Resumo: O presente artigo tem como objetivo elucidar a responsabilidade civil nos meios digitais. A cada dia a internet vem crescendo em números de usuários, e com isso cresce também a ocorrência de relações digitais danosas, o que se faz necessário a responsabilização civil do autor do dano. É de suma importância a análise por meio dos doutrinadores e também do ordenamento jurídico dessas relações contemporâneas que vem surgindo, o direito precisa acompanhar as mudanças e evoluções cotidianas da era digital para que os agentes causadores de danos não saiam impunes. Diante do exposto é notório a relevância do assunto a ser tratado, visto que para muitos indivíduos a internet é uma “terra sem lei”, na qual se pode fazer tudo aquilo que convir, desta forma se torna importante salientar que a responsabilidade civil é o dever incumbido de ressarcir os danos causados a outrem. Como pilar a Lei 12.965/14, vamos discorrer a respeito dos princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. A metodologia adotada neste estudo é baseada em pesquisas documentais e bibliográficas, alicerçadas na leitura de artigos e demais publicações acerca do tema tratado, utilizando-se de métodos como abordagem qualitativa.
Palavras-chave: Internet; Lei 12.965/14; Responsabilidade Civil.
Abstract: This article aims to elucidate civil liability in digital media. Every day the internet is growing in numbers of users, and with that the occurrence of harmful digital relationships also grows, which makes civil liability of the perpetrator of the damage necessary. It is of utmost importance to analyze through the doctrines and also the legal order of these contemporary relations that have emerged, the law needs to accompany the daily changes and evolutions of the digital age so that the agents that cause damage do not go unpunished. In view of the above, the relevance of the subject to be addressed is notorious, since for many individuals the internet is a “land without law”, in which everything that suits them can be done, thus it becomes important to emphasize that civil liability is the duty to compensate for damages caused to others. As a pillar of Law 12.965 / 14, we will discuss the principles, guarantees, rights and duties for the use of the Internet in Brazil. The methodology adopted in this study is based on documentary and bibliographic research, based on the reading of articles and other publications on the subject treated, using methods as a qualitative approach.
Keywords: Internet; Law 12.965 / 14; Civil Liability.
Sumário: 1. Introdução. 2. Internet: Aspectos Conceituais, Históricos e Legislativos. 3. Da Responsabilidade Civil Nos Meios Digitais: Internet Terra Sem Lei?; 3.1. Princípios Fundamentais do Marco Civil da Internet. 3.1.1; Confronto Entre Princípios: Liberdade de Expressão X Honra; 3.2. Inviolabilidade à Privacidade. 4. Considerações finais. 5. Referências.
Atualmente vivemos na era digital, onde todas as informações que precisamos podem ser buscadas na internet, mas não é só isso que ela nos proporciona, pois, a internet também é fonte de trabalho, além de trazer entretenimento para muitas pessoas. Estima-se que de 7,5 bilhões de habitantes espalhados pelo mundo 4 deste são usuários da internet segundo relatório Global Digital Statshot 2019, feito pelas empresas americanas de dados Hootsuite e We Are Social (Fonte: Hootsuite/We Are Social/Divulgação) no Brasil, este número é ainda maior, visto que de 210 milhões de habitantes em torno de 139 milhões são usuários da internet. O país se encontra na 3° posição dos países que passam mais tempo nas redes, convertendo isso em números podemos falar de um tempo médio de 9 horas e 14 minutos. Isso deixa claro, a razão mais que suficiente para se falar em responsabilidade civil no âmbito digital.
A internet tornou-se um espaço de livre manifestação democrática de pensamentos, informações e ideias. Com isso tornou-se também um lugar propício para transgressão da lei em virtude de um bombardeio de informações, uma vez que usuários se escondem no anonimato para cometer danos, sejam eles morais ou patrimoniais, transformando o meio digital em uma terra sem lei. Tendo em vista este cenário, muitos direitos acabam batendo de frente, o que nos leva a realizar alguns questionamentos: como garantir a alguém seu direito à liberdade de expressão ou garantir que a honra de alguém jamais seja atingida? Seria possível, no âmbito digital, contribuir para que ninguém seja vítima de um discurso de ódio ou até mesmo uma fake news?
Foi em meio a estes e outros questionamentos sobre o tema que o legislador criou a Lei 12.965/14, conhecida como Marco Civil da Internet, no intuito de solucionar um turbilhão de dificuldades acerca desses atos danosos cometidos no meio digital. Muito embora a lei haja limitações, a mesma veio para estabelecer princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil.
A Constituição Federal de 1988 assegura a liberdade e o acesso à informação, porém, não menciona o acesso à internet, com isto a necessidade de uma lei específica. Neste sentido, esta pesquisa visa o esclarecimento das formas de fiscalização dos atos e irregularidades cometidos na internet e sua responsabilidade quanto aos conteúdos publicados.
O tema abordado na pesquisa é “Acesso a internet: Violação da Intimidade e da Vida Privada e sua Responsabilidade Civil. Análise a partir do inciso I, artigo 7º, do Marco Civil da Internet”, tendo em vista a grande importância dos meios de comunicação e a relevância de uma norma específica para regulamentação do tema. Esta lei tem como pilar a neutralidade da rede, a liberdade de expressão e a privacidade dos usuários.
A internet é realmente uma “terra sem lei”? Com base neste questionamento, no que tange ao mundo virtual, vimos a necessidade de abordar este assunto, uma vez que muitos usuários do mundo digital usam destes meios para cometer atos ilegais, se passando por uma pessoa que não é, invadindo o direito de outros usuários. Utilizaremos como base para tal pesquisa a lei 12.965/14 para, desta forma, aprofundarmos nossos estudos.
É possível identificar os atos infracionais cometidos na internet? Extrai-se, deste modo, a necessidade da restauração do equilíbrio social gerado por uma ação (fato social) de um indivíduo que causou danos, seja ele moral ou patrimonial. Neste sentido, GONÇALVES (2009, p.9) leciona que “o interesse em restabelecer a harmonia e o equilíbrio violados pelo dano constitui a fonte geradora da responsabilidade civil”.
E qual a importância de tal lei para a sociedade? Com tantos atos praticados nos últimos anos se fez necessária uma norma para tentar sanar tal problema, o Marco Civil da Internet veio para coibir os usuários que fazem o mal-uso da internet, aplicando as sanções necessárias de forma a responsabilizar o agente pelo dano causado.
O objetivo geral desta pesquisa é analisar as legislações vigentes que regulamentam a privacidade e os dados de proteção na internet, de modo a verificar a privacidade de dados dos cidadãos e averiguar a eficácia dessas normas, dando ênfase ao Marco Civil da Internet.
Podemos conceituar a internet como um sistema mundial de redes com o objetivo de interligar computadores no intuito de levar ao usuário o acesso a uma infinidade de informações. Com a evolução tecnológica houve uma facilidade de interações das pessoas do mundo inteiro. Vivemos em um momento onde é bastante comum o compartilhamento de dados através dos meios de comunicação.
Discutindo sobre o tema em sua obra, BARROS (2007, p.6), conforme citado por NEVES (2012, p.15) conceitua “a internet é, portanto, um grande meio de comunicação, onde pessoas de diversos pontos do planeta, com culturas diferentes, podem interagir e trocar informações, desde que dominem a língua”.
O surgimento desse meio de comunicação iniciou-se com a descoberta do rádio, foi aí que logo em seguida surgiram os computadores, no período da Segunda Guerra Mundial, e durante este período as informações deixaram de ser apenas registros físicos e passaram a ser processados em computadores.
Aduz VIEIRA (2007, p.189) que a internet surgiu por meio de estudos científicos realizados pelos Estados Unidos, cujo intuito era a criação de uma tecnologia que fosse intocável pelo “inimigo”, em meio à Guerra-Fria, assim, operacionalizado pela Agência de Projetos de Pesquisa Avançada (Advanced Research Projects Agency – ARPA) do Departamento de Defesa, denominado ARPAnet.
Em 1970 e 1980, a internet começou a ser utilizada para fins acadêmicos, deixando de ser uma ferramenta desfrutada apenas pelo governo. E foi a partir de 1990 que a internet começou a ser utilizada pela população em geral, por meio da conexão empresarial e residencial oferecida através de empresas que ofereciam tal serviço.
Sancionada em 23 de junho de 2014 pela Presidente Dilma Roussef, a Lei 12.965/2014 conhecida como Marco Civil da Internet, tem escopo em diretrizes estabelecidas por meio de princípios, garantias, direitos e deveres das partes, para o uso da internet no Brasil.
Esta lei, também chamada de Constituição da Internet Brasileira, visa disciplinar a relação entre os usuários e as respectivas empresas operadoras de produtos e serviços ligados diretamente à internet.
A Constituição Federal e outras legislações já previam em seus artigos a proteção aos direitos de liberdade de expressão e privacidade, mas devido às constantes transformações da sociedade, e levando em consideração que as normas devem acompanhar tal evolução, houve uma necessidade de adequar as transformações advindas dos avanços tecnológicos, criando se então uma lei específica.
Cabe salientar que o povo participou do processo de desenvolvimento do Marco Civil por meio de comentários a respeito dos artigos elaborados e externando opiniões através das audiências públicas ou portais da internet relacionados ao projeto, tal como portal e-Democracia.
A internet é uma ferramenta muito importante nos meios de comunicação utilizados pela população mundial. Visto sua importância no contexto individual de cada cidadão, fez se necessário uma legislação específica para tratar tal matéria.
Para discorrer a respeito da responsabilidade civil é preciso antes compreendermos o conceito de ato ilícito, este é um tema de muita relevância, visto que é a partir dele que a pessoa que sofreu o dano invoca a responsabilidade civil para que o autor tenha o dever de indenizá-lo pelo dano sofrido.
Sílvio de Salvo Venosa conceitua o ato ilícito da seguinte forma:
[...] os atos ilícitos são os que promanam direta ou indiretamente da vontade e ocasionam efeitos jurídicos, mas contrários ao ordenamento. O ato voluntário é, portanto, o primeiro pressuposto da responsabilidade civil [...]. O ato de vontade, contudo, no campo da responsabilidade deve reverter-se de ilicitude. Melhor diremos que na ilicitude há, geralmente, uma cadeia ou sucessão de atos ilícitos, uma conduta culposa. Raramente a ilicitude ocorrerá com um único ato. O ato ilícito traduz-se em um comportamento voluntário que transgride um dever. Como já analisamos, ontologicamente o ilícito civil não difere do ilícito penal; a principal diferença reside na tipificação estrita deste último. (VENOSA 2013, p.24)
O elemento essencial para assumir a responsabilidade pelos atos ilícitos praticados é que haja a conduta ou fato praticado pelo agente. O comportamento humano pode obedecer ou violar a lei e a ordem jurídica. Os indivíduos podem cumprir os requisitos legais ou proceder em desobediência a elas.
Conforme se impõe no artigo 186 do Código Civil: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência” pode se observar que a conduta é o principal elemento do ato ilícito, sendo este o requisito necessário para que seja dado início à análise da responsabilidade civil.
Maria Helena Diniz leciona a respeito do assunto:
A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntario e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiros, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado. (DINIZ 2005, p. 43)
A responsabilidade sai de sua inércia quando ocorre violação a um dever já existente. No entanto, mesmo que ocorra a violação de um dever jurídico, não haverá indenização se não houver nenhum dano ou prejuízo. Isso porque a obrigação de indenizar sucede a violação de um direito e do dano causado, sendo estes requisitos síncronos.
Para tanto vejamos o conceito de responsabilidade civil:
A responsabilidade civil pode ser conceituada na reparação de dano que uma pessoa causa a outra, determinando em quais condições uma pessoa pode ser considerada responsável ao dano que foi causado a outra pessoa e quais os termos e medidas que retratam a obrigação de reparação do dano, a qual, no âmbito civil é quase sempre pecuniária, independente do dano ser de ordem física, a honra ou ao patrimônio do indivíduo. (SAMPAIO, 2003)
É necessário que se faça a diferenciação da responsabilidade civil da qual iremos tratar, da responsabilidade criminal. A vítima de danos cíveis busca a condenação judicial do autor a reparar o dano de forma que volte ao seu estado anterior (status quo ante). Onde estiver presente o ato ilícito, ali também estará a infração e a obrigação de não violar o direito de terceiros. Por outro lado temos o ato ilícito penal, que consiste na ação ou omissão do agente, cujo fato é tipificado por norma penal de direito público. O interesse lesado é da coletividade e seu reparo é feito por meio de punição, podendo ser de caráter indenizatório: multas ou fiança, até restrição total da liberdade da pessoa.
Um dos grandes marcos na criação de direitos e garantias fundamentais em âmbito virtual foi a criação da lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) que estabelece princípios, garantias e deveres para o uso das redes no Brasil, para provedores de conexão, provedores de aplicação e usuários da internet e dispõe em seus artigos sobre a responsabilidade civil dos usuários no ambiente virtual. Muito conhecida como “Constituição da Internet” por se voltar ao caráter principiológico da norma, esta lei é um símbolo mundial no tocante ao tratamento do mundo virtual sob a ótica do Direito Civil. Um ponto importante a respeito da lei 12.965/14 é o previsto nos termos do artigo 19, caput:
Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.
Na busca para estabelecer formas de tornar seus dispositivos eficazes, este artigo menciona a responsabilidade do agente que pratica ato lesivo contra os direitos nele contidos, como a responsabilidade subjetiva de provedores de aplicativos de internet, como os sites Google e Yahoo.
Em novembro de 2012, a Lei 12.737/12, mais conhecida como Lei Carolina Dieckmann foi sancionada. Esta lei institui a categoria de Crimes Cibernéticos do sistema normativo jurídico brasileiro a proteção necessária a violações contínuas que vinham acontecendo e que, antes da promulgação desta referida lei, eram tratadas na esfera civil. Esta lei visa a proteção jurídica da liberdade individual e o direito ao sigilo pessoal e profissional, levando em consideração a relevância do feito para o convívio social.
Outra lei norteadora da internet é a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Promulgada em 2018, a lei 13.709/2018 prevê regras sobre o manuseio de dados pessoais e segurança, além do sistema jurídico inovador, pois traz definições inovadoras sobre processamento de dados e segurança da informação. Vejamos a seguir a afirmação de Walter Aranha Capanema:
O legislador brasileiro, com o seu costumeiro atraso em acompanhar os avanços da sociedade e da tecnologia, somente em 2018 se preocupou em regular com efetividade a proteção de dados pessoais, o que ocorreu com a edição da Lei 13.709/2018, a denominada Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). (CAPANEMA 2020, p. 163)
A referida Lei supramencionada coloca o indivíduo como elemento principal das relações jurídicas que se relacionam com o tratamento de dados, não só porque regula a proteção dos dados pessoais, mas principalmente porque opta por utilizar como base a “autodeterminação informativa”, ou seja o direito de escolher quais dados serão utilizados, além do limite e prazo dessa utilização.
Para iniciarmos uma abordagem conceitual no que tange aos princípios essenciais do Marco Civil da internet, devemos fazer uma menção ao artigo 3° que discorre sobre os princípios que regulamentam o uso da internet no Brasil. Vejamos:
Art. 3º A disciplina do uso da internet no Brasil tem os seguintes princípios:
I- garantia da liberdade de expressão, comunicação e manifestação de pensamento, nos termos da Constituição Federal;
II- - proteção da privacidade;
III- - proteção dos dados pessoais, na forma da lei;
IV- - preservação e garantia da neutralidade de rede [...].
Iniciaremos o tópico abordando a respeito da liberdade de expressão. Prevista no artigo 5º, IV da Constituição Federal da seguinte forma “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato”, e também no inciso XIV do referido artigo “é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”, bem como no artigo 220 da Constituição “A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição”.
Paulo Gustavo Gonet Branco conceitua a liberdade de expressão da seguinte forma:
Toda opinião, convicção, comentário, avaliação ou julgamento sobre qualquer assunto ou sobre qualquer pessoa, envolvendo tema de interesse público, ou não, de importância e de valor, ou não – até porque diferenciar entre opiniões valiosas ou sem valor é uma contradição num Estado baseado na concepção de uma democracia livre e pluralista. (BRANCO 2011, pág. 297)
Tratada como princípio em seu artigo 3º, e considerada um fundamento no artigo 2° como disposto a seguir: “A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão [...]”, a liberdade de expressão foi introduzida no Marco Civil da Internet.
Nas palavras de JESUS e MILAGRE (2014, p.11), a liberdade de expressão tende a se sobressair, isso se não violar nenhum direito de terceiro. A censura no ambiente virtual é proibida e a garantia dessa liberdade é de grande impacto para uma internet livre e democrática.
O Marco Civil da Internet também fez ressalva ao direito à privacidade, tratada na referida lei em seu artigo 3°, incisos II e III como um princípio que abrange também a proteção dos dados pessoais. Conforme aduz Damásio de Jesus e José Antonio Milagre, “ao proteger a privacidade, o Marco Civil põe a salvo toda e qualquer informação textual ou audiovisual que seja considerada privada”. (JESUS; MILAGRE 2014, P.13)
Entende-se por privacidade a diversidade de informações pessoais de cada indivíduo, referente a sua vida doméstica, relações familiares e de trabalho, seus hábitos, religião, pensamentos, dentre outros, que não são ou pelo menos não deveriam ser de interesse e conhecimento público.
A privacidade também se encontra disposta na Constituição Federal no rol dos direitos fundamentais, artigo 5°, inciso X, expressa da seguinte forma: “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.
Finalizaremos abordando o princípio da neutralidade da rede. Entende-se deste princípio que o provedor de conexão à internet não pode interferir no conteúdo que o usuário deseja acessar, seja ele de cunho político, religioso ou qualquer outro, ou seja, precisa haver um tratamento isonômico do tráfego de dados sem distinção de conteúdo.
Sem a proteção da neutralidade, estaríamos passíveis de análise e discriminação do conteúdo acessado pelo usuário, degradação do andamento de serviços, e até limitação e entreve de determinados conteúdos por parte dos provedores.
A lei do Marco Civil da Internet em seu artigo 2° aduz que o uso da internet no Brasil tem como fundamento a liberdade de expressão.
Art. 2º A disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão, bem como:
I - o reconhecimento da escala mundial da rede;
II - os direitos humanos, o desenvolvimento da personalidade e o exercício da cidadania em meios digitais;
III - a pluralidade e a diversidade; IV - a abertura e a colaboração;
V - a livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor; e
VI - a finalidade social da rede.
A Constituição Federal de 1988 dispõe expressamente sobre a liberdade de expressão, liberdade de informação, liberdade de imprensa e a manifestação do pensamento:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: IV – é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;
IX – é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica ou de comunicação, independente de censura ou licença;
XIV – é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional;
Art. 220. A manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição. § 1º Nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e
XIV. § 2ª É vedada toda e qualquer censura de natureza política, ideológica e artística.
Para o Autor Jonh Rawls a liberdade é algo básico ao ser humano, vejamos:
“São liberdades básicas dos seres humanos: liberdade política (direito ao voto e a um cargo público), liberdades de pensamento, consciência, expressão, associação, reunião, profissão, direito de ir e vir; proteção contra agressão física, opressão psicológica, apreensão e detenção arbitrárias; direito à propriedade. Estas são as mais importantes, nas quais todos os seres humanos têm um interesse fundamental.” (RAWLS, 2009 apud SMITH, 1971/1999).
Quanto à opção de dar à liberdade de expressão uma posição preferencial, Ingo Sarlet sustenta que:
Por mais que se seja simpático também a tal linha de entendimento, a atribuição de uma função preferencial à liberdade de expressão não parece, salvo melhor juízo, compatível com as peculiaridades do direito constitucional positivo brasileiro, que, neste particular, diverge em muito do norte-americano e mesmo do inglês. Aliás, o nosso sistema, nesse domínio, está muito mais afinado com o da Alemanha, onde a liberdade de expressão não assume uma prévia posição preferencial na arquitetura dos direitos fundamentais. Mesmo uma interpretação necessariamente amiga da liberdade de expressão (indispensável num ambiente democrático) não poderia descurar o fato de que a CF expressamente assegura a inviolabilidade dos direitos à privacidade, intimidade, honra e imagem (artigo 5º, inciso X), além de assegurar expressamente um direito fundamental à indenização em caso de sua violação e consagrar já no texto constitucional o direito de resposta proporcional ao agravo. Importa sublinhar, ainda no contexto, que a vedação de toda e qualquer censura por si só não tem o condão de atribuir à liberdade de expressão a referida posição preferencial. (SARLET 2015, p.4)
Como muito bem delineado pelo Ministro Luís Roberto Barroso do Supremo Tribunal Federal:
As liberdades de expressão, informação e imprensa são pressupostos para o funcionamento dos regimes democráticos, que dependem da existência de um mercado de livre circulação de fatos, ideias e opiniões. Existe interesse público no seu exercício, independentemente da qualidade do conteúdo que esteja sendo veiculado. Por essa razão, elas são tratadas como liberdades preferenciais em diferentes partes do mundo, em um bom paradigma a ser seguido.
Por todo exposto podemos verificar que a liberdade de expressão trata-se de um princípio constitucional, assim sendo a lei do Marco Civil abordou tal princípio com objetivo de demonstrar tamanha é sua importância para as relações sociais.
Nos tempos atuais, o desenvolvimento tecnológico está em um ritmo muito acelerado, desta forma necessita de uma normatização específica para regulamentação de seu uso, garantindo assim que os direitos dos cidadãos não sejam violados.
Agora discorreremos sobre o instituto da honra. Trata-se de um direito diretamente protegido pela Constituição Federal, tamanha é sua importância nas relações humanas. O Artigo 5°, inciso X da CF/88 dispõe sobre tal direito. Vejamos:
Art. 5º(...)
X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
No ordenamento jurídico existe uma grande preocupação em preservar a honra e a imagem do indivíduo na sociedade,garantindo sua reparação quando maculadas ou indenizadas quando impossível for a restituição ao status quo ante, ou seja, a norma sustenta a reparação da ordem jurídica lesionada, seja ela por meio de uma indenização pecuniária, seja por outros meios satisfatórios como por exemplo o direito de resposta. Sobre a honra, MORAIS (2010, p.51), afirma que “a abrangência desse direito fundamental é ampla, aplicando-se em relação a todas as ofensas, configurem ou não infrações penais”.
Vejamos o conceito de honra para SILVA (2010, p. 209): “A honra é o conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa, o respeito dos concidadãos, o bom nome, a reputação”.
O Pacto de São José da Costa Rica (Convenção Interamericana de Direitos Humanos), vigente em nosso país, reconhece a proteção à honra no art. 11, dispondo que “toda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade”.
A honra é um atributo inerente à personalidade cujo respeito à sua essência reflete a observância do princípio da dignidade da pessoa humana.
Os doutrinadores Nelson Rosenvald e Cristiano Farias (2008, p. 149.) conceituam a honra como: “a soma dos conceitos positivos que cada pessoa goza na vida em sociedade”.
Como visto a honra trata se de sentimento de dignidade própria de apreço social, reputação e boa fama de cada indivíduo. Sendo assim o instituto da honra tutela o comportamento e a reputação das pessoas em sociedade.
Há inúmeras maneiras de um indivíduo ter a sua privacidade violada. Na era digital e das redes sociais, o ambiente virtual tem se tornado um lugar propício para muitos desses casos. Por exemplo, o cyberbullying, o vazamento de fotos privadas, dados pessoais ou e-mails é uma forma de violação da intimidade, privacidade, imagem ou honra das pessoas. Publicar fotos privadas por vingança está se tornando cada vez mais comum em ambientes virtuais e é um exemplo clássico de violação de privacidade e imagem.
A Constituição Federal em seu artigo 5° trata dos direitos fundamentais, este é um dos artigos mais importantes, visto que assegura a todos os cidadãos do país uma vida digna, livre e igualitária. Neste tópico vamos dar um destaque maior ao inciso X, que discorre a respeito da inviolabilidade da intimidade, da privacidade, da honra e da imagem. Vejamos o que dispõe o inciso X, do artigo 5°, da CF/88: “X – são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.”
Como disposto, o inciso X tem um escopo de proteção à intimidade, à privacidade, à honra e a imagem de cada cidadão, assegurando que eles tenham o direito de serem indenizados por quaisquer perdas causadas pela violação desses direitos.
Para Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, o conceito de direito à privacidade se define da seguinte forma:
A faculdade que tem cada indivíduo de obstar a intromissão de estranhos em sua vida privada e familiar, assim como de impedir-lhes o acesso a informações sobre a privacidade de cada um, e também impedir que sejam divulgadas informações sobre esta área da manifestação existencial do ser humano. (BASTOS; MARTINS 1989, página 63.)
A vida privada trata da relação de cada indivíduo com a sociedade de forma ampla. Dentro da esfera da privacidade vamos de encontro a intimidade que tem uma amplitude menor, e muito embora esses termos estejam relacionados, eles fazem alusão a campos sociais diferentes, a intimidade tem relação com o círculo mais próximo de um indivíduo, como por exemplo as relações mantidas com familiares, já a privacidade faz menção a todas as relações não públicas, mesmo não sendo tão próximas como a relação familiar.
Podemos dizer que o inciso X, da CF/88 visa evitar que estranhos invadam a vida privada e familiar de qualquer pessoa, restringindo assim o compartilhamento de informações pessoais e privadas sem o seu consentimento.
Diante do exposto, cabe salientar que quando a intimidade, privacidade, reputação ou imagem de um indivíduo é violada, é possível pleitear indenização pelos danos morais e materiais sofridos, por meio de procedimentos judiciais. Para tanto além da proteção conferida pelo artigo 5° da Constituição em seu inciso X, o indivíduo pode alicerçar o pedido com outras leis vigentes, como o Código Civil que dispõe:
Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma.
Conclui-se que a inviolabilidade da privacidade é direito fundamental, sendo protegido em esfera constitucional e infraconstitucional, sendo sua violação resultante em indenização por danos morais e materiais decorrentes da conduta violadora.
Vivemos em um mundo de constantes mudanças, isso porque a vida em sociedade com pessoas diversificadas proporciona tal dinamismo. Com o passar dos anos chegam com cada vez mais força as mudanças tecnológicas que proporcionam um novo ambiente de relacionamentos, trabalho, estudos e notícias. Extrai-se deste meio, a finalidade do referido artigo, o acesso a internet e os danos provenientes dela.
O Marco Civil da Internet veio para revolucionar o mundo virtual, atuando de forma a proteger e garantir que princípios fundamentais não sejam violados. Ocorre que mesmo com a existência de tal lei é comum nos depararmos com crimes oriundos do ambiente virtual, que causam a vida do indivíduo atingido, consequências irreparáveis que podem resultar em danos psicológicos e/ou materiais, como por exemplo a propagação de uma foto íntima nas redes, que causa um situação totalmente vexatória a vítima.
Na ocorrência do dano moral, é imprescindível que o causador do dano seja responsabilizado pelo ato ofensivo, assim como todos aqueles que contribuíram para a ocorrência de tal fato. Deste modo, a legislação, acompanhando os avanços tecnológicos, criou leis específicas capazes de punir os infratores na medida de suas responsabilidades, de modo a reparar o dano.
O instituto da Responsabilidade Civil visa punir os causadores de atos ilícitos. Nesta linha de pensamento o dano moral ganhou espaço, com os avanços do mundo virtual, as condutas que motivam a violação de um direito, alcança e fomenta a tutela do Estado que visa cada vez mais, prevenir ou reparar o dano.
O propósito da pesquisa é salientar que o ambiente virtual é regido por normas e regras contrárias à violação da intimidade e da vida privada de cada cidadão, que por muito tempo teve seus direitos violados sem poder recorrer a uma legislação própria da internet para sanar os conflitos. Isso não quer dizer que a jurisdição se afastava da apreciação dessas causas, mas sim que não havia uma unicidade na jurisprudência a respeito do assunto.
A legislação fechou as lacunas oriundas da precariedade de normas regulamentadoras de danos causado nas redes, objetivando maior controle social, que trouxe benefícios imensuráveis para a sociedade, assegurando inviolabilidade dos princípios, além de uma vida digna e saudável, dando amparo a tudo o que ela abrange, garantindo a justiça e o equilíbrio da sociedade.
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[1] Advogado, mestre em direito privado com especialização latu senso em direito processual. Atuação nas áreas cível, empresarial, contratos e responsabilidade civil, com experiência na coordenação de equipes para atuação em processos de massa.
Bacharelanda em Direito pela Instituição de ensino Centro Universitário UNA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Grasiane Maria Serra Da. Acesso a internet: violação da intimidade e da vida privada e sua responsabilidade civil. análise a partir do inciso i, artigo 7°, do marco civil da internet Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jun 2021, 04:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56803/acesso-a-internet-violao-da-intimidade-e-da-vida-privada-e-sua-responsabilidade-civil-anlise-a-partir-do-inciso-i-artigo-7-do-marco-civil-da-internet. Acesso em: 23 dez 2024.
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