RESUMO: Neste artigo, busca-se analisar a decretação de prisão preventiva para pessoas denunciadas por crime que sejam integrantes da etnia cigana. O recorte metodológico se efetuou com base no mapeamento da jurisprudência dos Tribunais de Justiça e dos Tribunais Regionais Federais que abrangem os Estados com maior concentração de acampamentos ciganos. A partir deste espaço amostral, constata-se, que na maior parte dos casos, o enquadramento do indivíduo adepto da cultura cigana na fattispecie legal de decretação de prisão preventiva ocorre por razões culturais, seja diretamente, seja por meio do uso retórico do conceito de “ordem pública”. Na sequência, demonstra-se como tal prática, ao se tratar de verdadeira discriminação indireta judicialmente chancelada, subverte o princípio da igualdade, mostrando-se atentatória ao Estado Democrático de Direito. Por fim, conclui-se que, por se tratar da tutela de direitos fundamentais de minoria historicamente estigmatizada, o Supremo Tribunal Federal possui legitimidade institucional para adotar uma postura de maior ativismo judicial, caso provocado a enfrentar a matéria em caráter estrutural.
Palavras-chave: ciganos; prisão preventiva; discriminação indireta; adaptação razoável.
Abstract: This work aims to analyze the preventive imprisonment of individuals who belong to gypsies’ groups. The methodological boundary is set by the mapping of State Courts and Federal Courts case-law which encompass the states that have the most gypsies camping sites. From this perspective, it gets clear that, in most cases, the judicial application of the legal framework of preventive imprisonment to gypsies takes places for cultural reasons: either directly or by means of the rhetorical use of “public order” as a legal concept. Moreover, it is confirmed that this practice represents an indirect discrimination judicially endorsed which subverts the principle of equality, undermining the Rule of Law. At last, it is affirmed that as it revolves the judicial enforcement of fundamental rights of a historically stigmatized group, the Brazilian Supreme Court possess institutional legitimacy in order to adopt an approach of a more intense judicial activism if it happens to deal with this issue in a structural sense.
Keywords: gypsies; preventive imprisonment; indirect discrimination; reasonable accommodation.
SUMÁRIO: 1. Introdução; 2 – Os ciganos no Brasil e no mundo: seminomadismo como cultura ou como sobrevivência? 3 – A tutela jurídico-constitucional dos povos ciganos; 4 – Mapeamento da jurisprudência pátria em matéria penal: indícios de seletividade cultural; 4.1. – A decretação da prisão preventiva fundada explicitamente na condição de cigano do réu; 4.2. – A “ordem pública” e a “aplicação da lei penal” como subterfúgios argumentativos da discriminação velada; 5 – Do reconhecimento à adaptação razoável: a erradicação da discriminação indireta; 6 – Conclusão - O Supremo Tribunal Federal e seu papel contramajoritário: em defesa dos direitos das comunidades ciganas; 7 - Referências
1 – Introdução
O povo cigano, cujas origens remontam à Idade Média, constitui, na sociedade contemporânea, uma das etnias que mais sofrem com a aplicação da Lei estatal, considerada a premissa de territorialidade que lhe é inerente vis-à-vis a relação distinta daqueles povos com o espaço físico.
Em outras palavras, o conceito de Estado majoritariamente adotado concebe a fixação do povo em determinado território como um elemento constitutivo. Dessa forma, toda legislação estatal, em qualquer nível – federal, estadual ou municipal -, irá ter esta noção como premissa implícita.[1] Ocorre, todavia, que os ciganos têm como traço constitutivo o seminomadismo, isto é uma atitude e uma cosmovisão completamente diferente do sedentarismo pressuposto pelo Estado. Assim, há uma potencialidade estrutural e conceitual de uma lei ou política pública estatal, por mais neutra que aparente ser, venha a ter impactos desproporcionais para os ciganos.
Dito isto, o objeto do presente artigo cinge-se a uma área específica e extremamente delicada do exercício da jurisdição estatal sobre as comunidades ciganas no Brasil, qual seja a decretação de prisão preventiva para tutela da ordem pública e para garantia da aplicação da lei penal.
A hipótese que se buscará demonstrar é de que as comunidades ciganas, tendo em vista sua itinerância, são desproporcionalmente afetadas na aplicação dessa medida cautelar processual penal, uma vez que referida providência é a regra nos sujeitos adeptos daquela cultura, não em razão de circunstâncias individuais do caso concreto, mas sim por atributos historicamente vinculados ao povo cigano.
No primeiro tópico, uma breve digressão histórico-antropológica das comunidades ciganas se faz necessária. Suas origens no Brasil e no mundo, assim como seu histórico de invisibilidade e perseguição serão traços acentuados nesta parte da exposição. Ao final, as características definidoras dos povos ciganos – seminomadismo, costumes e práticas econômicas – serão abordadas, sempre buscando estabelecer uma conexão lógica com elementos subjacentes à persecução penal.
Em seguida, o arcabouço normativo constitucional, legal e convencional que dispõe sobre os direitos dos ciganos no Brasil será desenvolvido de modo a conceder substrato normativo à tutela desta comunidade. Neste sentido, a Convenção n° 169 da OIT, o Decreto n° 6.040/07 e, por óbvio, a Constituição da República são os diplomas normativos que merecerão maior destaque.
Posteriormente, buscar-se-á abordar a jurisprudência dos tribunais pátrios no tocante à persecução penal de indivíduos adeptos da cultura cigana. Aqui, o espaço amostral analisado se cingiu aos Tribunais que abrangem Estados com maior concentração de acampamentos ciganos. Uma leitura atenta da fundamentação da concessão de prisão preventiva revelará que, na maior parte destes julgados, não houve uma correlação dos requisitos previstos em Lei com elementos específicos do caso concreto, mas sim com traços caricaturais atribuídos pelo imaginário social àquela pessoa que pertence a comunidade cigana.
Na sequência, as categorias dogmáticas da discriminação indireta e da adaptação razoável serão elaboradas como corolários protetivos das normas constitucionais e convencionais incidentes aos casos de imposição indiscriminada de prisão preventiva a ciganos.
Por fim, o caráter prescritivo do presente artigo se revelará na necessidade de o Supremo Tribunal Federal, cuja legitimidade se extrai de seu papel contramajoritário de proteção de direitos fundamentais de minorias estigmatizadas, uniformizar a matéria em prol dos direitos dos ciganos até então despercebidamente ignorados pelos demais Tribunais brasileiros.
2 – Os ciganos no Brasil e no mundo: seminomadismo como cultura ou como sobrevivência?
Os ciganos chegaram na Europa por volta do século XIV, muito provavelmente oriundos da Índia.[2] Já na Idade Moderna, a perseguição às suas comunidades se iniciariam muito em virtude de seu seminomadismo, razão pela qual as autoridades políticas à época passaram a incentivar a adoção de residência fixa. Por sua vez, as mulheres ciganas eram vistas pela Igreja Católica como hereges e o comércio realizado nas tendas ciganas atraíam antipatia das corporações de ofício.[3]
Séculos mais tarde, com a industrialização, os ciganos seminômades começaram a enfrentar um novo problema para assentarem suas tendas e caravanas: a adoção de políticas de crescimento urbano. Essas propostas homogeneizantes de crescimento urbano pautavam-se em critérios que excluíam os ciganos e sua cultura seminômade, que era vista como uma ameaça para o estilo de vida hegemônico cujas práticas sociais e econômicas pressupunham o assentamento dos indivíduos em territórios fixos e determinados.[4]
Nada obstante, o evento histórico mais trágico para as comunidades ciganas certamente foi o holocausto. Como se sabe, a proposta de extermínio e purificação nazista tinha como um dos seus alvos a comunidade cigana, considerada uma “ameaça” a “pura raça ariana”, tendo sido submetidos às leis de Nuremberg de 1935.[5] Ao invés de uma política de assimilação, que era adotada até o presente momento, as políticas nazistas procuravam excluir e exterminar os ciganos nômades, até mesmo aqueles que abandonaram tal prática e tinham se fixado na Alemanha. Suas práticas culturais eram proibidas de serem exercidas e, em 1938, todos os ciganos foram declarados “antissociais”, tendo sido criado o “Centro Nacional para lutar contra a ameaça cigana”. No mesmo ano, muitos deles foram esterilizados e deportados para trabalharem na construção dos campos de concentração.[6]
Por sua vez, a história dos ciganos no Brasil se mostra igualmente desalentadora. Os primeiros ciganos vindos ao Brasil datam do final do século XVII, período em que Portugal os deportava para a colônia como mera política de higienização.[7]
No início do século XVIII, por conta da corrida do ouro, os ciganos migraram para a região das minas, contrariando os desígnios da Coroa portuguesa. Desde então, aquela etnia começou a ser perseguida e criticada pelas comunidades locais, sob o argumento de que os furtos aumentaram, sem qualquer conexão entre esse fato e a culpa de um indivíduo determinando.[8] Com efeito, a dialética irracional que se adotava era a seguinte: os ciganos foram às regiões das minas, tendo se verificado aumento de furtos e subversão da ordem social, logo, os ciganos são os culpados por tais acontecimentos. Nesse sentido, ainda que as autoridades locais prendessem indivíduos que não fossem da etnia cigana, nos documentos e relatórios históricos havia sempre o registro genérico de que foram detidos “ciganos e outros malfeitores”.[9] Na mesma época, os ciganos que foram expulsos das minas migraram para São Paulo; porém, foram igual e gradativamente sujeitos a expulsão desta cidade por causarem “perturbações”.[10] Em outras palavras, os ciganos sempre serviram de bodes expiatórios, tendo que ficar em constante movimento – por uma questão cultural e de sobrevivência.
No curso do século XIX, os ciganos também sofreram os efeitos da urbanização e da explosão demográfica. Neste período, intensificou-se o processo de elaboração de uma política estatal voltada ao crescimento urbano nos moldes que melhor favorecessem os interesses da sociedade burguesa. Deste modo, os acampamentos – formas típicas de moradia cigana – eram vistos como ameaça à expansão das cidades, tendo a permanência destes passada a ser criminalizada pela exigência legal de documento ou identificação de propriedade daquele território, que, por óbvio, os ciganos não possuíam.[11] Nesse sentido, destacam-se as lições do historiador Rodrigo Teixeira ao analisar os ciganos em Minas Gerais:
A sociedade mineira rejeitava o cigano porque desejava que o espaço da cidade fosse liso, homogêneo, de acordo com a lógica da sociedade burguesa. ‘Um espaço liso é um espaço desterritorializado, aonde não há mais os mesmos tipos de circunscrições ou delimitações por emblemas étnicos ou religiosos, por exemplo’. Os ciganos tinham territórios delimitados por fronteiras subjetivas, existenciais, que a sociedade mineira procurava padronizar, seriar, enfim desterritorializar, ‘distendendo-os em espaços lisos’. O projeto civilizatório de esquadrinhamento do território mineiro, visava a seu alisamento, ou seja, a homogeneizar através de estratégias administrativas de censo, de controle sanitário e registro eleitoral.
No entanto, apesar da ampliação cada vez maior do projeto civilizatório, a chegada e o abarracamento dos ciganos era a reconstituição temporária de um território da subjetivação da cidade. Assim, a relação dos ciganos com a sociedade mineira poderia ser vista como um conflito entre tipos de percepções de espaço, a priori, contraditórias. A dos ciganos era constituída por elementos de seu cotidiano: relações de parentesco, festas e outros compromissos sociais, trabalho e ócio etc. Tornava-se, portanto, uma forma de reelaboração constante da identidade, respondendo às transformações e estímulos da sociedade mineira. Em geral, a forma mineira de apropriação do espaço seria guiada por uma racionalidade civilizatória e sedentária, enquanto a forma cigana seria direcionada por uma racionalidade comunitária e pelo nomadismo. A utilização de casas por ciganos, como no citado caso de Contendas, não traduzia numa sedentarização completa. Pois as casas funcionavam, sobretudo, como uma ‘base’ para se guardar mercadorias, utensílios e móveis, e como refúgio para o período de chuvas. As casas estavam lado a lado com as barracas, que armadas reforçavam a imagem de nomadismo.[12] (grifos nossos)
Em paralelo, começou a proliferar a legislação higienizadora de cunho moralista que criminalizava o estilo de vida cigano. Tratava-se de verdadeiras normas de etiqueta que visavam a um projeto civilizatório excludente ao enquadrar os acampamentos ciganos como questão de saúde pública.[13] Estas normas aumentavam o abismo simbólico entre a sociedade hegemônica e os povos ciganos, estereotipados como pessoas sujas, preguiçosas e criminosas em virtude de seu seminomadismo.[14]
Nos dias de hoje, de acordo com os dados do IBGE, relativos à Pesquisa de Informações Básicas Municipais (MUNIC) realizada em 2014, há, ao todo, 337 acampamentos ciganos espalhados pelo território brasileiro. Os Estados que possuem a maior quantidade de acampamentos são: Minas Gerais, com 61; Bahia, com 56; São Paulo, com 33; Goiás, com 31; e Paraná, com 24. É de se ressaltar que esta quantidade provavelmente é ainda maior em 2018, mas não há dados recentes contabilizados, tendo em vista que o IBGE realizou o último recenseamento apenas em 2014, sendo alvo de críticas dos representantes das comunidades e do Ministério Público Federal.[15]e[16]
O povo cigano possui forte apego comunitário, formando comunidades altamente herméticas para evitar assimilação e descaracterização cultural pela sociedade hegemônica. Assim, ainda que as práticas ciganas variem de acordo com a comunidade em questão, é possível extrair delas uma função comum de preservação cultural.[17] Tendo isto em mente, a classificação aqui realizada a respeito dos traços em comum das comunidades ciganas não se pautará numa lógica aristotélica de correspondência, mas sim numa dinâmica de sobreposição, gradação e aproximação, empregando a premissa metodológica das relações de parentesco.[18]
Em primeiro lugar, destaca-se o seminomadismo cigano refletido nas suas casas, isto é, seus acampamentos e tendas. Este traço cultural refere-se menos a uma efetiva itinerância e mais à noção de portabilidade de fronteiras, haja vista a relação especial que as comunidades estabelecem com o território. Assim, o seminomadismo é um estado de espírito manifestado em suas tendas, acampamentos e caravanas, que traduzem uma potencial mobilidade.[19]
Desta forma, o seminomadismo é a alcunha adotada pela sociedade ocidental hegemônica para captar esta territorialidade cigana, o que não significa tão somente sua mobilidade superior aos povos com residência fixa. No entanto, como se revelará nos julgados dos Tribunais pátrios, trata-se de característica determinante para aplicação da medida cautelar penal de prisão preventiva.
Noutro giro, os costumes ciganos também se chocam frontalmente com a cultura predominante nas sociedades contemporâneas. Com efeito, as comunidades ciganas costumam conferir o mesmo “nome” a uma multiplicidade de pessoas, o que dificulta a identificação civil para fins de reconhecimento estatal,[20] de modo que se trata de mais um fator que leva a uma maior predisposição de as autoridades judiciais aplicarem medidas penais preventivas com a preocupação de potencial evasão de um indivíduo cigano suspeito do cometimento de crimes.
Por fim, embora não seja objeto específico do presente artigo, cumpre mencionar as práticas econômicas ciganas e sua marginalização pela sociedade. Isso ocorre notadamente no que diz respeito à prática de quiromancia pelas mulheres ciganas, vista como charlatanismo e estelionato. Já os homens possuem um papel muito mais reduzido do que a mulher na atividade econômica, o que reforça, sob uma ótica patriarcal, a figura estereotipada do cigano como preguiçoso e ardiloso.[21]
3 – A tutela jurídico-constitucional dos povos ciganos
De início, é oportuno destacar que os ciganos, como qualquer outra pessoa, são titulares dos direitos fundamentais explícitos no artigo 5° da Constituição da República, bem como os implícitos ou constantes de outros artigos da Carta Maior, na forma do catálogo aberto previsto no §2° daquele dispositivo. No momento, entretanto, o objeto de análise será a eventual existência de direitos especiais a grupos ciganos, concedidos em razão da sua própria condição de minoria cultural. Neste sentido, cabe salientar que a Constituição da República não tutelou expressamente os ciganos, estabelecendo apenas no §1º do artigo 215 que o Estado deve proteger, além das manifestações culturais indígenas e afrodescendentes, aquelas “de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional”.
A seu turno, a Convenção n° 169 da OIT, internalizada no ordenamento jurídico pátrio pelo Decreto n° 5.051/04, trouxe inúmeras proteções aos “povos tribais”, definidos como aqueles “cujas condições sociais, culturais e econômicas os distingam de outros setores da coletividade nacional, e que estejam regidos, total ou parcialmente, por seus próprios costumes ou tradições ou por legislação especial”. Decerto, é indene de dúvidas que as comunidades ciganas possuem costumes e práticas socioeconômicas que as distinguem das demais.
Demais disso, a legislação especial igualmente prevê a tutela das comunidades ciganas, conforme se extrai do Decreto n° 6.040/07, que instituiu a Política Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais - PNPCT. Este Decreto delega a competência de implementar o PNPCT – à Comissão Nacional de Desenvolvimento Sustentável dos Povos e Comunidades Tradicionais – CNPCT. Por sua vez, esta Comissão conta com a participação da Associação de Preservação da Cultura Cigana na sua composição. Desde a criação da Comissão, representantes de comunidades ciganas participam de eventos nacionais que buscam a melhor forma de implementar políticas públicas visando à proteção e à promoção dos direitos desse grupo vulnerável.
Nada obstante, a demanda mais relevante em termos normativos e de reconhecimento estatal para tutela dos direitos das comunidades ciganas encontra-se atualmente em tramitação no Senado Federal. Trata-se do Projeto de Lei n° 248/2015, que cria o Estatuto do Cigano.[22] Com efeito, este PLS traz uma série de garantias importantíssimas às comunidades ciganas, embora esteja passando debaixo do radar. A título meramente exemplificativo, transcrevam-se as importantes conquistas lá inscritas em matéria de inviolabilidade de domicílio, direito à preservação cultural e direito à saúde:
Art. 9º Fica assegurado à população cigana o direito à preservação de seu patrimônio histórico e cultural, material e imaterial, e sua continuação como povo formador da história do Brasil
Art. 10. Fica assegurado o atendimento na rede pública de saúde ao cigano que não for civilmente identificado.
(...)Art. 13. O poder público elaborará políticas públicas para assegurar a moradia adequada à população cigana, respeitadas suas particularidades culturais.
Parágrafo único. Os ranchos e acampamentos são partes da cultura e tradição da população cigana, configurando-se asilo inviolável. (grifos nossos)
Conforme se extrai dos dispositivos supramencionados, dois dos grandes pontos de choque da sociedade hegemônica com a cultura cigana – a questão do “nome” e o seminomadismo – são expressamente abordadas com o intuito de se garantir uma acomodação razoável pelo Poder Público, de modo a preservar as comunidades ciganas com suas devidas peculiaridades. Como se demonstrará na seção 4, este imperativo de acomodação, ainda que não previsto na legislação atualmente em vigor, decorre da aplicação direta do princípio constitucional da igualdade. Sem embargo, cabe antes enfrentar a aplicação da lei processual penal aos povos ciganos.
4 – Mapeamento da jurisprudência pátria em matéria penal: indícios de seletividade cultural
Neste tópico, adentra-se propriamente na hipótese central do presente artigo: o exercício da jurisdição penal pelos Tribunais brasileiros se utiliza de conceitos jurídicos indeterminados para determinar prisões preventivas a indivíduos adeptos da cultura cigana, sem adentrar em aspectos específicos do caso concreto. Em outras palavras, haveria uma seletividade penal oriunda de motivações eminentemente culturais, tais como o seminomadismo e a escassa identificação civil dos indivíduos ciganos.
Para tal fim, avaliamos a jurisprudência dos Tribunais que abrangem os Estados com maior concentração de acampamentos ciganos – conforme delineado no item 1. A pesquisa não teve recorte temporal, abordando todos os julgados que continham os termos “ciganos”, “cigano”, “ciganas” e “cigana”.
Antes de abordar os julgados sobre o tema, cumpre traçar breves notas legais e doutrinárias sobre a temática da prisão preventiva. Por relevantes, transcrevam-se os dispositivos pertinentes do Código de Processo Penal:
Art. 282. As medidas cautelares previstas neste Título deverão ser aplicadas observando-se a:
I - necessidade para aplicação da lei penal, para a investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais;
II - adequação da medida à gravidade do crime, circunstâncias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado.
(...)§ 6o A prisão preventiva será determinada quando não for cabível a sua substituição por outra medida cautelar (art. 319).
Art. 310. Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:
(...)II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão;
Art. 312. A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.
Parágrafo único. A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).
Art. 313. Nos termos do art. 312 deste Código, será admitida a decretação da prisão preventiva:
(...) Parágrafo único: Também será admitida a prisão preventiva quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, devendo o preso ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
De acordo com esses preceitos, extrai-se uma característica importante da prisão preventiva: sua excepcionalidade como medida cautelar penal, tratando-se, em verdade, de ultima ratio a ser empregada. Neste sentido, vejam-se as lições de Aury Lopes Jr.:
“Portanto, prisão preventiva somente quando inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão, aplicadas de forma isolada ou cumulativa.
(...) Ademais, a excepcionalidade deve ser lida em conjunto com a presunção de inocência, constituindo um princípio fundamental de civilidade, fazendo com que as prisões cautelares sejam (efetivamente) a ultima ratio do sistema, reservadas para os casos mais graves, tendo em vista o elevadíssimo custo que representam. O grande problema é a massificação das cautelares, levando ao que FERRAJOLI denomina ‘crise e degeneração da prisão cautelar pelo mau uso’.
(...) As medidas cautelares diversas da prisão devem priorizar o caráter substitutivo, ou seja, como alternativas à prisão cautelar, reservando a prisão preventiva como último instrumento a ser utilizado. Não sem razão, o PL n. 4.208/2001 foi ressuscitado com a assumida finalidade de amenizar o caos do sistema prisional brasileiro, que, superando os 700 mil presos, tem quase 50% de presos cautelares, ou seja, aproximadamente 350 mil prisões preventivas (dados aproximados em 2016)”.[23]
Outro elemento prévio que se deve ter em mente quando da análise crítica da jurisprudência pátria é a proporcionalidade da decretação da prisão preventiva. Neste sentido, os incisos I e II do artigo 282 do CPP remetem às noções de “adequação” e “necessidade” - os dois primeiros estágios da máxima da proporcionalidade. Aliás, ainda que o Código de Processo Penal não o fizesse, tem-se a incidência do princípio da proporcionalidade como próprio corolário do ordenamento jurídico-constitucional.[24] Assim, todas as prisões preventivas deverão passar pela realização destes juízos no caso concreto.
Dito isto, cabe-nos agora trazer os julgados e agrupá-los em dois tipos distintos: (i) alguns casos, notadamente os mais antigos, aludem tão somente à mobilidade/itinerância do cigano para decretação da prisão preventiva, sem maiores fundamentações; (ii) os demais, valem-se de conceitos jurídicos indeterminados como “ordem pública” e “garantia da aplicação da lei penal” como trunfos argumentativos para afastar a análise dos requisitos no caso concreto e lançar uma cortina de fumaça na seletividade cultural da decretação da preventiva.
4.1. – A decretação da prisão preventiva fundada explicitamente na condição de cigano do réu
Neste primeiro item, avaliam-se os acórdãos que decretaram a prisão preventiva em razão do pertencimento do réu à etnia cigana. Felizmente, ao que parece, esse tipo de decisão perdeu lugar na retórica judicial, a partir da segunda metade dos anos 2000, muito provavelmente – especula-se – devido a maior penetração da dogmática do constitucionalismo da igualdade e do discurso de direitos.
Em todo caso, é oportuna a exposição dessas decisões com argumentação menos sofisticadas e nas quais a discriminação é mais perceptível, seja porque auxiliam na constatação da discriminação redirecionadas a conceitos jurídicos indeterminados, seja porque o risco de retrocesso em matéria de direitos fundamentais está sempre à espreita. Neste sentido, transcreve-se a ementa do seguinte acórdão do STJ:
“PROCESSUAL PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA.
I – Não se relaxa prisão preventiva de réu que devido a sua condição de cigano não tem residência fixa e que pelas circunstâncias do crime é considerado perigoso.
II – Para se decretar a custódia preventiva não é necessário prova da autoria, mas apenas indícios.
III – Recurso improvido”. (STJ, RHC n° 3.467-0/BA, 6ª Turma, relator: Ministro Pedro Acioli j. em 25 de abril de 1994) (grifos nossos)
No mesmo sentido, vêm, respectivamente, os seguintes acórdãos do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás e do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais:
“Habeas-Corpus. Sendo de vida nômade o paciente, por ser cigano, correta a decisão do juiz que tenha decretado sua custódia cautelar, por conveniência da instrução criminal e para garantia da aplicação da lei penal. Ordem denegada”. (TJGO, HC n° 11842-9/217, 2ª Câmara Criminal, relator Desembargador João Canedo Machado, j. em 14 de outubro de 1993) (grifos nossos)
“Habeas Corpus – Ausência de Comprovação de Residência. O paciente que afirma ser cigano e viver em acampamentos não tem condições de provar que reside no distrito da culpa” (TJMG, HC n° 1.000.07.452536-1/000, 3ª Câmara Criminal, relatora Desembargadora Jane Silva, j. em 24 de abril de 2004) (grifos nossos)
Ora, ainda que se admita que à época destes julgados o Código de Processo Penal não havia sido modificado – a inclusão das medidas cautelares penais diversas da prisão, bem como a previsão expressa da verificação de sua necessidade e adequação vieram apenas com a Lei n° 12.403/11 -, o texto constitucional originário traz garantias básicas, como o princípio da igualdade e a individualização da pena, que foram flagrantemente violados nos casos em questão. Estes fundamentos constitucionais serão mais bem desenvolvidos no item 4 do presente artigo.
4.2. – A “ordem pública” e a “aplicação da lei penal” como subterfúgios argumentativos da discriminação velada
Com a entrada em vigor da Lei n° 12.403/11, que conferiu a redação atual aos dispositivos do Código de Processo Penal, os requisitos para decretação da prisão preventiva se tornaram mais rigorosos, tratando-se ex lege de medida cautelar penal excepcional. Soma-se a isso a maior penetração do constitucionalismo democrático na retórica judicial e a institucionalização dos direitos fundamentais como normas diretamente aplicáveis, sem intermediação infraconstitucional.
Nada obstante, as preconcepções dos magistrados e ministros, oriundos de preconceitos enraizados no tecido social, não deixaram de penetrar no discurso jurídico. Notadamente, a forma mais comum de sua expressão, ainda que mediada, é por meio do recurso a conceitos jurídicos indeterminados sem maiores justificações analíticas. Este atalho argumentativo mostra-se presente no caso da decretação da prisão preventiva para ciganos, por meio do recurso a conceitos como “ordem pública” e “aplicação da lei penal”, senão vejamos:
HABEAS CORPUS IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO AO RECURSO PREVISTO NO ORDENAMENTO JURÍDICO. 1. NÃO CABIMENTO. MODIFICAÇÃO DE ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL. RESTRIÇÃO DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL. EXAME EXCEPCIONAL QUE VISA PRIVILEGIAR A AMPLA DEFESA E O DEVIDO PROCESSO LEGAL. 2. HOMICÍDIO QUALIFICADO. 3. PRISÃO PREVENTIVA. NECESSIDADE. FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA. PACIENTE QUE SE EVADIU DO DISTRITO DA CULPA APÓS O CRIME E QUE NÃO TEM RESIDÊNCIA FIXA. NECESSIDADE DA GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA E, SOBRETUDO, CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. 4. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO (...) 2. Na espécie, a prisão preventiva do paciente foi decretada e preservada não só em razão da gravidade concreta de sua conduta, desvelada pelo modus operandi que coloca em risco a ordem pública, mas também porque após a prática delitiva evadiu-se do distrito da culpa, vindo a ser preso somente no dia 19/4/2013, na cidade de Monte Alegre/MG. Além disso, consta, ainda, dos autos que o paciente "é cigano, e é notório o seu hábito de vagar por diversas cidades". Isso determina, nos termos da jurisprudência desta Corte, um maior rigor no exame dos seus requisitos de cabimento. Na análise da legitimidade da prisão preventiva, "o mundo não pode ser colocado entre parênteses. O entendimento de que o fato criminoso em si não pode ser conhecido e valorado para a decretação ou a manutenção da prisão cautelar não é consentâneo com o próprio instituto da prisão preventiva, já que a imposição desta tem por pressuposto a presença de prova da materialidade do crime e de indícios de autoria" (HC n.105.585/SP, Relatora a Ministra Rosa Weber, DJe de 21/8/2012). Desse modo, se as circunstâncias da prática do crime indicam a efetiva periculosidade do agente e a gravidade concreta da conduta, válida a manutenção da custódia cautelar para o resguardo da ordem pública. Precedentes”. (STJ, HC n° 276.340 – GO, 5ª Turma, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, j. em 24 de abril de 2014) (grifos nossos)
HABEAS CORPUS. IMPETRADO EM SUBSTITUIÇÃO A RECURSO PRÓPRIO. HOMICÍDIOS QUALIFICADOS CONSUMADO E TENTADO. PRISÃO PREVENTIVA. FUNDAMENTAÇÃO. MODUS OPERANDI. FUGA. NECESSIDADE DE GARANTIR A ORDEM PÚBLICA, A INSTRUÇÃO CRIMINAL E RESGUARDAR A FUTURA APLICAÇÃO DA LEI PENAL. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXCESSO DE PRAZO PARA A FORMAÇÃO DA CULPA. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. PROCESSO COMPLEXO. PLURALIDADE DE RÉUS (UMA FORAGIDA). NECESSIDADE DE EXPEDIÇÃO DE CARTA PRECATÓRIA PARA DIVERSAS COMARCAS. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. (...) 4. No presente caso, a segregação cautelar foi decretada pelo Tribunal estadual, em razão da periculosidade do paciente, evidenciada pelo modus operandi empregado (o réu, na companhia de seus dois filhos, realizou diversos disparos contra a vítima, amante de seu terceiro filho, em estabelecimento comercial de grande movimento, chegando inclusive a atingir terceira pessoa. E, após os disparos impedir testemunhas presenciais que acionassem a Polícia Militar e o SAMU, arrancando o aparelho celular de suas mãos). Prisão preventiva justificada, nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal, para a garantia da ordem pública e da instrução criminal. Precedentes. 5. Soma-se a isso o fato de o paciente ter se evadido logo após o crime, tendo sido preso em outro Estado e ainda por se tratar de cigano e, portanto, não possuir residência fixa. 6. Mostra-se indevida a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão, quando evidenciada a sua insuficiência para acautelar a ordem pública. (STJ, HC n° 431.957 - MG, 5ª Turma, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, j. em 20 de março de 2018) (grifos nossos)
Noutro giro, é oportuno destacar os seguintes trechos de precedentes, respectivamente, do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia e do Tribunal Regional Federal da 3ª Região:
“HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. PACIENTE PRONUNCIADO PELA PRÁTICA DO CRIME TIPIFICADO NO ART. 121, § 2º, INCISOS III E IV, DO CÓDIGO PENAL. (...) ARGUMENTAÇÃO DE QUE O DECRETO CONSTRITIVO TERIA SIDO FUNDADO EM PRECONCEITO QUANTO À ORIGEM CIGANA DO RECORRENTE. NÃO ACOLHIMENTO. PRISÃO PREVENTIVA FUNDADA EM ELEMENTOS CONCRETOS DA PRÁTICA DELITIVA ATRIBUÍDA AO PACIENTE E NO MODUS OPERANDI INDICATIVO DA SUA PERICULOSIDADE. FUNDAMENTAÇÃO DA MEDIDA NA SALVAGUARDA DA ORDEM PÚBLICA E NA CONVENIÊNCIA DA INSTRUÇÃO CRIMINAL, A QUAL FOI MANTIDA NA DECISÃO DE PRONÚNCIA. NÃO VERIFICAÇÃO DE IMPOSIÇÃO DA CUSTÓDIA CAUTELAR POR DISCRIMINAÇÃO EM RELAÇÃO À ORIGEM CIGANA DO PACIENTE. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS AO PACIENTE, POR SI SÓ, NÃO SÃO CAPAZES DE ASSEGURAR A CONCESSÃO DO ALVARÁ DE SOLTURA. (...)Não se observa, logo, qualquer indicativo de que a prisão
preventiva tenha sido decretada por preconceito ou discriminação relativa ao fato do Paciente integrar o povo cigano. (...)Ressalte-se que a decretação da preventiva, originariamente, baseou-se não apenas na conveniência da instrução criminal, mas também na salvaguarda da ordem pública, aspecto este já analisado nos autos do Habeas Corpus de nº 0000955-31.2014.8.05.0000.” (TJBA, HC n° 0012860-33.2014.8.05.0000, Primeira Câmara Criminal, relator Desembargador João Bosco de Oliveira Seixas) (grifos nossos)
“HABEAS CORPUS - PENAL E PROCESSO PENAL - ART. 171, § 3º, C.C ART. 29, EM CONCURSO MATERIAL COM ART. 304, C.C ART. 299, POR TRÊS VEZES, TODOS DO CP - SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA - FIXAÇÃO DO REGIME INICIAL FECHADO - VEDAÇÃO À SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR RESTRITIVAS DE DIREITOS - AFASTAMENTO DO DIREITO AO RECURSO EM LIBERDADE - DECISUM DEVIDAMENTE FUNDAMENTADO - AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL - ORDEM DENEGADA. 1- Objetiva o impetrante alterar o decreto condenatório e seus consectários por meio da via célere e limitada do habeas corpus, cujo procedimento é incompatível com a incursão no campo probatório, análise que seria imprescindível para se concluir corretamente pelo regime inicial a ser fixado, bem como pela eventual possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, matérias essas, porém, afetas ao procedimento ordinário e mais amplo da apelação. 2- Em informações prestadas, a autoridade apontada como coatora esclareceu ter dado provimento aos embargos de declaração opostos pelo ora paciente, a fim de corrigir a omissão apontada quanto à falta de fixação do regime inicial e menção à possibilidade de substituição da pena por restritivas de direitos. 3- O MM. Juízo a quo fixou o regime inicial fechado, diante da comprovada personalidade distorcida do paciente, voltada à criminalidade contumaz na prática do mesmo delito, sendo-lhe, pois, desfavoráveis as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP. Pelas mesmas razões, sua Excelência negou ao paciente o direito à substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, à luz do art. 44, inc. I e III, do CP, e vedou o recurso em liberdade, porquanto apurado nos autos que o paciente não possui residência fixa, já que pertence a grupo nômade de "ciganos", tampouco atividade profissional fixa, pois declarou ser vendedor "ambulante", sendo necessária, assim, a sua custódia para garantia da ordem pública. 4- Sentença condenatória devidamente fundamentada. 5- Ausência de constrangimento ilegal. 6- Denegação da ordem”. (TRF 3ª Região, HC n° 0013837-15.2014.4.03.0000/SP, relator Desembargador Luiz Stefanini, j. em 27 de agosto de 2014) (grifos nossos)
Da leitura destes julgados, extrai-se que, mesmo nos casos em que o órgão jurisdicional refuta tratar-se de decretação da prisão preventiva em razão da condição de cigano do réu, a prisão preventiva se lastreia na ausência de domicílio fixo ou de residência em acampamento – característica, como visto, constitutiva da identidade cigana. Assim, esta circunstância fática se mostra suficiente – ou ao menos, preponderante – para atrair o enquadramento em motivos de “ordem pública” e “fiel aplicação da lei penal”, o que, na prática, significa transformar a exceção – prisão preventiva – em regra para réus ciganos.
Aliás, cumpre trazer novamente as lições de Aury Lopes Jr., que, sob uma perspectiva mais abrangente, põe em xeque a própria constitucionalidade do conceito de “ordem pública” para fundamentar a prisão preventiva:
A prisão preventiva para garantia da ordem pública ou econômica nada tem que ver com os fins puramente cautelares e processuais que marcam e legitimam esses provimentos.
Grave problema encerra ainda a prisão para garantia da ordem pública, pois se trata de um conceito vago, impreciso, indeterminado e despido de qualquer referencial semântico. Sua origem remonta à Alemanha da década de 30, período em que o nazifascismo buscava exatamente isso: uma autorização geral e aberta para prender. Até hoje, ainda que de forma mais dissimulada, tem servido a diferentes senhores, adeptos dos discursos autoritários e utilitaristas, que tão “ bem” sabem utilizar dessas cláusulas genéricas e indeterminadas do Direito para fazer valer seus atos prepotentes.
(...) O art. 312 continha e contém uma “ anemia semântica”, explica MORAIS DA ROSA 84, pois basta um pouco de conhecimento de estrutura linguística para construir artificialmente esses requisitos, cuja “ falsificação” é inverificável. O grande problema é que, uma vez decretada a prisão, os argumentos “ falsificados” pela construção linguística são inverificáveis e, portanto, irrefutáveis. Se alguém é preso porque o juiz aponta a existência de risco de fuga, uma vez efetivada a medida, desaparece o (pseudo)risco, sendo impossível refutar, pois o argumento construído (ou falsificado) desaparece.
Para além disso, o preenchimento semântico (dos requisitos) é completamente retórico.
(...)Obviamente que a prisão preventiva para garantia da ordem pública não é cautelar, pois não tutela o processo, sendo, portanto, flagrantemente inconstitucional, até porque, nessa matéria, é imprescindível a estrita observância ao princípio da legalidade e da taxatividade. Considerando a natureza dos direitos limitados (liberdade e presunção de inocência), é absolutamente inadmissível uma interpretação extensiva (in mala partem) que amplie o conceito de cautelar até o ponto de transformá-la em medida de segurança pública.[25] (grifos nossos)
Ainda que não tenhamos condições, no presente artigo, de defender uma inconstitucionalidade do requisito legal de “ordem pública”, certo é que tal conceito jurídico indeterminado deve ser interpretado à luz da Constituição da República, o que implica, na hipótese de réus ciganos, uma acomodação razoável sobre suas notas culturais características, sob pena de a aplicação da Lei penal gerar um impacto desproporcional sobre essas minorias já estigmatizadas. Esta mesma acomodação como imperativo constitucional, que será analisada em detalhes na próxima seção, deve ser igualmente adotada na hipótese do não tão polêmico requisito da “aplicação da lei penal” quando aplicado a ciganos sem domicílio fixo ou que residem em acampamentos.
5 – Do reconhecimento à adaptação razoável: a erradicação da discriminação indireta
Um dos temas mais candentes da filosofia política é a tutela de minorias étnicas. Diferentes filiações teóricas – liberalismo, comunitarismo e teoria crítica – oferecem arranjos e respostas próprias para o debate acerca do multiculturalismo. Para fins da presente exposição, pode-se afirmar, por meio de uma super simplificação do debate, que todas convergem para a necessidade de adoção de políticas de reconhecimento pelo Estado, de modo a acomodar as minorias étnicas e o respeito à sua cultura, que é constitutiva da identidade do indivíduo que a integra.
Estas considerações morais podem auxiliar na formação de conceitos jurídico-constitucionais mais sensíveis às questões de reconhecimento, como, por exemplo, a ideia de discriminação indireta, elaborada a partir do princípio da igualdade. Daniel Sarmento, em artigo dedicado ao tema, traz as origens e as premissas deste conceito:
Também é de grande importância discriminação indireta, correlacionada à teoria do impacto desproporcional. Esta pode ser utilizada para impugnar medidas públicas ou privadas aparentemente neutras do ponto de vista racial, mas cuja aplicação concreta resulte, de forma intencional ou não, em manifesto prejuízo para minorias estigmatizadas. A discriminação indireta difere da discriminação de facto porque, nesta segunda, a norma pode ser aplicada de forma compatível com a igualdade. Já na discriminação indireta, tem-se uma medida cuja aplicação fatalmente irá desfavorecer um grupo vulnerável (...).
A teoria em questão surge nos Estados Unidos no começo da década de 70, após o fim das políticas públicas de conteúdo segregacionista naquele país. Àquela altura, a Suprema Corte norte-americana já firmara orientação sobre a necessidade de submissão a um controle estrito e rigoroso de constitucionalidade de normas que instituíssem discriminações baseadas em critérios raciais. Porém, em determinados casos, a ofensa à igualdade poderia ocultar-se em um texto normativo aparentemente neutro. Daí passou-se a atribuir grande importância à análise do impacto da medida sobre grupos estigmatizados.[26] (grifos nossos)
Assim, uma norma aparentemente neutra em seu conteúdo – como a ideia de “ordem pública” e de “aplicação da lei penal” – pode ter sua interpretação condicionada à luz do princípio da igualdade, se verificado que dado sentido que lhe é conferido atingirá desproporcionalmente um grupo minoritário – in casu, o réu cigano em processo criminal.
Noutro giro, a ideia de adaptação razoável, igualmente oriunda do princípio da igualdade numa acepção substantiva, é especialmente importante para tutela de minorias étnicas. Conforme destaca Letícia Martel, o conceito surgiu na legislação norte-americana para combater a discriminação no mercado de trabalho, mas começou a ser mais detalhadamente analisado em casos de práticas religiosas.[27] Após ampla análise do conceito na jurisprudência norte-americana, canadense e europeia, Martel oferece uma definição, tendo por base a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência:
(a) adaptação razoável é conceito que modifica o conteúdo jurídico da discriminação, que passa a ser configurada caso não haja oferta de adaptação razoável até o limite do ônus indevido;
(b) as pessoas com deficiência, à luz do modelo social combinado a elementos do biomédico, são titulares de um direito fundamental à adaptação razoável até o limite do ônus indevido nos mais diversos ambientes. Outros sujeitos poderão titularizar o direito fundamental à adaptação razoável, até o limite do ônus indevido, passo de inclusão que deve ser analisado caso a caso;
(c) adaptação compreende modificações, ajustes, amoldamentos e mesmo flexibilizações no ambiente material e normativo no qual é pleiteada, mediante emprego das mais diversos mecanismos;
(d) razoável é a adaptação eficaz para o indivíduo ou grupo, incluindo-se na ideia de eficácia a prevenção e a eliminação da segregação, da humilhação e da estigmatização;
(e) a adaptação razoável há de ser produto de um processo de diálogo entre os envolvidos;
(f) a defesa à adaptação razoável é o ônus indevido. Em essência, o ônus será indevido quando: (g.1) adotar uma adaptação obliterar exageradamente o objetivo da medida geral, ensejando riscos à segurança, saúde, bem-estar etc.; (g.2) no balanceamento de custos e benefícios, a adaptação mostrar-se demasiadamente custosa. Frisa-se que a análise de custos e benefícios não se restringe aos elementos econômicos, nem se esgota nos sujeitos ativo e passivo especificamente implicados.[28]
De acordo com estes standards, fica evidente que a adaptação razoável na hipótese vertente não gera um ônus indevido. Explica-se. A função da prisão preventiva, tal como modelada na redação atual do Código de Processo Penal, consiste em servir como ultima ratio, isto é, deve ser decretada quando da impossibilidade da adoção de qualquer medida prevista no artigo 319 daquele diploma normativo. Por outro lado, caso se admita que a ausência de residência fixa é requisito suficiente para sua incidência, sua aplicação para réus ciganos redundaria na sua degeneração, transfigurando-se em regra e desvirtuando a lógica das cautelares penais. Assim, tanto da perspectiva do Estado, quanto da perspectiva do indivíduo adepto da cultura cigana, a adaptação é medida de coerência normativa e da adequada tutela dos direitos fundamentais em jogo.
Por fim, verifica-se a existência de um canal infraconstitucional para adoção da acomodação da legislação processual penal para povos ciganos, qual seja, o artigo 8° da Convenção Internacional da OIT n° 169, internalizada pelo Decreto n° 5.051/04:
“Artigo 8o
1. - Ao aplicar a legislação nacional aos povos interessados deverão ser levados na devida consideração seus costumes ou seu direito consuetudinário.
2. - Esses povos deverão ter o direito de conservar seus costumes e instituições próprias, desde que eles não sejam incompatíveis com os direitos fundamentais definidos pelo sistema jurídico nacional nem com os direitos humanos internacionalmente reconhecidos. Sempre que for necessário, deverão ser estabelecidos procedimentos para se solucionar os conflitos que possam surgir na aplicação deste principio.
3 - A aplicação dos parágrafos 1 e 2 deste Artigo não deverá impedir que os membros desses povos exerçam os direitos reconhecidos para todos os cidadãos do país e assumam as obrigações correspondentes”. (grifos nossos)
Como se pode ver, este dispositivo traz verdadeira regra de hermenêutica inclusiva, demandando que a aplicação da lei nacional seja interpretada com a devida consideração dos costumes da comunidade tradicional. Não é demais ressaltar que os tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico pátrio possuem hierarquia supralegal e infraconstitucional, razão pela qual os dispositivos do Código de Processo Penal devem ser lidos à luz das peculiaridades ciganas, sem discriminar os adeptos desta cultura.
6 – Conclusão - O Supremo Tribunal Federal e seu papel contramajoritário: em defesa dos direitos das comunidades ciganas
A legitimidade democrática da jurisdição constitucional se extrai classicamente de sua aptidão de proteger os direitos fundamentais, ainda que contra a vontade política majoritária, visto se tratarem de verdadeiros trunfos das minorias em face das maiorias, excluídos, portanto, do cálculo político majoritário. Esta concepção robusta de democracia não se resume no governo da maioria, mas também no tratamento de cada indivíduo com igual respeito e consideração.[29]
Neste sentido, é inequívoco que a tutela dos direitos dos ciganos – minorias por excelência – legitima uma atuação institucional proativa do Supremo Tribunal Federal, no sentido de conceder interpretação conforme à Constituição dos requisitos de decretação da prisão preventiva, de modo a evitar um impacto desproporcional sobre aquele grupo étnico.
Evidentemente, contudo, o STF necessita ser provocado por meio do controle difuso ou concentrado de constitucionalidade para fixar o respectivo entendimento. Por outro lado, a maior chance de a Corte Suprema ser instada a tratar do tema certamente será pela via do Habeas Corpus. De toda sorte, propõe-se a seguinte tese para eventual julgamento futuro: a decretação da prisão preventiva para réus ciganos não pode se basear única e exclusivamente na ausência de domicílio fixo, não podendo esta circunstância ser requisito suficiente para enquadramento na preservação da “ordem pública” ou da “aplicação da lei penal”, devendo-se priorizar, em qualquer caso, as medidas cautelares penais previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal, considerado o dever de adaptação razoável decorrente das particularidades culturais dos indivíduos daquela etnia, na forma do art. 5°, §2° e 215, §1° CF e do art. 8° da Convenção Internacional da OIT n° 169, internalizada pelo Decreto n° 5.051/04.
Esta tese, caso adotada na oportunidade em que o STF venha a enfrentar o tema, exercerá uma tríplice função: (i) da perspectiva do réu cigano, haverá, obviamente, uma patente afirmação de reconhecimento de sua particularidade cultural, colmatando um ponto cego da normatividade hegemônica, além de garantir seu direito a não discriminação e à individualização da pena; (ii) por sua vez, o instituto das medidas cautelares penais não terá mais sua ratio subvertida, uma vez que a segregação cautelar permanecerá sendo exceção, mesmo na hipótese de réus ciganos; e (iii), por fim, haverá um efeito pedagógico e institucional nas instâncias inferiores, que não mais poderão velar eventual preconceito cultural por meio de sua recondução a conceitos jurídicos indeterminados. Trata-se, em suma, de claro avanço civilizatório.
7 - Referências
BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. Malheiros Editores, 17ª Edição, 2010.
DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. Editora Saraiva, 29ª Edição, 2010.
HARRIS, Angela P. Foreword. In: WEYRAUCH, Walter Otto (Ed). Gypsy Law: Romani Legal Traditions and Culture. University of California Press, 2001
KENRICK, Donald. Historical Dictionary of the Gypsies (Romanies). 2nd Edition. The Scarecrow Press Inc. 2007
KUSTERS, Joke. Criminalising Romani Culture through law. In: FOBLETS, Marie-Claire; RENTELN, Alison Dundes. Multicultural Jurisprudence: Comparative Perspectives on the Cultural Defense. Oxford and Portland Oregon, 2009
LEE, Ronald. The Rom-Vlach Gypsies and the Kris-Romani. In: WEYRAUCH, Walter Otto (Ed). Gypsy Law: Romani Legal Traditions and Culture. University of California Press, 2001
LEWY, Guenter. The Nazi persecution of the Gypsies. Oxford University Press, 2000
LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões Cautelares. 5. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo : Saraiva, 2017
MARTEL, Letícia de Campos Velho. Adaptação Razoável: O novo conceito sob as lentes de uma gramática constitucional inclusiva. Revista Internacional de Direitos Humanos. 14ª edição. Disponível em: http://www.surjournal.org/conteudos/getArtigo14.php?artigo=14,artigo_05.htm
NUSSBAUM, Martha. Liberty of Conscience: In defense of America’s Tradition of Religious Equality. Basic Books, 2008
SARMENTO, Daniel. A Igualdade étnico-racial no Direito Constitucional Brasileiro: Discriminação “de facto”, teoria do impacto desproporcional e ação afirmativa. In: ________________. Livres e iguais: estudos de direito constitucional. Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2006
SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional. 2ª Edição. Belo Horizonte: Fórum, 2014
TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos no Brasil: uma breve história. Crisálida, Belo Horizonte, 2009
WITTGENSTEIN, Ludwig. Tratado Lógico-Filosófico/Investigações Filosóficas. Fundação Calouste Gulbenkian. 5ª Edição, 2011
[1] Quanto ao ponto, cf: BONAVIDES, Paulo. Ciência Política. Malheiros Editores, 17ª Edição, 2010. p. 68-70 e 93; DALLARI, Dalmo de Abreu. Elementos de Teoria Geral do Estado. Editora Saraiva, 29ª Edição, 2010. p. 86 e 116-119
[2] KENRICK, Donald. Historical Dictionary of the Gypsies (Romanies). 2nd Edition. The Scarecrow Press Inc. 2007, p. xxxvii
[3] Ibid.
[4] Ibid. pp. xxxix e xl
[5] LEWY, Guenter. The Nazi persecution of the Gypsies. Oxford University Press, 2000. pp. 05-33
[6] KENRICK, Donald. Historical… p. xl
[7] TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos no Brasil: uma breve história. Crisálida, Belo Horizonte, 2009. pp. 28-29
[8] Ibid. p. 32
[9] Ibid. p. 33
[10] Ibid. p. 34
[11] Ibid. p. 60
[12] Ibid. pp. 60-61
[13] Ibid. p. 81
[14] Ibid. pp. 115-117
[15] Confira-se, sobre o ponto, a seguinte matéria jornalística relatando a audiência pública havida em 29/05/2018 na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2018/05/29/dados-sobre-a-populacao-cigana-precisam-ser-atualizados-dizem-debatedores
[16] Confira-se Recomendação do Ministério Público Federal, datada de 24 de maio de 2018, para inclusão dos povos ciganos no censo demográfico: http://www.mpf.mp.br/pgr/documentos/recomendacao-ciganos_ibge.pdf
[17] HARRIS, Angela P. Foreword. In: WEYRAUCH, Walter Otto (Ed). Gypsy Law: Romani Legal Traditions and Culture. University of California Press, 2001; TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos... p. 63
[18] WITTGENSTEIN, Ludwig. Tratado Lógico-Filosófico/Investigações Filosóficas. Fundação Calouste Gulbenkian. 5ª Edição, 2011. p. 228-229
[19] TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos... p. 63-64
[20] KUSTERS, Joke. Criminalising Romani Culture through law. In: FOBLETS, Marie-Claire; RENTELN, Alison Dundes. Multicultural Jurisprudence: Comparative Perspectives on the Cultural Defense. Oxford and Portland Oregon, 2009. pp. 203-204
[21] LEE, Ronald. The Rom-Vlach Gypsies and the Kris-Romani. In: WEYRAUCH, Walter Otto (Ed). Gypsy Law: Romani Legal Traditions and Culture. University of California Press, 2001. p. 196. TEIXEIRA, Rodrigo Corrêa. Ciganos no Brasil: uma breve história. Crisálida, Belo Horizonte, 2009. P. 90
[22] Confira-se a tramitação do PL em tela no seguinte endereço eletrônico: https://www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/120952
[23] LOPES JÚNIOR, Aury. Prisões Cautelares. 5. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo : Saraiva, 2017. pp. 27-28 e 99
[24] Ibid. pp. 27-31
[25] Ibid. pp. 74-76
[26] SARMENTO, Daniel. A Igualdade étnico-racial no Direito Constitucional Brasileiro: Discriminação “de facto”, teoria do impacto desproporcional e ação afirmativa. In: ___________________. Livres e iguais: estudos de direito constitucional. Editora Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2006. p. 148-149.
[27] Para uma análise da acomodação razoável de práticas religiosa à luz da filosofia política, cf: NUSSBAUM, Martha. Liberty of Conscience: In defense of America’s Tradition of Religious Equality. Basic Books, 2008. p. 116-134
[28] MARTEL, Letícia de Campos Velho. Adaptação Razoável: O novo conceito sob as lentes de uma gramática constitucional inclusiva. Revista Internacional de Direitos Humanos. 14ª edição. Disponível em: http://www.surjournal.org/conteudos/getArtigo14.php?artigo=14,artigo_05.htm
[29] A legitimidade democrática da jurisdição constitucional é posta em xeque sobretudo pelo argumento da sua “dificuldade contramajoritária” do Poder Judiciário, que consiste no fato de juízes não eleitos invalidarem normas editadas pelo legislador, este sim ungido pelo batismo popular. Para desenvolver o ponto, cf: SARMENTO, Daniel; SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. Direito Constitucional. 2ª Edição. Belo Horizonte: Fórum, 2014. pp. 35-40
mestre em Direito Público pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ. Assessor Jurídico Especial na Secretaria de Estado da Casa Civil do Estado do Rio de Janeiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Rafael Cascardo Cardoso dos. Um ponto cego da normatividade hegemônica: o caso da prisão preventiva para réus ciganos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 out 2021, 04:57. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57289/um-ponto-cego-da-normatividade-hegemnica-o-caso-da-priso-preventiva-para-rus-ciganos. Acesso em: 22 dez 2024.
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