Resumo: A modernização da agricultura exigida pela globalização tem causado graves danos aos ecossistemas e prejudicado as condições de vida na Terra. As consequências da adoção de técnicas produtivas de monocultura e o uso excessivo de agrotóxicos exigem a superação do atual paradigma do desenvolvimento econômico. O objetivo deste artigo é apontar que, para promoverem um efetivo Estado de Direito Ecológico, os processos agrícolas precisam respeitar os limites dos recursos naturais e a cultura tradicional dos povos. O problema elaborado aponta a insuficiência dos programas governamentais adotados até o presente momento para incentivar as práticas de restauração e proteção dos ecossistemas e garantir os direitos básicos necessários ao pleno desenvolvimento humano. A hipótese apresentada indica que a agroecologia constitui importante instrumento de promoção da nova ética na busca pela sustentabilidade. A pesquisa doutrinária, legislativa e a análise empírica dos programas de governo nacionais e internacionais sobre o tema são a base metodológica adotada no trabalho, observadas as publicações oficiais de organismos com o Ministério do Meio Ambiente e a Organização das Nações Unidas, bem como a interdisciplinaridade das fontes de pesquisa a partir de conceitos advindos de obras de diversas áreas do direito, além de obras não necessariamente jurídicas.
Palavras-chave: Agroecologia. Transição. Sustentabilidade. Políticas Públicas.
Abstract: The modernization of agriculture required by globalization has caused serious damage to ecosystems and harmed living conditions on Earth. The consequences of adopting monoculture production techniques and the excessive use of pesticides require overcoming the current economic development paradigm. The purpose of this article is to point out that, in order to promote an effective Ecological Rule of Law, agricultural processes need to respect the limits of natural resources and the traditional culture of peoples. The problem elaborated points to the insufficiency of the governmental programs adopted so far to encourage the practices of restoration and protection of ecosystems and guarantee the basic rights necessary for full human development. The hypothesis presented indicates that agroecology is an important tool for promoting the new ethics in the search for sustainability. Doctrinal, legislative research and empirical analysis of national and international government programs on the subject are the methodological basis adopted in the work, observing the official publications of bodies such as the Ministry of Environment and the United Nations, as well as interdisciplinarity of research sources from concepts arising from works from different areas of law, in addition to works that are not necessarily legal.
Keywords: Agroecology. Transition. Sustainability. Public policy.
Sumário: Introdução. 1. O caminho para a construção do Estado de Direito Ecológico. 1.1. A dimensão ecológica da dignidade humana. 1.2. A necessária superação do paradigma civilista: uma busca pela sustentabilidade. 2. Agroecologia: reflexões sobre uma nova ética. 2.1. Transição agroecológica: conceitos e elementos fundamentais. 2.2. A regulamentação da agroecologia no ordenamento jurídico brasileiro. 3. A Década das Nações Unidas da Restauração dos Ecossistemas. 3.1. Estratégias agroecológicas no âmbito das Nações Unidas. 3.2. PANORAMA: soluções governamentais para ecossistemas degradados. Conclusões. Referências.
Introdução
A crise ambiental planetária que se vive demonstra que fatores como a globalização e o crescimento populacional desenfreado desencadearam a industrialização dos processos agrícolas e tornaram insustentável o modo de produção baseado no uso excessivo da terra e de agrotóxicos. O resultado alcançado, fruto do investimento no desenvolvimento econômico e da ausência de políticas públicas voltadas à agricultura sustentável, fez surgir a noção de agroecologia. Essa nova ética fundamenta uma mudança de paradigma que exige a atuação solidária entre Estado e sociedade para romper com o modelo de produção reducionista e recuperar a cultura das populações locais capazes de restaurar e preservar a natureza.
Embora o direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado seja consagrado no Brasil como uma condição básica ao pleno desenvolvimento humano e constitua o fundamento do Estado de Direito Ecológico, mecanismos estatais que o garantam precisam ser efetivados. Como proposta de solução ao problema apontado, a agroecologia se desenvolve na busca por um desenvolvimento social, cultural, econômico e ambiental integrado, em respeito as condições da natureza como um todo. O presente estudo foi elaborado com o objetivo de evidenciar que o incentivo à implementação de processos agrícolas sustentáveis é importante não apenas porque fornece elementos à construção de um efetivo Estado de Direito Ecológico, mas por promover estratégias reconhecidas mundialmente como adequadas a restaurar os ecossistemas e, consequentemente, salvar as condições de vida na Terra.
Para tanto, o artigo utilizou o método de abordagem dedutivo, a partir de pesquisa doutrinária, legislativa e da análise empírica de programas nacionais e internacionais de governo. Inicialmente, subdivide a apresentação do caminho para a construção do Estado de Direito Ecológico entre o reconhecimento da dimensão ecológica da dignidade humana (1.1) e a necessária superação do paradigma civilista por uma visão mais sustentável (1.2). O segundo capítulo aborda a importância da transição agroecológica por meio da definição de conceitos e elementos centrais (2.1) e a regulamentação do tema na legislação brasileira (2.2). Por fim, o terceiro capítulo é dedicado às estratégias agroecológicas da Década das Nações Unidas da Restauração dos Ecossistemas (3.1) e a alguns programas governamentais já existentes para recuperar a degradação ambiental (3.2).
1. O caminho para a construção do Estado de Direito Ecológico
Os direitos humanos são reconhecidos nos sistemas jurídicos nacional e internacional conforme surgem exigências sociais em cada momento histórico. São classicamente considerados como direitos subjetivos de ordem pública, básicos e essenciais à vida humana, e que, quando positivados pelo Estado em uma ordem constitucional, passam a ser chamados de direitos fundamentais. Para Luigi Ferrajoli, eles são “um fator essencial e um motor essencial de crescimento, não apenas civil, mas também econômico”, que legitimam o ordenamento jurídico estatal e exigem a criação de normas de funcionamento que introduzam a nível nacional garantias primárias (2020, p. 55).
A doutrina tradicional os classifica por dimensões: a primeira surgiu com o reconhecimento de direitos civis e políticos através dos quais o ser humano passou a exigir seu próprio espaço e limitar a atuação estatal; a segunda reconheceu direitos sociais, econômicos e culturais, os quais passaram a exigir uma ação do Estado para alcançar o bem comum (DE PAULA, 2006, p. 40-43). Cada uma delas fundamentou, respectivamente, o Estado Democrático de Direito e o Estado Social de Direito. A terceira dimensão e a atenção dada a ela no direito brasileiro serão objeto de análise no subcapítulo seguinte.
1.1. A dimensão ecológica da dignidade humana
Os direitos fundamentais de terceira dimensão surgiram em 1979, no Instituto Internacional de Direitos do Homem, e consagraram os chamados direitos de solidariedade. O Supremo Tribunal Federal os definiu como direitos que materializam “poderes de titularidade coletiva atribuídos genericamente a todas as formações sociais”, dentre os quais está incluído o direito a um meio ambiente ecologicamente equilibrado (1995).
A solidariedade é um objetivo fundamental da República Federativa do Brasil (CF, art. 3º, I) e apresenta natureza jurídica tanto de direito fundamental quanto de princípio que rege a sociedade moderna. Em qualquer das suas formas, dá ensejo não só à preservação do indivíduo, mas também à sua integração ao meio em que vive e à manutenção da própria sociedade (REMEDIO, 2016, p. 247). Nesse sentido, orienta o Poder Público a promover políticas intencionadas a reduzir as desigualdades sociais na maior medida possível e a garantir condições ambientais adequadas ao pleno desenvolvimento das pessoas.
O reconhecimento do direito ao meio ambiente surgiu na Declaração de Estocolmo, cujo primeiro princípio garantiu ao homem viver “em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras” (ONU, 1972). Trata-se, como é possível observar, de um direito tão amplo que alcança todas as questões que envolvem a vida saudável na Terra e determina uma solidariedade intergeracional que atenda as necessidades atuais, sem prejudicar as que surgirão com o passar do tempo.
Na esfera infraconstitucional, a Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela Lei nº 6.938/81, definiu a participação social como condição essencial à proteção ambiental (art. 2º) e serviu como fundamento para que, posteriormente, outros países também o fizessem. A norma conceituou pioneiramente o meio ambiente como “o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas” (PNMA, art. 3º).
Com o advento da Constituição Federal de 1988, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado foi consagrado como “bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida”, sendo dever irrefutável do Poder Público e da coletividade protegê-lo (art. 225). Embora de projeção inicial antropocêntrica, a simples leitura do texto constitucional demonstra o reconhecimento de que o desenvolvimento econômico, social e ambiental precisa ocorrer de forma integrada.
A partir desse conceito, José Canotilho identificou a dupla natureza jurídica do direito ao meio ambiente: é um direito subjetivo da personalidade, em razão de a sua manutenção ecologicamente equilibrada ser condição ao pleno desenvolvimento da pessoa humana e garantir aos indivíduos pleitear o direito de defesa contra atos lesivos; e um elemento fundamental da ordem objetiva, diante das incumbências indeclináveis do Estado com vista à consecução da equidade ambiental (1995, p. 18-19).
O reconhecimento de que o meio ambiente é a base para a completa fruição dos direitos básicos dos seres humanos, os quais são fundamentais para a garantia da proteção ecossistêmica, revela uma relação direta e complementar entre esses direitos e garantias que evidencia a intenção da Lei Fundamental de promover o desenvolvimento sustentável. Márcia Bertoldi acrescenta que o meio ambiente ecologicamente equilibrado, compreendido como um direito de todos, assume não apenas uma garantia de vida saudável aos cidadãos e um desenvolvimento sustentável, mas efetiva o “direito do próprio ambiente em possuir condições de renovar continuamente seus recursos e manter íntegras todas as complexas conexões que interligam desde os microorganismos até a espécie humana” (2019, p. 249).
Na época da publicação do texto constitucional brasileiro, ressalvadas raras exceções Europeias, as constituições ainda não defendiam qualquer forma de proteção ambiental e foi a partir de então que os demais países iniciaram o processo gradual de constitucionalização do tema. A iniciativa de incentivo a que todas as esferas de governo (federal, estadual e municipal) desenvolvessem políticas públicas dedicadas a garantir a integridade ecológica adequada a assegurar os direitos básicos de desenvolvimento humano e ecossistêmico tornou-se um exemplo mundial.
Com uma visão mais atual a respeito da proteção ambiental no ordenamento jurídico nacional, Ingo Sarlet e Tiago Fensterseifer ensinam que a “forma simultânea de um objetivo e tarefa estatal e de um direito (e dever) fundamental do indivíduo e da coletividade” implica a criação de “um complexo de direitos e deveres fundamentais de cunho ecológico” (2017, p. 417). Constitucionalizar a matéria, segundo Andreas Krell, além de vetar ao poder estatal tomar medidas que diminuam o nível de proteção ambiental já alcançado, em evidente proibição do retrocesso, garante ao cidadão um mínimo existencial ecológico (2017, p. 49-50).
De acordo com o Ministro Ricardo Lewandowski
“o mínimo existencial é aquele conjunto de bens materiais e imateriais sem o qual uma pessoa não pode levar uma vida digna e esta inclui, evidentemente, um meio ambiente hígido, condição sine qua non, registre-se, para viabilizar a própria continuidade da vida dos seres humanos na Terra” (2018).
Em outras palavras, ao reconhecer a necessidade de que condições materiais sejam garantidas para que as pessoas alcancem uma vida saudável e determinar a definição de parâmetros mínimos de cuidados com o meio ambiente, a Constituição Federal de 1988 consagrou uma dimensão ecológica da dignidade humana. Dito isto, no subcapítulo seguinte será analisada a mudança de paradigma necessária à construção de um efeito Estado de Direito Ecológico de acordo com os conceitos estudados até aqui.
1.2. A necessária superação do paradigma civilista: uma busca pela sustentabilidade
O Superior Tribunal de Justiça, além de reconhecer expressamente a dimensão ecológica da dignidade humana, vincula a ela o princípio da solidariedade para determinar a integração axiológica da garantia ao meio ambiente ecologicamente equilibrado ao ordenamento jurídico brasileiro e impor que as normas de preservação respeitem a teleologia constitucional de forma sistêmica e harmônica (2019). Com isso, entende-se que um modelo estatal que promova a proteção ambiental e o pleno desfrute da dignidade humana deve levar em consideração aspectos ecológicos e sociais de forma conjunta.
Condições saudáveis de vida humana, de acordo com Tiago Fensterseifer
“só são possíveis dentro dos padrões mínimos exigidos constitucionalmente para o desenvolvimento pleno da existência humana, num ambiente natural onde haja qualidade ambiental da água que se bebe, dos alimentos que se comem, do solo onde se planta, do ar que se respira, da paisagem que se vê, do patrimônio histórico e cultural que se contempla, do som que se escuta, entre outras manifestações da dimensão ambiental” (2008, p. 61).
Como visto no subcapítulo anterior, essas necessidades básicas serão garantidas por meio do desenvolvimento de novas políticas públicas sustentáveis e pela efetiva implementação das já existentes. Para tanto, é indispensável a solidariedade entre a prestação estatal de proteção do meio ambiente e a abstenção de práticas ambientais degradantes por parte da sociedade. Essa visão mais sustentável e sensível em relação à saúde das pessoas, à expectativa das futuras gerações e à manutenção das funções ecológicas substitui o velho paradigma civilista de desenvolvimento econômico (POPE, 2017, p. 323).
A nova dimensão deve ultrapassar o antropocentrismo do Estado de Direito para garantir que as invasões, deteriorações e destruições da natureza sejam protegidas na mesma medida em que são protegidos os cidadãos, considerados os interesses e objetivos conflitantes (BUGGE, 2013, p. 7). Essa reconstrução das bases da estrutura estatal, a partir da imposição de limites às liberdades individuais para que seja preservada a natureza, acrescenta à concepção clássica de Estado o elemento ambiente – tradicionalmente formada por soberania, território e povo – e fundamenta o Estado de Direito Ecológico.
A teoria jurídica alemã estabeleceu o conceito de Estado Eco-constitucional como aquele que determina ao Poder Público promover o equilíbrio dos ecossistemas entre todos os interesses de vida, observando o princípio da sustentabilidade e respeitando os limites da Terra (BOSSELMANN, 2013, p. 4-9). Embora essa não seja uma definição estática, porque se aperfeiçoa conforme surgem novas exigências políticas, sociais e jurídicas, ela garante a extensão de uma responsabilidade, anteriormente restrita aos direitos civis, aos direitos do meio ambiente.
Na prática, o Estado de Direito Ecológico brasileiro ainda constitui uma espécie de ideologia que serve para incentivar o Poder Público e a sociedade a alcançar as metas necessárias à superação do paradigma civilista atual. O valor de um Estado cujo fundamento seja a sustentabilidade está, segundo a lição de Morato Leite e Heline Ferreira, na força da construção teórica “que se projeta no mundo real ainda como devir” para explorar “outras possibilidades que se apartam da realidade para compor novas combinações daquilo que existe” (2012, p. 22).
A definição do marco legal-constitucional socioambiental é importante para proteger e promover, de forma integrada e interdependente, direitos sociais e ambientais como parte do mesmo projeto político dedicado ao desenvolvimento humano a partir do conceito de sustentabilidade (SARLET; FENSTERSEIFER, 2011). No entanto, desafios como as reduzidas e pouco eficazes estratégias governamentais para a proteção da natureza e a prevalência dos interesses econômicos sobre os ecossistêmicos precisam ser enfrentados para que o Estado de Direito Ecológico se afaste da utopia e se torne real.
2. Agroecologia: reflexões sobre uma nova ética
Os estudos realizados pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente apontam que o atendimento de demandas – como a globalização e o crescimento populacional – exige a modernização da agricultura e afeta diretamente os bens e recursos ambientais da América Latina (2015). No Brasil, desde que o comércio de insumos químicos foi liberado pelo Plano Nacional de Desenvolvimento (1975), a diversidade natural passou a ser substituída pela tecnologia. Além disso, a utilização de técnicas de monocultura, através das quais a matéria-prima é extraída do ecossistema de forma manufaturada a partir de critérios de padronização adotados entre transnacionais e governos para exportação, causa graves impactos socioambientais e prejudica as condições de vida na natureza como um todo.
Diante da necessidade do rompimento com o modo de produção vigente, a agroecologia surge como um importante instrumento de substituição do paradigma do crescimento econômico por um modelo de desenvolvimento ecologicamente sustentável. O estudo da nova ética será desenvolvido neste capítulo para demonstrar que, ao adotar a proteção ambiental como estratégia produtiva adequada a proporcionar uma melhor qualidade de vida a todos os seres ecossistêmicos, a ciência jurídica ultrapassa os antigos padrões responsáveis por considerar o meio ambiente como um entrave econômico. Para tanto, inicialmente serão apresentados os conceitos e elementos centrais sobre a transição agroecológica (2.1) e, em uma segunda etapa, será analisada a regulamentação da matéria no ordenamento jurídico brasileiro (2.2).
2.1. Transição agroecológica: conceitos e elementos fundamentais
A agroecologia, segundo Miguel Altieri, é uma ciência que integra as dimensões ecológica, social e cultural, e avalia o efeito das tecnologias utilizadas nos sistemas agrícolas sobre a sociedade como um todo (2004, p. 23). Trata-se de processo caracterizado por uma agricultura que respeita a diversidade dos recursos naturais, retoma os saberes dos povos colocados à margem do sistema econômico e, consequentemente, rompe com o modelo anterior de desenvolvimento. Orienta-se na busca pela sustentabilidade, identificada no capítulo anterior como o fundamento do Estado Ecológico de Direito, e faz dela uma meta global a ser atingida na maior medida possível.
Paulo Cruz e Gabriel Ferrer defendem a flexibilidade como uma característica essencial da sustentabilidade, na medida em que permite que cada processo identifique e opte, “dependendo dos casos, por globalizar ou desglobalizar, crescer ou decrescer, desenvolver ou regredir, conservar ou transformar” (2015, p. 243). Alcançar a meta depende, para Miguel Altieri, de respeitar os conhecimentos que nutrem a cultura dos produtores, uma vez que fornecem informações relevantes a serem “utilizadas no desenvolvimento de estratégias agrícolas apropriadas, adequadas às necessidades, preferências e base de recursos de grupos específicos de agricultores e agroecossistemas regionais” (2004, p. 26).
O paradigma de conhecimento agroecológico, segundo Shiva, é um instrumento que remodela as formas pelas quais a humanidade compreende as questões relacionadas com agricultura e segurança alimentar em benefício da produção local e da cultura tradicional, especialmente das mulheres (2016, p. 16). A transição para este modelo determina a utilização de recursos naturais já existentes, de acordo com suas possibilidades, para definir estratégias que levem em consideração a capacidade produtiva do ambiente como um todo.
Nas palavras de Felipe Wienke, a transição agroecológica representa a
“alteração de um modelo de produção agrícola incompatível com a manutenção da sadia qualidade de vida, rumo a uma nova sistemática produtiva que incorpore práticas justas socialmente, ambientalmente e culturalmente” (2018, p. 224).
Além disso, o respeito à capacidade de regeneração e reprodução de cada ecossistema é requisito essencial para alcançar um novo paradigma que tenha como objetivo alcançar um “desenvolvimento socialmente justo, economicamente eficaz e ecologicamente comprometido” que respeite as capacidades de regeneração e reprodução de cada ecossistema (BRAUNER; GOMES, 2019, p. 49).
Para fazer parte do mundo real, essa transição depende da criação, aprovação e inserção de políticas agroecológicas que incentivem o setor econômico a promover o equilíbrio dos ecossistemas e estimulem a diversificação do sistema produtivo. Processos manufaturados artesanalmente pelas comunidades locais e integrados com o meio ambiente necessitam ser fomentados, a fim de que pequenos e médios agricultores consigam alcançar a qualidade produtiva necessária, para ingressar em redes locais de distribuição e consumo que precisam ser criadas.
Conforme destacado no subcapítulo 1.1, a solidariedade é essencial a qualquer mudança estrutural que se pretenda promover. Por isso, alterar todo o sistema de produção agrícola exige não apenas prestações estatais positivas, mas comportamentos sociais que, além de cessarem práticas ambientalmente nocivas, recriem os padrões de consumo a partir dos pilares da nova ética. Cabe aos setores público e privado formular um sistema produtivo e econômico sustentável, que torne a agricultura familiar mais rentável aos produtores, acessível aos consumidores e benéfica à saúde de todos os seres ecossistêmicos.
Ainda que o sistema jurídico nacional disponha de instrumentos capazes de intensificar a proteção ambiental e a restauração dos organismos degradados, caso sejam utilizados adequadamente pelo Poder Público, novas e complementares estratégias são necessárias para que seja implementada, de fato, a transição agroecológica. Feitas essas considerações, o subcapítulo seguinte analisará a atenção que a legislação brasileira concede aos processos agrícolas sustentáveis e as políticas públicas disponíveis, até o presente momento, para instrumentalizar a mudança de paradigma.
2.2. A regulamentação da agroecologia no ordenamento jurídico brasileiro
Há mais de três décadas surgiram no Brasil as primeiras políticas públicas voltadas à agricultura familiar, mas ela só foi adotada como estratégia de promoção da qualidade ambiental e da diversidade cultural no decorrer dos anos 2000 (WIENKE, 2018, p. 229-230). Embora a Lei nº 10.831/03, que dispõe sobre a agricultura orgânica em âmbito nacional, tenha definido princípios, diretrizes e instrumentos jurídicos que atribuíram ao meio ambiente uma visão sistêmica e integrada, o Decreto nº 7.794/12, que instituiu a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica foi o primeiro instrumento a fomentar a transição agroecológica no País, conceituando-a como
“processo gradual de mudança de práticas e de manejo de agroecossistemas, tradicionais ou convencionais, por meio da transformação das bases produtivas e sociais do uso da terra e dos recursos naturais, que levem a sistemas de agricultura que incorporem princípios e tecnologias de base ecológica” (PNAPO, art. 2º, IV).
A norma determinou a criação de um Plano Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica, conhecido como Brasil Ecológico, a ser desenvolvido em dois ciclos: o primeiro teve como principais objetivos ampliar o número de agricultores envolvidos com a produção orgânica, fomentar a conservação, o manejo e o uso sustentável dos recursos naturais e democratizar o conhecimento agroecológico (PLANAPO 2013-2015); o segundo foi lançado para dar continuidade e aperfeiçoamento ao anterior, a partir das mesmas bases, com a meta de desenvolver programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica de base agroecológica (PLANAPO 2016-2019)[1].
Em que pese as medidas planejadas pareçam adequadas, os números da agroecologia no Brasil não são capazes de romper com o modelo de produção reducionista atual. Observada a área agricultável informada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE no Censo Agropecuário de 2017 de 351.289.186 hectares, verifica-se que o País destina apenas 0,36% à agricultura orgânica (2017, p.61) e ocupa o décimo segundo lugar mundial em áreas dedicadas ao setor, com 1.283.054 hectares (IFOAM; FiBL, 2019, p. 41).
As políticas públicas ambientais brasileiras são promissoras especialmente porque desenvolvidas de forma associada à Política Nacional do Meio Ambiente, como os exemplos das políticas que tratam dos recursos hídricos, resíduos sólidos, desenvolvimento urbano e até mesmo a recente Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais. No entanto, resultados efetivos de transição agroecológica dependem de fatores complementares às suas simples instituições.
Sobre o tema, cumpre destacar que a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, instituída pela Lei nº 14.119/21, é extremamente bem-vinda e estabelece um marco legal importante de valorização dos ecossistemas por meio da regulação da relação entre a atuação humana e os ecossistemas. Estabelece um mecanismo de monetização da natureza orientado a remunerar os produtores que voluntariamente preservem e recuperem os recursos naturais e abandonem a utilização de técnicas agrícolas degradantes.
A norma foi elaborada na busca por mitigar as consequências negativas das ações antrópicas que tenham como objetivo principal a utilização de recursos naturais. Para tanto, definiu objetivos, diretrizes, modalidades e criou o Programa Federal de Pagamento por Serviços Ambientais destinado a oferecer remuneração em troca das atividades dos setores público e privado que promovam o desenvolvimento sustentável.
Entretanto, ainda que tenha dado especial atenção às comunidades locais com vistas a proteger as propriedades rurais de pequena produção, depende da adequada regulamentação administrativa para revalorizar efetivamente a cultura tradicional, a sociedade e a economia. Caso contrário, poderá acarretar o aumento da desigualdade entre o modo de produção intensivo e o modelo agroecológico, privilegiando a produção agrícola em vigor.
Além da implementação adequada das políticas ambientais já existentes, medidas públicas complementares precisam ser incrementadas para garantir a sustentabilidade dos modos de produção e, consequentemente, instrumentalizar a mudança de paradigma. A partir da análise do tema no âmbito nacional, o capítulo seguinte propõe uma abordagem acerca do incentivo à agroecologia no âmbito da Organização das Nações Unidas como instrumento de proteção e recuperação dos ecossistemas.
3. A Década das Nações Unidas da Restauração dos Ecossistemas
O estudo realizado no capítulo 1 demonstra o reconhecimento de uma dimensão ecológica à dignidade humana decorrente da identificação da proteção ambiental como a base para a completa fruição dos direitos humanos e neles o fundamento da própria restauração e manutenção da natureza. Para efetivar essa garantia primária de condições de vidas ecossistêmicas, a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável forneceu um plano compartilhado para todos os Estados-Membros das Nações Unidas, através do qual foram definidos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS dedicados a orientar políticas nacionais e ações de cooperação internacional (ONU, 2015).
Embora a natureza sustente toda a vida na Terra e a saúde de todos os seres vivos que a habitam esteja diretamente vinculada à sua preservação, dados recentemente divulgados pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente alertam sobre a eminência de uma catástrofe. Como proposta de solução à crise ambiental instaurada em nível global, a ONU lançou a Década da Restauração dos Ecossistemas, cujas metas atribuem importante papel aos meios de produção agrícola: promover a sustentabilidade. As estratégias agroecológicas definidas para salvar o planeta serão abordadas inicialmente neste capítulo (3.1), seguidas da identificação de programas governamentais que já alcançaram êxito ao aderir à nova ética (3.2).
3.1. Estratégias agroecológicas no âmbito das Nações Unidas
Em 2020, a Organização de Alimentos e Agricultura das Nações Unidas publicou um estudo que revelou que, embora a América Latina seja uma das maiores produtoras de alimentos do mundo e reúna os países mais ricos em biodiversidade, a fome afetou 47,7 milhões de seus habitantes em 2019 e o Objetivo do Desenvolvimento Sustentável referente à fome zero não será alcançado[2]. A situação ficou ainda mais grave após a divulgação de um relatório no Dia Mundial da Biodiversidade ter revelado que, se nada for feito para corrigir o caminho que vem sendo percorrido pela humanidade, os Estados-Membros não alcançarão os demais objetivos da Agenda 2030 (PNUMA; CDB, 2021).
Apesar de registrar progressos em algumas áreas, como água limpa, saneamento, energia limpa e manejo florestal, o estudo apontou como insustentável a forma que o mundo ainda vive e registrou o aumento da perda da biodiversidade e das mudanças climáticas. Com a indicação desses retrocessos, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente reconheceu a importância da produção de dados e de indicadores qualificados para garantir o progresso do desenvolvimento de uma forma mais simples e, no dia 05/06/2021, em parceria com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura, lançou a Década das Nações Unidas da Restauração de Ecossistemas.
O objetivo desse movimento global é prevenir, interromper e reverter a degradação dos ecossistemas em todos os continentes e oceanos. O termo final para que seja cumprido coincide com o prazo para que sejam alcançados os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável: 2030. A década foi identificada pelos pesquisadores como a última chance para evitar catástrofes globais e o limite para garantir a subsistência das pessoas, combater as mudanças climáticas e deter o colapso da biodiversidade (PNUMA; FAO, 2021).
A fim de orientar com cuidado o desenvolvimento do plano de colocar o mundo no caminho de um futuro sustentável, que permita reviver o meio ambiente e alcançar os ODSs, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura elaboraram um manual que define possíveis abordagens para restaurar os principais tipos de ecossistemas, incluídas as florestas, os campos agrícolas, as pastagens e savanas, os rios e lagos, os oceanos e costas, as vilas e cidades, as turfeiras e montanhas. Ao todo foram elaboradas dez estratégias para que entes públicos e privados executem o processo de restauração da natureza (PNUMA; FAO, 2021).
Ao longo do texto é possível identificar um apelo à transição agroecológica, diante da especial atenção voltada aos modos de produção agrícolas sustentáveis baseados na utilização de recursos locais já existentes e na capacidade dos agricultores, para diversificar o sistema produtivo e promover o equilíbrio dos ecossistemas. As medidas apontam para a essencialidade da adoção de práticas que recuperem a degradação da biodiversidade que assola a Terra.
Além de estabelecer incentivos às práticas de restauração ambiental e determinar a redução dos subsídios que financiam práticas agrícolas prejudiciais ao meio ambiente, o programa fomenta uma mudança de comportamentos sociais no sentido de identificar e valorizar o consumo sustentável, o que inclui desde hábitos alimentares mais saudáveis até a aquisição de produtos baseados em sistemas produtivos agroecológicos. Reconhece a importância de fortalecer as culturas locais, especialmente dos grupos mais prejudicados com a destruição dos ecossistemas, para que, diante do vasto conhecimento que possuem, assumam um papel ativo nesse processo de recuperação.
O estudo apresentado no subcapítulo 2.1 apontou que essas medidas remodelam a relação entre a sociedade e a natureza e instrumentalizam a mudança de paradigma necessária à manutenção das condições de vida de todos os seres ecossistêmicos. Além de destacar que o investimento em preservação ambiental traz mais benefícios do que os custos decorrentes das reparações, o manual dedicou uma parte específica a orientar o uso das terras agrícolas, reconhecidas como tesouros culturais cuja vitalidade está sendo esgotada pelos processos produtivos atuais (2021, p. 16).
A cartilha sugere que os agricultores respeitem a biodiversidade, recuperem espécies nativas, invistam na natureza com a utilização de pestes naturais e fertilizantes orgânicos, evitem o uso de substâncias agrotóxicas e adotem regimes de práticas rurais que, além de restaurar áreas já degradadas, deixem de usar excessivamente a terra. O manual indica, ainda, a plataforma PANORAMA como um recurso que reúne soluções comprovadas para uma gama de ecossistemas com o objetivo de instrumentalizar práticas mais sustentáveis. A ferramenta disponibiliza pesquisas que demonstram resultados positivos a partir da implementação de programas agroecológicos desenvolvidos por parcerias entre setores público e privado, conforme será analisado no subcapítulo seguinte.
3.2. PANORAMA: soluções governamentais para ecossistemas degradados
Em pesquisa publicada por Ingrid Heindorf na plataforma, a Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica brasileira foi identificada como um marco político federal significativo para o avanço da sustentabilidade (PANORAMA, 2019). De acordo com dados fornecidos, as conquistas alcançadas pelo primeiro ciclo do Brasil Ecológico, desenvolvido entre os anos de 2013 e 2015, resultaram no reconhecimento da PLANAPO com o Future Policy Silver Award 2018, concedido pelo Conselho Mundial do Futuro (WFC), em parceria com a FiBL & IFOAM – Organics International, às melhores políticas em agroecologia e sistemas alimentares do mundo.
O estudo desenvolvido no subcapítulo 2.2 permite acreditar que, com a conclusão do segundo ciclo do PLANAPO e com a instituição Plano Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, o País possa alcançar resultados ainda melhores no caminho da superação do atual paradigma de crescimento econômico pelo almejado desenvolvimento sustentável. Na esfera internacional, outra pesquisa relevante aponta que a agricultura desenvolvida mediante processos que respeitam a conservação ecossistêmica traz benefícios tanto para os agricultores quanto para o meio ambiente (ICARDA, 2021).
Isso porque, ao utilizar tecnologias produzidas de acordo com a cultura local, a produtividade da colheita aumenta, a eficiência do uso de recursos melhora e a saúde do solo se mantém. Com isso, o processo produtivo se desenvolve por uma ética oposta à da superexploração que atende à demanda da globalização, uma vez que aumenta a segurança alimentar, preserva os recursos naturais dos agroecossistemas e cria empregos para as populações locais.
Por fim, o estudo traz o testemunho de agricultores que já identificaram exemplos benéficos nessa alteração do sistema produtivo: as máquinas projetadas por agricultores locais produzem rendimentos semelhantes aos alcançados pelas importadas, mas apresentam maior ajustamento de semeadura e uma taxa de germinação mais alta; houve aumento da produtividade e, consequentemente, cresceu o apoio governamental ao setor; os insumos químicos e as cargas de trabalho dos agricultores foram reduzidos e o custo benefício da atividade melhorou (ICARDA, 2021).
A plataforma disponibiliza, ainda, casos em que Programas de Pagamento por Serviços Ambientais foram instituídos. Na Reserva Florestal Kikuyu Escapment do Quênia há uma bacia hidrográfica que enfrenta sérias ameaças de degradação ambiental ocasionada pela má gestão da terra, pelo cultivo nas margens dos rios, pelo aumento da poluição da água e pela redução dos níveis das represas. Para solucionar o problema, uma parceria entre os setores público e privado iniciou um programa de incentivo financeiro pelo uso do ecossistema hídrico. O objetivo do projeto, ao aumentar o financiamento sustentável local, foi investir na biodiversidade, aumentar a quantidade e qualidade da água, reduzir a erosão e assoreamento e reservatórios de água, além de reduzir a pobreza e outros fatores de perda da floresta (KARIARA, 2019).
Na região do Lago Chamo, na Etiópia, as plantações em terras comunais enfrentam desafios atribuídos à baixa taxa de sobrevivência de mudas em razão da ausência de políticas públicas que regulamentem o uso da terra e a alta demanda de recursos naturais. Como solução, foi desenvolvido um incentivo em parceria com o governo local para que os desenvolvedores florestais restaurem as terras comunais degradadas e plantem mudas de árvores. Ao envolvê-los em um processo de restauração que gera renda sustentável, o número de mudas ecológica e economicamente significativas plantadas e a taxa de sobrevivência delas aumentaram (DEMMERT, 2021).
Em ambos os casos, as sérias ameaças de degradação ambiental foram solucionadas por meio de parcerias entre voluntários, empresas, governo e instituições comunitárias para garantir um financiamento sustentável de proteção ecossistêmica. O estudo dos casos práticos comprova, assim como há anos já defendia a doutrina ambientalista, que essas parcerias aumentam o interesse social em manter a natureza íntegra e, consequentemente, melhoram as condições de existência na Terra.
Conclusões
O presente estudo demonstra a importância dos processos agrícolas sustentáveis para que seja alcançada uma proteção da natureza adequada a manter as condições de vida de todos os seres que nela existem. A agroecologia é um instrumento que promove a recuperação dos saberes que nutrem as culturas tradicionais e fomenta a produção orgânica de alimentos no âmbito da agricultura familiar para alcançar um desenvolvimento social, ambiental e econômico harmônico. A adoção dessa nova ética respeita a capacidade regeneração dos ecossistemas em benefício das presentes e futuras gerações, além de impor um repensar dos comportamentos sociais para impulsionar o rompimento com o atual modelo de desenvolvimento reducionista incompatível com a sustentabilidade.
No Brasil, o reconhecimento da dimensão ecológica da dignidade humana determina a integração da garantia ao meio ambiente ecologicamente equilibrado a todo o ordenamento jurídico. Portanto, compete ao Poder Público promover direitos sociais e ambientais de forma conjunta para que os direitos individuais sejam garantidos a partir do conceito do desenvolvimento sustentável que fundamenta o Estado de Direito Ecológico. Embora as políticas públicas agroecológicas venham ganhando força no País, medidas complementares precisam ser desenvolvidas para recriar os ideais que sustentam a atividade estatal e a produção agrícola vigente. O incentivo à agricultura sustentável permite o equilíbrio dos ecossistemas, otimiza os recursos naturais, diversifica o sistema produtivo e garante não apenas o direito dos indivíduos de viver em um meio ambiente saudável, mas o direito do próprio ambiente de manter-se íntegro.
O fomento à agroecologia no âmbito das Nações Unidas corrobora os resultados das décadas de estudo da doutrina ambientalista no sentido de que, se não houver a superação do paradigma do desenvolvimento, os ecossistemas não sobreviverão e, por ser diretamente dependente destes, a vida humana deixará de existir. Somadas às demais orientações da Década da Restauração dos Ecossistemas, as estratégias agroecológicas traçadas constituem potencial instrumento para solucionar a crise ambiental instaurada no planeta. Basta que os Poderes Públicos desenvolvam políticas de incentivo às atividades que respeitem a capacidade de regeneração e produção da natureza, e utilizem os saberes das populações locais para que promovam, solidariamente, um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
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[1] Por solicitação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento – MAPA, a Meta 7, relativa à implementação e ao monitoramento do Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos ainda está em processo de detalhamento e ajustes.
[2] Estima-se que o problema esteja ainda mais grave quando forem contabilizados os impactos da pandemia da COVID-19 na segurança alimentar.
Advogada. Formada em Direito pela Faculdade Anhanguera do Rio Grande (2013); pós-graduada em Direito Processual Civil, pela Universidade Anhanguera-UNIDERP (2015), e em Direito Civil e Processual Civil pela Universidade Católica de Pelotas (2020). Atualmente, aluna especial do mestrado em Direito e Justiça Social da FURG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MATTOS, Rafaella Fernandes de. Uma análise sobre a agroecologia como instrumento de promoção do Estado de Direito Ecológico e como estratégia da Década das Nações Unidas da Restauração dos Ecossistemas Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 jul 2021, 04:54. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56945/uma-anlise-sobre-a-agroecologia-como-instrumento-de-promoo-do-estado-de-direito-ecolgico-e-como-estratgia-da-dcada-das-naes-unidas-da-restaurao-dos-ecossistemas. Acesso em: 23 dez 2024.
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