IGOR DE ANDRADE BARBOSA[1]
(orientador)
RESUMO: O objetivo deste trabalho consiste em fazer uma análise sobre a aplicação de técnicas restaurativas e como elas podem contribuir para complementar a justiça criminal rígida atual do sistema jurídico penal brasileiro. Serão analisadas as premissas e as características tanto do modelo tradicional quanto da justiça restaurativa, que prega a recuperação dos danos por meio de diálogo, valoriza a vítima e permite que o infrator tenha a possibilidade de se retratar e se responsabilizar verdadeiramente por seus atos. Demonstrar-se-á que, a justiça restaurativa conciliada com a justiça criminal atual trás resultados bem mais significativos e duradouros. Como técnica de observação de dados foi utilizada a forma bibliográfica. Ao final, serão abordadas as vantagens do modelo restaurativo, como funcionam os círculos restaurativos e a sua importância para combater o mau funcionamento do sistema punitivo.
Palavras-chave: Direito Penal. Ineficiência Penal. Justiça Restaurativa. Sistema de Justiça Tradicional.
ABSTRACT: The objective of this work is to make an analysis of the application of restorative techniques and how they can contribute to complement the current rigid criminal justice of the Brazilian criminal law system. The premises and characteristics of both the traditional model and restorative justice will be analyzed, which preaches the recovery of damage through dialogue, values the victim and allows the offender the possibility of portraying and truly taking responsibility for his acts. It will be demonstrated that restorative justice reconciled with current criminal justice brings much more significant and lasting results. As a data observation technique, the bibliographic form was used. At the end, the advantages of the restorative model will be addressed, how restorative circles work and their importance to combat the malfunction of the punitive system.
Keywords: Criminal Law. Criminal Inefficiency. Restorative Justice. Traditional Justice System.
SUMÁRIO: 1 Justiça restaurativa no âmbito penal. 1.1 Justiça Restaurativa x Justiça Criminal. 2 Reflexos da justiça restaurativa nas partes. 3 Mediação penal. 3.1 O papel da mediação penal. 3.2 Etapas da mediação penal. 3.3 Círculos restaurativos.
INTRODUÇÃO
O sistema penal brasileiro, atualmente, garante uma minúscula participação da vítima no processo penal, de maneira que, ao focar meramente na função punitiva, o sistema deixa de lado os interesses das vítimas e daqueles que foram indiretamente prejudicados pelo delito.
É nesse contexto, que se faz necessária uma busca por formas alternativas de solução de conflitos que, sem retroagir os direitos e garantias do réu, possam tornar o sistema penal mais eficiente, de modo que o foco saia restritamente da função meramente retributiva e passe a atender os reais anseios das vítimas, possibilitando uma assistência maior àqueles lesados pelo delito e dessa forma restaurando as relações sociais.
Diante da evidente fragilidade do nosso sistema penal atual, é necessário se pensar em uma forma de retificação para essas falhas em relação a uma resolução eficaz de conflitos, pois os direitos constitucionais básicos não estão sendo respeitados em face de inoperância do atual sistema de justiça penal.
A metodologia deste trabalho se baseia no método bibliográfico, onde serão expostas as principais razões para a aplicação da justiça restaurativa bem como as principais diferenças com a justiça penal tradicional e também a implementação da mediação penal.
Esse presente trabalho tem o enfoque de apresentar de forma sucinta, uma análise sobre a aplicação da justiça Restaurativa e a Mediação Penal no cenário do Direito penal brasileiro, para tanto, na primeira seção será abordado sobre os aspectos conceituais da Justiça restaurativa vs a justiça criminal, bem como suas configurações e diferenças.
Pretende-se demonstrar que o direito penal brasileiro deve ser tratado de forma a não somente buscar a penalização do infrator, mas, principalmente, buscar a restauração do diálogo entre as partes de forma a evitar a reiteração criminosa.
Na segunda seção, abordaremos a respeito dos reflexos da Justiça Restaurativa nas partes, destacando sobre a importância de sua implementação, notabilizando também sobre o papel do ofensor, do ofendido e da participação da comunidade de forma mais efetiva.
Por fim, na terceira seção desse trabalho trataremos a respeito da mediação penal como forma de efetivação da justiça restaurativa, e como esse processo é vantajoso, não somente para as vítimas, mas também para todos aqueles que convivem no círculo social daqueles que por alguma razão entraram em conflito.
1 JUSTIÇA RESTAURATIVA NO ÂMBITO PENAL
1.1 Justiça Restaurativa x Justiça Criminal
O sistema jurídico criminal atual possui o objetivo de manter o convívio pacífico entre a sociedade, através do “ius puniendi” exercido pelo estado, e é voltado exclusivamente para confirmar a violação da lei e a culpa do acusado. Deixando de lado questões intrínsecas do cometimento do delito, como o desfecho do processo, o dano causado a vitima, ao infrator e a comunidade. Culpa e punições estão estritamente ligadas, conforme observado por Howard Zehr:
Culpa e punição são fulcros gêmeos do sistema judicial. As pessoas devem sofrer por causa do sofrimento que provocam. Somente pela dor terão sido acertadas as contas. O objetivo básico de nosso processo penal é a determinação da culpa, e uma vez estabelecida, a administração da dor. (ZEHR, 2008, p.75).
Dessa forma pode-se observar que a justiça retributiva busca apenas retribuir o mal feito, sem promover um diálogo entre as partes. O acusado, no atual modelo retributivo, participa do processo apenas no interrogatório, descrevendo os fatos do delito sem haver qualquer menção ou indagação aos motivos que o levaram a cometer tal infração.
Já a vítima, é substituída pelo estado, que possui a legitimidade do direito de punir, possuindo mínima participação no processo e atuando apenas como testemunha ou através de um assistente de acusação, nos delitos cujo processamento é de ação penal pública incondicionada ou outorgando legitimidade ao estado no direito de punir nos crimes processados mediante ação penal privada ou ação penal pública condicionada à representação.
O contraste entre os dois paradigmas fica cada vez mais claro ao analisarmos o foco da justiça restaurativa, uma vez que, esse modelo reflete sua atenção na prática do ato e no mal causado aos envolvidos no conflito.
A Justiça Restaurativa traz às partes ao centro do processo, analisando as causas que motivaram o infrator ao cometimento do delito, oferecendo autonomia aos envolvidos de um diálogo equilibrado entre vitima, ofensor e comunidade. Assim, o modelo restaurativo promove a democracia participativa das partes, conforme assevera Renato Sócrates Gomes Pinto:
A vítima, o infrator e a comunidade se apropriam de significativa parte do processo decisório, na busca compartilhada de cura e transformação, mediante uma recontextualização construtiva do conflito, numa vivência restauradora. O processo atravessa a superficialidade e mergulha fundo no conflito, enfatizando as subjetividades envolvidas. (PINTO, 2005, p.22).
A principal diferença entre os dois sistemas de justiça expostos reside na definição de crime adotado por cada um deles, pois, o sistema de justiça criminal convencional define o crime como uma violação aos interesses do estado. Já Howard Zehr define o crime na justiça retributiva como:
O crime é uma violação contra o estado, definida pela desobediência à lei e pela culpa. A justiça determina a culpa e inflige dor no contexto de uma disputa entre ofensor e estado, regida por normas sistemáticas. (ZEHR, 2008, p.171).
Confrontando essa definição, a justiça restaurativa propõe reconstruir o conceito de crime, afirmando que além de ser uma transgressão aos interesses do estado, o crime é um fato causador de prejuízos e consequências para todas as partes envolvidas no conflito. Zehr descreve o crime na ótica restaurativa como:
O crime é uma violação de pessoas e relacionamentos. Ele cria a obrigação de corrigir os erros. A justiça envolve a vitima, o ofensor e a comunidade na busca de soluções que promovam reparação, reconciliação e segurança. (ZEHR, 2008, p. 171).
A infração na justiça restaurativa deixa de ser apenas uma violação aos interesses do estado e passa a ser vista em um contexto mais amplo, analisando as origens do delito e não apenas uma relação de causa e efeito como é tratado no modelo retributivo.
Esse novo paradigma de justiça propõe um modelo não punitivo de justiça, que visa propor soluções alternativas frente à ineficácia do sistema de justiça atual, viabilizando uma abordagem democrática entre os envolvidos, proporcionando um modelo mais pacífico e humanitário de resolução de uma pena.
2 REFLEXOS DA JUSTIÇA RESTAURATIVA NAS PARTES
A Justiça Restaurativa é composta por três pilares ou elementos simples, são eles: foco no dano cometido, os danos resultam em obrigações e é necessário o engajamento das partes envolvidas.
“A Justiça Restaurativa se ergue sobre três pilares ou elementos simples: os danos e as consequentes necessidades (de vítimas em primeiro lugar, mas também da comunidade e dos ofensores); as obrigações (do ofensor, mas também da comunidade) que advêm do dano (e que levaram ao dano); e o engajamento daqueles que detêm legítimo interesse no caso e na solução (vítimas, ofensores e membros da comunidade)”. (ZEHR, 2012, p. 36, grifo do autor).
Ela vem para propor uma autoanálise e o reconhecimento do delito cometido pelo infrator, uma vez que, a ênfase não habita no culpado ou nas regras violadas, mas na reparação do erro, visto que, quando o autor do delito passa a compreender as consequências de seus atos perante sociedade e a vítima, vê-se na obrigação de tentar reparar os danos cometidos.
Outro reflexo significativo diz respeito à família do delinquente, que na maioria dos casos é marginalizada e se torna a “família do infrator”. A Justiça Restaurativa quando possível vem proporcionar o diálogo entre os entes familiares, a fim de solucionar os conflitos internos que por vezes são os reais motivos dos conflitos externos, para que, dúvidas sejam sanadas e para que haja o apoio necessário à vítima.
Efeitos para vítima:
JUSTIÇA RETRIBUTIVA |
JUSTIÇA RESTAURATIVA |
Pouquíssimas ou nenhuma consideração, ocupando lugar periférico e alienado no processo. Não tem participação, nem proteção, mal sabe o que se passa no processo; |
Ocupa o centro do processo, com um papel e com voz ativa. Participa e tem controle sobre o que se passa; |
Praticamente nenhuma assistência psicológica, social, econômica ou jurídica do Estado; |
Recebe assistência, afeto, restituição de perdas materiais e reparação; |
Frustração e Ressentimento com o sistema. |
Tem ganhos positivos. Supre-se as necessidades individuais e coletivas da vítima e comunidade. |
Pinto (2005, p. 26).
Observa-se que o atual sistema de Justiça Retributiva não trouxe muitos benefícios para a sociedade, pois é baseado em punição como forma de retribuir o mal causado. É neste contexto, que a Justiça Restaurativa entra em cena, com um novo olhar e disponibilizando alternativas para se chegar a um consenso de restauração entre os envolvidos no conflito.
Esse processo é conduzido por autoridades e facilitadores, sendo dada oportunidade de fala para ambas as partes, para que possam expor seus sentimentos e tentarem corrigir suas ações e então acharem o caminho para restauração dos sentimentos.
A vítima, tem a possibilidade de expor seus traumas e sentimentos decorrentes da injustiça que sofreu de modo a sensibilizar o infrator acerca de seus atos, já o autor do delito, ao assumir a responsabilidade de sua conduta, se compromete a reparar o mau causado à vítima e não retornar a delinquir, e por fim, a comunidade tem a oportunidade de dar assistência e apoio para a reestruturação dos laços perdidos no conflito.
Efeitos para o agressor:
JUSTIÇA RETRIBUTIVA |
JUSTIÇA RESTAURATIVA |
Infrator considerado em suas faltas e sua má formação; |
Infrator visto no seu potencial de responsabilizar-se pelos danos e consequências do delito; |
Raramente tem participação; |
Participa ativa e diretamente; |
Comunica-se com o sistema pelo advogado; |
Interage com a vítima e com a comunidade; |
É desestimulado e mesmo inibido a dialogar com a vítima; |
Tem oportunidade de desculpar-se ao sensibilizar-se com o trauma da vítima; |
É desinformado e alienado sobre os fatos processuais; |
É informado sobre os fatos do processo restaurativo e contribui para a decisão; |
Não é efetivamente responsabilizado, mas punido pelo fato; |
É inteirado das consequências do fato para a vítima e comunidade; |
Fica intocável; |
Fica acessível e se vê envolvido no processo; |
Não tem suas necessidades consideradas. |
Supre-se suas necessidades. |
Pinto (2008, p. 27).
Silva (2007, p. 32) assevera que, diante do déficit de comunicação atribuído ao sistema retributivo, defende-se a adoção de medidas que potencializem a capacidade do ofensor de compreender o efeito socialmente danoso de sua conduta, levando-o a reinterpretar a realidade e, sob essa nova perspectiva, transforma-se, assim como as relações que foram desestruturadas.
No sistema restaurativo busca-se promover sentimentos e relacionamentos positivos, não se contentando apenas em reduzir a criminalidade, mas ir além, ou seja, promover a regeneração dos vínculos rompidos. Essa ‘neojustiça’ tem a capacidade de preencher essas necessidades emocionais e de relacionamento, que são pontos chaves para a obtenção e manutenção de uma sociedade civil saudável (PORTO; SIMÕES, 2013, p. 4).
3 MEDIAÇÃO PENAL
Em Portugal o conceito de mediação penal está contido no artigo 4º, nº 1 da lei 21/2007 de 12 de junho, que cria um regime de mediação penal, sendo estabelecido como “um processo informal e flexível, conduzido por um terceiro imparcial, o mediador, que promove a aproximação entre o arguido e o ofendido e os apoia na tentativa de encontrar activamente um acordo que permita a reparação dos danos causados pelo facto ilícito e contribua para a restauração da paz social”.
O processo de mediação penal obedece a outros aspectos próprios, além das características próprias da mediação, devemos falar ainda que te forma superficial, de duas características da mediação penal, que são, a informalidade e a interdisciplinaridade.
A informalidade da mediação penal se dá devido a liberdade das partes em agir e também pela sutileza das fases desse processo que é contrário ao rigor existente no processo penal tradicional brasileiro. Muito embora a mediação penal seja menos rígida, há também fases processuais a serem respeitadas com o fim de atingir o objetivo conciliatório da mediação (NAHID, 2010), conforme será tratado no capitulo seguinte.
É conveniente destacar que o disposto no nº 2, 3, 4 e 5 do artigo 4.º[2] da lei 21/2007 de 12 de junho, que cria um regime de mediação penal em Portugal, acaba por destacar expressamente vários dos princípios da mediação penal quando prevê a possibilidade de as partes revogarem o consentimento para a participação da mediação, quando voluntária. Ainda, o nº 5 do artigo 4.º, estabelece a confidencialidade dos atos, inclusive, que o teor das sessões não pode ser utilizado como meio de provas em processos judiciais, nas hipóteses em que a mediação penal não é bem sucedida.
No Brasil, a mediação recebeu impulso por meio da resolução nº 125 de 29 de novembro de 2010[3] do conselho nacional de justiça, que estabeleceu diretrizes para a implantação de uma política de tratamento de conflitos que tem como proposta assegurar o direito à solução dos conflitos por meios adequados à natureza e peculiaridades de cada caso.
Desse modo, como não há nenhuma legislação específica que regulamente a mediação penal no brasil, ela vem sendo aceita e permitida em alguns institutos, como, por exemplo, no juizado especial criminal, lei 9.099 de 26 de setembro de 1995, porém, ainda é pouco utilizada. A última lei que foi promulgada foi a Lei nº 13.140, de 26 de junho de 2015, que trata no art. 1º os objetivos e conceito da mediação, no entanto, com enfoque para relações contratuais cíveis e autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública:
Art. 1º: Esta lei dispõe sobre a mediação como meio de solução de controvérsias entre particulares e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública.
Parágrafo único: considera-se mediação a atividade técnica exercida por terceiro imparcial sem poder decisório, que, escolhido ou aceito pelas partes, as auxilia e estimula a identificar ou desenvolver soluções consensuais para a controvérsia. (BRASIL, 2015).
Muito embora a resolução nº 125 do CNJ vise incorporar as conciliações nos procedimentos processuais cíveis e penais (SCHRODER, 2018), para o presente trabalho é retirada a ênfase da resolução para as tratativas menos agressivas na seara criminal que a mediação proporciona ao possibilitar a tentativa de recomposição do dano por parte do ofensor (artigos 72 e 89 da lei 9.099 de 26 de setembro de 1995).
3.2 Etapas da mediação penal
A fim de buscar a efetivação da mediação penal como forma de se atingir os objetivos restaurativos existem procedimentos a serem observados. Nesse sentido, sobre as etapas existentes no procedimento da mediação penal, é adequado trazer o contido no Portal Europeu da Justiça[4] que cita que após a realização de uma triagem para saber quais casos devem ou não serem levados para a mediação penal, ocorre a abertura de um processo de mediação, onde o mediador deve explicar para as partes o seu papel e sanar dúvidas sobre a finalidade da mediação e fixar as regras que as partes devem aceitar e seguir.
Em seguida o mediador abre espaço para que as partes exponham suas razões, afim de demostrar informações necessárias para que em seguida fixe as questões a serem debatidas e mediadas. Assim o mediador ajuda as partes a procurar soluções para determinada situação e também contribui para que as partes possam chegar em comum acordo.
Por fim, após a mediação, se as partes aceitarem acordo, lavra-se um acordo claro, em que os representantes das partes analisam para poder garantir que se produzam todos os efeitos jurídicos decorrentes do acordo. Caso não haja um acordo, o mediador deve reunir as questões debatidas e os eventuais progressos alcançados para que as partes decidam se prosseguirão com a ação judicial.
Nesse sentido, é importante destacar mais um pressuposto fundamental para que haja a possibilidade de tentativa de mediação: a necessidade de confissão formal por parte do agressor quanto ao lhe é imputado, já que de outra forma, sem o reconhecimento por parte do ofensor de que o mesmo praticou algo contrário à lei, seria necessária uma investigação policial, que não são os objetivos buscados pela mediação penal.
3.3 Círculos Restaurativos
São encontros restaurativos, em formato circular, uma roda diagonal que permite a participação de qualquer pessoa que esteja envolvida no conflito, direta ou indiretamente, buscando a reparação de danos, resolução de problemas, restauração da segurança e da sua dignidade.
Nessa modalidade restaurativa os participantes se acomodam em círculo. Um objeto chamado ‘bastão de fala’ vai passando de mão em mão para que todos tenham a oportunidade de falar, um de cada vez, na ordem em que estão sentados.” (ZEHR, 2012, p. 62).
Esse encontro tem um roteiro pré-determinado, que precisa ser seguido, esse roteiro é dividido em três etapas, são elas:
1 - O pré-círculo (preparação para o encontro com os participantes);
2 - O círculo (realização do encontro propriamente dito);
3 - O pós-círculo (acompanhamento).
O objetivo do círculo não é apontar culpados ou vítimas, buscar o perdão e a reconciliação, mas sim a percepção de como as ações praticadas afeta ao próprio praticante como aos outros.
Através da implantação dos projetos de justiça restaurativa no Brasil, pode-se perceber uma evolução na reabilitação de pessoas que cometeram algum tipo de delito, ou que em outrora, acarretaria em uma punição exagerada. Podemos citar um caso real no Tocantins em que a justiça restaurativa cumpriu o papel a que se propôs:
A comarca de Araguaína é referência nacional na aplicação da Justiça Restaurativa, o Juiz titular da 2ª Vara Criminal e Execuções Penais da Comarca de Araguaína, Antônio Dantas, colocou a unidade judiciária como referência na aplicação da Justiça Restaurativa no país. O magistrado já determinou a realização de 11 círculos restaurativos. No dia 13 de setembro foi publicada a sentença com enfoque restaurativo nos autos de nº 0003131-30.2016.827.2706, envolvendo os sentenciados Johnny Cristiano dos Santos e Maria Karollyny Campos Ferreira, tendo sido reconhecida a Justiça Restaurativa para o primeiro e, como consequência, a diminuição da sua pena e a aplicação do regime mais brando, o aberto. (PIRES, 2016)
Apesar da justiça restaurativa visar a conciliação entre a sociedade e o infrator, é de grande importância que que o “acusado” demonstre arrependimento e interesse na conciliação para que ela de fato se torne verídica e eficaz.
CONCLUSÃO
Diante do exposto, é possível notar que a Justiça Restaurativa surge como a possibilidade de um mecanismo alternativo na área criminal, buscando complementar o sistema e visando novas possibilidades de realização efetiva do interesse reparatório da vítima em uma construção conjunta, envolvendo todos os participantes do conflito, inclusive a comunidade.
Considerando que estamos vivendo em um país onde a criminalidade e a violência avançam imperiosamente contra a sociedade, nos deparamos todos os dias com uma evidente ineficácia no que se refere a contenção de crimes. É preciso focar em uma nova possibilidade de aplicação eficaz da justiça, que atue efetivamente e assim, construa uma sociedade mais segura.
Implementar práticas restaurativas não significa extinguir as práticas retributivas atuais ou colocá-las em desuso. O que se pretende é manter os dois sistemas atuando em conjunto. A Justiça Restaurativa não descarta a possibilidade de punição e de ressarcimento financeiro, apesar de estar focar na restauração.
Promover uma reflexão de compreensão a respeito da aplicação da justiça restaurativa e da mediação penal no ordenamento jurídico brasileiro foi o ponto essencial desse trabalho, onde pôde-se perceber que a aplicação da justiça restauradora já se faz presente no cenário jurídico brasileiro e que a cada dia avança mais rumo a se efetivar de forma ainda mais expressiva como um novo caminho a ser seguido para que possamos chegar a um vislumbramento da concretude de uma justiça que de fato seja mais justa para todos.
REFERÊNCIAS
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______. Lei nº. 9.099 de 25 de setembro de 1995. Presidência da República. Casa Civil. [Em Linha] [Consult. 09 Nov. 2020]. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/L9099.htm.
______. Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997, e o Decreto nº 70.235, de 6 de março de 1972; e revoga o § 2º do art. 6º da Lei nº 9.469, de 10 de julho de 1997. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm
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[1] Defensor Público Federal de 1º Categoria no Tocantins e Professor de graduação e pós-graduação do curso de Direito do Centro Universitário Católica do Tocantins. E-mail: [email protected].
[2] Artigo 4.º Processo de mediação
1 - A mediação é um processo informal e flexível, conduzido por um terceiro imparcial, o mediador, que promove a aproximação entre o arguido e o ofendido e os apoia na tentativa de encontrar ativamente um acordo que permita a reparação dos danos causados pelo facto ilícito e contribua para a restauração da paz social.
2 - O arguido e o ofendido podem, em qualquer momento, revogar o seu consentimento para a participação na mediação.
3 - Quando se revista de utilidade para a boa resolução do conflito podem ser chamados a intervir na mediação outros interessados, nomeadamente eventuais responsáveis civis e lesados.
4 - O disposto no n.º 2 é aplicável, com as necessárias adaptações, à participação na mediação de eventuais responsáveis civis e lesados.
5 - O teor das sessões de mediação é confidencial, não podendo ser valorado como prova em processo judicial.
[3] RESOLUÇÃO nº. 125 de 29 de novembro de 2010 do Conselho Nacional de Justiça.
[4] Princípios fundamentais e fases da mediação. Disponível em: https://e-justice.europa.eu/content_key_principles_and_stages_of_mediation-383-pt.do.
Acadêmica de Direito pelo Centro Universitário Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERRAZ, SARAH MOURA. Justiça restaurativa na construção de um novo paradigma da Justiça Criminal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 ago 2021, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57060/justia-restaurativa-na-construo-de-um-novo-paradigma-da-justia-criminal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Nathalia Sousa França
Por: RODRIGO PRESTES POLETTO
Por: LEONARDO RODRIGUES ARRUDA COELHO
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
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