOLINA, 2019). Após a aprovação da reforma, passou a ser admitido também esse benefício aos empregadores pessoas naturais, se comprovassem enquadramento para obtenção de tal mérito. Com essa mudança, surgiu o questionamento sobre a legalidade da abrangência do benefício em sede recursal, até mesmo, no tocante ao depósito recursal prévio (PERINAZZO, 2019). A interpretação do Tribunal Superior do Trabalho versa que o depósito recursal não possui natureza jurídica de taxa judiciária, e sim de pressuposto processual objetivo. Deste modo, requisita-se seu recolhimento, mesmo aos empregadores beneficiários da gratuidade (MOLINA, 2019).
Contudo, o CPC expressa que a gratuidade de justiça compreende os depósitos previstos em lei para a interposição de recursos, referentes a realização da ampla defesa e do contraditório (BRASIL, 2015). Deste modo, o benefício da justiça gratuita está disponível como custeio provisório do processo, isentando ingressante da antecipação das despesas. Porém, isso não significa, que caso condenado, após o transitado e julgado, se sucumbente não deva arcar com os custos processuais, sendo cobrado mediante o desconto do seu crédito obtido, na mesma ação ou em outras.
As mudanças na legislação trabalhista versam sobre a responsabilidade da parte sucumbente, mesmo que beneficiária da gratuidade de justiça, arcar com pagamento dos honorários periciais e ao direito do advogado em receber os honorários advocatícios de sucumbência que podem variar de 5% a 15% (GAIA, 2019).
Em relação ao custeio de honorários de advogados e peritos, a divergência entre o CPC e a CLT prejudicam aquele que ingressar na justiça do trabalho, pois mesmo que beneficiário da justiça gratuita, a parte sucumbente deve arcar com o ônus ter sua solicitação não atendida e com os custos dos honorários de peritos (Art. 790-B) e advogados (Art. 791- A).
Severo e Maior (2017, p.86) expõem que:
O § 4° desse mesmo dispositivo, quando menciona que o beneficiário da justiça gratuita terá as obrigações decorrentes de sua sucumbência “sob condição suspensiva de exigibilidade”, durante dois anos, nos quais o credor poderá provar que “deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade”, estabelece uma contradição que não poderá ser resolvida senão pela inaplicabilidade dessa disposição legal. É que a gratuidade se dá em razão da situação do trabalhador no momento em que demanda. E se ela abrange, inclusive sobre a exegese do CPC – que, repita-se, nem sequer tem por princípio a proteção a quem trabalha –, todas as despesas do processo, não há como sustentar tal condição suspensiva sem negar, por via oblíqua, a gratuidade. O mesmo ocorre em relação à suposta autorização, contida nesse mesmo dispositivo, para compensação com créditos obtidos em juízo, “ainda que em outro processo”. Novamente aqui, a disposição legal esbarra nas disposições do artigo 1.707 do Código Civil e no artigo 100 da Constituição.
Em 2018, o Tribunal Regional do Trabalho da 19ª Região (TRT/AL) emitiu decisão pela inconstitucionalidade do § 4º do art. 791-A, pois considerou que o pagamento de honorários sucumbenciais viola as a prerrogativa fundamental de assistência jurídica integral e gratuita, além dos princípios da igualdade e dignidade da pessoa humana. Tal decisão se apoia no art. 5º, inciso LXXIV, da Constituição Federal que garante como dever do Estado a prestação de assistência jurídica integral e gratuita aos cidadãos que comprovarem a hipossuficiência econômica (ALMEIDA, 2020).
Em março de 2020, o Ministro José Roberto Pimenta, da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho confirmou o direito ao benefício da assistência judiciária gratuita a bancário do Banco do Brasil, que declarou não possuir condições financeiras de arcar com as despesas do processo. O Relator observou que, em consonância com a jurisprudência do TST (com redação adaptada ao novo CPC, Súmula 463), a declaração de hipossuficiência financeira apresentada pelo declarante ou seu advogado é o bastante para configurar a condição econômica. O Ministro enfatizou que:
a alteração da CLT sobre a matéria não é incompatível com a do CPC e que as duas normas podem e devem ser aplicadas conjuntamente, e, portanto, que a comprovação a que se refere o parágrafo 4º do artigo 790 da CLT pode ser feita mediante declaração de miserabilidade da parte (Tribunal Superior do Trabalho, 2020).
Nesse sentido, outras decisões foram favoráveis ao trabalhador no tocante ao benefício da gratuidade de justiça, aplicando conjuntamente as redações do CPC e da CLT, uma vez que, a análise somente do parágrafo 4º do artigo 790 da CLT resultaria num retrocesso social, obstando o acesso do trabalhador ao Poder Judiciário. Em decisão de 04 de agosto de 2020 referente ao processo Nº TST-ARE-1002229-50.2017.5.02.0385, o Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, relatou que o empregado não possuía como arcar com as custas do processo, sem prejudicar o sustento próprio ou de sua família, uma vez que, estas totalizavam R$ 4.361,73 e sua remuneração mensal era de R$ 3.400,00. Deste modo, foi concedido ao requerente o benefício da justiça gratuita, com base no artigo 4º da Lei 1.060/1950, que “estabelecia como requisito para a concessão da gratuidade da justiça apenas a afirmação da parte nesse sentido na petição inicial”. De acordo com Relator, a declaração do requerente e o último salário indicado, admitem o pressuposto da veracidade em relação a declaração de miserabilidade.
Percebe-se que até a aplicação do §3º do artigo 790 conforme estabelece a CLT, e pelo posicionamento jurídico dos Tribunais que os condicionam, espera-se que haverá ainda muitos demanda, controvérsia até sua efetiva aplicação.
Nesse estudo é detalhado o instituto da gratuidade de justiça e o seu benefício é a primeira forma de garantir o acesso à justiça ao cidadão que comprovar sua hipossuficiência econômica, direito garantido pela Constituição da República, expresso no inciso LXXIV do artigo 5º.
O acesso à justiça constitui-se como direito básico do cidadão, pois serve como ferramenta para garantir o acesso aos demais direitos. Nesse aspecto, sua preservação é fundamental em um Estado democrático, que visa fornecer igualdade entre os seus, e, portanto, deve ser levado às instâncias máximas e não negligenciado.
As mudanças trazidas pela nova reforma trabalhista foram responsáveis pela queda do número de processos instaurados em primeira instância da Justiça do Trabalho. Do mais, conflitam com dispositivos trazidos na Carta Magna, mencionados no Art. 5° de que a assistência judiciária gratuita deve ser integral, bem como a redação do artigo 98, §1° do CPC, que descreve a abrangência da assistência judiciária gratuita, dentre eles os custos com “os honorários do advogado e do perito”, percebe-se ainda que os Tribunais vem se posicionando de forma contrária a Reforma Trabalhista como reza a CLT, pois a mesma não pode ser aplicada isoladamente, devendo haver uma sistemática com as demais normas da própria CLT, da Constituição da República e do CPC, pois entendem que as reclamações feita a Justiça do Trabalho não pode ter uma condição menos favorável daquelas postuladas na Justiça Comum, pois afronta o princípio da isonomia .
A assistência judiciária gratuita se concretiza como uma grande conquista da cidadania, sendo importante ressaltar que se uma norma causa perda de direitos ao trabalhador beneficiário da assistência judiciária gratuita, e contrarie uma norma geral e os preceitos contidos no CPC, reduzindo o nível de cidadania já assegurado, ela passa a não proteger como deveria, e, portanto, não deve ser aplicada.
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Bacharelanda do Curso de Direito da Universidade Brasil
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DIOGO, DIANA CALEGARI SILVA. Gratuidade da justiça após a reforma trabalhista Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 abr 2021, 04:23. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56406/gratuidade-da-justia-aps-a-reforma-trabalhista. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Maria D'Ajuda Pereira dos Santos
Por: Amanda Suellen de Oliveira
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