(orientadora)
RESUMO: O presente artigo aborda o Instituto do Poder Familiar previsto em nosso ordenamento jurídico, e como ocorre a destituição deste Poder. Será analisado o seu conceito, os direitos, as responsabilidades dos pais, e as hipóteses de extinção, de suspensão ou da perda do Poder Familiar por meio de uma revisão de literatura. Serão abordados também os critérios analisados pelo Judiciário ao aplicar tal medida. Entende-se que tal situação apenas poderá ocorrer quando o pai, a mãe ou ambos cometerem algum ato no exercício do poder familiar que viole os direitos dos filhos e cause prejuízo a essa criança ou adolescente. Verificada a necessidade de proteção e o melhor interesse da criança, o juiz poderá, por meio de sentença, destituir os pais (ou apenas um deles) do exercício do poder familiar, de acordo com os princípios do melhor interesse da criança e da proteção integral previstos em lei, cumprindo desta a função social que compete ao Estado, preservando a infância e juventude de crianças e adolescentes vulneráveis.
Palavras-chave: ECA. Destituição do Poder Familiar. Código Civil Brasileiro.
ABSTRACT: This article addresses the Institute of Family Power provided for in our legal system, and how this power is removed. Their concept, rights, parents' responsibilities, and the chances of extinction, suspension or loss of family power will be analyzed through a literature review. The criteria analyzed by the Judiciary when applying such a measure will also be addressed. It is understood that such a situation can only occur when the father, mother or both commit an act in the exercise of family power that violates the rights of the children and causes harm to that child or adolescent. Once the child's need for protection and best interest is verified, the judge may, by way of sentence, remove the parents (or only one of them) from exercising family power, in accordance with the principles of the child's best interest and full protection. provided for by law, fulfilling the social function that belongs to the State, preserving the childhood and youth of vulnerable children and adolescentes.
Key words: ECA. Dismissal of Family Power. Brazilian Civil Code.
O presente artigo se deu por meio à revisão de literatura acerca da destituição do poder familiar. O instituto da guarda, decorrente da separação dos pais representa uma das mais delicadas situações na vida forense. Neste artigo serão tratadas a evolução da família, o conceito de “família constitucionalizada” e o fato desse instituto gerar direito e obrigações para os pais perante os filhos menores.
Inicialmente, serão abordados alguns aspectos sobre a origem e evolução da destituição do poder familiar e do pai biológico, frente ao ordenamento jurídico brasileiro e ao Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Entende-se também que a figura do pai social, suas atribuições à luz do novo ordenamento jurídico, os cuidados que deve ter com as crianças e adolescentes e os direitos que a lei lhe atribui também deverão ser abordados.
Em nossa sociedade, um pai deve responsabilizar-se pelas necessidades básicas para o desenvolvimento saudável de seu(s) filho(s) quanto aos aspectos físicos, emocionais e psicológicos. Assim, o presente artigo tratará, das implicações geradas ao pai biológico e também ao padrasto, e como o filho será afetado com o afastamento de um e a permanência definitiva do outro.
A entidade familiar é uma das instituições mais antigas da humanidade que, por muito tempo, ocupou papel central no âmago de uma sociedade patriarcal em que o chefe da família tinha o dever de garantir o sustento e a união de seus entes. Com o passar dos anos, essa instituição sofreu várias e importantes modificações, e assim, passou a valorizar e incluir, no seu conceito, as “relações afetivas”. A partir disso, ocorreu a descentralização do poder familiar, que era somente exercido pelo chefe de família (pai) e passou a ser exercido tanto pelo pai como pela mãe, ampliando, e consequentemente o conceito da expressão “família” passou a significar: “o conjunto de pessoas ligadas, tanto consanguineamente, quanto por relações afetivas que se amparam de várias outras formas como física, psicológica e financeiramente” (DINIZ, 2002).
Entende-se que família é uma instituição diferenciada e única, e é indispensável a participação e presença constante de todos os seus membros para o desenvolvimento dos filhos decorrentes da união estabelecida entre os pais, de acordo com o art. 226 § 5 DA Constituição Federal (BRASIL, 1988). Quando essas responsabilidades não são divididas igualmente entre o pai e a mãe, há o desequilíbrio que pode desencadear o abandono dos filhos, sendo muitas vezes, necessária a intervenção do Estado, ou, no caso de abandono apenas por um dos genitores, pelo próprio cônjuge ou interessado no desenvolvimento da criança envolvida.
A substituição do pai biológico por alguém que assume seu papel se dá pela chamada paternidade sócio afetiva. Pode-se entender paternidade sócio afetiva como aquela que se baseia em sentimento de afeto e interesse por pessoa que não tem ligação consanguínea como o filho de criação ou adotivo, mas que age como pai biológico no que se refere ao apoio no desenvolvimento saudável e sólido.
Como medida de proteção da criança, no caso de quem não cumpre com os deveres pertinentes a educação e a criação da mesma, existe a possibilidade da destituição do poder familiar. Tal medida deve ser amparada tanto pelos pais como pelo Estado. Quando ocorre a destituição do poder familiar, em virtude de abandono do filho pelo pai, devemos lembrar que surge o importante debate sobre possibilidade jurídica de o padrasto, que goza de relação afetiva consolidada com a criança vir à pleitear perante a justiça a adoção definitiva do filho(a) de criação, juntamente com pedido preparatório de destituição do poder familiar em relação ao genitor (ATAÍDE JUNIOR, 2009).
3. FAMÍLIA CONSTITUCIONALIZADA
A Constituição Federal de 1988 introduz a Doutrina da Proteção Integral, eliminando o antigo Código de menores e orientando a edição do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990), o qual reafirma a existência do dever dos pais em relação aos filhos, baseado na igualdade entre pai e mãe, e aumentando a fiscalização do Estado. O poder familiar é considerado irrenunciável e intransferível, pois os pais não podem abrir mão desse poder. Trata-se de condição existencial entre pais e filhos; imprescritível, vez que dele não decai o genitor pelo simples fato de deixar de exercê-lo, somente podendo perder o exercício do poder familiar nos casos previstos na lei.
Os deveres dos pais são previstos na Constituição Federal de 1988, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Código Civil de 2002. É importante também mencionar, que o poder familiar existe independentemente do vínculo entre os pais, e se esses vierem a ter divergências, poderão recorrer à justiça.
De acordo com Ataíde Júnior (2009), o mérito de consagração dos avanços do poder familiar dá-se na Constituição Federal de 1988, vista como uma resposta social às necessidades dos indivíduos, impondo novos contornos axiológicos para o sistema jurídico, e assumindo a direção de matérias que antes eram exclusivas do Direito Civil e tratando sobre a família, a criança, o adolescente e o idoso.
A Lei 8.069, de 13 de julho de 1990, conhecida como “Estatuto da Criança e do Adolescente” inaugurou um novo paradigma no tratamento dado as crianças e adolescentes, o qual veio regulamentar os artigos 227 e 229 da Constituição Federal de 1988, conforme discorre Dias (2007):
“O ECA, acompanhando a evolução das relações familiares, mudou substancialmente o instituto. Deixou de ter um sentido de dominação para se tornar sinônimo de proteção, com mais características de deveres e obrigações dos pais para com os filhos do que de direitos em relação a eles”.
Diante disso, o Estatuto põe fim ao regime jurídico baseado na chamada “Doutrina da Situação Irregular”, para dar lugar aos postulados da “Doutrina da Proteção Integral”, possibilitando a esses, além da mudança de terminologia estereotipada, que passaram a ser sujeitos de direitos e não mais vistos como meros objetos. Posteriormente, o Código Civil de 2002, em seu capítulo V, engloba uma série de direitos e deveres nos artigos 1.630 a 1.638 e, apesar de conservar a disciplina e possuir basicamente as mesmas regras do Código anterior, adaptou-se aos princípios constitucionais, possibilitando a acomodação dos avanços já consolidados na Constituição Federal e no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Por fim, cumpre mencionar que a Lei 12.010/2009, a qual dispõe sobre a adoção, alterou a expressão “pátrio poder”, utilizada até então no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), substituindo-a por “poder familiar”, conforme segue:
“Art. 3º A expressão “pátrio poder” contida nos arts. 21, 23, 24, no parágrafo único do art. 36, no § 1º do art. 45, no art. 49, no inciso X do caput do art. 129, nas alíneas “b” e “d” do parágrafo único do art. 148, nos arts. 155, 157, 163, 166, 169, no inciso III do caput do art. 201 e no art. 249, todos da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, bem como na Seção II do Capítulo III do Título VI da Parte Especial do mesmo Diploma Legal, fica substituída pela expressão “poder familiar”.
Entende-se que o poder familiar se constitui em um conjunto de normas protetivas que procura fortalecer os laços de parentesco, desdobrando-se em direitos e deveres recíprocos. A autoridade parental deve ser um instrumento de garantia dos direitos fundamentais da criança e do adolescente, vez que serve para resguardar o melhor interesse desses, bem como primar pela promoção e desenvolvimento de sua personalidade (TEIXEIRA, 2009).
4. DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR
O objetivo do poder familiar é a proteção da criança e adolescente desde o nascimento até a maioridade. Segundo Dias (2010) o poder familiar é um dever dos pais o qual deve ser exercido sempre no interesse dos filhos, o Estado como guardião, deve fiscalizar se o exercício esta sendo realizado de acordo como preconiza a legislação. Caso reste demonstrada ocorrência de violação aos direitos relativos ao poder familiar o Estado deve intervir tomando as medidas necessárias para dar atendimento ao melhor interesse da criança/adolescente.
Nesse sentido, Carvalho (1995) traz uma justificativa para a intervenção do Estado, no que se refere a destituição do poder familiar ao dizer que:
“O exercício do pátrio poder é, antes de tudo, um compromisso assumido pelos pais para com a sociedade. A família, núcleo situado dentro de um todo meio, que é o grupo social, não esgota seus fins em si mesmo. O homem é preparado na família para ingressar na sociedade, e carregará para essa os valores assimilados naquela. É por isso que, se não houverem a contento no desempenho do múnus paterno, devem os pais prestar contas à sociedade, maior interessada nas peças que a compõem, eis a razão pela qual o pátrio poder está subordinado a regras e limites”.
A aplicação da destituição do poder familiar gera efeitos graves tanto na vida do filho quanto na vida dos pais, isto porque com a aplicação da medida, os pais perderão a autoridade e prerrogativas que tinham em relação aos filhos, havendo dessa forma a extinção do vinculo afetivo existente entre eles, por isso é que só possível a aplicação da destituição nos casos previstos em lei, e quando houver o melhor interesse da criança e adolescente.
Os casos em que a destituição pode ser aplicada são previstos nos artigos 24 e 1638 do ECA (BRASIL, 1990) e do Código Civil (BRASIL, 2002), respectivamente, podendo vir a ter natureza tanto sociais - cabendo ao estado sua parcela de responsabilidade pela situação do menor - quanto pessoais, quando estão ligados à conduta dos progenitores. O artigo 1635 do Código Civil determina a destituição do poder familiar só poderá ser aplicada por meio de uma decisão judicial:
Art. 1.635. Extingue-se o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; II - pela emancipação, nos termos do art. 5, parágrafo único; III - pela maioridade; IV - pela adoção; V - por decisão judicial, na forma do artigo 1.638.
Já o artigo 1638 do Código Civil vem regular as hipóteses em que o juiz poderá determinar através da decisão judicial, a destituição do poder familiar:
Art. 1.638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.
A primeira hipótese autorizadora da destituição do poder familiar é a situação de castigo imoderado do filho, ou seja, aquele que resulta em agressões e violência e afronta sua dignidade e integridade física e psicológica. Não possui, todavia, o rol do art. 1638, caráter taxativo, sendo previstas por nosso legislador no ECA outras hipóteses nas quais o Estado, representado neste caso pelo seu poder judiciário, pode interferir de maneira definitiva no exercício do poder familiar.
Passando então a analisar o inciso II do artigo 1638 do Código Civil (BRASIL, 2002), temos que poderá ser decretada a destituição do poder familiar quando os pais abandonarem os filhos. Nesse sentido, Comel (2003) descreve o conceito de abandono:
“Traduz-se o abandono na falta de cuidado e atenção, na incúria, ausência absoluta de carinho e amor. É o pai que tem desleixo para com a prole, que pouco se lhe importa a nutrição, faltando aos cuidados básicos e essenciais à própria sobrevivência, e mantendo o filho em estado de indigência”.
A destituição do poder familiar poderá ser aplicada quando os pais de alguma maneira abandonam os seus filhos, descumprindo seu dever de criação e proteção, deixando a criança ou adolescente em situação de desamparo. Este tipo abandono intelectual e moral ocorre nos casos em que mesmo possuindo condições para garantir o sustento e desenvolvimento do filho, o pai deixa-o à mercê da própria sorte.
Gonçalves (2009) relata que “[...] o lar é uma escola onde se forma a personalidade dos filhos. Sendo eles facilmente influenciáveis, devem os pais manter uma postura digna e honrada, para que nela se amolde o caráter daqueles”.
Segundo o art. 21 do ECA (BRASIL, 1990), o poder familiar será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência. Assim, a destituição do poder familiar é uma medida de proteção e prevista no ECA. Muitos profissionais veem a destituição como única e prioritária medida para solucionar as situações de risco, agindo para que:
“[...] as medidas de destituição e de extinção do pátrio poder, sejam tomadas em razão de apresentarem-se como os únicos caminhos possíveis para solucionar o que se percebe ou se avalia como necessidade de proteção prioritária a uma criança”. (FAVERO, 2001).
No entanto, tal perspectiva apresenta-se como um equívoco uma vez que o ECA (BRASIL, 1990) assegura em seu art. 101, outras medidas de proteção que se pautam na direção de restabelecer e restaurar os vínculos familiares, tais como orientação, apoio e acompanhamento temporários; matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento de ensino fundamental; inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos. Em último caso, o abrigamento em entidade e/ou colocação em família substituta. Deve-se buscar alternativas que garantam maior assistência aos pais e à família para que possam permanecerem com os filhos, suprindo seu desenvolvimento integral, todavia, se todas as alternativas forem insuficientes, a ação de destituição do poder familiar é um mecanismo que possibilitará um novo convívio familiar à criança e adolescente, que se encontram em risco em relação á sua família biológica.
Nenhuma medida deve ser tomada se a decisão não melhorar as condições de vida da criança, “portanto, a perda do pátrio poder acontece, na maioria dos casos, em momentos em que a criança já está integrada a outra família” (FÁVERO, 2001).
Em suma, é preciso entender que os fatores determinantes no processo de destituição envolvem um universo complexo, necessitam de uma análise crítica prévia da realidade e a tentativa de inclusão desta família numa rede de solidariedade para que vínculos familiares esgarçados possam ser restabelecidos.
5. A ADOÇÃO E SUAS CARACTERÍSTICAS
A legislação trata da adoção como uma das formas de extinção do poder familiar em que os pais adotivos passam a ocupar a posição dos pais naturais. A Constituição Federal, em seu artigo 227, § 6º (BRASIL, 1988), descreve que, os filhos possuídos, ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias referentes à filiação. Vale ressaltar que o ECA foi reformado através da Lei n° 12.010/2009, denominada de “Lei Nacional de Adoção”, que promoveu alterações em 54 artigos da Lei n° 8.069/90 e estabeleceu inúmeras outras inovações legislativas (DIGIÁCOMO, 2010).
A maioria dos artigos do Código Civil de 2002 que tratavam deste tema - adoção - foram revogados por esse nova Lei Nacional de Adoção.
Segundo Iamamoto (2006), a importância da criança e do adolescente quanto sujeito de direitos e a necessidade de ter a Política de Proteção surgiram a se consolidar na década de 90 com a promulgação da Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Nesta a criança e o adolescente deixam de ser analisados como objetos de intervenção social e jurídica e passam a ser reconhecidos como indivíduos em pleno desenvolvimento e absoluta primazia.
A lei 8.069/90 revolucionou o direito infanto-juvenil, inovando e adotando a doutrina da proteção integral. Essa visão é baseada nos direitos próprios e especiais das crianças e dos adolescentes, que, na condição peculiar de pessoas em desenvolvimento, necessitam de proteção diferenciada, especializada e integral (TJPS.AC 19.688-0,Rel. Lair Loureiro apud Liberati 2000, p. 13).
Do ponto de vista jurídico, segundo Cartilha da AMB, a adoção é um método legal que incide em transferir todos os direitos e deveres de pais biológicos para uma família substituta, entregando a crianças e o adolescente todos os direitos e deveres de filho, tal função deve ser deferida quando consistir em esgotados todos os recursos para que a convivência com a família original seja conservada.
O artigo 41, caput, do ECA (BRASIL, 1990), dispõe que “[...] a adoção atribui a condição de filho adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios desligando-os de qualquer vínculo com os pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”.
Na Lei 8.069/90, a criança e o adolescente passam a ser reconhecido como sujeito de direito, e a criança deixa de ser elemento de medidas judiciais, vistos como marginalizados, vítimas da omissão do Estado, na garantia dos direitos a cidadania, pela precarização das políticas sociais, que garantiriam os mínimos sociais para seu sustento e da sua família. O ECA reconhece o valor da preservação dos vínculos familiares e a integração em família substituta, assim como esgotado os recursos de manutenção na família de origem. De acordo com o Estatuto (BRASIL, 1990) em seu artigo 41:
“A adoção é medida excepcional, irrevogável e atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive os sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo impedimentos matrimoniais”.
Quanto aos que podem adotar e aos que a lei veda expressamente a adoção, dispõe o artigo 42 do ECA (BRASIL, 1990) que “podem adotar os maiores de 18 anos, independente do estado civil. [...] §1°- Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando”.
Veronese, Gouvêa e Silva (2005) preconizam sobre o juízo competente que “[...] para crianças, e adolescentes, de zero a dezoito anos de idade – processamento na vara da infância e juventude (art. 148, III, do ECA) (BRASIL, 1990); já para os maiores de dezoito anos, a vara competente é a da família”. Ainda, prevê o artigo 148 do ECA que “a Justiça da Infância da Juventude é competente para: [...] III – conhecer de pedidos de adoção e seus incidentes [...]”. Nessa linha, Ataíde Junior (2009) enfatiza:
“[...] A adoção como causa de extinção do poder familiar restringe-se a hipótese de adoção consensual (com consentimento dos pais), em procedimento de jurisdição voluntária, no qual o Juiz não precisa decretar a perda da autoridade parental para deferir a adoção. O poder familiar dos pais naturais, neste caso, simplesmente se extingue pela adoção deferida, que constitui um novo estado jurídico, com a criação do poder familiar para os pais adotivos. Os fatos extintivos independem, em regra, do pronunciamento do Poder Judiciário”.
De fato, se ocorre a adoção quando os pais já foram destituídos do poder familiar, a própria destituição extinguirá o poder familiar e não a adoção. Importante mencionar que a adoção deve ser considerada uma decisão concreta e objetiva, sendo uma medida tomada em último caso, uma vez que a família será a referência no desenvolvimento social desta criança ou adolescente.
Referente às necessidades do adotado, o princípio do melhor interesse é considerado primordial em relação aos demais princípios constitucionais, visto que, devem ser preservados os direitos das crianças e dos adolescentes, para que possam desfrutar de um desenvolvimento sadio e pleno, digno da pessoa humana e que possam ser atendidas suas necessidades básicas, sejam elas materiais, afetivas ou emocionais, prevalecendo os interesses dos infantes juvenis em relação aos adultos no seio familiar (LOBO, 2010).
É, portanto, um princípio bastante abrangente que possibilita ao aplicador da lei ao observar o melhor interesse da criança e do adolescente e preservar ao máximo a proteção jurídica daqueles que se encontra em situação de hipossuficiente merecendo uma proteção mais destacada do Estado. A aplicação desse princípio deverá ocorrer quando houver a possibilidade da criança ou adolescente permanecer em família substituta na qual já esteja construído um vínculo de afinidade e afetividade recíproco, não sendo necessária a habilitação no cadastro.
Por outro lado, existem defensores do cadastro de pretendentes à adoção que comprovam que a rigorosa observância desse cadastro é uma forma de garantir e materializar a doutrina da proteção integral e a primazia do melhor interesse da criança e do adolescente porque é possível analisar os pré-requisitos que serão indispensáveis para a habilitação, que por sua vez, apresenta várias etapas avaliativas por equipe Inter profissional a serviço da justiça da Infância e da Juventude e após a aprovação é que se habilitam ao cadastro.
É importante ressaltar que na maioria das vezes os problemas enfrentados pelas crianças e adolescentes não estão focados simplesmente nelas, devendo ser analisada as relações familiares. O Estatuto da Criança e do Adolescente também enfoca em seu texto a prioridade absoluta pela Lei n° 12.010/2009, que diz:
Art. 4 É dever da família, comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Com isso, verifica-se a necessidade de dar efetividade aos direitos das crianças e dos adolescentes, garantidos constitucionalmente, para que elas possam ter um desenvolvimento pleno e no futuro possam ser pessoas bem sucedidas. Também devem ter primazia no atendimento público, para que em primeiro lugar suas necessidades sejam supridas.
Na análise da evolução histórica do afeto, lembra-se que nem sempre o sentimento de afetividade esteve presente, especialmente nas relações familiares, uma vez que crianças e adolescentes em muitas ocasiões não eram considerados sujeitos de direito, tampouco lhes eram destinados amor e proteção afetiva.
A lei de adoção enfatiza a necessidade de afetividade, sendo que este princípio passa a ter um valor de destaque, devendo ser levado em consideração no contexto da adoção na atualidade. Por cautela, é preciso identificar como se deu o desligamento do poder familiar e o quanto foi traumático para a criança esse processo.
Nesta fase, os assistentes sociais utilizam a expressão “namoro”, conforme apresentada na obra de Lima (2011) para definir o primeiro período de convivência, sendo que desta pode existir o desejo que a criança tenha em voltar para o abrigo ou a dificuldade da mesma em adaptação na nova família.
Camargo (2006) também menciona como é importante que os pais que querem adotar, principalmente nos casos de adoção tardia, sejam preparados juntos com as crianças a serem adotadas: “o vínculo na adoção tardia se dá como uma via de mão dupla: a família adota a criança e a criança adota a família”.
O princípio da afetividade baseia-se na possibilidade das pessoas expressarem e receberem afeto, sendo que tal gesto não se manifesta de forma isolada, mas através de comportamentos variados e diversificados (olhares, declarações, gestos, etc.), em que um simples encorajamento ou uma acusação poderá ser suficiente para desestabilizar uma pessoa. Diante disso, é imprescindível o papel da família nos processos de desenvolvimento humano, compreendendo-se desenvolvimento como sendo todas as alterações que ocorrem no organismo e na personalidade dos indivíduos. Por fim, destaca-se que o princípio da afetividade especializa, no plano das relações familiares, o princípio da dignidade da pessoa humana, que por sua vez fundamente todas as relações jurídicas.
A adoção deve trazer reais vantagens para o adotado, exigência que se baseia no princípio do melhor interesse da criança e deve ser baseada em motivos legítimos, conforme exposto no art. 43 do ECA (BRASIL. 1990). A adoção deve ser efetivada mediante um processo judicial, que somente ocorre se tiver acompanhamento do Ministério Público, inclusive na adoção de maiores de dezoito anos. Granato (2010), acerca do procedimento relativo ao processo de adoção, afirma que:
“[...] pode-se extrair, das diversas posições esparsas na lei, que o procedimento será de jurisdição voluntária quando houver consentimento dos pais naturais ou estes já tiverem sido destituídos do poder familiar. Será contencioso quando os pais estiverem no exercício do poder familiar e não consentirem expressamente na adoção. Em sendo contencioso, o processo segue o rito ordinário do Código de Processo Civil”.
De acordo com as modificações introduzidas pela nova lei de adoção, pessoas interessadas em adotar devem se cadastrar previamente em juízo, ou seja, seus nomes constarão em uma lista de pretendentes em cada Comarca ou Foro Regional, e será elaborado um registro de crianças e adolescentes em condições de serem adotados, conforme expõe o art. 50 do ECA (BRASIL, 1990).
Para atingir o mister a que se propõe o referido artigo, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), através da Resolução 54/08, criou o Cadastro Nacional de Adoção, ferramenta de fundamental importância para dinamizar o processo de adoção no país. Não obstante seja obrigatório o prévio cadastramento do pretendente a adotar uma criança ou adolescente, o §13° do art. 50 do ECA (BRASIL, 1990) admite uma exceção a esta regra, no caso de quem detém a guarda legal de criança maior de três anos ou adolescentes, desde que o lapso de convivência demonstre que se estabeleceu um laço de afinidade e afetividade entre adotante e adotado, bem como não exista má-fé neste ato.
Outro requisito inerente à adoção se refere à obrigatoriedade do estágio de convivência entre adotante e adotado, que segundo Ribeiro, Santos e Souza (2010):
“[...] é o período no qual a convivência da adoção será avaliada pelo juiz e seus auxiliares, com base nas relações desenvolvidas cotidianamente entre adotante e adotado. Considerando a seriedade da medida e, ainda, que a adoção é irrevogável, o estágio de convivência visa à possibilidade de análise da adaptação da criança ou adolescente ao seu novo lar”.
A adoção por se tratar de uma mediante excepcional, que somente deve ser efetivada quando esgotados todos os recursos para a manutenção da criança ou do adolescente na família natural ou extensa, como dispõe o art. 39 §1° e segunda parte do ECA. Deve se revestir de caráter irrevogável, considerando a importância deste ato, principalmente para os adotados, que desta forma entram definitivamente na família do adotante. A irrevogabilidade desta decisão perdura, inclusive, com a morte do adotante, condição que não enseja o restabelecimento do poder familiar aos pais naturais, conforme previsão do art. 49, do ECA (BRASIL, 1990).
A maioria as famílias que recorrem à adoção expressam sua vontade de adotar uma criança que tenha as determinadas características: que sejam brancas, de preferência bebês, que não possuam irmãos ou não padeçam de alguma enfermidade, visto que essas informações foram retiradas de dados estatísticos da Corregedoria de Justiça do Estado de São Paulo, (Jornal do Advogado, 2005, p. 14).
Existem no Brasil, organizações não-governamentais formadas por pais adotivos, profissionais técnicos e voluntários, que oferecerem apoio às famílias candidatas à adoção. Conforme Leite (2005) preceitua, 71% dos pretendentes à adoção recorrem aos Grupos de Apoio à Adoção com o intuito de adotarem crianças entre 0 e 2 anos de idade, sendo que 25% desejam adotar crianças de até 5 anos de idade, restando 4% dos pretendentes à adoção como o grupo dos que adotariam uma criança maior de 5 anos de idade.
Ainda em relação aos dados estatísticos fornecidos pelo autor supracitado, após realizadas reuniões entre os candidatos à adoção e os membros dos Grupos de Apoio à Adoção, tais dados modificaram-se, sendo que, 65% dos candidatos à adoção demonstraram o desejo de adotar uma criança entre 0 e 2 anos de idade; 15% adotariam crianças entre 2 e 5 anos de idade, e 20% manifestaram-se sobre a possibilidade de adoção de maiores de 5 anos de idade como alternativa possível.
Ainda, ao que tange à adoção, tem-se a problemática da adoção inter-racial. Muitas famílias e candidatos à adoção, preferem criança de raça branca, em vez daquela que possui a raça parda ou negra. Leite (2005) ainda indica que 79% das famílias adotariam crianças brancas, 19% dos candidatos à adoção adotariam as pardas, e, tendo como menor índice à adoção de crianças negras, sendo esta, 2%.
Também deve-se levar em conta que há certa dificuldade na colocação de crianças e adolescentes que possuam irmãos na mesma situação de candidatos à colocação em família substituta, no caso, a adoção; ou seja: a família onde será inserida a criança a ser adotada, pretende adotar apenas uma criança e, caso essa possua irmão nas mesmas condições, pode ser preterida ou separada de seu irmão pela adoção. Apesar do perfil do suposto adotado mais procurado pelas famílias adotantes seja o de bebês com idade entre 0 à 2 anos e saudáveis mental e fisicamente, existem outros perfis de crianças que também merecem um lar digno, como afrodescendentes, adolescentes, grupos de irmãos e as crianças enfermas, porém, em nossa sociedade, tal realidade não favorece esses menores. Pode-se presumir que em nossa cultura, pais adotivos esperam pacientemente por recém nascidos que ofereçam possibilidade de omitir a verdade sobre a adoção.
A adoção é ato pessoal do adotante, já que a lei veda que esta seja realizada por procuração (art. 39, parágrafo único, do ECA) (BRASIL, 1990). Todas as pessoas quem tenham diferença de idade de 16 anos ou mais que o possível adotado, independente do estado civil, têm capacidade e legitimação para adotar. Algumas inovações foram trazidas referente à legitimidade para adotar, destacando-se entre elas a possibilidade de a pessoa casada ou com união estável, adotar o filho de seu consorte, ou companheiro, sem afetar o limite de parentesco e, portanto, o pátrio poder de seus ascendentes consanguíneos. Contudo, com o Estatuto da Criança e do Adolescente, o adotado passa a ostentar a condição de filho legítimo, desligando-se totalmente da família biológica, assumindo todos os direitos e deveres inerentes à filiação, como por exemplo, a obediência dos pais, o direito de participar na sucessão hereditária e os alimentos, entre outros (PICOLIN, 2007).
Conforme entendimento de Dias (2010), este tipo de adoção é possível quando os genitores do menor se divorciam, e com o advento de um novo relacionamento, o atual companheiro de um deles decide querer adotar o menor. Com a anuência de um deles, decai o poder familiar daquele que deixa de ser o pai (ou mãe) do menor. Entretanto, para que este caso ocorra, é necessário que o genitor aceite a adoção, genitor este que será destituído do poder familiar, não podendo mais reclamá-lo.
O adotando não pode ter pais no registro ou no exercício da autoridade parental. Exceção a esta regra é a adoção unilateral, prevista no artigo supracitado, quando o filho tem apenas um pai ou uma mãe registrado e o companheiro ou cônjuge deste pretende preencher o vazio no registro.
Caso não esteja nesta hipótese, os pais deverão ser desconhecidos ou então deverá haver o procedimento de destituição familiar dos genitores, para que assim a criança ou adolescente possa ter em seu registro o nome do padrasto ou madrasta.
6 PAI SOCIAL
A legislação que protege a criança e o adolescente indica a colocação destes em instituições de abrigo, de forma provisória e excepcional, somente quando se encontram em situação grave de risco à sua integridade física, psicológica e sexual. Nesse sentido, o abrigo é uma medida de proteção social, funcionando como instrumento de política social ao oferecer assistência à criança e ao adolescente que se encontram sem os meios necessários à sobrevivência (moradia, alimentação, atenção à saúde e educação), ou mesmo diante da incapacidade dos pais e/ou responsáveis para cumprir com as obrigações de guarda, sustento e cuidados dos filhos, por um tempo determinado ou de maneira definitiva (FUNDO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A INFÂNCIA, 2005; RIZZINI, RIZZINI, 2004; SILVA, 2004).
A realidade dos abrigos brasileiros demonstra que são instituições que em principio deveriam ter função temporária, mas acabam se tornando a moradia permanente de muitas crianças à espera do retorno ao meio familiar.
Siqueira e Dell’Aglio (2006) ressaltam que a instituição de abrigo, para as crianças e adolescentes, constitui-se na fonte de apoio social mais próxima e organizada, desempenhando um papel fundamental para o seu desenvolvimento. O mundo social das crianças e adolescentes abrigados expande-se ao incluírem os pares e os profissionais em sua convivência. As autoras afirmam que é necessário a instituição fornecer recursos para o enfrentamento de eventos negativos provenientes tanto das famílias dos abrigados quanto do mundo externo, além de modelos identificatórios positivos, segurança e proteção. No novo modelo de atendimento preconizado pelo ECA, a qualidade dos cuidados oferecidos pelas instituições passou a ser motivo de preocupação e intervenção, a fim de que o atendimento massificado e despersonalizado de outrora fosse gradativamente substituído.
Dessa forma, a composição das equipes de assistência à criança em situação de acolhimento foi reformulada, e sua importância foi reconhecida pela legislação vigente e políticas de desenvolvimento social. Os profissionais que se ocupam da rotina de cuidados diretos de crianças e adolescentes acolhidos tendem a se construir em um referencial de família, já que podem ser fonte de apoio, orientação e afeto.
Nesse sentido, Cassol e De Antoni (2006) consideram a instituição do acolhimento como um contexto onde de tenta produzir as relações parentais. O cuidador pode ainda ser considerado como mediador da atenção, cognição, linguagem e emoções da criança, aspectos fundamentais de seu desenvolvimento psicossocial. O afeto proveniente da relação dos cuidadores com os acolhidos, assim como as práticas educativas por eles exercidas, influenciarão tal processo de desenvolvimento. As relações humanas e a forma como o funcionário se vincula à criança ou adolescente, são fundamentais para avaliação da qualidade do funcionamento das instituições. Diante da necessidade desse vínculo, é que o Projeto de Lei n° 98/2009, foi aprovado, garantindo que homens possam cuidar de crianças e adolescentes em situação de abandono ou de risco social abrigadas em casas-lares.
Para isso, o interessado deve ter no mínimo 25 anos, sanidade física e mental, ensino fundamental completo e boa conduta social. Além disso, exige aprovação em treinamento específico para a função, com duração de 60 dias, bem como teste psicológico. O pai social deverá ainda se dedicar, exclusivamente, aos cuidados com as crianças e os adolescentes e à casa-lar onde deverá residir.
Ainda, o pai social tem direito ao piso de um salário mínimo, décimo terceiro salário, férias anuais remuneradas, assistência gratuita aos filhos de zero a cinco anos em creches e pré0escolas, licença paternidade, seguro-desemprego e contra acidentes de trabalho, e aposentadoria. Com fulcro no art. 5°, I, da CF, a Justiça do Trabalho tem aplicado a Lei n° 7.644/87 ao trabalhador masculino na condição de pai social:
Art 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
I – homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição [...].
As expectativas legais acerca dos pais sociais parecem sugerir que contribuam para a formação de um ambiente educativo, próximo ao familiar, em sua relação com as crianças e adolescentes. Dessa forma, os cuidadores podem deparar-se com conflitos em relação ao apego com a criança e o adolescente (MORÉ, SPERANCETTA, 2010).
De acordo com Oliveira e Milnitsky-Sapiro (2007), a transitoriedade e a permanência são realidades contraditórias, mas presentes nas instituições de abrigo. Concomitante ao trabalho que busca a reintegração da criança ao seio familiar, elas devem empreender esforços no sentido de propiciar um atendimento de qualidade, tendo em vista os casos em que o retorno à família de origem é inviável, e que esperam pela colocação em uma família substitua (SILVA, AQUINO, 2005).
7 O PAI BIOLÓGICO
Conhecida como a sanção mais grave, imposta aos pais que faltam com deveres em relação aos filhos, desviando-se ostensivamente da finalidade imposta a instituição, ocasionando a destituição de toda e qualquer prerrogativa com relação ao filho, esta adquire caráter personalíssimo, surtindo efeito somente àquele contra o qual a medida for decretada.
Segundo Comel (2003), a perda do poder familiar poderá ocorrer em qualquer situação de descumprimento injustificado dos deveres. Sua previsão legal encontra-se no art. 1.638 do CC, na qual as hipóteses previstas são consideradas exaustivas, não permitindo interpretação extensiva. O castigo imoderado à criança ou adolescente é previsto como causa, gerando polêmica principalmente no que tange a concepção da palavra imoderado. O pai que age de modo a castigar o filho imoderadamente demonstra não possuir condições pessoais de exercer a função a ele imposta, configurando a caracterização de crime de maus tratos nos termos do art. 136 do Código Penal (BRASIL, 1940). A prática de atos contrários à moral e aos bons costumes é aferida objetivamente, incluindo as condutas que o direito considera ilícitas, e considerada situação de perda do poder familiar. O genitor, sendo este educador do filho, deve servir de exemplo, agindo de forma honesta e retida, condição fundamental para a boa educação da prole.
Aquele que pratica atos ilegais, afrontando os bons costumes e a moral, não está apto para criar um filho, fornecendo-lhe tudo que deste é de direito, sendo considerado relevante motivo para a perda do poder familiar. O pai que comete reiteradas faltas que ensejam suspensão e modificação do poder familiar, também está sujeito a perda deste.
No entanto, para Dias (2010), não se pode subtrair a possibilidade do magistrado, ao analisar o caso, decidir pela exoneração por fatos que considere incompatíveis com o poder familiar, não se podendo falar em abuso de autoridade.
Enfim, a perda do poder familiar é considerada a sanção mais grave, na medida em que não admite reaver a titularidade e o exercício deste poder ao pai que o perdeu mediante ação de destituição do poder familiar. Em decorrência da gravidade deste instituto, analisa-se detalhadamente os aspectos ocorridos na ocasião e a medida mais adequada que deverá se imposta.
Cumpre ainda esclarecer que o consentimento dos pais poderá ser dispensado se forem desconhecidos ou forem destituídos do poder familiar, de acordo com o que prevê o art. 1.621, §1° do CC e art. 45 do ECA (BRASIL, 1990). Essa forma de dispensa deve ser analisada de forma cuidadosa pelo magistrado, tendo em costa que a sentença que defere a adoção tem como efeito a destituição do poder familiar dos pais biológicos.
O Código Civil inovou no consentimento dos pais biológicos para o processo de adoção, podendo este ser revogável até publicação da sentença constitutiva da adoção, podendo acarretar em insegurança aos pretendentes à adoção, mesmo que o julgador tenha possa analisar o melhor interesse da criança em detrimento do interesse dos adotantes. Entretanto, nos casos em que pais biológicos do adotado são desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar, dispensa-se tal autorização. A guarda constitui maneira mais simples de colocação da criança ou adolescente em família substituta, pois não suprime o poder familiar dos pais biológicos. Diferente da tutela, porquanto, esta implica em simples aceitação de um comando alheio ao sujeito, enquanto a guarda requer atitude proativa de quem à busca.
Com a adoção há o rompimento automático do vínculo de parentesco do adotado com a família de origem, salvo os impedimentos matrimonias. Os pais biológicos não possuem o direito de exigir notícias da criança ou do adolescente adotado. Preceitua o art. 1.626 do Código Civil (BRASIL, 2002) que “a adoção atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de qualquer vínculo com os pais e parentes consanguíneos, salvo quando aos impedimentos para o casamento”. A adoção enseja o desligamento definitivo do adotando com seus parentes naturais. Por meio desse instituto é atribuída a condição de filho ao adotando, equiparando-o ao filho consanguíneo, gerando vínculo com todos os parentes do adotante, inclusive no que concerne aos efeitos sucessórios.
Estabelece o art. 47 do ECA (BRASIL, 1990) que a sentença judicial que concede a adoção será inscrita no registro civil, isto é, há o cancelamento do registro de nascimento anterior e a constituição de um novo registro de nascimento, onde constará o nome dos novos pais e dos avós, não havendo qualquer referência sobre a origem da adoção. O legislador ao estabelecer tal procedimento, integra totalmente o menor na nova família, de modo que este possa esquecer o vínculo com os pais biológicos.
Com a adoção, o poder familiar dos pais biológicos é extinto, como determina o art. 1.635, IV, do CC. O adotado é equiparado aos filhos consanguíneos, adquire, pois, todos os direitos e deveres inerentes à condição de filho, ficando submetido ao poder familiar que passa a ser exercido pelo adotante, que terá competência para praticar todos os atos que envolvem o exercício do referido poder estabelecidos no art. 1.634 do CC. Nem mesmo em caso de morte do adotante o poder familiar dos pais naturais é restaurado, consequentemente o menor deverá ser posto sob tutela do art. 49 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
8 CONCLUSÃO
O poder familiar é um conjunto de direitos e deveres colocados ao alcance dos pais, para que esses exerçam as suas prerrogativas e busquem contribuir no desenvolvimento, na formação e na criação de seus filhos até que esses alcancem a maioridade. A justificativa para o então “poder familiar” é que uma criança não possui condições de se desenvolver e crescer sem um auxílio que lhe ajude na sua formação moral e material.
No entanto, a partir do momento em que os principais autores designados para a formação íntegra de seus filhos não estão cumprindo o seu papel, ou seja, colocam esses menores em situações de riscos físicos, de abandono moral e material, é dever do Estado intervir para proteger essas crianças e adolescentes. E é com a medida de destituição do poder familiar que o Estado poderá excluir os pais do exercício do poder familiar para garantir aos menores os direitos salvaguardados.
Pode-se concluir que a destituição do poder familiar constitui medida extrema, pois extingue laços entre pai(s) e filho(s). Entretanto, o objetivo não é utilizá-la como punição, pois esta medida visa preservar unicamente a proteção do melhor interesse da(s) criança(s) e do(s) adolescente(s) diante de situações externas que fogem ao seu controle e que muitas vezes podem lhes afetar física e/ou psicologicamente para o resto de suas vidas, cabendo ao Estado amparar e proteger esses menores em situação de vulnerabilidade e/ou perigo.
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[1] Docente mestre do curso de Direito – IESB Instituto de Ensino Superior de Bauru
Discente do curso de Direito – IESB Instituto de Ensino Superior de Bauru.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FLORIANO, Fatima Cristina. Destituição do poder familiar: revisão de literatura Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 maio 2021, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56512/destituio-do-poder-familiar-reviso-de-literatura. Acesso em: 23 dez 2024.
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