VERÔNICA SILVA DO PRADO DICONZI[1]
(orientadora)
Resumo: A fixação da guarda é um dos reflexos da separação que necessita ser debatida entre os genitores que dissolvem a união estável ou o casamento. Desde a entrada em vigor da Lei nº 13.058/2014, que alterou o Código Civil, a regra legal é da aplicação da guarda compartilhada, modalidade que tem como característica essencial o compartilhamento e exercício conjunto da guarda dos filhos. Nela, ambos os genitores exercem os direitos e deveres decorrentes do poder familiar. Considerando as disposições legais contidas no Código Civil, a pesquisa objetiva debater o instituto da guarda compartilhada tendo em vista as melhores condições para os filhos e a ignorância de seus pais. Através de Pesquisa bibliográfica e exploratória, com análise qualitativa dos conteúdos acerca do tema, o trabalho irá discutir a guarda compartilhada segundo as leis e doutrinas e apontar que a sua fixação é a medida que melhor atende aos interesses das crianças e adolescentes, por ser a modalidade que prioriza o menor envolvido, deixando de lado os conflitos secundários que possam existir entre os genitores após o término do casamento.
Palavras-chave: Código Civil. Guarda compartilhada. Interesse do menor. Conflito dos pais.
Abstract: The fixation of the guard is one of the reflexes of the separation that needs to be debated among the parents who dissolve the stable union or marriage. Since the entry into force of Law No. 13,058 / 2014, which amended the Civil Code, the legal rule is the application of shared custody, a modality that has as its essential characteristic the sharing and joint exercise of custody of children. In it, both parents exercise the rights and duties arising from family power. Considering the legal provisions contained in the Civil Code, the research aims to discuss the institute of shared custody in view of the best conditions for the children and the ignorance of their parents. Through bibliographical and exploratory research, with qualitative analysis of the contents on the theme, the work will discuss shared custody according to laws and doctrines and point out that its fixation is the measure that best meets the interests of children and adolescents, as it is the modality that prioritizes the minor involved, leaving aside the secondary conflicts that may exist between the parents after the end of the marriage.
Keywords: Civil Code. Shared custody. Minor interest. Parental conflict.
Sumário: Introdução. 1. transtorno do espectro autista 2. Dos direitos e garantias constitucionais ao portador de TEA. 3.Lei Romeo Mion e a importância da carteira de identificação da pessoa com transtorno do espectro autista (CIPTEA) 4. terceiro setor e o TEA 5. lei nº 12.764/2012: política nacional de proteção dos direitos da pessoa com TEA. 6. Contexto Social e o Autismo. Considerações Finais. Referências.
INTRODUÇÃO
A dissolução do casamento ou da união estável é uma matéria que sempre é objeto de debate no direito de família por ser um período delicado em que os integrantes da família sofrem uma expressiva alteração, com saída do lar e etc. Os filhos do ex-casal são afetados com a nova realidade, e passam a conviver com seus genitores de um modo diferente, com o convívio de forma individualizada e em lares diversos.
Na maioria dos casos, a guarda dos filhos é uma das matérias a serem resolvidas já no momento em que a ruptura acontece, momento que o filho ficará sob a guarda exclusiva de um deles ou sobre a modalidade compartilhada, regra atual do Código Civil.
Infelizmente, esse instituto é um dos mecanismos de conflito utilizados pelos genitores inconformados com o término do relacionamento, situação que não deveria acontecer por causar danos aos filhos. O fundamento que deve permear a discussão da guarda deve sempre ser a busca por melhores condições de criação da criança e do adolescente.
Assim sendo, o objetivo deste trabalho é conscientizar e apontar os critérios que devem nortear os genitores e o julgador ao fixar o regime de guarda dos filhos, para garantir a eles as condições necessárias ao crescimento sadio, em local harmonioso que lhe assegure seus direitos como pessoa humana em formação.
No decorrer do estudo serão explanados os aspectos legais da guarda compartilhada - hoje considerada a espécie que melhor atende aos interesses dos filhos, e os efeitos que a sua não fixação pode desencadear para os filhos e para os pais, destacando os elementos que devem ser considerados pelo Magistrado ao optar por tal regime quando ele diverge dos interesses dos pais.
1. Separação dos Pais e seus Reflexos
A escolha pela ruptura de um vínculo conjugal ou de união estável é uma decisão que compete exclusivamente aos parceiros, contudo é inegável que essa tomada de decisão interfere na vida dos demais, principalmente os filhos, que são submetidos a uma nova realidade.
Com o divórcio, um dos genitores se muda para outro local e a rotina da criança e do adolescente sobre uma mudança significativa, tendo a convivência com um deles reduzida em razão do afastamento do lar.
o divórcio abrange certo receio em relação ao novo mundo que os envolvidos terão que enfrentar, faz surgir um turbilhão de emoções que torna a vida de um ou de outro ainda mais tenso. Nesse sentido, o divórcio torna-se traumático para crianças, mesmo que elas não sejam capazes de compreender completamente suas implicações que tornam às vezes complexas, diante dessa situação é muito importante à atitude coesiva e equilibrada dos pais para evitar danos futuros que teriam um período impresumível no desenvolvimento emocional na maioria das crianças. Desse modo, a crise familiar é sentida pela criança como uma perda, por mais adaptada que ela esteja com a situação, ela vive numa mistura de sentimentos, pois, as crianças são muitos sensíveis, espertas e atentas ao ambiente familiar, e percebem o clima de tensão ou de harmonia que é construído entre os pais (MELO e MICCIONE, 2014, p.7).
Para impedir a ocorrência destas situações, a legislação brasileira tem avançado ao longo das ultimas décadas com o propósito de tornar a dissolução menos penosa para os filhos, que tem direito ao convívio com ambos os genitores.
O Código Civil determina que os genitores, ao se separarem, deverão estipular, em comum acordo ou por decisão judicial, os direitos aos alimentos, à visita, convivência e guarda, essenciais para manter a relação de afeto dos filhos com seus genitores.
Por muitos anos, vigorou o posicionamento majoritário de que a guarda dos filhos menores deveria ser concedida à mãe, por ser ela a principal responsável pelo cuidado dos filhos enquanto ao pai cabia o papel de trabalhar e prover o sustento familiar (TARTUCE, 2015). Hoje em dia prevalece a fixação da guarda que assegurar melhores condições à formação do filho, conforme determina o princípio do melhor interesse do menor..
2. Guarda e a Proteção aos Interesses do Menor
A guarda é um dos principais temas do direito de família, porque discute a convivência dos pais com seus filhos após a dissolução de um casamento ou de uma união estável. A sua regulamentação evoluiu ao longo dos anos para assegurar os direitos dos pais e dos filhos à convivência mútua.
Com a ruptura do casamento, compete aos pais de filhos menores de idade o estabelecimento dos aspectos de sustento e convivência de ambos com seus descendentes.
O Código Civil, ao dispor sobre a dissolução da união conjugal deixa claro em seu artigo 1.579 que “o divórcio não modificará os direitos e deveres dos pais em relação aos filhos”(BRASIL, 2002).
Este dispositivo legal busca assegurar a proteção aos interesses das crianças e dos adolescentes, que inevitavelmente são inseridos no processo de separação por estarem fixados no termo de divórcio os direitos aos alimentos, convívio e guarda.
O dever de cuidado e criação dos filhos é resultado do Poder Familiar do qual os dois genitores são detentores de forma igualitária. Carlos Roberto Gonçalves assim o define:
Modernamente, graças à influência do Cristianismo, o poder familiar constitui um conjunto de deveres, transformando-se em instituto de caráter eminentemente protetivo, que transcende a órbita do direito privado para ingressar no âmbito do direito público. Interessa ao Estado, com efeito, assegurar a proteção das gerações novas, que representam o futuro da sociedade e da nação. Desse modo, o poder familiar nada mais é do que um munus público, imposto pelo Estado aos pais, a fim de que zelem pelo futuro de seus filhos. Em outras palavras, o poder familiar é instituído no interesse dos filhos e da família, não em proveito dos genitores, em atenção ao princípio da paternidade responsável insculpido no art. 226, § 7º, da Constituição Federal (GONÇALVES, 2017, p. 536).
Esse direito-dever não sofre alteração em razão da separação, do divórcio ou da dissolução da união estável. Portanto, a relação entre os genitores e seus filhos deve permanecer (BRASIL, 2002), respeitada as condições fixadas no regime de guarda adotado.
Esses deveres estão expressos no artigo 1.634 do Código Civil, que estabelece:
Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
I - dirigir-lhes a criação e a educação; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
II - exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
III - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
IV - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
V - conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
VI - nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
VII - representá-los judicial e extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; (Redação dada pela Lei nº 13.058, de 2014)
VIII - reclamá-los de quem ilegalmente os detenha; (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014)
IX - exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição. (Incluído pela Lei nº 13.058, de 2014) (BRASIL, 2002).
Como explanado acima, a dissolução do casamento ou da união estável não altera o poder familiar, exceto no que se refere ao direito à guarda, que pode ficar a cargo de apenas um dos genitores (GONÇALVES, 2017).
A guarda “representa a convivência do guardião com o menor sob o mesmo teto e o dever de prover a assistência material ao que for necessário à sobrevivência física e moral e o seu pleno desenvolvimento psíquico” (MADALENO apud LIMA, 2019, p.1).
Está regulamentada no artigo 1.583, que determina que ela possa ser tanto unilateral quanto compartilhada, a depender do caso concreto (BRASIL, 2002). A fixação da guarda pode ser definida de forma consensual ou por determinação do magistrado, quando os dois genitores demonstrarem interesse pela guarda dos filhos.
Desde o ano de 2014, vigora no direito de família brasileiro a regra de fixação da guarda compartilhada, cuja fixação será estudada no tópico subsequente.
3. A Fixação da Guarda Compartilhada
A Guarda está disciplinada no artigo 1.583 do Código Civil, estando a modalidade compartilhada definida no parágrafo 1º do dispositivo, cujo conceito legal é o seguinte:
Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada. (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 1 o Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5 o ) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008) (BRASIL, 2002).
De acordo com Ricardo Lima, a guarda compartilhada, “é aquela exercida por ambos os pais, que conjuntamente se responsabilizam por todas as decisões relevantes relacionadas ao bem-estar dos filhos.” (LIMA, 2019, p.1).
Para Rolf Madaleno, a Guarda compartilhada consiste no
coexercício dos pais acerca da sua responsabilidade com respeito ao sadio desenvolvimento mental de seus filhos comuns, porquanto, eles repartem estas suas naturais responsabilidades como pais, sem que a custódia conjunta represente uma rotatividade de residências, como infelizmente, muitos confundem com a guarda alternada, na qual se alternam ou se dividem os dias de permanência dos pais com seus filhos (MADALENO, 2018, p. 574).
A guarda compartilhada pode ser fixada tanto por consenso entre os genitores quanto por determinação judicial, medida adotada quando existe discussão dos pais quanto à guarda dos filhos. Nessas situações, o §2º do artigo 1.584 determina a fixação da guarda compartilhada como a regra a ser adotada pelo Juízo da Vara da Família (BRASIL, 2002).
O sistema introduzido pela citada Lei n. 13.058/2014 deixa de priorizar a guarda individual. Além de definir o que é guarda unilateral e guarda compartilhada, dá preferência ao compartilhamento (CC, art. 1.584, § 2º), por garantir maior participação de ambos os pais no crescimento e desenvolvimento da prole (GONÇALVES, 2017, p. 376).
Para a doutrina, a guarda compartilhada é a espécie que prioriza os interesses dos menores e sua saúde emocional.
guarda compartilhada ou conjunta — modalidade preferível em nosso sistema, de inegáveis vantagens, mormente sob o prisma da repercussão psicológica na prole, se comparada a qualquer das outras. Nesse tipo de guarda, não há exclusividade em seu exercício. Tanto o pai quanto a mãe detém-na e são corresponsáveis pela condução da vida dos filhos 302. O próprio legislador a diferencia da modalidade unilateral: “art. 1.583, § 1.º Compreende-se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5.º) e, por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns. (GAGLIANO; PAMPLONA, 2015, p.715).
A adoção do regime de guarda deve considerar os interesses dos filhos, para impedir que a disputa dos pais apenas para causar sofrimento ao outro não prevaleça sobre os interesses dos filhos, que devem ser considerados a prioridade no momento da fixação da guarda. Uma vez fixada a modalidade compartilhada, estão os genitores sujeitos ao cumprimento de direitos e obrigações decorrentes ao seu exercício.
4. Direitos e Obrigações na Guarda Compartilhada
Quando os genitores passam a deter a guarda compartilhada dos filhos, eles automaticamente passam a participar mais ativamente do dia a dia dos menores, já que nesse regime “o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos”, conforme dispõe o §2º do artigo 1.583 do Código Civil (BRASIL, 2002).
Em contraposição à guarda unilateral, em que a maior parte das obrigações eram exercidas apenas pelo genitor que detinha essa função, na modalidade compartilhada ambos são corresponsáveis pelo cuidado dos filhos, de modo a permanecerem exercendo sua função de genitor tal qual ocorria na constância da união.
A guarda compartilhada procura fazer com que os pais, apesar da sua separação pessoal e vivendo em lares diferentes, continuem sendo responsáveis pela formação,criação, educação e manutenção de seus filhos e sigam responsáveis pelo integral desenvolvimento da prole, mesmo estando separados de fato ou divorciados, obrigando-se a realizarem da melhor forma possível suas funções parentais. A prática dual da custódia considera a possibilidade de os pais seguirem exercendo o poder familiar, tal como ocorria enquanto coabitavam, correpartindo a responsabilidade que têm com suas funções parentais e com as decisões relativas aos filhos menores e incapazes (MADALENO, 2018, p. 566/567).
Ou seja, a guarda compartilhada torna os genitores iguais em direitos e deveres em relação ao filho, de modo que nenhum deles tem sua convivência restrita e desigual, como ocorre na guarda unilateral.
Com o advento da Lei n. 13.058/2014, ocorreu uma verdadeira bifurcação da guarda compartilhada em seu elemento exercício compartilhado do poder familiar, passando a importar o tempo equilibrado de permanência física dos genitores, transmudando a guarda alternada em um complemento do poder familiar, justamente quando relevante é a qualidade do exercício do poder familiar, e não a posse física dos filhos, que terminam confinados em duas moradias distintas, com cada genitor usufruindo de seu direito e nenhum deles exercendo o direito superior dos filhos (MADALENO, 2018, p.569).
Deste modo, tanto o pai quanto a mãe tem o mesmo direito a tomar decisões acerca do estudo, alimentação e cuidados em geral das crianças e adolescentes, sendo que mesmo que o local de residência do filho seja de um genitor, aquele que reside em local diverso deve ter ampla participação na tomada de decisões e acesso ao filho, para que o convívio seja equilibrado, conforme determina a Lei.
Os termos desta convivência podem ser definidos pelos pais ou pelo juízo, a depender da situação, conforme determina a norma:
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser:
[...]
§ 3 o Para estabelecer as atribuições do pai e da mãe e os períodos de convivência sob guarda compartilhada, o juiz, de ofício ou a requerimento do Ministério Público, poderá basear-se em orientação técnico-profissional ou de equipe interdisciplinar, que deverá visar à divisão equilibrada do tempo com o pai e com a mãe (BRASIL, 2002).
Portanto, ambos os genitores terão o dever de exercer as funções decorrentes do poder familiar que estão elencados no artigo 1.634 do Código Civil, que são, ao mesmo tempo, direitos e deveres de proteção dos filhos, já que o direito a convivência vem acompanhada do dever de zelo e cuidado de que os pais são detentores até a maioridade dos filhos.
São esses os direitos e deveres dos genitores quando fixada a guarda compartilhada, situação que é distinta quando o regime adotado é diverso do aqui tratado, o qual possui outras regras e consequências a serem enfrentadas pelos filhos e seus pais.
5. As Consequências da fixação da Guarda Compartilhada: Interesses dos Filhos X Pais
Apesar da guarda compartilhada ser a regra legal estimulada pelos dispositivos legais, existe situações em que ela não é fixada e prevalece o regime de guarda unilateral, que antigamente era aplicado na grande maioria dos casos.
Conforme explanado nas linhas anteriores, a guarda pode ser fixada tanto por consenso entre os genitores quanto por decisão judicial, quando as partes não chegam a um denominador comum (BRASIL, 2002).
Em alguns casos, os genitores não concordam em partilhar a guarda do filho por motivo diverso do esperado. Na maioria dos casos o conflito é resultado das magoas decorrentes do término da relação. Inconformado, o genitor pode se utilizar do filho como meio de punir o outro, com seu afastamento do convívio diário.
Nessas hipóteses, os genitores se afastam do verdadeiro objetivo da guarda, que é o cuidado e formação dos filhos e passam a disputar o filho como meio de “punir” aquele que optou pelo fim da relação conjugal, situação que pode desencadear atos de alienação parental.
Ainda que se deva respeitar a deliberação dos genitores, é preciso atentar para o momento de absoluta fragilidade emocional em que eles se encontram quando da separação. Daí a recomendação ao juiz para que mostre as vantagens da guarda compartilhada (CC 1.583 § 1.º). O estado de beligerância, que se instala com a separação, acaba se refletindo nos próprios filhos, que, muitas vezes, são usados como instrumento de vingança pelas mágoas acumuladas durante o período da vida em comum. Mesmo que a definição do regime de convívio esteja a cargo dos pais, é necessária a chancela judicial, que só ocorre após a ouvida do Ministério Público. Na ação de divórcio, é indispensável que tais questões fiquem definidas, não só quando se trata de divórcio consensual (CPC 731 II). Nas demandas litigiosas, com muito mais razão. Reconhecendo o juiz que o acordado pelos pais não atende aos interesses dos filhos, pode determinar a guarda compartilhada (DIAS, 2016, p.854).
É por isso que o artigo 1.584, §2º estabelece que mesmo em situações de conflito, o julgador deve ater-se aos interesses dos fixos e buscar a aplicação da regra legal de compartilhamento da guarda, a qual somente é afastada quando o conflito entre os genitores extrapola a ponto de ser mais prejudicial aos envolvidos o compartilhamento da guarda.
Quando isto ocorre e a guarda é unilateralmente exercida por um dos genitores, surgem consequências para os pais e para os filhos. Assim dispõe o Código Civil:
Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.
Parágrafo único. O direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente (BRASIL, 2002).
Portanto, quando a guarda é unilateral, permanecem os direitos e deveres decorrentes do poder familiar, contudo fica a cargo apenas do guardião o direito de ter o filho residindo consigo, sendo o responsável pela tomada de decisões em relação ao cuidado do filho, enquanto que o não guardião fica encarregado de supervisionar os interesses de seus filhos, já que “o fato de o filho estar sob a guarda unilateral de um não subtrai do outro o direito de convivência. Mesmo que o filho não esteja na sua companhia, está sob sua autoridade. (DIAS, 2016, p.764)”.
Além disso, também fica a cargo do genitor não guardião o dever de prestar alimentos que, conforme dispõe o artigo 1.694, §2º do Código Civil, será fixado em valor proporcional a atender o binômio necessidade/capacidade do alimentante e do alimentado (BRASIL, 2002).
Conforme já dito, é somente em casos extremos de conflito que a guarda unilateral é fixada, ou seja, quando a ignorância dos genitores é tamanha a ponto de não priorizarem o interesse dos filhos e permanecerem em conflito após o término do casamento, situação que afeta diretamente o direito à convivência garantida as crianças e adolescentes em fase de crescimento. É fato que os genitores são afetados, mas as consequências para os filhos são ainda piores.
Caso a guarda compartilhada não seja fixada, ficará o filho prejudicado por não ter contato com os seus genitores de forma igualitária, já que sua convivência ficará restrita aos dias de visitas previamente estabelecidos.
A guarda unilateral afasta, sem dúvida, o laço de paternidade da criança com não guardião, pois a este é estipulado o dia de visita, sendo que nem sempre esse dia é um bom dia - isso porque é previamente marcado, e o guardião normalmente impõe regras (DIAS, 2016, p.856).
Ou seja, a fixação da guarda unilateral por motivo diverso do esperado, isto é, motivada por conflito entre os genitores mostra-se prejudicial para a formação dos filhos, já que a interpretação legal atual é de que deve ser priorizado o interesse do filho quando fixada a guarda, em razão do princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.
É evidente que a guarda unilateral também resguarda os direitos do genitor não guardião, que permanece detentor de suas funções decorrentes do poder familiar (DIAS, 2016), contudo devemos buscar tornar a convivência com os genitores mais aproximada possível da igualdade, para que a relação do filho e dos pais não seja afetada pelo término do relacionamento.
Assim sendo, devem os genitores tomarem consciência dos direitos de seus filhos e priorizá-los a todo tempo, a fim de que as mágoas entre si não afetem a relação afetiva que deve existir entre pais e filhos. Optar pela guarda compartilhada é um primeiro passo rumo a esse objetivo, motivo pelo qual deve ser fixado sempre que possível.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Um dos reflexos legais do fim de um casamento ou de uma união estável é a fixação do regime de guarda dos filhos do ex casal, haja vista que o fim do relacionamento não interfere nos direitos e deveres de proteção que os pais tem em relação aos seus filhos menores de idade.
Deste modo, tanto a mãe quanto o pai tem o dever legal de criar seus filhos e com eles manter contato através do instituto da guarda, que pode ser exercida de forma unilateral ou compartilhada.
A redação atual do parágrafo 1º do artigo 1.583 do Código Civil define a guarda compartilhada como sendo aquela em que os pais e mães são corresponsáveis pela guarda do filho, ainda que residam em locais diversos, esta tida como regra legal segundo o artigo 1.548, §2º do CC/2002.
Portanto, prevalece no ordenamento jurídico brasileiro a preferencia pela fixação da guarda compartilhada, que pode ser estabelecida a pedido dos genitores ou por decisão judicial, por ser o regime apontado pela doutrina como o que melhor atende aos interesses das crianças e dos adolescentes.
Através da guarda compartilhada, o filho tem garantido o mesmo tempo de convívio com os dois genitores, ainda que possua residência fixa com apenas um deles, posto que as visitas e o contato é ampliado de modo a assegurar os direitos iguais dos genitores.
Apesar de ser a regra adotada pelo legislador, existem situações em que a ignorância dos genitores, motivada pelos conflitos do término do relacionamento, acabam por tornar inviável o compartilhamento da guarda e surge a disputa pela sua fixação de forma unilateral.
Acontece que tais conflitos são motivados por interesses diversos do que o dos filhos, os quais devem sempre ser o fator primordial. Assim sendo, a opção pela fixação de guarda unilateral somente deveria ocorrer quando comprovado que é o meio que garante melhores condições aos filhos e não aos seus pais.
Portanto, cabe aos genitores tomarem a consciência de que este instituto é para a garantia dos direitos dos filhos, e que os conflitos devem ser deixados de lado para que o melhor interesse das crianças seja assegurado. Essa percepção deve ser atingida pelos genitores e pelo julgador. Seja em qual for, é essencial que o interesse dos filhos se sobreponha aos demais, tendo em vista sua proteção assegurada pela Constituição Federal Brasileira.
REFERÊNCIAS
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE PERNAMBUCO TJ-PE - Agravo : AGV 0011193-42.2015.8.17.0000 PE Relator: José Fernandes, Data de Julgamento: 16/12/2015, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 21/01/2016. Disponível em: https://tj-pe.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/299702030/agravo-agv-3996996-pe. Acesso: 10 de abril de 2021.
[1] Graduada em Direito na FAFICH (2000); Pós-Graduada em Direito do Trabalho e Processo Trabalhista pela Anhanguera (2005); Mestre em Gestão Pública pela UFT (2018); Professora na Unitins de Palmas/TO (2019 aos dias atuais). Diretora-Geral da ESA-TO (Gestão atual), Professor Universitário de Direito na Universidade UnirG, Gurupi/TO
Bacharelando em Direito pela Universidade Unirg, Gurupi/TO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Alexandre Torres dos. Guarda Compartilhada: melhores condições para os filhos ou ignorância dos pais. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 jun 2021, 04:32. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56791/guarda-compartilhada-melhores-condies-para-os-filhos-ou-ignorncia-dos-pais. Acesso em: 23 dez 2024.
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