JADY LEAL DA SILVA MELO [1]
(coautora)
MARIA DO SOCORRO MOURA COSTA [2]
(orientadora)
RESUMO: O presente estudo foi desenvolvido através de uma pesquisa bibliográfica, tem como abordagem natureza dedutiva, e apoia-se em pesquisas de jurisprudências e na plataforma de bases de dados do Google Acadêmico. Por meio dele pretende-se fazer uma reflexão acerca da postura dos gestores de Teresina-PI frente à problemática da última etapa do ciclo de violência contra a mulher. A ênfase é posta com ênfase nos aspectos sóciojurídicos em casos de feminicídio, a fim de conhecer as causas mais frequentes do crime em foco, traçar a fonte histórica do comportamento dos autores de tal ato e apontar as políticas públicas aplicadas com vistas a reduzir o número de delitos dessa natureza. A relevância do tema dá-se diante do fato de que no Brasil é notório que a própria Constituição Federal traz como direitos fundamentais, em seu art. 5º, a dignidade da pessoa humana e a igualdade entre homens e mulheres, além de assegurar o direito à vida, ainda, dedica um capítulo inteiro que discorre sobre direitos e/ou deveres da família. Nesse sentido, o estudo em comento permite compreender o avanço legislativo diante de tal crime, além da conquista alcançada pelas mulheres após anos de luta.
PALAVRAS-CHAVE: Violência contra mulher. Ciclo de violência. Agressor. Feminicídio.
1. INTRODUÇÃO
No Brasil do século XIX, predominava a sociedade patriarcalista, ou seja, a estrutura social baseava-se na dominação masculina, normatizadora dos corpos e almas femininos, de modo que às mulheres era impossível fugir do padrão socialmente estabelecido. Dessa forma, eis que se fora estivessem do ideal de submissão e recato, estariam manchando sua imagem social e colocando em risco o poder masculino, o que justificava as reprimendas, segundo Bicalho (1989, p.88).
Hodiernamente, os homens exercem opressão sobre as mulheres de maneira mais silenciosa, uma vez que, apesar da sociedade continuar aprestando forte presença do patriarcado, onde os homens já nascem tendo papéis importantes atribuídos a eles por sua condição de sexo e gênero masculinos, não se toleram mais alguns comportamentos nesse sentido. É comum, por exemplo, que meninos brinquem com objetos que simulam certas profissões, enquanto às meninas é ensinado que sua função é cozinhar, criar os filhos e cuidar da casa.
Nesse sentido, quando adultos, é também comum que reproduzam declarações machistas, que passam despercebidas e até sejam romantizadas, tendo em vista que sempre lhes foram ensinados valores e ideais machistas, tais como “mulher tem que obedecer ao marido”, “é o homem que manda na casa”, “você não pode fazer certas coisas porque é mulher”, e tantas outras que diminuem a figura da mulher, afirmando a posição de dominação masculina.
Portanto, identificar um possível agressor de mulher, nos dias atuais, não é tarefa simples, já que este, normalmente, não possui características explícitas. No entanto, estudos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) comprovam que a maioria dos casos que chegam ao extremo – feminicídio – acontece com casais que já viviam um relacionamento abusivo, mas não se deram conta de quando o ciclo se iniciou.
Pesquisas demonstram que esses perfis são recorrentes, levando a confirmação de que as vítimas são reféns de uma sociedade patriarcal em que o homem é detentor do poder sobre a mulher, assim se julgando dono da mesma. (WAISELFISZ, 2015).
Dessa forma, a busca pela redução significativa dos índices alarmantes de mulheres assassinadas em razão da condição de pertencerem ao sexo feminino foi intensificada no Brasil, justificando-se por esse figurar na quinta posição entre os países de maior índice de violência de gênero do mundo, observando-se que o crescimento desse quantitativo se deu vertiginosamente nos últimos 30 anos, como aponta o Mapa da Violência de 2012 (WAISELFISZ, 2012), desenvolvido pelo instituto Sangari.
Diante do avanço legislativo que visa à proteção da mulher, ao acompanhar o debate mundial sobre os direitos femininos, em especial o Protocolo Latino-Americano de Investigação de Mortes Violentas de Mulheres por Razões de Gênero, 2015, projeto encabeçado pelo ONU, dado que se constitui em um dos responsáveis pela implementação legislativa do feminicídio no Brasil, este se tornando vanguardista na busca de soluções para redução da violência de gênero.
A novidade nessa história de hostilidade e desigualdade de gêneros é a preocupação com o tratamento da sociedade contra a violência feminina, cuja atenção ao problema nasceu das lutas femininas que trouxe o assunto para a mesa de poder e fez ecoar no mundo o discurso de que as mulheres são merecedoras de respeito e em um lugar sem desigualdade na sociedade, não sendo mais possível sustentar a impunidade da violência diária. (WAISELFISZ, 2015).
Do ponto de vista do avanço legislativo, no Brasil, lei n° 13.104/2015 foi sancionada com o intuito de punir com maior rigor o homicídio em razão da condição do sexo feminino, incluindo assim no Código Penal o inciso IV, ao artigo 121, parágrafo 2°, o dispositivo legal que possui as formas qualificadas do homicídio. Insta salientar que, a própria Constituição Federal traz como direitos fundamentais em seu art.5° a dignidade da pessoa humana, igualdade entre homens e mulheres, além de assegurar o direito à vida. Outrossim, dedica um capítulo inteiro a discorrer sobre direitos e/ou deveres da família.
Dessa forma, resta manifesto a relevância do tema, visto que historicamente as mulheres sofrem os mais variados tipos de abusos, muitas vezes tem sua vida ceifada por sua condição de mulher, e foi a partir da tipificação do feminicídio, no Código Penal, que se conseguiu ter um maior grau de proteção às mulheres. Indo, assim, ao encontro dos parâmetros constitucionais pregados e defendidos pela Carta Magna.
Sendo assim, o presente estudo tem como objetivo analisar a postura dos gestores da Secretaria de Segurança Pública frente à problemática da última etapa do ciclo de violência contra a mulher, com ênfase no comportamento do agressor, a fim de estabelecer as causas mais frequentes desses crimes, bem como identificar quais políticas públicas são aplicadas com vistas a reduzir o número de delitos dessa natureza.
2. VIOLENCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL
2.1 Contexto Histórico da Violência Contra a Mulher no Brasil
A violência de gênero é ampla e engloba muitas formas, seja física, sexual, psicológica e modernamente moral e patrimonial também. Os números estatísticos alarmantes no Brasil não advêm de um processo contemporâneo, dado que essa violência é remota na história do mundo, e se protrai no tempo até os dias de hoje.
No Brasil do século XIX, a sociedade era estruturada no patriarcalismo, significando que a dominação masculina regulava corpos e almas femininas, de modo que as mulheres não podiam fugir do padrão estabelecido. Uma vez que fora do ideal de submissão e recato, incorreriam em culpa de estarem manchado sua imagem social e colocando em risco o poder masculino o que justificava as reprimendas, achaques e reparo, segundo Bicalho (1989).
Esse cenário foi o terreno fértil para normalização da violência contra a mulher, sendo os homens dentro dessa sistemática encorajados ao exercício amplo do machismo, seria o natural violentar mulheres de todos os modos para que as normas sociais de submissão fossem respeitadas e a “hegemonia” masculina solidificada. Ao longo de anos a violência contra a mulher foi sendo relativizada, ante ao fato das mulheres estarem inseridas em uma sociedade que as colocavam como objeto ou servas do sistema, ao ponto da violência ser considerada justificável, fundada na legitima defesa da honra patriarcal.
O enfrentamento no mundo a essa forma de violência só teve início na década de 1950, a partir dos esforços da Organização das Nações Unidas (ONU), por meio da criação da Comissão e Status da Mulher, entre os anos de 1949 e 1962, constituindo-se tal fato em um momento histórico, de extrema relevância, posto que a Carta das Nações Unidas, foi o primeiro documento a se referir expressamente a direitos iguais entre homens e mulheres.
Contudo, os ecos desse desejo de mudança social e a necessidade do respeito aos direitos da mulher, que já eram ensurdecedores no mundo contemporâneo em razão do movimento feminista Europeu, demoraram a chegar às mentes da nação.
Sobre isso, cabe assinalar a contribuição de Nader (2014, p.102), ao aduzir que o fortalecimento, no Brasil, da busca por politicas públicas para o combate a violência contra mulher, cujo marco foi o assassinato da mineira Ângela Diniz, morta com quatro tiros por seu ex-marido, o rico empresário Raul Fernandes do Amaral Street. Ângela teve sua condição feminina de vanguarda exposta, a fim de denegrir sua imagem, qual seja, mulher separada, mãe de três filhos e vivendo uma história de amor com outro homem.
O fato é que o assassino foi absolvido sob o fundamento de que tinha agido em defesa de sua honra. Essa decisão gerou uma grande revolta que culminou em um novo julgamento em 1979, momento em que o argumento de absolvição já não tinha mais validade e a condenação foi inevitável, frente à chegada dos ecos da mudança.
Esse fato é reconhecido como marco histórico, e foi importante, visto que nos anos 80 a violência contra a mulher ganhou destaque e a luta feminista se fortaleceu, oportunidade em que a mídia brasileira de comunicação discutia a temática em busca de formas efetivas de combater à violência. Ou seja, como consequência da incessante luta das mulheres, o mundo começou a discutir o problema e a tentar minimizar os números estratosféricos de crimes de gêneros, começando pela redução das desigualdades e dando maior atenção aos anseios feministas.
Como resultado de toda essa luta por direitos e mudanças legislativas foi possível a criação, em 1985, da primeira Delegacia especial de atendimento à Mulher (DEAM) em São Paulo.
Contudo, em que pese a iniciativa acima citada, no campo jurídico a temática teve seu tratamento intensificado, apenas, com a promulgação da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006), criada como mecanismo para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, a fim de efetivar o que foi discutido na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a mulher (2002) e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher (1996).
A Lei 11.340/2006 representou grande avanço legislativo sendo modelo para outros países, porém, não foi capaz de conter a evolução da violência até seu último estágio, o feminicídio, que enquadra todo crime de homicídio em razão do sexo feminino seja em situação doméstica e familiar ou crimes de ódio por menosprezo que tem ceifado a vida de muitas mulheres.
Diante da necessidade de punir mais severamente o assassinato de mulheres em razão de gênero, a Lei 13.104/2015 alterou o Código Penal brasileiro para tipificar o crime de feminicídio.
2.2. Feminicídio no Brasil
A violência contra a mulher constitui-se em uma escalada. Isso significa que as agressões são intensificadas gradativamente; é como se fosse uma progressão criminosa. Nessa escalada quanto mais próximo do desfecho fatal, mais fortalecido do desígnio estará o agressor que desde o primeiro ato violento cria em seu íntimo as justificações que possam respaldar os atos violentos.
Dessa forma, ao mesmo tempo em que a mulher tem seu psicológico abalado e encontra na socialização de gênero a naturalização das discrepâncias entre homens e mulheres, torna-se vítima vulnerável, e por vezes ameaçada a não buscar por providências legais.
Ademais, essa violência é naturalizada inclusive pela própria vítima, corrobora com esse pensamento Meneghel e Portella (2017, p. 3079), ao afirmar:
O fato das mulheres, muitas vezes, negarem a existência do problema é atribuído à repressão ou negação produzida pela experiência traumática do próprio terrorismo sexista, além da socialização de gênero, em que a ideologia de gênero (ideologia considerada aqui no seu aspecto negativo) é utilizada para naturalizar as diferenças entre os sexos e impor estes padrões e papeis como se fossem naturais ou constituintes da natureza humana.
Diante dessa realidade houve necessidade de dar mais efetividade à contenção da violência de gênero. Para tanto, foi implementada a Lei 13.104/2015 que alterou o Código Penal brasileiro para tipificar o crime de feminicídio, aquele homicídio praticado com requintes de crueldade contra mulheres por motivação de gênero. Ressalte-se que este foi importante reconhecimento da luta pela concretização dos direitos das mulheres, principalmente, do movimento feminista.
Com o advento da nova legislação, o Brasil tornou-se protagonista na implementação do Protocolo Latino-Americano de Investigação de Mortes Violentas de Mulheres por razão de gênero, e seguindo uma tendência internacional de concretização dos direitos das mulheres (ROSA; CARVALHO, 2018).
Outrossim, é importante mencionar que, a promulgação do feminicídio não poderá ser considerada ofensa a Constituição Federal de 1988, uma vez que não se pretende relativizar o princípio da isonomia insculpido no seu art. 5°, mas sim garantir sua efetividade, eis que o longo período de desigualdade de gênero determina essa normatização.
Além disso, quando se analisa os casos de assassinato de mulheres é perceptível que a causa da morte encontra explicações na desigualdade de gênero e no machismo patriarcal, fato que não ocorre no assassinato de homens.
No Brasil, os números da violência de gênero são alarmantes. O País ocupa a 5ª posição entre 83 países pesquisados pelo Mapa da Violência de Mulheres de 2015, no que se refere à taxa de homicídio de mulheres em razão do gênero.
A análise estatística dos homicídios contra as mulheres aponta que 50,3% dos crimes ocorreram dentro de relações familiares, e cerca de 33,2% das ocorrências tiveram como infrator os parceiros ou ex-parceiros das vítimas (WAISELFISZ, 2015).
Disso depreende-se que o avanço legislativo ainda não foi suficiente para clarificar o número de casos ocorridos no Brasil, posto que quando se trata de violência contra mulher ainda existe a subnotificação, ou seja, as cifras negras que são aquelas ocorrências não formalizadas, e a estatística apresentada por todos os órgãos levam em consideração apenas a violência formalizada.
O 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2017 disponibilizou números assustadores no quesito efetivação das políticas públicas contra o feminicídio. Nesse ano uma mulher teve sua vida ceifada a cada duas horas, somando 4.026 (quatro mil e vinte e seis) assassinatos, sendo que desses apenas 621 (seiscentos e vinte e um) casos foram classificados como feminicídio. Gerando, assim, a falsa impressão de que o quantitativo é pequeno.
No ano seguinte, 2018, o Anuário Brasileiro de Segurança Pública registrou 1.133 (hum mil, cento e trinta e três) feminicídios representando quase 55% de majoração nos casos em relação ao ano anterior. Quanto aos casos da escalada da violência estes foram 606 (seiscentos e seis) casos por dia registrados sob quaisquer das formas de violência da Lei Maria da Penha.
No empenho para que a qualificadora do art. 121, IV, do Código Penal seja aplicada aos casos de violência de gênero, o legislador editou a Lei 13.771/2018 alterando o §7° do art.121, do Código Penal, que trata das causas de aumento no crime de feminicídio, implementando modificação no inciso II para incluir aumento de 1/3 para a metade quando a vítima for portadora de doenças degenerativas que acarreta condição limitante ou de vulnerabilidade física ou mental, bem como no inciso IV para incluir crimes que ocorram na presença física ou virtual de descendente ou ascendente da vítima e por fim quando for descumprida medida protetiva de urgência previstas na Lei Maria da Penha.
Como é possível notar, existe uma grande dificuldade na implementação da qualificadora, e isso ocorre, principalmente, pela dificuldade de investigação dos crimes seja por falta de agentes públicos em algumas localidades, seja por falta de pericias qualificadas, dada a dificuldade de interiorização das equipes técnicas.
Ademais, o tipo penal estabelece no artigo 121, §2º que para caracterizar a qualificadora do inciso IV, é necessário que o crime envolva menosprezo ou discriminação à condição de mulher, situação que nem sempre é de fácil apreensão, e em alguns casos, dependendo das circunstâncias, podem ser constatados outros crimes contra vida, como latrocínio ou lesão corporal, seguida de morte, de modo a afastar a aplicação da qualificadora.
Conforme registra o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019, o ano de 2018, teve 1.206 vítimas do feminicídio, sendo que 88,8% dos casos o autor do crime foi o companheiro ou o ex-companheiro da mulher assassinada, também houve um aumento de 4% de mortes em relação ao Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2018 (BRASIL, 2019, p. 07).
O termo feminicídio foi usado pela primeira vez em um simpósio, em Bruxelas, Bélgica, pela socióloga Diana Russel, em 1976. Russel participava do Tribunal Internacional de Crimes contra Mulheres e sustentou a ideia de criar uma definição específica para homicídios praticado contra as mulheres. Em 1992 escreveu o livro "Femicídio: a política de matar mulheres", obra que inspirou Marcela Lagarde, antropóloga da Universidade Autônoma do México (UNAM), que em 1998 trouxe o termo à discussão na América Latina, ao descrever os assassinatos de mulheres ocorridos desde 1993 em Ciudad Juarez, situada no Estado de Chihuahua, no norte do México, na fronteira com a cidade de El Paso (Texas/EUA).
No Brasil, em 2015, o vocábulo, até então desconhecido, ganha protagonismo em virtude de sua inclusão como qualificadora do crime de homicídio (art.121, IV, do CP), porém na prática o assassinato de mulheres em razão da condição feminina já era amplamente conhecido, posto que o número de casos já era assustador.
3. VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER EM TERESINA-PI
3.1. Feminicídio em Teresina/PI
Como dito, anteriormente, a tratativa legislativa através da Lei 13.104/15 representa um avanço na defesa dos direitos das mulheres e representa um símbolo da luta feminista na busca de igualdade real entre os gêneros.
O contexto da violência contra a mulher em Teresina, capital do Piauí, não é diferente do resto do Brasil, uma vez que o machismo está enraizado na vida de homens e mulheres de todo país. Fazendo com que toda a sociedade sofra com números alarmantes de mortes em razão do gênero. Além disso, os que obstáculos são inúmeros para a efetivação da proteção aos direitos femininos, sendo o principal deles a ausência de denúncias por parte das vítimas.
Enquanto problemática isso é resultante do ciclo da violência que mina a coragem da vítima em denunciar desde o primeiro ato de violência, instalando-se assim, a escalada da violência, cuja culminância é o perecimento de vidas femininas.
No Piauí o primeiro caso de feminicídio levado a júri, em novembro de 2015, foi o caso do Réu Edimar Francisco da Silva Batista, e o julgamento levou a condenação, tendo como pena 63 anos e seis meses, por ter ceifado a vida de sua sobrinha de três anos. O crime foi motivado pela negativa da mãe da vítima em manter relações sexuais com o agressor.
O rompimento do circuito violento não acontece muitas vezes em virtude da violência psicológica presente em todas as fases, segundo pesquisa da SEMPLAN, 2018, realizada na capital em estudo. Conforme os dados da citada pesquisa, essa é a forma de violência que prevalece e, em razão do seu impacto emocional nem sempre a busca dos meios legais é o caminho escolhido. A falta de denuncia das agressões sofridas é motivada pelo medo das vítimas de sofrerem mais violência (pelo agressor ou pelo Estado), da revitimização que faz com que venha à tona toda a dor já sofrida, a dependência financeira, o medo da exclusão social e o desconhecimento das leis que tutelam direitos.
A pesquisa de 2018, sobre a condição socioeconômica e violência doméstica e familiar contra as mulheres (PCSVDF mulher, 2018) verificou que a notificação dos crimes de gênero é um exercício de coragem, frente à existência dos fatores supracitados. Dessa forma, a capacidade de se autodeterminar como sujeito de direitos é crucial, e para que exista a aptidão para esse exercício é necessário conhecimento dos direitos a serem pleiteados e esse conhecimento é o processo de empoderamento, segundo Pasinato (2015).
Sob esse enfoque a pesquisa destacou que as mulheres em Teresina possuem informação da existência de leis que tutelam seus direitos, em especial a Lei Maria da Penha, ao mesmo tempo em que se constatou a necessidade de que os agentes públicos, assim como toda a sociedade civil se comprometa a descortinar as medidas protetivas para o amplo conhecimento e efetividade desse mecanismo de defesa e enfrentamento do problema da violência de gênero, de modo a tornar o empoderamento feminino, realidade.
3.2. Ações Estatais no Enfrentamento aos Crimes de Feminicidio
Em Teresina, existe uma parceria entre o Estado e o Município, com propósito de garantir dados mais específicos da violência, desde o atendimento nas delegacias, hospitais, pericias, com a intenção de implementar programa de atendimento especializado às mulheres em todos os níveis de violência, além de possibilitar a punição adequada de seus opressores.
No sentido de efetivar a aplicação da legislação de proteção à mulher, bem como a intensificação da estrutura para prevenir, investigar e punir os crimes de feminicídio, o Estado do Piauí adotou desde 2015 medidas nesse sentido, como por exemplo a instalação de quatro delegacias especializadas no atendimento à mulher vítima.
Em termos percentuais o Piauí é o estado com maior índice de feminicídio, proporcionalmente aos crimes contra a vida de mulheres, e as ações estatais são de grande valia, ressalte-se que advém do estudo e da busca de meios para diminuir a níveis mínimos a violência contra mulher.
Também é do Piauí a primeira iniciativa entre os estados do Brasil na criação de um núcleo de investigação de feminicídio e a adesão às Diretrizes Nacionais para investigar processar e julgar com perspectiva de gênero as mortes violentas de mulheres. Ademais, houve a implementação do aplicativo Salve Maria, criado pela Secretaria de Segurança Pública do Piauí em parceria com a Agencia de Tecnologia da Informação (2019), que possibilita o rápido atendimento por meio de denúncias feitas pelo celular.
Desse modo, com as medidas adotadas, os índices de aplicação da qualificadora aumentaram em relação ao ano de 2015, devido a instalação de quatro delegacias especializadas no atendimento à mulher vítima, o que torna a investigação mais qualificada. O atendimento especializado não só possibilita a produção de inquéritos robustos, mas também propicia um atendimento específico para as vítimas e familiares, servindo para que seu sofrimento não seja agravado pela revitimização.
Contudo, a instalação das DEAMs, por si só não é suficiente se os profissionais a elas relacionados não forem qualificados para atender a demanda de forma específica. Isso significa que é necessário o treinamento dos servidores, cursos de aperfeiçoamento no sentido legislativo e psicossocial; ou seja, a contratação de servidores qualificados para um devido atendimento das demandas.
Constatou-se que as maiores dificuldades de executar um bom trabalho nas delegacias é a falta de pessoal e a falta de integração com outros órgãos, o que facilitaria a investigação, principalmente, a interlocução com o judiciário, assegurando a celeridade processual, garantida para além do texto legal.
Foi diante dessa perspectiva da necessidade de integração entre os entes públicos e seus órgãos, que a Prefeitura de Teresina criou em 2017 a Secretária Municipal de Políticas Públicas para Mulheres. A desconcentração tem como finalidade promover a estruturação municipal para a efetivação de políticas públicas integrativas para o enfrentamento da violência.
Segundo a Secretaria Municipal de Políticas Públicas para Mulheres (2018), a violência contra a mulher requer integração Inter setorial e a articulação de um amplo conjunto de atores sociais e políticos, para uma atuação efetiva em cadeia, sendo esse o compromisso municipal.
O sistema de proteção integrada à mulher conta, atualmente, com Delegacias Especializadas, Núcleo de Defesa da Mulher – NUDEM da Defensoria Pública, Núcleo das Promotorias de Justiça de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e familiar, Juizados de Violência Doméstica e Familiar e Coordenadorias da Mulher do Poder judiciário.
Contudo, é necessário que o agir individual das instituições seja efetivamente integrado e contínuo, para que o processo de enfrentamento à violência garanta a aplicabilidade de todos os dispositivos legais.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
No primeiro momento, fazendo uma retomada histórica, a sociedade era estruturada no patriarcalismo, dessa forma as mulheres eram completamente desprotegidas, pois eram tratadas como objetos, só eram reconhecidas como donas de casa que tinham de ser submissas aos seus maridos, sem qualquer outro reconhecimento por parte de suas famílias.
Por não existir leis que as protegessem, ficavam vulneráveis aos diversos tipos de violências que eram submetidas e ainda tinham que esperar o destino trágico caladas. Diante dos inúmeros casos de mortes de mulheres por questão de gênero foi que se pensou em punir de forma mais gravosa os autores desses crimes.
Foi assim que se constatou a importância da inclusão da Lei do Feminicídio no Código Penal Brasileiro, em seu artigo 121, e, ainda, verificar a Lei do Feminicídio juntamente com a Lei Maria da Penha e o homicídio qualificado como circunstância do crime de feminicídio.
Tal acontecimento foi um progresso na realidade alarmante e é, até os dias de hoje, uma dose de esperança para a diminuição do número de casos de assassinatos em razão do gênero, decorrentes da violência doméstica e familiar experimentado por mulheres, e constituídos na Lei Maria da Penha.
A atenção do Poder Público precisa estar voltada ao estudo e a criação de políticas públicas direcionadas a violência contra mulher, principalmente no âmbito familiar, que, como dito anteriormente, é onde mais ocorrem tais crimes.
Esses estudos e políticas públicas de conscientização precisam ser inseridos na sociedade, abordando a temática em todos os ciclos sociais, de todas as faixas etárias. Dessa forma, crianças aprenderiam desde cedo que todos temos os mesmos direitos, e que mulher não possui nenhum dever a mais em razão do gênero. As crianças e adolescentes, entenderiam desde o começo a não suportar nenhum tipo de grosseria por parte de seus companheiros e nem a romantizar qualquer tipo de atitude negativa, principalmente no âmbito familiar.
Apesar de o Brasil caminhar a passos lentos em relação a luta pela diminuição desses crimes, a criação das leis supramencionadas tem grande importância visto que encoraja muitas mulheres a prestarem queixa contra seus agressores, a não aceitarem se submeter a uma relação tóxica/abusiva desde o primeiro e/ou menor sinal.
Ademais, indubitavelmente, tais leis de proteção, as mulheres se sentiram mais seguras em enfrentar o problema com o intuito de viver melhor e longe de violência. Isto é, tem mais segurança em lutar pelas suas vidas.
Embora, como mencionado, ainda tenha muito o que se fazer no sentido de suavizar os problemas, há de se pensar que sim, uma vez que esta lei foi criada no intuito de prestar assistência a todas as mulheres, juntamente com as instituições como a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres e o Ministério dos Direitos Humanos que foram criados para acolher todas as vítimas de todos os tipos de violências, foi um grande avanço.
Por fim, o feminicídio como circunstância qualificadora do crime de homicídio vem precisamente para tratar dos crimes que afrontam a dignidade das mulheres, portanto, ainda é necessário que existam organismos legais eficazes de amparo à integridade física e psicológica da mulher, impedindo a exercício de homicídios em razão do gênero e encorajando cada vez mais mulheres a denunciar o agressor, a se livrar dessas relações e consequentemente a optar por viver.
5. REFERÊNCIAS
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WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2015: Homicídios de mulheres no Brasil. 2015. Disponível em: < https://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2016/04/MapaViolencia_2015_mulheres.pdf> Acesso em: 05/09/2020.
Bacharelanda do curso de Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: QUEIROZ, Andressa gabrielle portela. Feminicídio: aspectos sociojurídicos em casos de feminicídio Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 jun 2021, 04:39. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56662/feminicdio-aspectos-sociojurdicos-em-casos-de-feminicdio. Acesso em: 23 dez 2024.
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