Resumo: A tutela dos Direitos de Família, por envolver situações fáticas enormemente sensíveis e complexas, passa pela constante reflexão sobre a conveniência e efetividade da atuação do Estado-juiz em tão delicada seara. O artigo objetiva, a partir desse problema, analisar criticamente as novas disposições do Código de Processo Civil sobre o tema, cotejando os procedimentos especiais de jurisdição voluntária e contenciosa e apontando algumas de suas falhas e possíveis soluções. Após a apresentação de um panorama descritivo, identifica-se uma unidade teleológica nos ritos processuais, que consiste na proteção da família e de seus membros por meio do prestígio à solução consensual dos conflitos, em linha com a aposta geral trazida pelo CPC/2015.
Palavras-chave: Processo civil. Procedimentos especiais. Direito de Família. Consensualidade.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Panorama dos procedimentos de Direito de Família no CPC/2015. 3. Unidade teleológica dos procedimentos de jurisdição voluntária e contenciosa: proteção da família e consensualidade. 4. Considerações finais. 5. Referências.
1.Introdução
A particular complexidade das situações fáticas abrangidas pelo Direito de Família justifica, ainda hoje, que lhe sejam dedicados procedimentos especiais para a tutela em juízo, embora em outros ramos do Direito o procedimento comum adaptável (art.139, VI e 327, §2º, entre outros, do Código de Processo Civil) supra a necessidade de ritos especiais, conforme se verifica da extinção de alguns deles no CPC/2015.
Por isso, cabe ao operador do Direito conhecer as vantagens e desvantagens das variadas ferramentas processuais postas pelo legislador, especialmente em seara tão sensível na qual qualquer atuação do Estado pode irremediavelmente atrapalhar a resolução do conflito familiar, ainda que ajam as autoridades de acordo com a lei.
Este trabalho objetiva analisar criticamente o tratamento destinado pelo CPC/2015 às ações de família, cotejando suas disposições com as da lei anterior, bem como contextualizando-as com as demais diretrizes do atual diploma.
Após um panorama descritivo dos procedimentos elencados no Código, procede-se a um estudo pormenorizado a partir da identificação de uma unidade teleológica por ele erigida conforme a peculiaridade do direito material, qual seja, a proteção da comunidade familiar e de cada um de seus membros por meio, especialmente, da busca da reparação do conflito através da solução consensual. Apontam-se, ao longo da exposição, algumas incongruências, cuidados a serem observados e sugestões para o melhor deslinde possível dos processos.
2.Panorama dos procedimentos de Direito de Família no CPC/2015.
As ações de família de natureza contenciosa são espécie de procedimento especial a que o Código de Processo Civil de 2015 dedicou o Capítulo X do Título III do Livro I da Parte especial (arts. 693 a 699). Erigiu-se um amplo rol de ações que contempla o divórcio, separação, reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.
Quanto às ações de alimentos e as que versarem sobre interesse da criança ou do adolescente, prescreve o parágrafo único do art. 693 do CPC/2015 que observarão o procedimento previsto em legislação específica, aplicando-se, no que couber, as disposições do Capítulo X.
A novidade em relação ao código de 1973 é que naquele diploma não havia parte que designasse as ações de família como de procedimento de rito especial. Assim, as ações eram propostas pelo rito ordinário, o que era indesejável porque as demandas de família sabidamente demandam uma série de cautelas em seu deslinde, por se tratar de litígio muito sensível do ponto de vista de ambas as partes.
Uma ação de família malconduzida pode, muitas vezes, ter resultado diametralmente oposto ao almejado pela jurisdição estatal, qual seja, a pacificação do conflito. Ao contrário, ao transportar o conflito doméstico-familiar ao fórum, delegando a terceiro desinteressado o poder de decidir, costuma ter-se justamente o acirramento das mágoas e dos embates, arrastando-o por anos e demolindo as possibilidades de reconciliação e apaziguamento dos ânimos pelo tempo.
Assim, é louvável que o Código de Processo Civil de 2015 tenha destinado capítulo específico às ações contenciosas de família, erigindo rito especial para sua solução, o qual, como se verá, possui mecanismos que podem em muito contribuir para um grau superior de sucesso nestas demandas em relação ao que se observava na ordem processual anterior.
Já a jurisdição voluntária é definida por parte da doutrina como “administração pública de interesses privados” por ser função exercida pelo juiz em causas nas quais não há conflito de interesse entre as partes, que se convencionou chamarem, por conta disso, de “interessados”.
Os procedimentos de jurisdição voluntária ganharam corpo no CPC/2015 pela destinação de um capítulo específico a partir do art. 719. Destaca-se que a lei prevê expressamente a possibilidade de o juiz decidir por equidade, ou seja, estando desobrigado a “observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que considerar mais conveniente ou oportuna.” (art. 723, parágrafo único).
No Código de Processo Civil de 1973, o único procedimento voluntário de família era a separação consensual, previsto nos arts. 1.120 e seguintes.
Já no Código de 2015, o procedimento de jurisdição voluntário nas matérias de direito de família encontra previsão normativa nos arts. 731 a 734, que contemplam, no entanto, apenas o divórcio e a separação consensuais, não abrangendo o reconhecimento e extinção de união estável, guarda, visitação e filiação.
Ressalte-se, contudo, que o art. 732 dispõe aplicarem-se, no que couber, ao processo de homologação da extinção consensual de união estável as regras relativas ao processo de homologação judicial de divórcio ou separação consensuais. O artigo está em linha com o tratamento constitucional destinado à união estável, reconhecida pelo art. 226, §3º da CF/88 como entidade familiar para efeito da proteção do Estado, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Não obstante, o art. 733 ressalva que a realização de divórcio, separação e extinção de união estável consensuais só podem ser realizados por escritura pública caso não haja nascituro ou filhos incapazes, o que prestigia o comando constitucional de proteção do menor (art. 227 da CF/88)
3. Unidade teleológica dos procedimentos de jurisdição voluntária e contenciosa: proteção da família e consensualidade
No entanto, vislumbra-se de plano que os tratamentos destinados pelo Código de 2015 aos procedimentos contenciosos e voluntários de família tem mais semelhanças que diferenças, mormente por seguirem uma unidade teleológica de proteção da família e incentivo à resolução consensual e pacífica dos conflitos, rechaçando-se a litigiosidade tão danosa aos integrantes do núcleo familiar que tradicionalmente se verifica nesta seara.
A constatação advém do art. 694 do CPC/2015, segundo o qual, nas ações de família, todos os esforços serão empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxílio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação. O parágrafo único ainda permite que o juiz determine a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar.
Não se pode olvidar que o incentivo à solução consensual da controvérsia foi largamente acolhido por todo o código de 2015, tratando-se de verdadeiro vetor normativo da nova ordenação processual. Já o art. 3º, §3º da Lei disciplina que a conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial.
O sentido de favorecimento da conciliação desponta também na norma erigida pelo art. 334, pelo qual, em vez de o réu ser citar para contestar, o juiz, verificando que a petição inicial preenche os requisitos inicias e não sendo o caso de improcedência liminar do pedido, designará audiência de conciliação ou de mediação, para a qual será chamado o demandado. Conforme o §4º, a audiência somente não será realizada se ambas as partes se manifestarem expressamente rejeitando-a, ou quando não se admitir a autocomposição. No entanto, no caso das ações de família, prevalece que não se aplicam as referidas limitações, sendo a audiência de mediação etapa obrigatória do processo.
Destaque-se, sem embargo, convincente posicionamento contrário que leva em conta a impertinência da audiência de conciliação em casos específicos nos quais a reaproximação das partes pode até ser indesejável (TARTUCE, 2018):
Em demandas familiares, a via consensual, por um lado, pode se apresentar como o meio adequado para que a família se reorganize, soando obvio que a solução construída pelos envolvidos é preferível à imposição de um terceiro. Por outro lado, há situações críticas em que o uso da técnica consensual se revela inadequado. Como exemplo, em um conflito marcado por violência doméstica em que a esposa precisou obter uma medida protetiva contra o marido violento, deve-se, na posterior demanda de divórcio litigioso, designar a realização de uma sessão inicial de autocomposição mesmo que ela expresse não ter condições de com ele conversar? Nestes casos, em que resta patente a inadequação da sessão consensual para tentativa de autocomposição do conflito, ainda que uma das partes não manifeste sua oposição à realização da audiência, esta não deve ser designada.
O art. 6º do CPC também prestigiou a nova concepção do desincentivo à litigiosidade ao prever expressamente o princípio da cooperação, ao qual estão vinculados todos os sujeitos do processo (inclusive o juiz). É claro que não se espera que com a mera prescrição normativa atinja-se maior pacificação social dentro e fora do processo, principalmente no âmbito das complexas ações de família, nas quais a imensa carga emocional transcende a controvérsia posta nos autos e impede, muitas vezes, a resolução de questões de direito simples.
No entanto, por isso mesmo deve o ordenamento fornecer ferramentas e diretrizes, na tentativa de conferir ao processo mais efetividade não só jurídica, mas também para as vidas dos envolvidos. Isso passa, necessariamente, pela modificação dos ambientes e métodos discursivos empregados pelas partes, para o que a realização de audiências de mediação é um meio potencialmente muito eficaz.
Outra disposição legal que confirma o espírito conciliatório destinado pelo código às ações contenciosas de família é a do art. 695, §1º, que prescreve que o mandado de citação deverá estar desacompanhado da cópia da petição inicial, o que contribuiu para evitar que o conflito se perpetue e ganhe escala, o que seria efeito da leitura da exposição dos fatos e do direito pelo réu na referida ação.
Já o art. 696 permite que a audiência de mediação e conciliação se divida em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução consensual. Passam a incidir as normas do procedimento comum, segundo o art. 697, somente caso não realizado o acordo.
Por outro lado, a doutrina alerta para que o “empreendimento de esforços” para a solução consensual do conflito de família previsto pelo art. 694 não deve suplantar a vontade das partes, impondo-se decisão acordada que não se adequa às reais necessidades e pretensões da parte. Nesse sentido, o enunciado 187 do Fórum Permanente de Processualistas Civis: “no emprego de esforços para a solução consensual do litígio familiar, são vedadas iniciativas de constrangimento ou intimidação para que as partes conciliem, assim como as de aconselhamento sobre o objeto da causa”.
Mesmo assim, é perfeitamente possível, e até desejável, que a ação contenciosa de família transcorra até o fim sem que prevaleça a conflituosidade, atuando o juiz não como julgador do mérito da demanda para dar razão a uma das partes e impor derrota à outra, mas apenas como administrador da solução da controvérsia, cujo protagonismo será dado inteiramente às partes.
Sendo assim, a doutrina vem defendendo que o rol de procedimentos de jurisdição voluntária disposto nos arts. 731 e 732 não é taxativo, mas enunciativo, nada impedindo que as demais ações elencadas no art. 694 sejam também qualificadas como de jurisdição voluntária, seguindo seu procedimento.
Essa conclusão estende-se à celeuma advinda de o art. 732 prever que, quanto à união estável, será admitido o procedimento de jurisdição voluntária no que diz respeito à “extinção”, silenciando o artigo quando ao “reconhecimento”, o qual é admitido pelo art. 693. A partir do referido entendimento, segue-se que também o reconhecimento da união estável admitirá o rito da jurisdição voluntária, caso não haja divergência entre os interessados.
Interessante destacar a prescrição do art. 733, §2º do CPC, segundo a qual, nos procedimentos voluntário de divórcio ou separação consensual ou dissolução consensual de união estável, que podem ser realizados por escritura publica, o tabelião somente lavrará a escritura se os interessados estiverem assistidos por advogado ou por defensor público.
A norma é polêmica porque, em havendo consenso entre as partes, e sendo o tabelião profissional dotado de fé pública apto a assegurar o respeito às formalidades inerentes ao ato, é difícil justificar a necessidade de assistência dos cônjuges ou companheiros por advogados, considerando inclusive que a desjudicialização do procedimento cumpre também a função de reduzir os custos inerentes ao processo. Por outro lado, o Código estabelece ao menos que a escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras (art. 731, §1º).
Quanto à intervenção do Ministério Público, delimita o art. 698 do CPC que o Parquet intervirá somente quando houver interesse de incapaz, devendo ser ouvido previamente à homologação de acordo. Trata-se de medida útil à razoável duração do processo (CF, art. 5º, LXXVIII), considerando também que o art. 178 do CPC prescreve que o MP intervirá como fiscal da ordem jurídica apenas nas hipóteses previstas em lei ou na Constituição Federal.
Por outro lado, igualmente na linha do prestígio à efetividade do processo, embora o CPC determine que é nulo o processo quando o membro do Ministério Público não for intimado a acompanhar o feito em que devia intervir (art. 279), a nulidade só pode ser declarada após a intimação do Ministério Público, que se manifestará sobre a existência ou a inexistência de prejuízo (art. 279, §2º). Com isso, tem-se a adoção do princípio “pas de nullité sans grief”, pelo qual as nulidades processuais dependem sempre da demonstração de prejuízo, derivado da concepção de instrumentalidade do processo. O princípio é amplamente adotado pelo STJ.
Também nas ações de jurisdição voluntária de família a intervenção do Ministério Público se faz presente. É o caso da necessidade de intimação da instituição no procedimento de alteração do regime de bens do casamento, que é disciplinado pelo art. 734 do CPC.
Nessa demanda, prescreve-se também a publicação de edital que divulgue a pretendida alteração de bens, podendo os cônjuges propor ao juiz meio alternativo de divulgação a fim de reguardar direitos de terceiros (art. 734, §§1º e 2º). A disposição é criticada na doutrina por contemplar “formalidade ausente no regime anterior e que pode ensejar demora adicional injustificável no feito” (TARTUCE, 2018).
Destaca-se que o regramento processual da alteração de regime de bens do casamento é novidade do Código de Processo Civil de 2015, já que anteriormente havia previsão da matéria somente na lei material.
Já a contenda a respeito da subsistência da separação judicial no ordenamento brasileiro, que vem desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 66/2010, não foi resolvido pelo Código de 2015, que manteve a previsão da separação consensual como procedimento de família. Fernanda Tartuce (2018) destaca que o projeto do Código de Processo Civil tramitou por considerável tempo contemplando apenas o divórcio, tendo a separação sido incluída no texto no fim do processo legislativo.
Contudo, cabe apontar que não se vislumbra mais utilidade no procedimento de separação, dado que, a partir da referida emenda constitucional, o direito a requerer o divórcio passou a ser potestativo, ou seja, indiferente a qualquer resistência da parte contrária, admitindo-se a plena (des)constituição da relação jurídica tão somente a partir da manifestação de vontade de um dos cônjuges.
Assim, poder-se-ia levantar o problema da falta de interesse de agir, que tem como um de seus parâmetros a utilidade da prestação jurisdicional. Contudo, como o Código previu expressamente esta modalidade, a extinção de todos processos sem resolução do mérito por falta de interesse de agir representaria indevida interferência judicial na vontade do legislador, já que inviabilizaria o prosseguimento de qualquer ação deste tipo.
Quanto à oitiva de incapazes nas ações de família, importante disposição é a do art. 694, parágrafo único, combinada com o art. 699 do CPC. Estas normas, reconhecendo que o caráter sensível das matérias tratadas nas ações em questão, principalmente quando envolvem incapazes, prescrevem que o juiz deve ser assistido por especialistas ou equipes multidisciplinares no tratamento das demandas. Objetiva-se, com isso, evitar que o deslinde processual seja mais um trauma na vida da criança, que muitas vezes se vê no centro de um fervoroso embate entre os pais. O caso de alienação parental é definido pelo art. 2º da Lei 12.318/2010:
Art. 2o Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.
Conforme o art. 3º da mesma lei, a prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda.
Nesse contexto, o acompanhamento do caso por especialista nos momentos de comparecimento do menor em juízo, conforme determina o art. 699 do CPC, pode ter o condão de evitar que o processo sirva de pretexto para a nefasta prática de alienação parental, assegurando que o melhor interesse do menor estará no centro da discussão, impedindo que este seja utilizado como “arma” na briga entre os demais membros da família.
Nestes casos, que envolverão principalmente as demandas relativas a guarda, a atenção judicial deve ser redobrada, e talvez por isso os artigos do CPC destinados aos procedimentos de jurisdição voluntária não tenham expressamente contemplado essa espécie de ação, conforme acima tratado. No entanto, assim como nas outras ações de família, nada impede que os cônjuges ou companheiros, quando do divórcio ou da extinção de união estável, entrem em acordo relativo à guarda dos filhos incapazes e ao regime de visitas (art. 731, III), bem como ao valor da contribuição para criar e educar os filhos (art. 731, IV). Se isso ocorrer, o procedimento adotado poderá ser o consensual, exigindo-se apenas a homologação pelo juízo em procedimento de jurisdição voluntária.
4.Considerações finais
O tratamento dado pelo Código de Processo Civil de 2015 às ações de família, contenciosas ou voluntárias, apresenta mais pontos de contato do que de divergência. O diploma processual, além de inovar em relação ao anterior por destinar artigos específicos aos procedimentos contenciosos de família, o que atende a necessidade de destinar a esta matéria instrumentos processuais mais adequados à sensibilidade das relações jurídicas em discussão, prevê meios para que as partes, em consenso, utilizem-se da via judicial apenas para chancelar as decisões já tomadas, o que representa grande valorização de sua autonomia privada.
As disposições estão em consonância com a valorização dada pela lei instrumental aos meios alternativos de resolução de conflitos, cuja presença se pretende estender a todo o ordenamento processual, mas que têm especial relevância nas ações de família, dada a proximidade das partes e o potencial destrutivo que uma intervenção estatal drástica pode ter sobre as próprias relações que pretende proteger.
O incentivo à solução consensual do conflito, por outro lado, não pode servir de catalisador da inefetividade do processo, que pode ocorrer quando os meios alternativos são forçados em situações nas quais não cabem, o que também é frequente nas ações de família, principalmente nas que envolvem violência doméstica, abuso de menores, alienação parental etc.
Nesses casos, o provimento judicial deve ser firme, conferindo efetiva proteção às partes vulneráveis. Para isso, cabe ao juiz utilizar as ferramentas e instituições que podem, por vezes muito melhor do que ele, contribuir para a solução da controvérsia e para a efetivação da melhor solução, como equipes de assistência social, psicólogos etc.
Nem se deve esquecer do importante papel cumprido pelo Ministério Público nas ações de família, como instituição afeta à defesa da ordem jurídica e dos interesses individuais indisponíveis. Contudo, o comando constitucional que consagra a razoável duração do processo e a concepção de que este é instrumento para a realização dos direitos impõe que a decretação de qualquer nulidade processual, e especialmente as decorrentes de ausência de intimação do Parquet, devam ser precedidas de intimação para que a instituição alegue o prejuízo eventualmente sofrido.
Embora a discussão dos problemas familiares em juízo seja tema muito delicado e que certamente escapa do que é possível ser tratado por um Código de Processo, acredita-se, a partir do estudo comparado da lei de 1973 com a de 2015, que avançou-se no delineamento de um procedimento adequado à solução destas controvérsias, passando desde o incentivo à desjudicialização até a adoção de normas protetivas das partes vulneráveis em juízo, nos casos em que a intervenção estatal mais drástica se faz necessária.
5.Referências
TARTUCE, Fernanda. Ações de família. Enciclopédia jurídica da PUC-SP. Edição de junho de 2018. Disponível em https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/169/edicao-1/acoes-de-familia.
PIMENTEL, Alexandre Freire. O procedimento das ações de família (de jurisdição contenciosa e voluntária) no CPC/2015. Disponível em http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_biblioteca/bibli_servicos_produtos/bibli_informativo/bibli_inf_2006/Rev-AJURIS_141.03.pdf.
OLIVEIRA, Rogério Alvarez de. Breve diagnóstico sobre os procedimentos de família após a vigência do CPC/2015. Disponível em https://www.conjur.com.br/2019-mai-20/mp-debate-breve-diagnostico-procedimentos-familia-atual-cpc.
Advogado inscrito na OAB/MG. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FIORINDO, Vitor Paiva. Procedimentos de Direito de Família no CPC/2015: teleologia e importância da consensualidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 out 2021, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57293/procedimentos-de-direito-de-famlia-no-cpc-2015-teleologia-e-importncia-da-consensualidade. Acesso em: 23 dez 2024.
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