RESUMO: A temática do estudo incide sobre a cobrança de custas judiciais mesmo na hipótese de concessão da gratuidade da justiça na seara trabalhista. O objetivo geral do estudo, é analisar a cobrança de custas do beneficiário da justiça gratuita na busca de satisfação do seu direito perante o judiciário trabalhista. A metodologia aplicada é o método dedutivo, realizado sobre vários enfoques tomando como base pesquisas bibliográficas por meio de livros, artigos científicos e revistas jurídicas. O trabalho é estruturado em duas vertentes, a primeira remete-se a abordagem do acesso à justiça nas Constituições anteriores, até chegar a Constituição de 1988, sintetizando também os aspectos gerais na justiça gratuita no ordenamento. Posteriormente aborda-se sobre noções gerais da cobrança de custas processuais na justiça do trabalho, e as possíveis implicações da cobrança de custas processuais ao direito de defesa fundamental do reclamante de acesso à justiça de modo gratuito. Conclui-se que a Reforma Trabalhista limita o direito de acesso à justiça garantido constitucionalmente que assegura aos trabalhadores buscarem a tutela de seus direitos.
Palavras-Chaves: Acesso à Justiça. Beneficiário da Gratuidade da Justiça. Cobrança de Custas. Reforma Trabalhista.
ABSTRACT: The study's theme focuses on the collection of legal costs even in the event of granting free justice in the labor field. The general objective of the study, is to analyze the collection of costs of the beneficiary of the free justice in the search of satisfaction of its right before the labor judiciary. The applied methodology is the deductive method, carried out on various approaches based on bibliographic research through books, scientific articles and legal journals. The work is structured in two aspects, the first referring to the approach to access to justice in the previous Constitutions, until reaching the 1988 Constitution, also summarizing the general aspects of free justice in the order. Subsequently, it deals with general notions of the collection of procedural costs in labor courts, and the possible implications of the collection of procedural costs for the fundamental right of defense of the claimant of access to justice free of charge. It is concluded that the Labor Reform limits the right of access to the constitutionally guaranteed justice that assures workers to seek protection of their rights.
Key-Words: Access to justice. Beneficiary of the Gratuity of Justice. Collection of Costs. Labor Reform.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1. O DIREITO CONSTITUCIONAL DE ACESSO À JUSTIÇA. 1.1 Evolução histórica. 1.2 Disposições envolvendo a previsão constitucional do acesso à justiça. 1.3 Aspectos gerais da justiça gratuita. 2. A POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DE CUSTAS PROCESSUAIS AO BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. 2.1 Noções sobre o pagamento de custas processuais pelo beneficiário da justiça gratuita na seara trabalhista e a necessidade ou não de comprovação da hipossuficiência alegada. 2.2 Implicações do acesso à justiça pelo beneficiário da gratuidade da justiça após a Reforma Trabalhista. CONSIDERAÇÕES FINAIS. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O tema incide reflexos sobre o ordenamento jurídico brasileiro acerca da viabilidade de cobrança de custas judiciais do beneficiário da justiça gratuita frente a Reforma Trabalhista pela Lei nº 13.467/2017. As custas processuais compreendem as despesas referentes aos trâmites do processo judicial, gastos com citação, intimação, com oficial de justiça, recursos, bem como o auxílio ao Estado com o pagamento de servidores públicos. A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, pautando pela efetividade do acesso à justiça, assegurou em seu texto normativo (especificamente no artigo 5º, inciso LXXIV), a assistência jurídica gratuita as pessoas economicamente hipossuficientes desde que comprovada a carência econômica.
Frisa-se que o acesso à justiça é desdobramento do princípio da dignidade humana, tendo em vista a previsão no rol dos direitos fundamentais da Constituição de 1988. Além disso, o preâmbulo da Constituição, fixou a justiça como direito social e individual do cidadão brasileiro. Após a criação da Lei nº 13.467/2017 ocorreram alterações significativas no direito trabalhista que afetaram o direito constitucional de acesso à justiça, propiciando insegurança jurídica no tocante a prestação judicial.
Visando alcançar o objetivo geral de analisar a cobrança de custas do beneficiário da justiça gratuita na busca de satisfação do seu direito perante o judiciário trabalhista. Faz-se uso também que objetivos específicos, quais sejam: a) Expor as alterações advindas da Reforma Trabalhista, por meio de análise da Lei nº 13.467/2017, no que tange ao pagamento custas do processo pelo beneficiário da justiça gratuita; b) Identificar as imposições de encargos financeiros ao empregado e a consequente insegurança jurídica na postulação de reclamações trabalhistas e c) Apontar os posicionamentos favoráveis e contrários da doutrina e o entendimento da jurisprudência acerca da cobrança de custas dos beneficiários da justiça gratuita.
É certo que, a gratuidade da justiça garante o previsto constitucionalmente (facilitação de acesso à justiça as pessoas carentes economicamente). Nesse contexto, surgiu a ideia desta pesquisa em outras palavras, a formulação de um estudo que pudesse demonstrar se realmente a Reforma Trabalhista pode ser considerada como óbice ao acesso à justiça. Diante de tais apontamentos surge o seguinte questionamento: De que forma a cobrança de custas da justiça gratuita impede o beneficiário de buscar o seu direito?
Para que os objetivos sejam alcançados, é de grande importância o auxílio de métodos e técnicas em que a conclusão obtida permitirá a priorização do conhecimento do pesquisador. O tipo de pesquisa é descritivo, a metodologia aplicada é o método dedutivo, realizado sobre vários enfoques tomando como base pesquisas bibliográficas através de livros, artigos científicos, e estudo de caso com o intuito de demonstrar as hipóteses de resolução da problemática.
Desse modo, o estudo estará estruturado em duas vertentes, a primeira remete-se a abordagem do acesso à justiça, a sua definição, detalhando os parâmetros descritos no bojo da Carta Constitucional a respeito do referido instituto.
Posteriormente aborda-se sobre a gratuidade da justiça. E por fim, trata-se das noções gerais envolvendo a cobrança de custas processuais na justiça do trabalho e as limitações ao acesso à justiça em caso de cobrança de custas processuais por beneficiário da gratuidade da justiça, fazendo uma contextualização dos efeitos da Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) na seara das causas trabalhistas.
1. O DIREITO CONSTITUCIONAL DE ACESSO À JUSTIÇA
Para o embasamento teórico do estudo, é fundamental a compreensão dos preceitos históricos do direito de acesso à justiça, o conceito, a previsão constitucional, e por fim, a diferenciação de assistência gratuita e assistência judiciária, isso que se pretende descrever.
1.1 Evolução histórica
A priori, é essencial se fazer uma breve evolução histórica do acesso à justiça no Brasil, até o contexto atual da Constituição Federal de 1988, dispondo também as previsões das Constituições anteriores.
Segundo Érico Hack (2012) após a independência do Brasil em 1822, foi outorgada a Constituição Política do Império do Brasil em 25 de março de 1824, sendo imposta pelo imperador, caracterizava-se pela instituição do Poder Moderador que tinha prevalência sobre os demais poderes. Nada dispunha sobre o acesso à justiça.
Em seguida, em conformidade com o supracitado autor em 1889, após a proclamação da República, emergindo a necessidade de uma nova Constituição, assim, em 1891 promulgada a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (inspirada no modelo norte americano), estabelecia o Brasil como república federativa, também não havia disposição sobre o acesso à justiça. (HACK, 2012)
O renomado doutrinador constitucionalista, Pedro Lenza diz que no Brasil, o acesso à justiça somente adquiriu status constitucional da Constituição de 1934:
(...) só adquiriu status de garantia constitucional expressa a partir do advento da Constituição de 1934, art. 113, n. 32, com a seguinte redação: “a União e os Estados concederão aos necessitados assistência judiciária, criando, para esse efeito, órgãos especiais, e assegurando a isenção de emolumentos, custas, taxas e selos”. Tal direito e garantia individual foi, porém, retirado do texto de 1937, reaparecendo na Constituição de 1946, em seu art. 141, § 35: “o poder público, na forma que a lei estabelecer, concederá assistência judiciária aos necessitados”, bem como na de 1967 (art. 150, § 32) e na EC n. 1/69 (art. 153, § 32). (LENZA, 2019, p. 1.608)
Pedro Lenza comenta, que o acesso à justiça foi concretizado constitucionalmente somente na Constituição de 1934, sendo retirado da Constituição de 1937, e novamente disposto na Constituições de 1946 e 1967e também no texto da Emenda Constitucional nº 1/1969.
Ressalte-se que a Constituição de 1937 revogou a Constituição de 1934, outorgando a Carta de 1937, dando início ao período ditatorial, no Estado Novo que representou:
(...) um período conturbado no Brasil em que direitos e garantias foram brutalmente reprimidos, inclusive aqueles destinados ao acesso à justiça. Foi uma carta outorgada fruto de um golpe de Estado, inspiração fascista, de caráter marcamente autoritário e com forte concentração de poderes nas mãos do Presidente da República Getúlio Vargas, frequentemente chamada de Constituição Polaca em alusão à Constituição Polonesa de 1935 que a teria inspirado, embora contivesse um rol de pretensos direitos fundamentais, não contemplava o princípio da legalidade, nem o da irretroatividade das leis, não previa o mandado de segurança, possibilitava a pensa de morte por crimes políticos e censura. (ALEXANDRINO, 2015, p. 72)
Segundo Vicente Paulo Marcelo Alexandrino, com o fim do Estado Novo, ocorre a redemocratização, a queda de Getúlio Vargas e a promulgação de uma nova Constituição de 18 de setembro de 1946, não cumprindo sua tarefa de redemocratização e nem proporcionando condições de desenvolvimento para o Brasil. Contudo, o rol de direitos fundamentais retoma do que existia na Constituição de 1934, acrescendo o princípio da inafastabilidade da jurisdição ou também conhecido como acesso à justiça.
Ana Flávia Messa (2018) contextualiza que a Carta Constitucional de 1967 foi instaurada após o regime militar que se estendeu até 1965, traduzindo o regime militar e institucionalizando a ditadura. Sofrendo alterações pela Emenda Constitucional nº 1 de 1969 (existe divergência na doutrina a respeito da referida Emenda, alguns autores consideram como nova Constituição). Finalmente, com a promulgação da Constituição Federal de 1988 se consagra em sede constitucional, a instituição da Defensoria Pública, alocando-a como função essencial a justiça. (LENZA, 2019)
Com isso, o acesso à justiça foi reconhecido constitucionalmente em 1934, sendo consolidado de fato, após a promulgação da Constituição Cidadã de 1988, definida como garantia fundamental inerente a condição de pessoa humana como se verá a seguir.
1.2 Disposições envolvendo a previsão constitucional do acesso à justiça
Antes de adentrar as disposições constitucionais do princípio do acesso à justiça, cabe aqui, definir o instituto. Desse modo, utilizando-se da visão de inúmeros autores sobre o assunto em comento. Para Carlos Henrique Bezerra Leite (2019) o conceito jurídico de acesso à justiça, remete-se ao acesso do Poder Judiciário, não apenas da tutela jurisdicional de ocorrência de lesão a direito, mas também, na ameaça.
No entanto, entende Cristiane Conde Chmatalik (2019) que como acesso à justiça a terminologia que envolve a proteção judicial, essencialmente o direito formal do indivíduo de propor ou contestar algo, afastando a deficiência de algumas pessoas possuem para utilizaram plenamente à justiça.
Pedro Lenza (2019, p. 1.884) critica a expressão acesso à justiça, dizendo que “ a doutrina mais abalizada entende como à ordem jurídica justa que viabiliza o acesso ao judiciário”. Todavia, Pereira e Rojo (2017, on-line) salientam que “muito se fala em justiça e muito se sente sobre justiça. Porém, não se trata de conceito que pode ser definido. Trata-se de concepção com abstração e subjetivismo, o que por si só já exprime a complexidade de seu exame”.
Assim, a garantia do direito de acesso à justiça, também chamado de princípio da inafastabilidade da apreciação judicial, ampliado na Constituição da República de 1988, compreende não apenas a “lesão”, mas também a “ameaça” a direito. A Constituição Federal de 1988 dispõe em seu artigo 5º, inciso XXXV sobre a garantia de acesso à justiça, in verbis:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito;
(BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988)
Vislumbra-se que a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, positivou o acesso à justiça (também conhecido como princípio da inafastabilidade da apreciação judicial) no rol dos direitos fundamentais, sendo também desdobramento do princípio da dignidade da pessoa humana, esculpido no artigo 5º, inciso XXXV.
Frisa-se que o direito fundamental ao acesso à justiça, mais do que apenas um direito fundamental, é o grande responsável por possibilitar a todo aquele que tenha um direito ameaçado ou queira reivindicar seus direitos, que possa valer-se do Poder Judiciário, e que possa confiar que seu ingresso se dará de forma ampla, que sua demanda será pautada nos parâmetros da legalidade, que o juiz (natural) decidirá de acordo com a lei. (RODRIGUES, BOLESINA, 2014)
Nas palavras de Luciano de Araújo Migliavacca (2012, p. 42) o acesso à justiça se caracteriza pela “efetividade da prestação jurisdicional pela possibilidade de submeter o conflito à apreciação judicial através de um ‘devido processo legal’ e sobretudo da razoável duração do processo”. Mas, não basta o judiciário para que se tenha o acesso à justiça. O direito postulado deve ser efetivo, com processo célere e adequado, sendo muito além do simples demandar, defender-se e contar com um juiz imparcial e competente. O Judiciário atual é visto como um dos meios para se alcançar o acesso à justiça, e não o único.
A interpretação do princípio do acesso à justiça não pode se limitar, portanto, à mera possibilidade de ingresso em juízo; ao contrário, esse princípio deve ser interpretado compreendendo a noção ampla do acesso a ordem jurídica justa, para a qual converge todo o conjunto de princípios e garantias constitucionais fundamentais do processo. (DONIZETTI, 2017)
Por fim, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firma o acesso à justiça como direito fundamental no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade 3995 DF:
DIREITO CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL DO TRABALHO. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DEPÓSITO PRÉVIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. ACESSO À JUSTIÇA E AMPLA DEFESA. PROPORCIONALIDADE. 1. As normas processuais podem e devem criar uma estrutura de incentivos e desincentivos que seja compatível com os limites de litigiosidade que a sociedade comporta. A sobre utilização do Judiciário congestiona o serviço, compromete a celeridade e a qualidade da prestação da tutela jurisdicional, incentiva demandas oportunistas e prejudica a efetividade e a credibilidade das instituições judiciais. Afeta, em última análise, o próprio direito constitucional de acesso à Justiça. 2. Dessa forma, é constitucional o depósito prévio no ajuizamento de ação rescisória como mecanismo legítimo de desincentivo ao ajuizamento de demandas ou de pedidos rescisórios aventureiros. Não há violação a direitos fundamentais, mas simples acomodação com outros valores constitucionalmente relevantes, como à tutela judicial efetiva, célere e de qualidade. 3. O depósito no percentual de 20% sobre o valor da causa não representa uma medida demasiadamente onerosa, guardando razoabilidade e proporcionalidade. 4. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. Fixação da seguinte tese: “É constitucional a fixação de depósito prévio como condição de procedibilidade da ação rescisória”. (STF-ADI: 3995 DF- 0006724-87.2007.1.00.0000, Relator: Min. Roberto Barroso, Data de Julgamento 13/12/2018, Tribunal Pleno, Data de Publicação: 01/03/2019)
Em âmbito internacional, a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) prevê que: “VIII. Todo homem tem direito a receber, dos tribunais nacionais competentes, remédio efetivo para os atos que violem os direitos fundamentais que lhe sejam reconhecidos pela constituição ou pela lei”. As normativas internacionais preveem como premissa da dignidade da pessoa humana, principalmente o acesso facilitado e eficaz a justiça. Dessa forma, o acesso à justiça possui ligação intrínseca com importantes direitos fundamentais previstos no ordenamento pátrio, o direito fundamental de acesso à justiça e o princípio fundamental da razoável duração do processo.
1.3 Aspectos gerais da justiça gratuita
Pautando pela efetividade do acesso à justiça, a Constituição Federal de República Federativa do Brasil assegurou em seu texto normativo a gratuidade da justiça, especificamente no artigo 5º, inciso LXXIV, in verbis:
5º (...) LXXIV - o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;
(BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988)
Dessa forma, a Constituição de 1988 sintetizou o benefício da gratuidade da justiça para as pessoas economicamente hipossuficientes (desde que comprovada a carência econômica), é garantido o acesso à justiça em todos atos necessários para o exercício da cidadania). Tem-se que o benefício da gratuidade da justiça, encontra-se também previsto no bojo normativo da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), especificamente em seu artigo 790, que assim dispõe:
Art. 790. Nas Varas do Trabalho, nos Juízos de Direito, nos Tribunais e no Tribunal Superior do Trabalho, a forma de pagamento das custas e emolumentos obedecerá às instruções que serão expedidas pelo Tribunal Superior do Trabalho. (Redação dada pela Lei nº 10.537, de 27.8.2002)
§ 1º Tratando-se de empregado que não tenha obtido o benefício da justiça gratuita, ou isenção de custas, o sindicato que houver intervindo no processo responderá solidariamente pelo pagamento das custas devidas. (Redação dada pela Lei nº 10.537, de 27.8.2002)
§ 2º No caso de não-pagamento das custas, far-se-á execução da respectiva importância, segundo o procedimento estabelecido no Capítulo V deste Título. (Redação dada pela Lei nº 10.537, de 27.8.2002)
§ 3º É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. (Redação dada pela Lei nº 13.467, de 2017)
§4º O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.
(BRASIL, Lei nº 13.467, de 2017 - Reforma Trabalhista)
Além das previsões da Consolidação das Leis do Trabalho, em sede infraconstitucional também, o Código Civil de 2015 prevê a gratuidade da justiça, dispondo em seu artigo 98 o direito já esculpido na Constituição do Brasil de 1988 como Direito Constitucional:
Art. 98. A pessoa natural ou jurídica, brasileira ou estrangeira, com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios tem direito à gratuidade da justiça, na forma da lei.
(BRASIL, Lei nº 13.105/2015 - Código de Processo Civil)
A Lei nº 13.105/2015 (Código de Processo Civil) revogou alguns artigos da Lei nº 1.060/1950, abandando a nomenclatura antiga (assistência jurídica integral e gratuita) passando a dispor sobre a gratuidade da justiça fazendo as devidas alterações. Carlos Henrique Bezerra Leite, faz a seguinte ponderação entre assistência judiciaria gratuita e o benefício da justiça gratuita:
Primeiramente, parece-nos importante distinguir assistência judiciária gratuita de benefício da justiça gratuita, porquanto, a nosso ver, a assistência judiciária, nos domínios do processo do trabalho, continua sendo monopólio das entidades sindicais, pois a Lei n. 10.288/2001 apenas derrogou (revogação parcial) o art. 14 da Lei n. 5.584/70, mesmo porque o seu art. 18 prescreve que a “assistência judiciária, nos termos da presente lei, será prestada ao trabalhador ainda que não seja associado do respectivo sindicato”. Na assistência judiciária, portanto, temos o assistente (sindicato) e o assistido (trabalhador), cabendo ao primeiro oferecer serviços jurídicos em juízo ao segundo. A assistência judiciária gratuita abrange o benefício da justiça gratuita e talvez por isso tenha surgido a confusão a respeito destes dois institutos. (LEITE, 2019, p. 520) (grifo do autor)
Dessa forma, os atos processuais devem ser praticados de maneira menos onerosa tanto para as partes que integram a lide como para o Estado. Dessa forma, o princípio da economia processual está amplamente interligado ao princípio do acesso à justiça e consequentemente a gratuidade da justiça.
Assim, a gratuidade da justiça, garante o acesso à justiça as pessoas economicamente carentes. Ressalte-se que o princípio da economia processual possui normas voltadas para a gratuidade judiciária, incorporam nesse instituto, em relação aos gastos processuais diante daqueles que não possuem condições de arcar com o processo, no entanto, esse benefício só atinge as partes, visto que, causa mais gastos ao Estado.
2. A POSSIBILIDADE DE COBRANÇA DE CUSTAS PROCESSUAIS AO BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA
Devido as alterações advindas da Reforma Trabalhista envolvendo a possibilidade de cobrança de custas processuais do beneficiário da justiça gratuita, o presente tópico além de descrever as noções gerais do pagamento de custas pelo beneficiário da justiça gratuita na seara trabalhista, observa também das possíveis limitações de acesso à justiça pelo beneficiário da justiça gratuita após a Reforma Trabalhista.
2.1 Noções sobre o pagamento de custas processuais pelo beneficiário da justiça gratuita na seara trabalhista e a necessidade ou não de comprovação da hipossuficiência alegada
Devido as alterações ocorridas na Consolidação das Leis do Trabalho por meio da Reforma Trabalhista, ocorre a possibilidade de cobrança de custas por parte do beneficiário da justiça gratuita. Entretanto, antes de adentrar ao assunto, é preciso tecer sobre o que se entende por custas processuais. Leonardo Resende Martins (2021) que por sua vez, comenta que o Código de Processo Civil conferiu vasta amplitude à gratuidade da justiça, compreendendo as custas, como as despesas provenientes do processo no geral.
Colaborando com o disposto acima, Aline Rebouças Lopes Freitas (2019) diz que as custas processuais representam a somatória das despesas envolvendo o processo, devidas ao Estado como forma de remuneração pela prática dos serviços prestados pelo Judiciário. No processo do trabalho, a parte sucumbente (quem perdeu) é quem paga as custas ao final da ação.
Por outro lado, Cyane Toledo e Adilsen Martinezi (2019, p. 13) dizem que “não há dúvidas de que a gratuidade judiciária abrange custas e despesas, por esse motivo, é imprescindível que os processos sejam analisados minuciosamente”.
Sendo assim, as custas processuais são contraprestação devida ao Estado em função da realização de um serviço forense, possuindo natureza tributária, conforme entendimento inclusive manifestado pelo o Supremo Tribunal Federal. Em decorrência disso, as custas são pagas pelo vencido, em outras palavras, por aquele que perder a demanda após o trânsito em julgado. (SALES, 2020)
Com isso, em processos referentes a justiça do trabalho, o artigo 789 da Consolidação da Leis do Trabalho estabelece sobre as custas processuais, em sede de processo de conhecimento, in verbis:
Art. 789. Nos dissídios individuais e nos dissídios coletivos do trabalho, nas ações e procedimentos de competência da Justiça do Trabalho, bem como nas demandas propostas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição trabalhista, as custas relativas ao processo de conhecimento incidirão à base de 2% (dois por cento), observado o mínimo de R$ 10,64 (dez reais e sessenta e quatro centavos) e o máximo de quatro vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, e serão calculadas:
I – quando houver acordo ou condenação, sobre o respectivo valor:
II – quando houver extinção do processo, sem julgamento do mérito, ou julgado totalmente improcedente o pedido, sobre o valor da causa;
III – no caso de procedência do pedido formulado em ação declaratória e em ação constitutiva, sobre o valor da causa;
IV – quando o valor for indeterminado, sobre o que o juiz fixar.
§ 1º As custas serão pagas pelo vencido, após o trânsito em julgado da decisão. No caso de recurso, as custas serão pagas e comprovado o recolhimento dentro do prazo recursal.
§ 2º Não sendo líquida a condenação, o juízo arbitrar-lhe-á o valor e fixará o montante das custas processuais.
§ 3º Sempre que houver acordo, se de outra forma não for convencionado, o pagamento das custas caberá em partes iguais aos litigantes.
§ 4º Nos dissídios coletivos, as partes vencidas responderão solidariamente pelo pagamento das custas, calculadas sobre o valor arbitrado na decisão, ou pelo Presidente do Tribunal.
(BRASIL, Lei nº 13.467, de 2017 - Reforma Trabalhista)
Todavia, em sede de recursos, as custas processuais deverão ser pagas dentro do prazo recursal previsto no artigo 789, parágrafo 1º, sob pena de não conhecimento do recuso e também deserção. (BRASIL, Lei nº 13.467, de 2017)
Conforme visto, o benefício da justiça gratuita nas ações trabalhistas é regulamentado pelo artigo 790 (acima transcrito), sendo a gratuidade concedida a requerimento da parte ou de oficio pelo magistrado desde que comprove a hipossuficiência de recursos para arcar com as custas processuais. (BRASIL, Lei nº 13.467, de 2017)
Ocorre que o § 4º do artigo 790 da Consolidação das Leis do Trabalho dispõe que o benefício da justiça gratuita somente será concedido caso a parte comprove a hipossuficiência, não sendo possível a simples alegação, devendo comprovar com os documentos e provas que considerar necessários para o preenchimento dos requisitos previstos em lei. (BRASIL, Lei nº 13.467, de 2017)
Conquanto, a Consolidação estabelece por forca do artigo 790, o §3 que terá direito ao benefício da gratuidade da justiça quem receber até quarenta por cento do limite máximo do benefício do Regime Geral de Previdência Social ou quem comprovar a insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo. Podendo ser requerido a qualquer tempo (até mesmo na fase recursal) desde que implique o prejuízo da subsistência do trabalhador ou de sua prole. (KOHLS, 2021)
Com efeito, Carlos Henrique Bezerra Leite (2019) diz que o benefício da justiça gratuita é regulado pelo artigo 790 da CLT, pode ser concedido, a mero requerimento da parte ou de oficio por qualquer juiz (independentemente da instância), sendo o trabalhador representado por advogado ou sindicato, desde que recebe salário igual ou inferior a 40% do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social. Com isso, concedido a parte que comprovar insuficiência de recursos e impossibilidade arcar com as custas processuais.
Todavia, em relação a situação de necessidade de comprovação da condição para obter o benefício da gratuidade, Fernando Augusto de Vita Borges Sales, apresenta a seguinte situação ilustrativa:
A concessão da gratuidade para pessoas físicas, tratando-se a parte de pessoa física, especialmente se for o reclamante, o entendimento prevalente é de que, para a concessão do benefício, basta a simples declaração., firmada pelo requerente, de que não tem condições de suportar as despesas do processo. A declaração comprova, a sua hipossuficiência econômica. Assim, percebendo salário maior que 40% do teto da previdência, a pessoa física deverá forma e juntar aos autos declaração de hipossuficiência econômica que se presume verdade até que se comprove o contrário. (SALES, 2020, p. 108-109)
Vislumbra-se a existência de uma divergência entre a doutrina acerca da configuração da hipossuficiência do empregado, Carlos Henrique Bezerra Leite (2019) considera somente possível a concessão da gratuidade desde que o trabalhador receba salário inferior ao teto da previdência, mesmo que se apresente declaração. Por sua vez, em conformidade com Fernando Augusto de Vita Borges Sales (2020), a declaração de hipossuficiência é bastante para haver a concessão do benefício da gratuidade.
Devido a Reforma Trabalhista foram feitas muitas alterações nas regras sobre processo do trabalho. Anteriormente, a regra que prevalecia é que todo os trabalhadores não deviam pagar custas processuais, bastando apresentar no processo uma declaração de pobreza, informando não possuir condições de arcar com as despesas processuais sem prejuízo do seu próprio sustento de sua família, a declaração era considerada suficiente. (PIPEK, 2017)
Além do mais, a Súmula nº 463 do Tribunal Superior do Trabalho, coaduna no seguinte sentido:
Súmula nº 463 do TST
ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. COMPROVAÇÃO (conversão da Orientação Jurisprudencial nº 304 da SBDI-1, com alterações decorrentes do CPC de 2015) - Res. 219/2017, DEJT divulgado em 28, 29 e 30.06.2017 – republicada - DEJT divulgado em 12, 13 e 14.07.2017
I – A partir de 26.06.2017, para a concessão da assistência judiciária gratuita à pessoa natural, basta a declaração de hipossuficiência econômica firmada pela parte ou por seu advogado, desde que munido de procuração com poderes específicos para esse fim (art. 105 do CPC de 2015);
II – No caso de pessoa jurídica, não basta a mera declaração: é necessária a demonstração cabal de impossibilidade de a parte arcar com as despesas do processo.
Desse modo, cabendo ao juiz decidir com razoabilidade, a possibilidade ou não da concessão da gratuidade da justiça ao trabalhador, apenas com a apresentação da declaração, sem a necessidade de apresentação de outros documentos comprobatórios, analisando todos os aspectos envolvendo o caso concreto. O artigo 844 da CLT impõe ainda o pagamento de custas ao beneficiário da gratuidade da justiça que não justificar sua ausência em audiência, in verbis:
Art. 844 - O não-comparecimento do reclamante à audiência importa o arquivamento da reclamação, e o não-comparecimento do reclamado importa revelia, além de confissão quanto à matéria de fato.
(...)
§ 2o Na hipótese de ausência do reclamante, este será condenado ao pagamento das custas calculadas na forma do art. 789 desta Consolidação, ainda que beneficiário da justiça gratuita, salvo se comprovar, no prazo de quinze dias, que a ausência ocorreu por motivo legalmente justificável.
§ 3o O pagamento das custas a que se refere o § 2o é condição para a propositura de nova demanda.
(BRASIL, Lei nº 13.467, de 2017 - Reforma Trabalhista)
Com a Reforma Trabalhista acrescentou-se no artigo 844, os § 2º e § 3º, estabelecendo punição ao empregado que faltar em audiência inicial de modo injustificado, sendo impedido de realizar nova demanda sem realizar o pagamento das custas processuais, mesmo que o reclamante seja beneficiário da justiça gratuita.
Visto o entendimento da doutrina, destaca-se, a jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 1º e 2º Região sobre o assunto em foco:
GRATUIDADE DE JUSTIÇA. COMPROVAÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA. ART. 790, §§ 3º E 4º, CLT. LEI 13.467/17. É óbvio que o rendimento informado pela Reclamada não é compatível com a contratação de profissional, com remuneração com remuneração equivalente ao dobro da renda da empregadora, durante quase dois anos. Resta claro, assim, que a Reclamada não declarou seu verdadeiro rendimento nos autos, não havendo comprovado sua incapacidade financeira de arcar com as despesas processuais, como exige o artigo 790, §§ 3º e 4º, da CLT. Sendo assim, a Reclamada não faz jus ao benefício da gratuidade de justiça, razão pela qual, ante a ausência de recolhimento de preparo, seu recurso está deserto. (TRT-1 - RO: 01004055720195010541 RJ, Relator: ANA MARIA SOARES DE MORAES, Data de Julgamento: 22/10/2019, Primeira Turma, Data de Publicação: 30/10/2019)
GRATUIDADE DA JUSTIÇA. VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 790, §§ 3º e 4º, CLT. RECURSO PROVIDO. A presente reclamação trabalhista foi ajuizada durante a vigência da Lei 13.467/2017, razão pela qual a ela aplicam-se as alterações introduzidas na CLT. Nos termos dos §§ 3º e 4º, do artigo 790, da CLT, a reclamante comprovou que estava desempregada na data do ajuizamento da ação, com anotação de novo contrato de trabalho somente na data de 18.02.2019, com salário de R$ 1.600,00, cujo valor é inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social, restando comprovada a insuficiência. Dou provimento. (TRT-2 10013262720185020014 SP, Relator: SERGIO ROBERTO RODRIGUES, 11ª Turma - Cadeira 5, Data de Publicação: 28/01/2020)
Observa-se que a doutrina e jurisprudência caminham no sentido de permitir a cobrança das custas processuais, mesmo que o reclamante se trata de beneficiário da justiça gratuita, embasando seus entendimentos nas novas disposições da Consolidação das Leis do Trabalho, como consequência das alterações feitas com a Reforma Trabalhista.
2.2 Implicações do acesso à justiça pelo beneficiário da gratuidade da justiça após a Reforma Trabalhista
É certo que, a possibilidade de pagamento de custas por beneficiários da justiça gratuita em sede de justiça trabalhista teve suas alterações após a implementação da Lei nº 13.467, de 2017 que alterou significativamente as disposições da Consolidação das Leis do Trabalho. Em razão disso, surgiram algumas implicações para a efetividade do direito fundamental de acesso à justiça, como base no que será disposto.
Tem-se que a partir da implementação da Lei da Reforma Trabalhista ocorreram denúncias quanto à existência de inconstitucionalidade no texto, dentre elas está a inafastabilidade da jurisdição prevista no art. 5º, XXXV da Constituição Federal de 1988 em caso de pagamento de custas pelo beneficiário da justiça gratuita.
Nesta lógica, compreende que o beneficiário da gratuidade da justiça satisfaz o requisito da hipossuficiência, desde logo, qualquer imposição ao pagamento de custas, deve ser considerado inconstitucional, pois está em desencontro com os princípios norteadores do direito do trabalho. Além de violar preceitos constitucionais e a normativas descritas pela Organização Internacional do Trabalho sujo status é supralegal. (GALIA; SILVEIRA, 2019)
Tal exigência de comprovação da hipossuficiência, constitui retrocesso no ordenamento jurídico trabalhista, sendo considerado obstáculo para o acesso à justiça do trabalho, para aquele que demanda em situação econômica de precariedade. Em razão disso, a gratuidade da justiça deve ser interpretada sobre o viés da Constituição, para se compreender que a simples declaração de hipossuficiência econômica provoca a presunção em favor do declarante. (LEITE, 2019)
Maurício Godinho Delgado (2017, p. 40) visualiza a lei reformadora, “sendo uma afronta direta aos direitos conquistados e assegurados constitucionalmente. Além disso, é notório que a Reforma Trabalhista tomou “direção regressiva, excludente, desigual e segregacionista”.
Considerando que a Justiça do Trabalho visa facilitar o acesso à justiça essa modificação não pode “obstar a missão histórica da Justiça Trabalhista que é facilitar o acesso à Justiça do Trabalhador”. (SCHIAV, 2017, p. 85)
Souto (2017, p. 57) entende que a Constituição Federal de 1988 é pautada na “proteção da dignidade, dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, da prevalência dos Direitos Humanos, da função social da propriedade, da melhoria da condição social dos trabalhadores, da política do pleno emprego”. A respeito dos prejuízos causados pela Reforma Trabalhista na justiça gratuita, Cyane Toledo e Adilsen Martinezi entendem que:
(...) há muito ainda o que se entender dos Tribunais Superiores e doutrinas pertinentes quanto aos aspectos de inconstitucionalidade, que, além de inviabilizar e restringir o acesso à justiça, ainda agrava mais a vulnerabilidade da parte hipossuficiente financeiramente, tendo em vista que, tais demandas tem caráter unicamente alimentar ou a possibilidade de comprometimento de necessidades essenciais do trabalhador. Percebe-se que esta alteração promoveu restrições inconstitucionais à garantia de gratuidade judiciária aos que comprovem insuficiência de recursos, na Justiça do Trabalho, violando as garantias constitucionais de amplo acesso à jurisdição e a assistência judiciária integral aos necessitados, além de gerar ônus desproporcionais para que cidadãos vulneráveis e desassistidos busquem o judiciário. (TOLEDO; MARTINEZI, 2019, p. 8-13)
Conquanto, após a reforma em análise, foi imposto (permitido a cobrança) ao empregado, a possibilidade de custeio das despesas processuais. Isto é, os encargos financeiros da demanda judicial trabalhista, ainda que tenham sido concedidos os benefícios da justiça gratuita.
Ao limitar o alcance da justiça gratuita ao trabalhador, a Consolidação das Leis do Trabalho viola o benefício da justiça gratuita diretamente ligado com o direito fundamental de acesso à justiça que possibilita aquele que não tem condições de pleitear em juízo, arcar com as despesas processuais, a possibilidade de submeter sua demanda ao Poder Judiciário. (KOHLS, 2021)
Arnaldo Pipek (2017) faz critica as alterações na legislação trabalhista, dizendo que devido a Reforma Trabalhista os juízes poderão conceder a justiça gratuita somente aos trabalhadores que preencherem os requisitos do artigo 790 da CLT, exigindo-se uma prova concreta dos rendimentos. Para o autor, esse tipo de alteração impacta o dia a dia de quem está envolvido em uma reclamação trabalhista.
Denise Fincato (2019) descreve que a lei nova ao estabelecer critérios objetivos para a identificação do beneficiário da justiça gratuita (prevista no artigo 790 da CLT, tendo a parte liberação de custas e despesas do processo), não teria alterado a possibilidade de defesa gratuita (assistência gratuita), impactando apenas sobre a imposição de comprovação da condição de miserabilidade o que contraria o entendimento constitucional e jurisprudencial já definido à época dos fatos (antes da reforma trabalhista).
Os dispositivos acrescidos no artigo 790, §3º e §4º e no artigo 844, §2º e §3º que permitem a cobrança de custas judicias do beneficiário da justiça gratuita funcionam como obstáculos para à jurisdição e aniquilam o acesso ao direito fundamental de gratuidade da justiça, impor medida sancionatória e gravosa a esses respectivos direitos, é atentado aos preceitos constitucionais inerentes a existência humana. (GALIA; SILVEIRA, 2019)
No mesmo sentido, Mauro Schiavi (2018) em sua obra, julga a inconstitucionalidade da exigência do pagamento de custas como condição para o ajuizamento de nova demanda trabalhista (artigo 844 da CLT), afirmando a violação dos fundamentos constitucionais.
Em consequência disso, as alterações advindas da Reforma Trabalhista possivelmente prejudicam o acesso à justiça em razão da alteração dos requisitos para concessão do benefício da justiça gratuita. Com isso, atribuir a responsabilidade pelo pagamento de custas ao beneficiário, além de viabilizar o cerceamento da defesa, aumenta a desigualdade. Portanto inviabiliza a efetivação da equidade, que consiste em tratar os iguais de forma igual e os desiguais de forma desigual, e inegavelmente afeta o direito fundamental constitucionalmente assegurado que o acesso à justiça.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O abarcamento do acesso à justiça é um direito de todos os cidadãos brasileiros, conforme disposição do artigo 5º, inciso LXXIV, sendo dever do Estado promovê-lo de maneira igualitária. A justiça gratuita objetiva que as partes no bojo da reclamação trabalhista, tenham seus direitos garantidos, independentemente dos aspectos financeiros, em face da necessidade do cidadão possuir segurança jurídica, tutelando os seus direitos enquanto empregado.
A Reforma Trabalhista acabou responsabilizando o reclamante, ainda quando forem concedidos os benefícios da justiça gratuita pelo pagamento de custas processuais, prezando a redução do número de demandas ajuizadas na seara trabalhista. Nas premissas do Estado Democrático de Direito, a Reforma Trabalhista pode ser considerada desproporcional, já que atinge o acesso à justiça, prevista na Constituição de 1988.
De fato, o trabalhador ajuíza ação de reclamação trabalhista na tentativa de reivindicar seus direitos trabalhistas que são protegidos em âmbito nacional e internacional. Mas, quando entra em foco a alteração feita pela Lei nº 13.467/2017 sobre a possibilidade de pagamento de custas processuais por beneficiários da justiça gratuita, os direitos trabalhistas passam a ser questionados.
As limitações acrescidas nos artigos 790 e 844 da Consolidação das Leis do Trabalho, permitindo a cobrança de custas judiciais de beneficiários da gratuidade da justiça, configuram-se como obstáculos para o direito fundamental de acesso à justiça, ao impor medidas punitivas e restritivas para efetivação dos direitos dos trabalhadores. Embora, o amparo da Constituição Federal de 1988 e da Consolidação da Leis do Trabalho, bem como da Declaração Universal do Direitos do Homem, seja bastante nítido, alguns autores criticam a mudança normativa realizada com a Reforma Trabalhista, alegando que a mesma seja incabível.
Evidentemente que se falando de limitações ao acesso à justiça traz a chaga das desigualdades sociais, interferindo e impedindo que a população tenha acesso a esse benefício legalmente assegurado, pois há imposição de encargos financeiros aos trabalhadores, que comumente são a parte autora, acredita-se também na redução do número de demandas protocoladas na justiça trabalhista. Diante do explanado ao longo do estudo, conclui-se que a Reforma Trabalhista limita o direito de acesso à justiça, ao permitir a cobrança de custas judiciais do beneficiário da gratuidade da justiça, violando garantia fundamental prevista constitucional, e com isso, interferindo que trabalhadores possam buscar a tutela de seus direitos.
REFERÊNCIAS
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Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ROCHA, LUIS HENRIQUE MASCARENHAS DA. Cobrança de custas judiciais do beneficiário da justiça gratuita ante a reforma trabalhista da Lei nº 13.467/2017 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jun 2021, 04:52. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56660/cobrana-de-custas-judiciais-do-beneficirio-da-justia-gratuita-ante-a-reforma-trabalhista-da-lei-n-13-467-2017. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Maria D'Ajuda Pereira dos Santos
Por: Amanda Suellen de Oliveira
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