RESUMO: Este trabalho de conclusão do curso de Direito teve como objetivo analisar a aplicabilidade da prescrição nos diferentes contextos da ação de ressarcimento ao erário, com base na Legislação, Jurisprudência de Tribunais Superiores e Doutrina. Tendo em atenção os objetivos propostos para este estudo, optou-se por realizar uma investigação no âmbito do Supremo Tribunal Federal (STF) e na legislação de caráter nacional, bem como na doutrina especializada. Procedeu-se à uma análise do entendimento atual, a qual fora puramente técnica, por meio dos citados meios de análise. Os resultados do estudo trazem a perspectiva de que a prescrição nas ações de ressarcimento ao erário deve ser regra, e tal entendimento será abordado nas hipóteses em que essa ação é decorrente de ilícitos civis e de decisões de tribunais de contas. Entretanto, tal regra pode ser relativizada no ordenamento jurídico brasileiro, como no caso a ser demonstrado da referida ação quando proveniente de condenação em improbidade administrativa.
Palavras-chave: Princípios. Prescrição. Pretensão e Ação. Ressarcimento ao Erário.
1. INTRODUÇÃO
Diante do passar dos séculos, notadamente com o surgimento do direito pretoriano, o direito iniciou um processo de se tornar mais humanizado e liberal, como meio de se adequar à nova realidade social em que se encontrava.
Com a chegada do sistema democrático ao direito brasileiro vieram inúmeros benefícios, bem como uma infinidade de normas e interpretações jurídicas. Atualmente, é unânime o entendimento de que o Estado e as normas devem trabalhar para o bem estar das pessoas, atuando e especificando seus direitos, obrigações e deveres.
A importância das normas é verificada na medida em que se coadunam com os princípios presentes no ordenamento jurídico brasileiro, dos quais se destacam, dentre outros, a segurança jurídica e o bem estar social.
Ocorre que, muitas controvérsias permeiam os institutos que buscam justamente garantir e solidificar a segurança, tanto jurídica, quanto social.
O objetivo do presente estudo é exatamente de clarear e demonstrar, ainda que de forma breve, a importância de um instrumento que detém o objetivo de gerar segurança e bem estar à sociedade: a prescrição. Tal instrumento, que materializa a frase icônica “o direito não socorre aos que dormem”, quando aplicado à ação de ressarcimento ao erário, tem gerado significativa controvérsia.
A fim de embasamento, realizou-se pesquisa doutrinária, bem como análise dos julgados provenientes do Supremo Tribunal Federal, sendo o trabalho estruturado em três capítulos, trazendo no primeiro um estudo acerca da prescrição, com breve histórico e objetivos do referido instituto e examinando seus fundamentos.
No segundo capítulo, será estudada a imprescritibilidade aplicada à ação de ressarcimento ao erário decorrente de ato de improbidade administrativa e os seus pressupostos, que tem trazido entendimento a ser esmiuçado.
Por fim, no terceiro capítulo serão analisados casos no qual foi adotado entendimento oposto, nos casos de prescrição da ação de ressarcimento ao erário decorrente de outros ilícitos civis (com exceção da ação de improbidade) e decorrente de decisão de tribunais de contas, estando presente em todos os capítulos o estudo e a citação de legislações, decisões de tribunais e entendimentos doutrinários. Divide-se em dois tópicos distintos em virtude da diferença de entendimento, notadamente pela necessidade de análise do aspecto subjetivo por parte do Poder Judiciário.
2. BREVE HISTÓRICO E OBJETIVOS DO INSTITUTO DA PRESCRIÇÃO
O instituto da prescrição, proveniente da expressão latina “praescriptio” que significa “um escrito posto antes”, trouxe solução à uma das problemáticas que seriam inerentes ao exercício do direito de ação: a perseguição eterna.
O Estado de Direito, na antiguidade, era fortemente calcado na insegurança jurídica uma vez que, a qualquer tempo e de forma vitalícia, as relações jurídicas poderiam ser contraditadas, comprometendo a pacificação social. Em verdade, no antigo direito civil, as ações extinguiam-se tão somente pelo modo inverso a qual nasceram, ou seja, por meio da satisfação da questão demandada ou sua improcedência.
De fato, é direito do autor a satisfação de seus direitos. Ocorre que surge uma grande problemática no momento que é impossível ou excessivamente oneroso ao demandado cumprir a referida obrigação, trazendo à realidade deste indivíduo a cobrança e um desgaste emocional que perduraria o resto de sua vida.
Além disso, a insegurança social e jurídica gerada é latente, uma vez que seria possível um indivíduo, aos seus oitenta anos de idade, ser cobrado por uma conta de restaurante que esqueceu de pagar quando jovem. Das situações trazidas, surgiram questionamentos: deve-se de fato haver a privação do direito ao esquecimento, notadamente de situações que não se pode reverter? É razoável que um homem, ao fim da vida, esteja preocupado com situações que ocorreram há décadas?
Diante dessa problemática, no Direito Romano surgia um novo instrumento que visava combater tais situações de exagero: a prescrição. Nessa época a prescrição passou a ser arguida como meio de exceção (um contradireito que permite ao réu impugnar a pretensão do autor).
A prescrição é causa extintiva da pretensão, a qual, em um primeiro momento, depende da prestação voluntária de outrem. Não se desimcunbindo do seu ônus o sujeito passivo, caberá a respectiva ação para pleitear a satisfação dessa pretensão, independentemente de sua vontade.
Conforme se observa, a ação surge após a pretensão não ser cumprida voluntariamente e, apesar de ser instituto presente no direito privado, a prescrição é considerada matéria de ordem pública, podendo ser reconhecida de ofício pelo magistrado, nos termos do art. 921, § 5º.
Por sua vez, a ação é o meio pelo qual é exercida em juízo a pretensão, ou seja, é a persecução pelo direito subjetivo trazido ao juízo. Em um primeiro momento a pretensão existe, viabilizando a ação, porém o credor escolhe não exercer no período adequado. Surge para o devedor a opção de argüir uma denominada “prejudicial de mérito”, com o fito de neutralizar a pretensão do credor.
Ocorre, dessa forma, a “perda do poder de se exigir judicialmente o reconhecimento ou a satisfação de um direito, ainda que existente, em razão do decurso do tempo fixado em lei” (MARCATO, 2005. p. 620). Ressalte-se que, em que pese haja o fim da pretensão, diante de sua inexigibilidade, esse direito continua existindo, não podendo o credor exercê-lo.
No Brasil, a regra no ordenamento jurídico é, de fato, a prescritibilidade, fazendo parte importante da estrutura do Estado de Direito. Justamente por isso, via de regra as pretensões devem ser exercidas dentro de um marco temporal limitado.
Há, no entanto, algumas exceções explícitas no texto constitucional, nas quais se reconhece a imprescritibilidade em determinadas situações. É o caso, por exemplo, dos crimes de racismo (art. 5º, XLII, CF/88) e da ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático (art. 5º, XLIV).
Além dessas exceções as quais o poder constituinte originário trouxe de forma clara e direta, há uma hipótese com previsão no art. 37 § 5º, a qual trata especificamente da prescrição na ação de ressarcimento ao erário nos casos de improbidade administrativa.
3. PRESCRIÇÃO NA AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DECORRENTE DE ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA
Nos termos do art. 23 da Lei nº 8.429/92, o prazo prescricional para propositura de ações de improbidade administrativa é de 5 anos. No que tange à ação de ressarcimento, entretanto, a parte final do art. 37 da CF/88 traz entendimento que confrontaria a tese geral da prescritibilidade, in verbis:
Art. 37 (...) § 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível. § 5º A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.
Em que pese haja tal previsão constitucional no § 5º do art. 37, muitos se insurgiram em face da tese da imprescritibilidade. Argumentavam que a intenção do Poder Constituinte não foi a de fixar a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário.
De acordo com essa tese, a adequada interpretação dos §§ 4º e 5º do art. 37 deveria ser a seguinte: o constituinte deu um comando ao legislador infraconstitucional: faça uma lei prevendo atos de improbidade administrativa (§ 4º); as sanções para os atos de improbidade são a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário (§ 4º); a lei deverá prever prazos prescricionais para a imposição dessas sanções (§ 5º).
Assim, enquanto não houver lei prevendo quais são os atos de improbidade administrativa, não poderão ser ajuizadas ações de improbidade administrativa pedindo a aplicação das sanções previstas no § 4º; ficam ressalvadas dessa proibição as ações de ressarcimento (parte final do § 5º), ou seja, mesmo sem lei expressa, as ações de ressarcimento já poderiam ser propostas.
Dessa forma, para essa tese, o que a parte final do § 5º quis dizer foi unicamente que, mesmo sem Lei de Improbidade Administrativa, poderiam ser ajuizadas ações pedindo o ressarcimento ao erário. Isso porque o § 5º deve ser interpretado em conjunto com o § 4º.
Como reforço a esse argumento, alegaram que a Lei de Improbidade somente foi editada em 1992 (Lei nº 8.429/92). Logo, o objetivo do constituinte foi o de evitar que se alegasse que o ressarcimento ao erário somente poderia ser exigido com a edição de lei.
Por fim, argumentavam que a Constituição Federal, quando quis, determinou a imprescritibilidade de forma expressa (como já citado anteriormente). Ex: art. 5º, XLII (racismo) e XLIV (ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático).
Tal controvérsia fora analisada pelo Supremo Tribunal Federal em 2019 (RE 852475/SP). Nas palavras do Min. Alexandre de Moraes, um dos adeptos dessa tese:
A preocupação do legislador constituinte foi legítima, pois, em virtude da exigência do § 4º de edição de lei específica para a definição dos “atos de improbidade administrativa”, bem como da forma e gradação da aplicação das sanções de suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, poderiam surgir dúvidas sobre a recepção do ordenamento jurídico que, desde a década de 1940, permitia ações de ressarcimento no caso de improbidade administrativa, apesar da inexistência de conceituação e de tipificação específica dos denominados “atos de improbidade administrativa.
Em outras palavras, com a promulgação da Constituição Federal de 1988, que ampliou a possibilidade de sanções por atos de improbidade administrativa, e em respeito aos princípios da reserva legal e da anterioridade, passou-se a exigir a edição de lei específica para tipificar as condutas correspondentes a atos de improbidade administrativa.
Nesse momento, houve o justo receio do legislador constituinte quanto à ocorrência de interpretações que passassem a impossibilitar ações de ressarcimento ao erário pela prática de atos ilícitos tradicionalmente entendidos como improbidade administrativa, desde a década de 1940, mas ainda não tipificados pela nova legislação, que somente foi editada em 1992.
A ressalva prevista no § 5º do art. 37 da CF não pretendeu estabelecer uma exceção implícita de imprescritibilidade, mas obrigar constitucionalmente a recepção das normas legais definidoras dos instrumentos processuais e dos prazos prescricionais para as ações de ressarcimento do erário, inclusive referentes a condutas ímprobas, mesmo antes da tipificação legal de elementares do denominado “ato de improbidade” (Decreto 20.910/1932, Lei 3.164/1957, Lei 3.502/1958, Lei 4.717/1965, Lei 7.347/1985, Decreto-Lei 2.300/1986); mantendo, dessa maneira, até a edição da futura lei e para todos os atos pretéritos, a ampla possibilidade de ajuizamentos de ações de ressarcimento.
Portanto, a ressalva do § 5º do art. 37 teria permitido a recepção dos prazos prescricionais existentes para as ações de ressarcimento decorrentes de graves condutas de enriquecimento ilícito, por influência ou com abuso de cargo ou função pública pela legislação então em vigor, até que fosse editada a lei específica exigida pelo §4º do mesmo artigo; não tendo, portanto, estabelecido qualquer hipótese implícita de imprescritibilidade.
Ocorre que, tal entendimento não fora acatado pelo STF, havendo decidido a maioria pela imprescritibilidade, fazendo uma “exigência” a mais que não está explícita no art. 37, § 5º da CF/88. O Supremo afirmou que somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento envolvendo atos de improbidade administrativa praticados dolosamente.
Assim, se o ato de improbidade administrativa causou prejuízo ao erário, mas foi praticado com culpa, então, neste caso, a ação de ressarcimento será prescritível e deverá ser proposta no prazo do art. 23 da LIA. Há previsão legal da prática de ato de improbidade que causa lesão ao erário na modalidade culposa, in verbis:
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:
I - facilitar ou concorrer por qualquer forma para a incorporação ao patrimônio particular, de pessoa física ou jurídica, de bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei; II - permitir ou concorrer para que pessoa física ou jurídica privada utilize bens, rendas, verbas ou valores integrantes do acervo patrimonial das entidades mencionadas no art. 1º desta lei, sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie; (...)
Cabe citar que o placar da votação foi de 6 x 5 em favor da tese da imprescritibilidade da ação de ressarcimento decorrente de atos praticados com dolo. Votaram pela prescritibilidade os ministros: Alexandre de Moraes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio.
Votaram a favor da tese vencedora, por outro lado, os ministros: Edson Fachin, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Celso de Mello, Luiz Fux, Roberto Barroso.
Cita-se, ainda, uma peculiaridade que está no fato de que os Ministros Luiz Fux e Roberto Barroso inicialmente votaram em favor da prescritibilidade. Ocorre que, uma semana depois, revisaram o posicionamento e alteraram o entendimento, votando em favor da tese da imprescritibilidade.
4. PRESCRIÇÃO NA AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO DECORRENTE DE OUTROS ILÍCITOS CIVIS E DECORRENTE DE DECISÃO DE TRIBUNAIS DE CONTAS
Por outro lado, se fosse realizada uma interpretação ampla da ressalva final contida no § 5º, faria com que toda e qualquer ação de ressarcimento movida pela Fazenda Pública fosse imprescritível, o que seria desproporcional. O entedimento vigente é de que § 5º do art. 37 da CF/88 deve ser lido em conjunto com o § 4º, de forma que ele se refere apenas aos casos de improbidade administrativa.
Isso decorre da premissa que a prescrição é um instituto importante para se garantir a segurança e estabilidade das relações jurídicas, sendo uma forma de se assegurar a ordem e a paz na sociedade. Desse modo, a ressalva contida na parte final do § 5º do art. 37 da CF/88 deve ser interpretada de forma estrita, não se aplicando para danos causados ao Poder Público por força de ilícitos civis. Foi como decidiu o STF anteriormente, em 2016:
É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil. Dito de outro modo, se o Poder Público sofreu um dano ao erário decorrente de um ilícito civil e deseja ser ressarcido, ele deverá ajuizar a ação no prazo prescricional previsto em lei.” STF. Plenário. RE 669069/MG, Rel. Min. Teori Zavascki, julgado em 03/02/2016 (repercussão geral).
No que tange à (im)prescritibilidade das referidas ações baseadas em decisão de Tribunais de Contas, entendeu o STF que seriam prescritíveis. Segundo o relator do recurso, ministro Alexandre de Moraes, o STF concluiu, no julgamento do RE 636886, com repercussão geral (tema 897, 2020), que somente são imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário com base na prática de ato de improbidade administrativa doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992). Cabe citar que a referida decisão ainda não transitou em julgado, tendo sido opostos embargos declaratórios.
No caso sob análise, o relator disse que não ocorreu a imprescritibilidade, pois as decisões dos tribunais de contas que resultem imputação de débito ou multa têm eficácia de título executivo. Assim, é prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário baseada nessas decisões, uma vez que a Corte de Contas, em momento algum, analisa a existência ou não de ato doloso de improbidade administrativa.
Além disso, não há decisão judicial caracterizando a existência de ato ilícito doloso, inexistindo contraditório e ampla defesa plenos, pois não é possível ao acusado defender-se no sentido da ausência de elemento subjetivo (dolo ou culpa). Entretanto, nada impede que, com base nas decisões das Cortes de Contas, seja ajuizada uma ação civil de improbidade administrativa para se verificar a presença de dolo na suposta conduta ímproba (hipótese na qual a pretensão de ressarcimento seria imprescritível).
De acordo com o referido ministro, no caso, deve ser aplicado o disposto no artigo 174 do Código Tributário Nacional (CTN), que fixa em cinco anos o prazo para a cobrança do crédito fiscal e para a declaração da prescrição intercorrente. No RE, a União alegava que a decisão do TCU configurava ofensa ao artigo 37, parágrafo 5º, da Constituição Federal, porque não se aplica a decretação de prescrição de ofício às execuções de título extrajudicial propostas com base em acórdão do Tribunal de Contas que mostram, em última análise, a existência do dever de ressarcimento ao erário. O Plenário desproveu o recurso, mantendo a extinção do processo pelo reconhecimento da prescrição. Foi fixada a seguinte tese de repercussão geral: “É prescritível a pretensão de ressarcimento ao erário fundada em decisão de Tribunal de Contas”.
O julgamento se deu por unanimidade, o entendimento se deu, em sessão virtual, no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 636886, com repercussão geral reconhecida (tema 899).
No caso concreto, Vanda Maria Menezes Barbosa, ex-presidente da Associação Cultural Zumbi, em Alagoas, deixou de prestar contas de recursos recebidos do Ministério da Cultura para aplicação no projeto Educar Quilombo.
Por isso, o Tribunal de Contas da União (TCU) ordenou a restituição aos cofres públicos dos valores recebidos.
Com a não quitação do débito, a União propôs a execução de título executivo extrajudicial.
O juízo de 1º grau reconheceu a ocorrência de prescrição e extinguiu o processo.
O Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) manteve a decisão, ocasião na qual houve a interposição do Recurso Extraordinário ainda não transitado em julgado, mas já com o citado entendimento amplamente divulgado.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A compreensão do significado e das problemáticas que circundam o tema prescrição é de suma importância para qualquer profissional da área do direito, tanto por ser questão presente em todos os ramos do direito, quanto por ser instituto de entendimento dificultado pelo antigo regramento civil do ordenamento brasileiro (CC/1916).
A prescritibilidade é uma realidade contemporânea e deve ser aplicada pelo ordenamento jurídico brasileiro, sendo fundamental para que haja estabilidade, segurança jurídica e direito ao esquecimento. Deve-se considerar a existência deste paradigma como regra, para que haja uma limitação ao abuso de um direito do credor.
Especificamente tratando do Estado, este presta serviço público e, portanto, tem como objetivo o interesse público, não o seu interesse público, mas sim o interesse público do administrado. O escopo da administração a partir da CRFB de 1988 é trazer para o cidadão um serviço público eficiente, apto a trazer benefícios, celeridade, moralidade, impessoalidade, entre tantos outros princípios previstos na constituição, os quais se coadunam com a prescrição, devendo perseguir estes objetivos dentro da razoabilidade.
Importante ressaltar, ademais, o aspecto histórico à época do Direito Romano, que retirou o caráter perpétuo das ações para a possibilidade de prescrição, sendo adaptadas às reais necessidades daquela realidade e do que veio a ser o direito contemporâneo. A ausência da referida perpetuidade legitima o entendimento esboçado neste artigo no que tange aos ilícitos civis e às decisões de tribunais de contas.
Por outro lado, a existência da "perpetuidade" no que tange à ação de ressarcimento proveniente de condenação em improbidade administrativa não acarreta no entendimento de que a regra tenha sido desrespeitada, sendo a compatibilidade de entendimentos diversos em casos excepcionais fortalecida a partir do voto do Ministro Luis Roberto Barroso – forte defensor da regra da prescritibilidade – no sentido da imprescritibilidade no citado caso da ação de improbidade administrativa, uma vez defende que num Estado Democrático de Direito a ordem jurídica gravita em torno de dois valores essenciais: a segurança e a justiça, sendo a prescrição um dos mecanismos fundamentais para concretizar a segurança jurídica.
O ordenamento jurídico vive, em verdade, um modelo de prescrição calcado com razoável experimentação, cujos efeitos são efetivamente desconhecidos. Ante a imprescindibilidade do instituto, é possível enxergar a modificação do instituto com olhos desanimados, mas é necessário considerar a situação presente em cada nova interpretação dada ao fenômeno, para que haja um equilíbrio entre a ideia de satisfação do credor e o direito do prescribente, bem como que não sejam sacrificados os princípios constitucionais e a função social do direito.
Concluindo, o objetivo do presente trabalho foi o de subsidiar a compreensão do instituto prescricional sob à luz da ação de ressarcimento ao erário, tão incompreendido no mundo processual. Por isso, foi demonstrado o surgimento, a fundamentação e o posicionamento dos tribunais, para que houvesse plena distinção e compreensão do cenário jurídico-social contemporâneo.
REFERÊNCIAS
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Advogado e Servidor Público. Universidade Tiradentes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Emanuel Messias Barboza Moura. A (im)prescritibilidade da ação de ressarcimento ao erário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 maio 2021, 04:44. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56451/a-im-prescritibilidade-da-ao-de-ressarcimento-ao-errio. Acesso em: 23 dez 2024.
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