CHEILA CRISTINA DA SILVA
(orientadora)
RESUMO: Tendo em vista a importância do tema abandono afetivo, visa-se abordar e identificar os principais impactos que o abandono afetivo vem causar na vida de crianças e adolescentes. Busca-se abordar o tema como de relevância social e pública, uma vez que, a Constituição Federal dispõe de forma clara e objetiva que é dever da Família, da Sociedade e do Estado assistir a criança e adolescente, proporcionando o mínimo existencial de forma digna. É certa a necessidade de que sejam desenvolvidas políticas públicas como meio de prevenir, auxiliar, reparar, assistir não só a criança e ao adolescente, mas também todo o núcleo familiar, deste modo, será ainda neste trabalho analisadas quais possíveis políticas públicas se forem desenvolvidas pelo poder público poderiam trazer uma resposta positiva. Realiza-se, então, uma pesquisa básica de natureza bibliográfica. Ademais diante das pesquisas realizadas pode-se perceber que o abandono afetivo vem trazendo consequências sociais, morais, psicológica, institucional e intelectual, na vida da criança e do adolescente desde a fase da infância até a fase adulta.
Palavras-chave: Abandono. Consequências. Políticas. Dignidade.
ABSTRACT: In view the importance of the subject affective abandonment, we aim to address and identify the main impacts affective abandonment has on the lives of children and adolescents. We seek to address the issue with social and public relevance, since the Federal Constitution provides in a clear and objective way that it is duty of the Family, Society and State to assist children and adolescents, providing the existential minimum in a dignified manner. The need is sure for public policies to be developed as a means of preventing, assisting, repairing and watching not only the child and adolescent, but also the entire family nucleus, as so, this essay will also analyze which possible public policies, if developed by the government, could bring a positive response. Thus, a basic research of bibliographic nature is carried out. Furthermore, in view of the investigations performed, it can be seen that affective abandonment has brought upon social, moral, psychological, institutional and intellectual consequences in the life of the child and adolescent from childhood to adulthood.
Keywords: Abandonment, Consequences. Policies. Dignity.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO. 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ABANDONO AFETIVO NA FILIAÇÃO. 3 PRINCÍPIOS. 3.1 PRINCÍPIO DA PATERNIDADE RESPONSÁVEL. 3.2 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. 3.3 PRINCÍPIO DO INTERESSE DO MENOR. 3.4 PRINCÍPIO JURÍDICO DA AFETIVIDADE. 4 A FAMÍLIA COMO BASE DA SOCIEDADE. 5 ABANDONO AFETIVO E SUAS CONSEQUÊNCIAS. 5.1 REFLEXOS DO ABANDONO AFETIVO NA VIDA EM SOCIEDADE. 5.2 REFLEXOS DO ABANDONO AFETIVO NO ASPECTO PSICOLÓGICO. 5.3 REFLEXOS DO ABANDONO AFETIVO NO ÂMBITO INSTITUCIONAL. 6 DO DIREITO AO DANO MORAL NO DECORRENTE DO ABANDONO AFETIVO NA FILIAÇÃO. 7 POLÍTICAS PÚBLICAS NO ÂMBITO FAMILIAR. 8 – DO ENTENDIMENTOS JURISPRUDÊNCIAIS DOS TRIBUNAIS ACRECA DA MATÉRIA. 9 CONCLUSÃO. 10. REFERÊNCIAS
1 INTRODUÇÃO
A chegada de uma criança ao mundo, e sempre motivo de grande alegria, uma verdadeira festa, mês após mês um misto de ansiedade e nervosismo são construídos involuntariamente. Cada olhar, cada sorriso, cada choro, são novos na vida de quem deu a vida a um filho, mesmo que dia após dia os atos mais comuns sejam vistos em outras pessoas, nada se compara aos movimentos dados por aquele que é tão amado e esperado.
Junto a isso, e preciso entender qual o papel dos pais na vida de seus filhos, levando em conta que é dever de ambos ampará-los em todos os âmbitos de sua vida, os preparando para uma vida social, moral, intelectual, psicológica e institucional de forma saudável. O dever de cuidado à criança e ao adolescente como pessoa em desenvolvimento é incumbida a seus responsáveis, que deverá conjuntamente desenvolvê-lo de forma a preparar cidadãos e pessoas de bem. Além disso, cabe a discussão sobre a importância da presença dos pais na vida de uma criança, bem como os princípios que os cercam.
O abandono afetivo pelos pais a crianças e adolescentes nestes últimos anos tem sido crescentes, assim como os danos causados também tem sido notório no seio da sociedade. O abandono formou pessoas que psicologicamente, intelectualmente, socialmente e institucionalmente não possuem estrutura para conduzir suas próprias vidas.
Por diversas vezes pode-se encontrar no ordenamento jurídico o estado em atividade na busca que esses danos possam ser diminuídos, seja através de políticas públicas no amparo social, seja por meio do judiciário quando provocado por aqueles dos quais foram abandonados na busca de que aqueles que o abandonaram de alguma forma possa ressarcir os danos sofridos.
Com esta pesquisa, que visa fundamentadamente à realização de um trabalho de conclusão de curso – TCC em direito, pretende-se como objeto compreender os reflexos danosos causado no desenvolvimento da criança e do adolescente no âmbito social, psicológico e institucional pelo abandono afetivo dos pais.
Para tanto, será desenvolvido através de revisões bibliográficas, complementada por jurisprudência, leis, e outras fontes de natureza jurídica. Será constituída, enquanto resultado final de um artigo, que possibilitará posteriores publicações de trabalhos em eventos científicos.
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO ABANDONO AFETIVO NA FILIAÇÃO
Ao falarmos em Família é imprescindível perceber seu contexto histórico em relação ao Estado. A família é a base estrutural que vem evoluindo com o passar do tempo, todavia, é necessário adequar a justiça à vida e não engessar a vida dentro de normas jurídicas.
No período das primeiras civilizações a família surge na sociedade como base de equilíbrio, somada a religião e a moral, tornando-se um pilar de estrutura familiar como uma unidade jurídica, fundada no pátrio poder autoritário no Direito Brasileiro.
O direito brasileiro tem como base de origem o direito romano, onde os vínculos sanguíneos e jurídicos eram mais importantes e prevaleciam sobre os vínculos do amor, bem como a importância econômica predominava sobre a afetiva.
Convém citar o entendimento de Carbonera (1998, p. 297-298) que trata o afeto na concepção da família tradicional, sustentando que.
A affectio, no modelo da família patriarcal, tinha sua existência presumida e condicionada à existência de uma situação juridicamente reconhecida. Desta forma, o casamento já trazia consigo a affectio maritalis, justificando previamente a necessidade de continuação da relação. Não se questionava tal elemento, uma vez que ele trazia parte da estrutura do matrimônio. [...] O compromisso de manter a vida em comum, não revela necessariamente, a existência de afeto. A continuidade podia ser motivada por outros elementos como, por exemplo, a impossibilidade de dissolução de vínculo: neste caso a affectio, presumida, se fazia presente.
Com o passar do tempo e as mudanças de época a legislação referente a família e a filiação evoluíram, assim superando as ideias contidas no Código Civil de 1916, em vista que os valores do século XIX caminhavam em direção contrária com a realidade pelas quais passavam a sociedade do século XX.
O Decreto-Lei n° 3.200 de 1941 tratou da organização e proteção da família, determinando que não se fizesse menção nas certidões de registro civil, sobre a origem da filiação, se legítima ou ilegítima, salvo quando solicitado pelo interessado ou em virtude de decisão judicial.
Posteriormente com o advento do Decreto-Lei n° 5.213 de 1941 foi autorizado ao pai permanecer com a guarda do filho natural, se assim o tivesse reconhecido e através do Decreto-Lei n° 4.737 de 1942 foi reconhecido o filho ilegítimo, condicionado ao desquite. Este decreto esteve em vigor até 1949, quando passou a vigorar a Lei n° 883 de 1949 abrandando esse rigorismo. Em 1962 a mulher casada passou a ter plena capacidade, eliminando a sua incapacidade relativa pelo denominado “Estatuto da Mulher Casada”.
Pertinente acrescentar que em relação a esse avanço na compreensão da relação familiar esclarece Diniz (2002, p. 20): “Está instituída a completa paridade dos cônjuges ou conviventes tanto nas relações pessoais como nas patrimoniais, visto que igualou seus direitos e deveres e também seu exercício na sociedade conjugal ou convencional”.
Com esse progresso observa-se a quebra do patriarcalismo e o surgimento de uma família que transmite valores e enfatiza o afeto, a compreensão e a igualdade entre seus membros. Nesse mesmo sentido está a lição de Boeira (1999, p. 22-23):
A família ao transformar-se, valoriza as relações de sentimentos entre seus membros, numa comunhão de afetividade recíproca no seu interior. Assim, sob uma concepção eudemonista, a família e o casamento passam a existir para o desenvolvimento da pessoa, realizando os seus interesses afetivos e existenciais, como apoio indispensável para sua formação e estabilidade na vida em sociedade.
3 PRINCÍPIOS
3.1 Princípio da Paternidade Responsável
A paternidade familiar, tem como destaque ser um dos princípios mais importantes no que tange à proteção dos direitos de personalidade da criança. Visto que este princípio se encontra inserido no § 7º, do artigo 227, da Constituição Federal de 1988, pelo legislador nos artigos 3º e 4º do Estatuto da Criança e do Adolescente e no inciso IV, do artigo 1.566 do Código Civil brasileiro de 2002.
O objetivo do constituinte como o do legislador foi o de garantir que a paternidade seja exercida de forma responsável, porque, apenas assim, todos os princípios fundamentais (como a vida, a saúde, a dignidade da pessoa humana e a filiação) serão respeitados e resguardados.
3.2 Princípio da Dignidade da Pessoa Humana
O princípio da dignidade da pessoa humana é um dos princípios constitucionais elencados como fundamento do Estado Democrático de Direito Brasileiro no inciso III, do art. 1º da Constituição Federal de 1988. Invocado em diversos dispositivos legais e na atividade judiciária, tem por objetivo a garantia da vida digna, embora não possua um conceito objetivo.
Ressalta-se que o princípio da dignidade da pessoa humana tem por objetivo garantir que todos tenha resguardado o mínimo necessário para sua sobrevivência de forma digna, bem como garantir a afetiva assistência por meio do Estado.
Quando ao menor garante o texto Constitucional o direito a desenvolve-se de forma digna por intermédio do Núcleo Familiar, da Sociedade e do Estado, prestando-lhe assistência desde a infância até seu pleno desenvolvimento e aptidão para conduzir sua própria vida na fase adulta.
3.3 Princípio do Interesse do Menor
O artigo 1º da Lei n. 12.010, de 03 de agosto de 2009 busca garantir o direito à convivência da criança e adolescente com o núcleo familiar, devendo o enfoque estar sempre voltado aos interesses do menor, que devem prevalecer sobre os demais.
Em suma, o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente prima de maneira absoluta para que seja assegurado a eles o direito “à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito e à liberdade e à convivência familiar e comunitária”.
A importância da aplicação deste princípio se dá diante da necessidade de amparo àqueles que se encontram em situação de vulnerabilidade, a fim de que lhes seja dada a devida proteção e lhes seja proporcionado um processo sadio de desenvolvimento e formação de personalidade.
Importante ressaltar que, em situações de abandono, sempre se deve aplicar o princípio do melhor interesse da criança, observando-se o seu bem-estar psíquico, físico e emocional. O Código Penal ressalta que o abandono material em seu artigo 244 e o moral em seu artigo 246 como crimes.
3.4 Princípio Jurídico da Afetividade
O princípio da afetividade aborda, em seu sentido geral, a transformação do direito, mostrando-se uma forma aprazível em diversos meios de expressão da família, abordados ou não pelo sistema jurídico codificado, possuindo em seu ponto de vista uma atual cultura jurídica, permitindo o sistema de protecionismo estatal de todas as comunidades familiares, repersonalizando os sistemas sociais, e assim dando enfoque no que diz respeito ao afeto atribuindo uma ênfase maior no que isto representa.
De certo o princípio da afetividade, entendido este como o mandamento axiológico fundado no sentimento protetor da ternura, da dedicação tutorial e das paixões naturais, não possui previsão legal específica na legislação pátria. Sua extração é feita de diversos outros princípios, como o da proteção integral e o da dignidade da pessoa humana, este também fundamento da República Federativa do Brasil.
4 A FAMÍLIA COMO BASE DA SOCIEDADE
A Constituição Federal 1988 cita a família como principal base da sociedade, independentemente de sua procedência seja ela monoparental, biológica, socioafetiva, dentre outras. Em conjunto a proteção do núcleo familiar pode-se encontrar a proteção dos direitos da criança e do adolescente como pessoa em desenvolvimento, descrevendo o dever de proteção, assistência e amparo a criança e ao adolescente de forma não exclusiva apenas da família, mas também da sociedade e do Estado, sendo assim é de corresponsabilidade de todos, devendo ser feita de forma prioritária.
Por tanto assim determina o artigo 227 da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010). (BRASIL, 1988).
Entre um dos direitos que deverão ser assegurados a criança e ao adolescente está à dignidade da pessoa humana. Está também resguardada pelo artigo 1º da Constituição Federal de 1988 como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil.
Cabe ainda salientar o instituto do poder familiar descrito no artigo 1.630 do Código Civil de 2002 que é definido por Gonçalves, (2012, p. 360), da seguinte forma “Poder família é o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, no tocante à pessoa e aos bens dos filhos menores”.
Assim, o poder familiar passou a ser exercido de forma conjunta por ambos os pais, tendo os mesmos idêntica carga de responsabilidade sobre a criança e adolescente enquanto menores, conforme o artigo 226, § 7°, da Constituição Federal de 1988.
Nesse mesmo sentido, vejamos o que a Lei 8.069 de 13 de julho de 1990 dispõe.
Artigo 22 – Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores cabendo-lhes ainda, no interesse desses a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
Parágrafo Único – A mãe e o pai, ou responsáveis, tem direitos iguais e deveres e responsabilidades compartilhados, no cuidado e na educação da criança, devendo ser resguardado o direito de transmissão familiar de suas crenças e culturas, assegurados os direitos das crianças estabelecidos nesta Lei 13.257 de 2016. (BRASIL, 1990)
Percebe-se que são muitas as bases constitucionais e legais que visam à proteção da criança e do adolescente, de forma a garantir um desenvolvimento saudável com total participação dos pais, devendo ser dedicado a esses enquanto menores o amor, cuidado, zelo, dedicação e etc., porém, a realidade vivenciada por milhares de crianças e adolescentes é totalmente diferente, onde predomina o abandono afetivo dos pais.
5 ABANDONO AFETIVO E SUAS CONSEQUÊNCIAS
O abandono afetivo ocorre quando um ou ambos os pais passam a não prestar a assistência moral e afetiva a seus filhos, seja pelo afastamento natural, pela separação ou divórcio dos pais ou pela negligência dos mesmos. Quando o cenário de fato é o divórcio pode-se perceber que os pais acreditam que apenas a assistência material é necessária, deixando a mercê a criança e ao adolescente de um fator tão importante na vida do ser humano que é o amor.
Os lanços de afetividade são cruciais para a criança e ao adolescente como pessoas em desenvolvimento, pois e através do núcleo familiar seja ele biológico ou sócio afetivo que se formará todas as bases e pilares dos âmbitos de suas vidas.
Sabe-se que aos pais lhes são dadas atribuições e autoridades para gerir a vida do menor, bem como lhes é dado o dever de proteção contra qualquer ato de violação de seus direitos, provendo que enquanto pessoa em desenvolvimento sua vida seja norteada de um olhar mais criterioso e cuidadoso.
Educar uma criança vai além de prepará-la para encarar as responsabilidades futuras, mas sim, dar amor, carinho e respeitar suas limitações e mostrar como diferenciar o que há de mal ou ruim pelo mundo a fora. A afetividade é um pilar da família, visto que o amor e o carinho são qualidades genuínas de um relacionamento, através deles, é possível que o respeito e compaixão sejam cada vez mais construídos, fortificando essa relação, para que junto a tudo isso, nasça uma linda família, que gere frutos, sendo eles os filhos.
O poder familiar é exercido por ambos os pais, assim deverão exercê-lo em sincronia, de forma recíproca e corresponsável na formação de seus filhos como pessoas. A presença de ambos os pais na fase da infância e da juventude é de extrema importância, pois o abandono afetivo paterno ou materno pode causar diversos danos psicológicos, social, moral, intelectual e institucional de forma profunda e irreversível, prejudicando a formação de identidade da criança e do adolescente.
Os reflexos do abandono afetivo na filiação podem ser percebidos no comportamento social e psicológico, pois as atitudes emanadas desses indivíduos são de pessoas revoltadas com a própria vida e com a sociedade que a cerca, possuem uma visão totalmente transtornada do seu papel na sociedade e como pessoas.
O abandono afetivo configura-se de diversas formas, uma de suas características é a recusa injustificada do dever de convivência e cuidado. São situações comuns em que o pai ou a mãe não possui o desejo de estar na companhia de sua família e acaba por se afastar do filho, rejeitando-o e o tratando de maneira indiferente, como se o filho fosse uma pessoa desconhecida.
Caracteriza-se também com a omissão de assistência no que diz respeito à formação moral, social, institucional e psicológica do filho que se encontra em sua companhia, onde o cenário do qual se predomina e o desinteresse e abandono dos genitores quanto às necessidades biopsíquicas dos filhos.
O abandono afetivo vem irradiar reflexos negativos em diversas áreas na vida de um indivíduo. Portanto pode-se citar 3 (três) áreas que são afetadas visivelmente, sendo abordadas a partir de então mais especificamente no presente trabalho em subtópicos.
5.1 Reflexos do Abandono Afetivo na Vida em Sociedade
A criança e o adolescente se retraem socialmente não construindo uma convivência no meio social em que vive. Portanto por diversas vezes ao sentir que é injustiçado no meio da sociedade leva o mesmo a ter dificuldade a se relacionar devido ter criado uma imagem negativa de si mesmo, encontrando limites e dificuldade no mercado de trabalho, na construção de sua própria família, na convivência em grupos sociais, na formação de caráter, na formação educacional entre outros.
5.2 Reflexos do Abandono Afetivo no Aspecto Psicológico
Psicológico – São várias às consequências e danos emocionais e até morais que o abandono afetivo vem causa a criança e ao adolescente que está formando seu psiquismo e conceitos morais. As crianças e adolescentes que sofrem abandono afetivo por diversas vezes desenvolvem transtornos psicológicos e emocionais, como exemplo a depressão e complexo de inferioridade.
Como bem explica Rodrigo da Cunha Pereira (2015, p. 401) o estado de filiação é um bem indisponível cuja ausência causa grandes consequências psíquicas.
O exercício da paternidade e da maternidade – e, por conseguinte, do estado de filiação – é um bem indisponível para o Direito de Família, cuja ausência propositada tem repercussões e consequências psíquicas sérias, diante das quais a ordem legal/constitucional deve amparo, inclusive, com imposição de sanções, sob pena de termos um Direito acéfalo e inexigível.
5.3 Reflexos do Abandono Afetivo no Âmbito Institucional
Institucionais – O abandono afetivo por diversas vezes forma crianças e adolescentes com uma predominância a práticas de ilícitos penais, gerando uma necessidade de que o estado tenha que desenvolver meios de prevenção e repressão desses indivíduos. A falta de assistência familiar gera crianças e adolescente sem limites e conhecimento do que seja moral, social e juridicamente correto, assim, cabe ao Estado desenvolver políticas públicas institucionais de assistência e integração, pois havendo também omissão por parte do Estado, essas mesmas crianças e adolescentes não saberão exerce seu papel de forma positiva na sociedade e será nesse momento que o Estado desenvolverá politicas repreensivas que não necessariamente represente algo que tenha efetividade.
É evidente que a participação da família no desenvolvimento do indivíduo na fase da infância e da adolescência ditará sua conduta moral, social, psíquica e institucional na fase adulta, pois, é nas primeiras fases da vida que um indivíduo forma sua personalidade e caráter enquanto pessoa. Neste sentido vejamos.
Para a transformação do estado infantil em estado adulto, imperioso o respeito à infância, aos primeiros passos da longa jornada representada pela vida. Somente possibilitando o aprendizado sadio das experiências da vida, o processo de formação humana poderá atingir seu ápice final: a conquista da dignidade da pessoa e seu auto reconhecimento como pessoa com plena dignidade. (COSTA, 2012, p. 41).
Assim havendo o abandono afetivo por parte dos pais pode-se dizer que um dos principais direitos inerentes a pessoa humana se ver violado qual seja a dignidade da pessoa humana, não só este mais como o direito a saúde mental, a personalidade, a igualdade, a participação efetiva no meio social, dentre outros.
Em texto de Tartuce (2010, p. 5, grifo do autor), observa:
Como se pode perceber, o princípio de proteção da dignidade da pessoa humana é o ponto central da discussão atual do Direito de Família, entrando em cena para resolver várias questões práticas envolvendo as relações familiares. Concluindo, podemos afirmar, que o princípio da dignidade humana é o ponto de partida do novo Direito de Família.
De fato, não há como obrigar um pai a amar um filho, mas a legislação lhe assegura um direito de ser cuidado. Pode-se encontrar em nosso ordenamento jurídico entendimentos jurisprudenciais pugnando pela aplicabilidade do artigo 186 e 927 do Código Civil brasileiro de 2002, ao deparar-se com responsáveis que negligenciam ou são omissos quanto ao dever geral de cuidado respondendo os mesmos judicialmente por terem causado danos morais a seus próprios filhos.
6 DO DIREITO AO DANO MORAL NO DECORRENTE DO ABANDONO AFETIVO NA FILIAÇÃO
O dano moral afetivo vem sendo reconhecido de forma majoritária no ordenamento jurídico brasileiro como meio de reparação aquele do qual sofreu o abandono, a base para esse entendimento vem tendo seu principal pilar na dignidade da pessoa humana como um direito personalíssimo.
A partir do princípio da pessoa humana que outros princípios constitucionais e infraconstitucionais deveram ser analisados, principalmente quanto ao direito de família. A dignidade da pessoa humana é fundamento jurídico suficiente para embasar as decisões judiciais que vem garantindo indenização às vítimas do abandono afetivo.
Nas relações de família, a prática de atos ilícitos poderá gerar danos materiais e morais, sendo estes últimos os que atinam os direitos da personalidade da vítima. O abandono material não gera nenhuma dúvida acerca das previsões legais que exigem o seu cumprimento. O abando moral, por sua vez, demonstra, no mínimo, um desrespeito aos direitos da personalidade, o que impõe aos lesados, em obediência ao princípio da dignidade da pessoa humana, o direito à busca da reparação pelos danos sofridos. (SCHUH, 2006, p. 62).
Após uma longa discussão no ordenamento jurídico pátrio sobre a pertinência do dano moral em relação ao abandono afetivo, houve a pacificação do entendimento que a indenização por abandono afetivo objetiva uma compensação pelos bens imateriais agredidos, assim, não visa retornar o indivíduo ao status quo antes, mas sim compensar por algo que subjetivamente encontra-se lesado. Não se busca auferir o valor do dano causado ao indivíduo pelo abandono afetivo, mas sim compensá-lo de forma efetiva.
A lei não busca forçar aos pais a desenvolver algo tão natural e intrínseco do ser humano que é o amor, pois juridicamente seria impossível tal prática, porém, o que a lei resguardar é o dever que os mesmos tem em educar, respeitar, cuidar, preparar para uma vida efetiva na sociedade e garantir o desenvolvimento saudável da criança e do adolescente.
Não há como ignorar a ocorrência de lesão moral sofrida pelo filho pela ausência da figura paterna ou materna no desenvolvimento de sua vida como pessoa dotada de sentimentos. Por tanto o comportamento ilícito praticado pelos pais contra seus filhos, deve ser punido, sendo meio legítimo como forma de sanção aplicada diretamente pelo Estado Juiz e ao mesmo tempo meio compensatório a ação de responsabilidade civil por danos extrapatrimoniais, assim a indenização não tem caráter apenas compensatório como também função punitiva.
O reconhecimento do dano moral pelo abandono afetivo tem sido totalmente colhido e aceito pelos tribunais, por tanto menciona-se uma de suas decisões, prolatada pelo Superior Tribunal de Justiça contida no Recurso Especial n. 1159242/SP 2017/0213687-9, em 22 de março de 2018, onde teve como relator o Ministro Francisco Falcão.
Ementa
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO PORDANO MORAL. POSSIBILIDADE.
1. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família.
2. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88.
3. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non facere, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia - de cuidado - importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico.
4. Apesar das inúmeras hipóteses que minimizam a possibilidade de pleno cuidado de um dos genitores em relação à sua prole, existe um núcleo mínimo de cuidados parentais que, para além do mero cumprimento da lei, garantam aos filhos, ao menos quanto à afetividade, condições para uma adequada formação psicológica e inserção social.
5. A caracterização do abandono afetivo, a existência de excludentes ou, ainda, fatores atenuantes - por demandarem revolvimento de matéria fática - não podem ser objeto de reavaliação na estreita via do recurso especial.
6. A alteração do valor fixado a título de compensação por danos morais é possível, em recurso especial, nas hipóteses em que a quantia estipulada pelo Tribunal de origem revela-se irrisória ou exagerada.
7. Recurso especial parcialmente provido.
É certo que será impossível a reposição dos bens imateriais perdido, pois a presença e o amor que não foi dado à criança e adolescente pelos pais nas primeiras fases ou passos de suas vidas jamais poderá ser ofertado posteriormente, assim, mesmo havendo o reconhecimento do direito ao dano moral pelo abandono afetivo esse não se faz meio suficiente a reparar os danos morais, sociais, psicológicos e institucionais sofridos por estes indivíduos. Por fim deve-se concluir que o amor não pode ser auferível economicamente, amar é uma arte, ser amado é um privilégio.
Portanto é de extrema necessidade que a família, sociedade e o Estado passem a tratar o abandono afetivo não meramente como um dano possível de reparação moral, mas sim como uma situação fática social que traz consequências que comprometem a existência e dignidade da pessoa humana.
Necessário se faz entender que a mera indenização em valor jamais poderá reparar uma lacuna existencial e afetiva da qual encontra-se no mais íntimo de uma pessoa, pois o afeto que não lhe fora prestado na fase necessária jamais lhe poderá ser prestada posteriormente.
7 POLÍTICAS PÚBLICAS NO ÂMBITO FAMILIAR
Criado em 1995 na presidência de Fernando Henrique Cardoso com a finalidade de distribuir recursos para a família e melhorado no governo de Lula em 9 de Janeiro de 2004, a lei 10.836 foi criado à bolsa família, que acabou unificando o (Vale gás, bolsa escola, bolsa alimentação), que deve assistir a famílias com filhos de 0 a 15 anos, a contrapartida desse programa é que as famílias beneficiadas devam manter seus filhos na escola e o cartão de vacinação atualizado, é considerado um dos melhores programas de combate à pobreza do País. Esse programa tem como finalidade combater a fome à desigualdade social, assegurar o direito a família a uma alimentação de qualidade e adequada e principalmente contribuir para melhorar a situação de famílias que estão em posição de vulnerabilidade extrema que vive também na zona rural, e que tem dificuldades de acessar serviços sociais básicos e de difícil acesso a escola.
A bolsa família juntamente com as ações da PRONAF (programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e do PAA (Programa de Aquisição de Alimentos), são programas que em conjunto veio para melhorar a vida da família rural e urbana. O que é declarado explicitamente no (Artigo 16.º Declaração Universal dos Direitos do Homem).
Foi lançado também um programa social voltado crianças de zero a seis anos, que garantirá uma renda mínima de R$ 20,00, por membro, que irá beneficiar mais de dois milhões de famílias. O pacote batizado de “Brasil Carinhoso” será integrado ao plano “Brasil sem miséria” e pago no mesmo cartão da bolsa família, esse novo programa inclui investimentos em creches e medicamentos, incluirá também a distribuição gratuita de remédios para tratamento da asma, com a distribuição de vitaminas A durante a campanha de vacinação e ampliar a prevenção e o tratamento de doenças que afetam as crianças.
A política pública precisa traçar o seu propósito e ajudar no desenraizamento da extrema pobreza, pois se entende que atualmente que as atenções voltas ou as poucas politicas publicas criadas são extremamente inertes e ineficazes sendo justificáveis somente mediante um contexto cultural tutelar dominante. Um olhar acerca da pobreza, se bem que, fragmentado, pode ser obtida através distribuição de riqueza entre os sujeitos, onde milhões de brasileiros estão fora do mercado de trabalho.
Nessa direção Durham (1986, p. 57) aponta “A crise econômica com seus corolários de desemprego, diminuição da renda familiar e aumento do custo de vida desestrutura todo o esquema em função do qual as classes populares 'organizam' sua prática social...”.
Durham também cita que os obstáculos confrontados pela família, a fim de inserirem adquirir os proventos indispensáveis e manterem suas autenticidades de provedores.
Cada vez mais as políticas públicas, são inseridas no seio familiar e percebe-se a necessidade de enfatizar mudanças nas condições habitacionais. A questão da proteção do Estado consiste assegurar a independência da família preservando-a das necessidades em face ao déficit habitacional. Lançado em Março de 2009 o Programa Minha Casa Minha Vida, é um recurso do governo federal, recurso gerido pelo Ministério das Cidades e operacionalizado pela Caixa Econômica Federal, com parceria entre os estados e municípios, tem como objetivos a produção de unidades habitacionais, que são vendidas sem arrendamento prévio, incluindo também neste programa, a Minha Casa, Minha Vida Rural (MCMVR) que oferece subsídios para a construção ou reforma de imóveis de famílias rurais a trabalhadores e 24154 aposentados rurais, este projeto tem como público alvo famílias rurais com renda bruta de R$15.000,00 anual e comprovada.
Na medida em que o governo vai criando novos programas, permita-se mostrar as políticas sociais vai sendo inserindo novos recursos para a família, resultando no fato de que a família está protegida no que se refere à condição da moradia. Se a noção de bem-estar veio para garantir a segurança habitacional apoiando no MCMV, o governo põe em evidencia a sua estruturação de poder que afeta a sobrevivência da família, fica mesmo evidente a submissão da família através dos seus programas e projetos.
Fica evidente, com a Lei nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, quando o governo investe na família com o benefício da previdência para donas e donos de casa que se dedicam somente ao trabalho doméstico, e que não possuem renda própria. E no benefício da Tarifa Social de Energia; que é um auxílio social criado pelo Governo Federal para ajudar as unidades residenciais de famílias com baixa renda, instituída pela Lei nº. 10.438/2002 para consumidores de baixa renda.
O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), que foi criado em 1995 com os mines e pequenos produtores, mediante a valorização do produtor rural e a profissionalização dos produtores familiares, com esse programa as famílias produtoras terá um aumento de renda com a melhoria da sua condição social e do uso racional da terra e da propriedade, à transferência de renda e assistência social, com geração de oportunidades para a inclusão e Independência das famílias, além de melhorar a condição social do mesmo. O que coloca o Brasil no patamar maior na oferta de alimentos, estimulando a permanência do agricultor e qualidade de vida.
Nota-se, que é preciso voltar a olhar a família na sua dimensão e pluralidade, e o acesso das políticas publica inserido na família, se tornou um direito reconhecido, para o Estado a família desprovida de bens, assinalada pela privação, carência, pela extrema pobreza, pela fragilidade dos sentimentos e companheirismo, que (Vicente 1994 apud Gomes; Pereira 2004, p.361) explica:
Quando a casa deixa de ser um espaço de proteção para ser um espaço de conflito, a superação desta situação se dá de forma muito fragmentada, uma vez que esta família não dispõe de redes de apoio para o enfrentamento das adversidades, resultando, assim, na sua desestruturação. A realidade das famílias pobres não traz no seu seio familiar a harmonia para que ela possa ser a propulsora do desenvolvimento saudável de seus membros, uma vez que seus direitos estão sendo negados.
O autor aqui afirma que as famílias juntamente com seus membros mais velhos são responsáveis pelo sustento de toda prole e a necessidades de intervir e determinar as limitações aos membros mais novos, do mesmo modo, cabe às ligações intrafamiliar a ideia de como reagir com as pressões existentes cada vez mais cedo impostas aos jovens atuais.
À medida que a família desfavorável se apresenta como expressão mais desumana da desproporção e da distinção coletiva. Essa condição de perda de garantia chega a sua prole de forma bastante intima, à proporção que, gera a mediocridade das emoções, da sensibilidade e ligações, em concordância (Gomes e Pereira, 2005, p. 359):
O ser humano é complexo e contraditório, ambivalente em seus sentimentos e condutas, capaz de construir e de destruir. Em condições sociais de escassez, de privação e de falta de perspectivas, as possibilidades de amar, de construir e de respeitar o outro ficam bastante ameaçadas. Na medida em que a vida à qual está submetido não o trata enquanto homem, suas respostas tendem à rudeza da sua mera defesa da sobrevivência.
Diante do pensamento do autor citado acima ao enraizar os conflitos entre as famílias forma-se uma imagem viva que reflete as crises financeiras e que está fixada dentro das famílias desprovidas de bens e percebe-se que diante do desgaste dos conflitos nas famílias as consequências do subdesenvolvimento que está sujeito o indivíduo, principalmente para aquele que sustenta é motora para perturbar a ‘paz familiar’.
8 DO ENTENDIMENTOS JURISPRUDÊNCIAIS DOS TRIBUNAIS ACRECA DA MATÉRIA
Através de pesquisas realizadas nos sites da rede mundial de computador: https://www.tjdft.jus.br/ e https://www.jusbrasil.com.br/, com o intuito de verificar os entendimentos jurisprudenciais sobre a matéria “abandono afetivo na filiação”, pode se extrair de tribunais de diversos Estados o levantamento da suscitação de questões e elementos importantes para a configuração do abandono afetivo e o deferimento do dano moral.
São várias as temáticas levantadas pelos Tribunais, aborda-se a partir de então algumas dessas temáticas.
O reconhecimento do abandono afetivo pelos Tribunais vem se fundamentando mediante o ato ilícito que cause abalo psíquico, angustia, dor, traumas, sentimento de rejeição, dificuldade de inserção social, assim como demais fatores de ordem psíquica e física. Sendo que o abandono para que gere a obrigação de indenizar deve ser devidamente comprovado nos autos do processo.
O valor de quantificação do dano moral não tem um parâmetro econômica absoluto, mas representa uma estimativa feita pelo Juiz sobre o que seria mais razoável, levando-se em consideração e tendo como base a condição econômica do réu e o dano causador ao autor, sem que cause enriquecimento ilícito do credor (filho), e empobrecimento indevido ao devedor (Pais).
Abandono afetivo – dano moral in re ipsa – indenização de 50 mil reais
"(...) A mesma lógica jurídica dos pais mortos pela morte deve ser adotada para os órfãos de pais vivos, abandonados, voluntariamente, por eles, os pais. Esses filhos não têm pai para ser visto. Também para eles, "O sonho é o recurso do vidente que nele se refugia a fim de ganhar forças para afrontar o sentido do futuro." (Fernando Gil, Op. cit.). Também eles afrontam o sentido do futuro e sonham o sofrimento, a angústia e a dor causados pelo desamor do pai que partiu às tontas, quando as malas não estavam prontas e a conta não estava em dia. (...) Não há dúvidas. No simbolismo psicanalítico, há um ambicídio. Esse pai suicida-se moralmente como via para sepultar as obrigações da paternidade, ferindo de morte o filho e a determinação constitucional da paternidade responsável. (...) Por essa razão, o dano moral decorrente do abandono afetivo não depende de perícia, não depende do futuro nem do passado, tampouco depende de resultado negativo na existência filial no presente. O dano é in re ipsa, 'traduzindo-se, assim, em causa eficiente à compensação.' (...) Anoto que a ação foi ajuizada quando a autora completou 18 anos, 10 meses e 20 dias de abandono. O último encontro entre pai e filha, em 2001, quando ela contava dois anos de idade, não passou de uma visita feita pela ex-companheira e suas duas filhas ao apelante, no interior de São Paulo, onde ele já havia constituído outra família, como prova a fotografia juntada com a contestação (fl. 80), destacando-se a legenda aposta à mão. Até 28 de março de 2019, data da conclusão do julgamento deste recurso, foram 21 anos, 2 meses e 20 dias (ou 1.107 semanas). Por fim, foram 7.749 dias e noites. Sim, quando o abandono é afetivo, a solidão dos dias não compreende a nostalgia das noites. Mesmo que nelas se possa sonhar, as noites podem ser piores do que os dias. A indenização não é, por tudo isso, absurda, nem desarrazoada, nem desproporcional. Tampouco é indevida, ilícita ou injusta. R$ 50.000,00 equivalem, no caso, contados, ininterruptamente, desde o nascimento da autora, a R$ 3,23 por dia e a R$ 3,23 por noite. Ainda que a indenização tenha sido estabelecida em valor fixo e não em dias e noites, e que esses cálculos não tenham a precisão do tempo contado por um relógio atômico, porque não se sabe o dia exato do início do abandono, não havendo dúvida, contudo, de que foi logo depois do nascimento da autora, esses números apenas ilustram a proporcionalidade e a razoabilidade do valor fixado, que deve ser mantido em R$ 50.000,00, atualizados pelo INPC e juros de 1% ao mês, incidentes da data do arbitramento (data da sentença)." (TJ-DF Acórdão 1162196, 20160610153899APC, Relator Designado Des. DIAULAS COSTA RIBEIRO, 8ª Turma Cível, data de julgamento: 28/3/2019, publicado no DJe: 10/4/2019).
Contudo, como já mencionado não havendo prova do dano causado pelo abandono afetivo ou que a circunstância de fato não configura abandono afetivo os Tribunais tem pugnado pelo não reconhecimento do dever de indenizar.
(...) A indenização por danos morais em decorrência de abandono afetivo somente é viável quando há descaso, rejeição, desprezo por parte do ascendente, aliado à ocorrência de danos psicológicos, não restando evidenciada, no caso em comento, tal situação. 3. Dada à complexidade das relações familiares, o reconhecimento do dano moral por abandono afetivo emerge como uma situação excepcionalíssima, razão pela qual a análise dos pressupostos do dever de indenizar deve ser feita com muito critério. 3.1. É dizer: as circunstâncias do caso concreto devem indicar, de maneira inequívoca, a quebra do dever jurídico de convivência familiar e, como consequência inafastável, a prova de reais prejuízos à formação do indivíduo. 4. O fato de existir pouco convívio com seu genitor não é suficiente, por si só, a caracterizar o desamparo emocional a legitimar a pretensão indenizatória. 5. O mero distanciamento afetivo entre pais e filhos não constitui, por si só, situação capaz de gerar dano moral, restando, assim, ausente à demonstração dos requisitos ensejadores do dever de indenizar, dispostos nos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, não havendo que se falar em indenização." (TJ-DF Acórdão 1154760, 07020022220178070005, Relator Des. JOÃO EGMONT, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 27/2/2019, publicado no DJe: 7/3/2019).
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ABANDONO AFETIVO. A sentença julgou procedente pedido para condenar apelante, genitor, a indenizar dano moral à filha, por abandono afetivo. Embora a demonstração de que a apelada necessite tratamento por depressão, chegando a tentar contra a própria vida os elementos dos autos são insuficientes para comprovar, com segurança e robustez, nexo de causalidade entre a conduta omissiva do genitor, quanto às visitações determinadas judicialmente, e os danos emocionais/psíquicos ou sofrimento indenizável, nos termos dos arts. 186 e 927 do CCB. A penas em situações excecionais e com efetiva prova é que, na seara das relações familiares, se devem conceder reparação por danos extrapatrimonial, sob pena de excessiva patrimonialização das relações familiares. DERAM PROVIMENTO UNÂNIME. (TJ-RS, Apelação Cível AC 70083174474, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Data de Publicação 08/09/2020).
Quanto ao prazo para o ajuizamento da ação de indenização por danos morais decorrente do abandono afetivo, é reconhecido o prazo prescricional vintenário quando o abandono ocorreu na vigência do Código Civil de 1916 e de 03 (três) anos quando o abandono ocorre na vigência do Código de Civil de 2002, contados a partir de quando atingida a maioridade do abandonado.
APELAÇÃO CÍVEL, AÇÃO INDENIZATÓTIA, ABANDONO AFETIVO, PRESCRIÇÃO. IRRESIGNAÇÃO AUTOTAL. Tese de que o suposto abandono afetivo teria se dado apenas doze meses antes da propositura da presente ação que consubstancia em inovação recursa. Fatos vertidos na inicial que acusam o suposto abandono afetivo por parte do Réu desde a infância do autor. Prazo prescricional vintenário. Art. Art. 177 do Código Civil de 1916. Diploma vigente a época entendimento do Eg. STJ no sentido de que, sendo a paternidade biológica do conhecimento do autor desde sempre, o prazo prescricional da pretensão reparatória de abandono afetivo começa a fluir a partir da maioridade do autor. (REsp 1298576/RJ, DJe 06/09/2012). Autor que afirmada sempre ter tido ciência de que o Réu era seu pai. Pretensão fulminada pela prescrição, posto que decorrido mais de 20 (vinte) anos entre o implemento da maioridade do Autor e a data da propositura da ação ainda que se considere como tese subsidiaria a confusa narrativa fática, contida na inicial, que poderia nos fazer concluir pelo suposto abandono afetivo acerca de 10 (dez) anos, permaneceria a conclusão quanto à prescrição da pretensão autoral. Prazo prescricional trienal que se aplicaria à hipótese. Precedentes desta Corte. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. (TJ-RJ, Apelação APL 00474276120198190021, Relator: Desembargador Murilo Kieling, Data da Publicação 09/06/2020).
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL. ABANDONO AFETIVO. PRESCRIÇÃO TRIENAL. TERMO INICIAL. MAIORIDADE DO FILHO. SENTENÇA MANTIDA. I. Prescreve em três anos a pretensão de compensação de dano moral fundada em abandono afetivo, nos termos do artigo 206, § 3º, inciso V, do Código Civil. II. Na hipótese em que a paternidade é reconhecida quando o filho tem seis anos de idade, a prescrição trienal deve ser contada a partir da maioridade. III. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF 20160110122499 - Segredo de Justiça 0003899-75.2016.8.07.0001, Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Data de Julgamento: 05/09/2018, 4ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE 14/09/2018. Pág.: 286/288).
Outro importante ponto a ser destacado é a necessidade do reconhecimento da paternidade, seja ela feita no âmbito extrajudicial ou judicial, a fim de que seja comprovada a paternidade biológica. Portanto, caso a paternidade ainda não esteja definida é necessário que antes da ação de reconhecimento do abandono afetivo cumulado com indenização de danos morais, seja dado ingresso a ação de investigação de paternidade nos termos da Lei 8.560, de 29 de dezembro de 1992.
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INVESTIGAÇÃO DE PATERNIDADE C/C INDENIZAÇÃO. REVELIA. AUSÊNCIA DE RECURSO. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA EM SEDE DE APELO. PRECLUSÃO. ABANDONO AFETIVO. CONHECIMENTO PRÉVIO DA PATERNIDADE NÃO COMPROVADO. INEXISTÊNCIA DA OBRIGAÇÃO DE INDENIZAR. 1. Não se insurgindo, no momento oportuno e por intermédio do recurso adequado, contra a decisão interlocutória que afastou a tese de revelia, opera-se a preclusão sobre a matéria e, por isso, é vedada sua rediscussão em sede de apelação. 2. O colendo Superior Tribunal de Justiça já firmou entendimento no sentido de não ser possível falar em abandono afetivo antes do reconhecimento da paternidade. 3. Sendo assim, anteriormente à ação de reconhecimento de paternidade não há que se falar em abandono afetivo, porquanto somente a partir dessa decisão judicial é que se fazem presentes os deveres inerentes ao poder familiar e, consequentemente, poderá ser aferido o seu descumprimento para fins de reparação civil. 4. Na espécie, não há prova, antes do ingresso desta ação e o resultado positivo do exame por análise de DNA, do reconhecimento da paternidade, nem mesmo informal, razão pela qual não há que se falar em abandono afetivo, revelando-se, por conseguinte, a prejudicialidade do pleito indenizatório formulado na proemial. 5. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA, MAS DESPROVIDA. (TJ-GO – Apelação (CPC): 03649482120148090175, Relator: SEBASTIÃO LUIZ FLEURY, Data de Julgamento: 21/09/2018, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 21/09/2018).
São vários os entendimentos dos Tribunais, no entanto percebe-se que nem sempre o abandono afetivo gerará o direito de indenização por danos morais. Assim, cabe ao julgador verificar os fatos, a existência de prova, o cometimento de ato ilícito, dano, e nexo de causalidade.
Desta feita, não existe uma sentença ou entendimento pré-fixado, vez que o ordenamento jurídico jamais poderia ou poderá normatiza todos os acontecimentos no seio da sociedade, porém, cabe ao direito e as normas jurídicas sempre em evolução conjuntamente com a mesma se aprimorar e evoluir de forma que nenhum caso concreto fique à mercê e sem uma resposta do Estado por meio do poder judiciário.
9 CONCLUSÃO
Através da presente pesquisa, pode se comprovar que é de extrema importância à relação de afeto entre filhos e pais, que, no entanto, é visto como imprescindível, irrenunciável, inalienável e indisponível, para o desenvolvimento da criança e adolescentes.
Também ficou demostradas as consequências causadas às crianças e adolescentes, não podendo ser simplesmente ignorada, deixando os mesmos à mercê de sua própria sorte. Necessário se faz que a sociedade, família e estado comece a perceber as consequências que o abandono afetivo vem causando nas primeiras fases de vida do indivíduo em formação. A realidade deve ser encarada com um único objetivo criar meios eficazes de prevenção e punição aos pais e responsáveis que são omissos aos seus deveres familiares.
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Sempre fui sonhador, é isso que me mantém vivo...
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Maurício Proença dos. Abandono afetivo na filiação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 maio 2021, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56528/abandono-afetivo-na-filiao. Acesso em: 23 dez 2024.
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Por: Sandra Karla Silva de Castro
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