Resumo: O presente trabalho visa trazer uma discussão ampla acerca da redução da maioridade penal e quais os impactos da adoção dessa medida no sistema jurídico-penal no país. Por meio de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, buscou-se a análise dos principais argumentos favoráveis e contrários à medida, de modo a trazer à tona a discussão sobre suas consequências no sistema jurídico brasileiro e na segurança pública. Diante desse contexto, emerge o questionamento na busca para a solução do problema: qual a possibilidade jurídica de redução da maioridade penal? Assim, esse estudo assume vem analisar a possibilidade Jurídica de redução da maioridade penal. Outrossim, esse estudo se justifica, pelo fato de que o crescente número de casos de violência e crimes registrados em todo o país praticados por menores de idade, faz com que a temática escolhida para o desenvolvimento da pesquisa volte à tona no tocante a análises na área de direito penal. O método a ser utilizado neste trabalho é o dedutivo. A tipologia da pesquisa abrangeu três aspectos: quanto aos objetivos tratou-se de uma pesquisa exploratória; quanto à abordagem do problema, foi qualitativa; quanto aos procedimentos técnicos, bibliográfica.
PALAVRAS-CHAVE: Imputabilidade Penal. Estatuto da Criança e do Adolescente. Maioridade Penal.
ABSTRACT: This work aims to bring up a broad discussion about the reduction of the age of criminal responsibility and the impacts of the eventual adoption of the measure in the Brazilian criminal justice system. Through extensive bibliographical and jurisprudential research, we sought to analyze the main arguments for and against the measure, in order to bring up the discussion about its consequences in the Brazilian legal and public security system. From this context, the questioning of this study emerges, which seeks to answer the following problem: What is the legal possibility of reducing the age of criminal responsibility? To answer this problem, this study assumes the objective of analyzing the legal possibility of reducing the age of criminal responsibility. In this vein, this study is justified by the fact that the growing number of cases of violence and crimes registered throughout the country makes the theme chosen for the development of this research, that is, the reduction of the age of criminal responsibility, always come back. surface, with regard to analyzes in the area of criminal law. The method adopted to carry out this research was deductive. The research typology adopted covered three aspects: regarding the objectives, it was an exploratory research; as for the approach to the problem, it was qualitative; as for the technical procedures, it was bibliographical. It was concluded that, it is undeniable that accommodating minor offenders in the same prisons as adults would not contribute anything to their resocialization, but, on the contrary, could contribute to the recurrence of crimes.
KEYWORDS: Criminal Imputability. Child and Adolescent Statute. Criminal majority.
SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Maioridade penal: 2.1 Da maioridade penal no brasil; 2.2 Análise estatística acerca da realidade penal dos adolescentes em conflito com a lei; 2.3. A pouca efetividade da política de aplicação de medidas socioeducativas; 2.4. A possibilidade jurídica de redução da maioridade penal. 3. Conclusão. 4. Referência.
No atual contexto sócio econômico, verifica-se a necessidade de o Direito evoluir, tendo em vista o dinamismo inerente às relações sociais. O Direito, de uma forma geral, amolda-se como um caminho de regulação do meio social. Assim, com a evolução social surge a necessidade de regular de forma adequada as atividades, num movimento constante de adaptação normativa.
No âmbito do Direito Penal, esse fato também se manifesta verdadeiro, vez que, com o passar do tempo, muitos dos comportamentos que eram vistos com alto grau de reprovabilidade por conta de uma concepção moral da sociedade passam, em virtude da já mencionada evolução, a serem vistos como fatos sociais que acontecem naturalmente.
Dessa forma, há atenção especial dos aplicadores do direito e, também, dos legisladores, de modo a fazerem com que a aplicação do Direito esteja, o mais próximo possível, da realidade social. O Direito Penal se afigura como uma ferramenta à disposição do Estado, que visa regular as relações sociais onde exista desequilíbrio social ou uma injusta interferência de um particular nos direitos ou bens jurídicos de outrem.
Assim, por meio dessa ferramenta, o Estado está autorizado a atuar de maneira restritiva na esfera jurídica do infrator, diminuindo-lhe a liberdade através da pena aplicada. Todavia, é também um imperativo jurídico de que a pena não se descole de seu caráter pedagógico, devendo ser atrelada ao fato delituoso e, ao mesmo tempo, à condição pessoal do agente. Partindo desse contexto emerge o questionamento desse estudo que busca responder ao seguinte problema: Qual a possibilidade jurídica de redução da maioridade penal?
Para responder a esse problema, esse estudo assume o objetivo de analisar a possibilidade Jurídica de redução da maioridade penal. Neste diapasão, esse estudo se justifica, pelo fato de que o crescente número de casos de violência e crimes registrados em todo o país faz com que a temática escolhida para o desenvolvimento da presente pesquisa, isto é, a redução da maioridade penal, sempre volte à tona, no tocante a análises na área de direito penal.
Neste mesmo propósito, nota-se que as crianças e adolescentes acabam não sendo uma realidade alarmante, mas seus próprios transformadores, é porque esteve em contato com situações que lhe proporcionaram a cidadania, e assim, a finalidade da medida estará cumprida e quem ganha é a própria sociedade.
No Brasil como um todo, temos assistido um aumento dos números de delitos na sociedade, especialmente, os contra a vida e, consequentemente, considerados hediondos pela legislação especial para tais crimes. Em muitas das vezes, tais condutas criminosas são cometidas por pessoas que se encontram abaixo da faixa etária de 18 anos de idade, considerados pela norma pátria crianças e adolescentes que, amparados pela sua inimputabilidade e da percepção de impunidade diante das frágeis medidas socioeducativas impostas pela Lei no 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA), passam a uma vida de delinquência.
Muitos argumentam que a inimputabilidade é uma falácia, eis que menores de 18 anos já podem exercer diversos atos da vida civil, como casar-se, votar e trabalhar. Lado outro, muitos afirmam que punir não é suficiente: é necessária uma educação inclusiva, de modo a criar no jovem a consciência sobre seu papel na sociedade, da consequência de seus atos, e que somente assim formar-se-iam cidadãos, com a consequente redução no número de crimes. E assim, com ambos os lados possuindo parcela de razão, a discussão prossegue, sem solução.
A mais notável e pioneira tentativa de alteração penal foi intentada através da PEC 171/1993, de autoria do ex-deputado Benedito Domingos, onde se pretende alterar o Artigo no 228, da Constituição da República Federativa Brasileira (CRFB/88), que preceitua que “são penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial” (BRASIL, 1988), de modo a relativizar a norma, permitindo a imputação de crimes considerados hediondos (aqueles descritos na lei 8.072/90) a adolescentes maiores de 16 (dezesseis) e menores de 18 (dezoito) anos. Essa proposta foi aprovada na câmara dos deputados, em dois turnos, e atualmente encontra-se em análise pela comissão de Constituição e Justiça no Senado Federal.
De toda sorte, é possível afirmar categoricamente que somente a redução da maioridade penal não seria suficiente para acabar definitivamente com a criminalidade no país. Todavia, é notável que a redução traria impactos, em muitos aspectos do campo jurídico penal. Dessa forma, através do presente trabalho, buscam-se discorrer acerca das consequências da possível adoção da redução da maioridade penal no Brasil, de modo a verificar quais seriam os impactos no sistema penal brasileiro.
Durante o período colonial, a maioridade penal foi estatuída no Brasil, por meio do primeiro Código Criminal do Império (1830), que seguiu uma tradição da Europa, no intuito de colocar severidade na legislação brasileira, através da punição aos cidadãos infratores. Durante seis décadas, o Código supracitado, foi responsável pela imputabilidade e sanção dos infratores, havendo mudanças na legislação apenas mediante o Decreto nº 847, de 11 de outubro de 1890, assinado durante o governo do General Manoel Deodoro da Fonseca (1889-1891), que veio instaurar uma reforma no regime penal, considerando inclusive a maioridade penal, desde a perspectiva da inimputabilidade, nesse contexto, os menores de nove anos eram considerados como inimputáveis, como garantia de proteção ao menor.
Desta forma, percebe-se que os direitos dos adolescentes sempre foram uma preocupação por parte da sociedade, em geral, e da legislação, em particular. Essa preocupação foi ratificada mediante o Decreto no 17.943, de 12 de outubro de 1927, (Código Mello Mattos), que reúne em seus 123 artigos o objetivo de proteger à criança e, ao mesmo tempo, de reprimir os delitos cometidos pelas crianças e adolescentes.
A imputabilidade penal, entendida como o conjunto de condições que determinam que um agente possua a capacidade de que suas ações sejam juridicamente imputadas, por décadas foi pensada para possibilitar que apenas o jovem com 18 anos completos pudesse ser imputável, considerando essa idade como um critério de segurança, pois se entende que o adolescente não possui a maturidade necessária para responder por seus atos perante a lei, deste modo Masson diz:
“Em relação aos menores de 18 anos de idade adotou-se o sistema Biológico para a constatação da inimputabilidade. Tais pessoas, independentemente da inteligência, da perspicácia e do desenvolvimento mental, são tratadas como inimputáveis. Podem, inclusive, ter concluído uma faculdade ou já trabalharem com anotação em carteira de trabalho e previdência social. A presunção de inimputabilidade é absoluta (iuris et de iure), decorrente do art. 228 da Constituição Federal2 e do art. 27 do Código Penal3 e não admite prova em sentido contrário. “Nos termos da Súmula 74 do Superior Tribunal de Justiça, a prova da menoridade deve ser feita por documento hábil”. Esse documento pode, mas não deve ser necessariamente a certidão de nascimento. Serve qualquer documento de identidade, certidão de batismo, carteira escolar, entre outros” (MASSON, 2019, p. 552).
Todavia, e tendo em vista as alterações sociais vivenciadas nas últimas décadas, conclama-se a alteração da política de apenamento, conforme será demonstrado durante o próximo capítulo.
2.1 ANÁLISE ESTATÍSTICA ACERCA DA REALIDADE PENAL DOS ADOLESCENTES EM CONFLITO COM A LEI
No contexto atual apesar de termo alcançado um status de país democrático, ainda é percebível no Brasil, o desrespeito à dignidade da criança os direitos previstos na CF/88 dentro do rol dos direitos sociais, esse contexto reforça-se os achados em muitos escritos jurídicos, os objetivos sociais presumíveis são prosseguidos pela lei, onde muitas vezes está expressa a moralidade necessária; em que eles tendem a confundir os conceitos de final (propósito) ou função (funções). “Os críticos reclamam instrumentalismo ingênuo, que são específicos a ser medido pela sua efetividade” (COTTERRELL, 1991). Frente a este novo cenário da criminalidade infantil Silva descreve que:
“No contexto da sociedade brasileira, a preocupação com a proteção da infanto-adolescência refletiu-se em diversos dispositivos da carta constitucional de 1988, dessa maneira cabe ao estado, à sociedade e à família assegurar condições efetivas do exercício de cidadania plena à criança e ao adolescente, os quais devem ser protegidos e ter seus direitos garantidos” (SILVA, 2018, p. 212).
Em nesse sentido, que a análise funcional trata diretamente as causas e origens dos fenômenos sociais, onde a orientação é implícita em distinguir ordem e função; a origem histórica da doutrina inglês de estados, ou o sistema jurídico estão sujeitas às fiscalizações completamente diferentes funções sociais, políticas e económicas ou real. As funções próprias podem ser consideradas em sua mudança temporária progressiva; uma monarquia, o que representou tempos em uma política militar e direção pode começar a cumprir funções puramente simbólicas ou ideológicas; um ritmo de elementos funcionais pode tornar-se prejudicial para o funcionamento do sistema social coeso (COTTERRELL, 1991). Corroborando a esse contexto tem-se na Constituição (CF, 1988) o seguinte texto:
Art. 227 – é dever da família, da sociedade e do estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
§ 1º – o estado promoverá programas de assistência integral à saúde da criança e do adolescente […].
§ 3º – o direito à proteção especial abrangerá os seguintes aspectos:
I – Idade mínima de quatorze anos para admissão ao trabalho, observando o disposto no art. 7 o, XXXIII; […].
III – garantia ao acesso do trabalhador adolescente à escola; […].
§ 4º – a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.
Art. 229 – os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores […].
Constituindo ainda o cenário de proteção ao menor, tem-se no ECA, uma condição peculiar ao tratamento de crianças e adolescentes, pois este preconiza que criança é o indivíduo de até 12 anos de idade incompletos, já o adolescente tem entre 12 e 18 anos, sendo dever do estado assegurar seus direitos, sem ao menos alguém protestar ou contestar qualquer ato infrator cometido por esse menor. Retornando a redação da CF (1998) lê-se:
I – ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria;
II – progressiva extensão da obrigatoriedade e gratuidade ao ensino médio;
III – atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino;
IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade;
V – acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um;
VI – oferta de ensino noturno regular, adequado às condições do adolescente trabalhador;
VII – atendimento no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde.
É cediço acrescentar que tais direitos não excluem os autores de atos infracionais que são merecedores de igual atenção e cuidado por parte da família, do estado e da sociedade. São seres humanos que foram, em algum momento de sua história, violados em seus direitos e necessitam de especial atenção para sua recuperação (SOARES, 2017). Para se entender as causas presentes nesta contradição, torna-se importante assinalar as mudanças que ocorreram na origem do capitalismo que iniciou com revolução industrial na Inglaterra 1780, onde provocaram mudanças econômicas no sistema de produções a consequência foi à imigração de grande parte da população das zonas rurais para zona urbanas atraídas pela oferta de emprego, além desse fator imigratório crianças acompanharam seus pais nas realizações das atividades fabris.
“Buscavam o máximo da força de trabalho pelo mínimo necessário para pagá-las. Como mulheres criança podiam cuidar das máquinas e receber menos que os homens. A princípio os donos de fabricas compravam o trabalho das crianças pobres, nos orfanatos; mais tarde, como os salários do pai operário e da mãe operária não era suficiente para manter as famílias, também as crianças que tinha em casa foram obrigadas a trabalhar nas fabricas e minas” (COTTERRELL, 1991, p. 178).
Com o processo de reestruturação econômica do capital, o aumento do desemprego que cresce desordenadamente colocando as famílias em situação de vulnerabilidade social, obrigando os pais a colocarem seus filhos para trabalharem nos setores informais, para garantir o sustento e a manutenção financeira da casa.
“Nestas condições que a questão social se torna – mais exatamente: podem torna-se – objeto de uma intervenção continua e sistemática por parte do Estado. É só a partir da concretização das possibilidades econômicas e sociais e política segregada na ordem monopólica (concretização variável do jogo das forças políticas) que a questão social se opõe como alvo das políticas sociais” (PEREIRA, 2015, p. 29).
Soma-se a esse fato que na sociedade capitalista os seres humanos são tratados como coisas, podendo ser substituídos por qualquer outro trabalhador. Desta forma a questão social, se caracteriza de forma expressiva e agressiva na sociedade onde a moeda de troca é à força de trabalho. Agregando a este contexto capitalista Trentin, ressalta que:
“O adolescente em conflito com a lei, habitualmente, nasce numa família pobre, de pais não inseridos socialmente ou que praticam delitos. As famílias influenciam o desenvolvimento dos seus descendentes através da sua situação social e física. A educação e a ocupação dos pais têm consequências de grande importância para as crianças. O mesmo acontece com a zona em que vivem. Pais física e afetivamente ausentes, separados, violentos ou, até mesmo, criminosos são exemplos para muitas crianças e adolescentes. Essa criminalidade praticada pelos pais tende a ser transmitida aos filhos, perpetuando a sina familiar para comportamentos desviantes antissociais” (TRENTIN, 2016, p. 221).
Agregado aos fatores capitalistas da sociedade, Silva leciona que “as causas de marginalidade entre os jovens são amplas, não se restringindo apenas a aspectos estigmatizados como a mendicância, fome, baixo nível de escolaridade e renda, desemprego, subemprego, desestruturação familiar e o descaso social” (SILVA, 2018, p. 04), de modo geral a autora classifica que estes motivos estão relacionados a duas causas as psico-patogênicas e/ou psicossociais.
Independente das causas relacionada as práticas criminais de crianças adolescentes, “qualquer indivíduo deve desenvolver a sua capacidade de controle dos impulsos, para não ultrapassar as leis impostas pela sociedade ao qual ele pertence. É indispensável que consiga adiar a gratificação de uma ação, sem sentir-se prejudicado, além de saber levar em conta os sentimentos alheios, não transpondo o limite de uma boa convivência visando uma gratificação imediata” (TRENTIN, 2016, p. 225). Com relação aos fatores que fazem com que as crianças e adolescentes recorram à criminalidade é explicado nos estudos de Roberti quando o autor descreve:
“Na maioria das vezes as crianças refugiam-se na marginalidade, em consequência do fracasso da geração dos seus pais, fugindo, desta forma, das opressões de todos os gêneros, protegendo-se da despersonalização em que a sociedade os obriga a se amoldar. Como resposta à irresponsabilidade e desumanidade da sociedade, que tem seus interesses voltados para o desenvolvimento e ignora as vítimas de uma política que não leva em conta o social e, sobretudo, a criança, esta reunindo-se em bandos, tenta criar, clandestinamente, um mundo irreal que responda às suas necessidades mais profundas” (SILVA, 2018, p. 04).
Agregado aos fatores sócios ambientais que estão envolvidos os jovens infratores do Brasil, Soares salienta que:
“Outro aspecto significativo na história de vida de adolescentes que se envolvem em atividades ilícitas e que pode influenciar na prática de atos infracionais é o alto índice de evasão escolar. É grande o número de adolescentes que deixam a escola após inúmeras reprovações, por não se sentirem instigados a aprender o que a escola tem para lhes oferecer, talvez por não compreenderem o sentido destes conteúdos em suas vidas práticas. Outros, ainda, deixam a escola para trabalhar ou por não conseguirem conciliar trabalho e estudos” (SOARES, 2017, p. 12).
Neste sentido, muitas vezes a família tem grande influência, seja por negligenciar o abandono escolar ou por incentivar a evasão diante de uma dura realidade onde a necessidade de sobrevivência fala mais alto, isso porque “o direito não é mais constituído por genarilades, isso porque as relações ou relacionamentos sociais no sentido em que Marx fala, está na falta de um acabamento no sistema de relações” (STUCKA, 1969). Outro fator que merece destaque é a drogadição onde Soares (2018, p. 12) descreve que:
“Sabe-se que o mercado de substâncias entorpecentes cresce de forma alarmante e se prolifera desde a cidade até o interior, da periferia aos bairros nobres. Os adolescentes acabam por se envolver com as drogas de diferentes maneiras. Alguns são atraídos pelo dinheiro fácil que o comércio ilegal de entorpecentes proporciona, outros se envolvem com as gangues para receber segurança, ajuda econômica e social dos “patrões” do tráfico, outros ainda, pela própria dependência química precisam trabalhar para as gangues a fim de pagar suas dívidas com as mesmas”.
Isso ocorre devido aos adolescentes que passarem a estabelecer algum vínculo com estes grupos, muitas vezes, são incentivados a cometer assaltos, roubos e até homicídios. Os próprios traficantes facilitam o uso de armas de fogo a estes jovens que, fascinados pelo poder e pelo fácil acesso às drogas, envolvem-se nestas atividades ilegais e quando percebem já não conseguem mais sair desta realidade.
De modo a ilustrar melhor a importância da discussão sobre o tema, cumpre-se primeiramente a missão de demonstrar, através de números estatísticos, coletados por meio de pesquisas feitas por grandes veículos de comunicação e institutos especializados, a real situação criminal do Brasil. Considerando que o objetivo do presente trabalho é análise do vínculo existente entre a redução da maioridade penal e a criminalidade, imperioso é verificar como é a atual situação, e como faz sentido essa discussão.
A Constituição e outras legislações vigentes determinam que as leis infraconstitucionais, no que se refere à proteção da criança e do adolescente, sejam interpretadas desde uma perspectiva protetiva do infante. Justamente o ECA define-se como um instrumento que visa a proteção integral aos interesses de crianças e adolescentes. Neste sentido Nucci sugere:
Sei da importância dos princípios regentes de todas as áreas do Direito, em particular o da dignidade da pessoa humana, que jamais poderia ser olvidado na sensível área infanto-juvenil. Mas esta matéria goza de princípios próprios, dentre os quais um deles é evidentemente o sol no horizonte dos demais: o princípio da proteção integral, que se associa ao princípio da absoluta prioridade (ou do superior interesse) da criança e do adolescente. Cabe aos operadores do Direito respeitar, com fidelidade, os princípios norteadores da Infância e da Juventude, o que ainda não ocorre. Eis o primeiro motivo para preocupação (NUCCI, 2019, p. 10).
Desta forma, percebe-se que a norma, além de considerar ao adolescente como um sujeito de direitos, também reúne normas com características repressivas, que visam nortear os incidentes na aplicação de medidas aos indivíduos infratores. Estas normas legais ainda devem ser entendidas como instrumentos de proteção às crianças e adolescentes, e não apenas como instrumentos penais, pois a punição deve considerar seu estado de desenvolvimento.
Todavia, cabe ressaltar que o modelo vigente de imposição de medidas socioeducativas não está sendo efetivo, no sentido de socializar e educar o adolescente responsável por atos infracionais, pois não consegue evitar que o adolescente cresça e cometa crimes, nem retribuir de forma adequada a lesão causada ao bem jurídico mediante esse ato; percebe-se ainda que há um aumento na criminalidade entre os jovens, não sendo possível identificar as vantagens dessa lei no sentido educativo e nem punitivo. A esse respeito:
Define-se o ato infracional como a conduta descrita como crime ou contravenção penal, embora não se deixe claro a sua finalidade: educar, punir ou ambos; proteger, educar ou ambos; proteger, educar e punir, enfim, desvendar o fundamento das medidas aplicadas em função do ato infracional é tarefa das mais complexas e, sem dúvida, controversa. Levando-se em consideração constituir-se a República Federativa do Brasil em Estado Democrático de Direito (art. 1.º, caput, CF), bem como os postulados constantes dos arts. 228 e 229 da Carta Magna, há de se acolher a finalidade protetiva, em primeiro plano, para crianças, seguida do propósito educativo; para adolescentes, em primeiro plano a meta educativa, seguida do fim protetivo. Há algum aspecto punitivo? Seria ingenuidade supor que não. Internar um adolescente, por si só, representa uma privação à sua liberdade e, por mais que se pretenda impingir a prevalência do caráter educativo – o que nos parece válido –, sobra o ranço da punição (IBID, p. 194).
A partir dos apontamentos acima, pode-se entender como há uma grande dificuldade, que ainda não encontra subsídios, na cominação de sanções adequadas aos adolescentes, considerando que eles ainda não possuem um desenvolvimento integral de suas faculdades, principalmente mentais, o que evita que eles entendam efetivamente as consequências de seus atos de forma pedagógica, pois não conseguem distinguir entre o que é certo e o que é errado, entre o que é aceitável socialmente e o que não é, desde uma perspectiva moral.
Percebe-se que, a maior parte das vezes, o indivíduo que comete um ato delitivo, possui algum desequilíbrio no que se refere à construção da socialização, sendo necessário que ele seja inserido no modelo considerado aceitável moralmente pela sociedade, através de um direcionamento auxiliado pelo Direito Penal. Acerca da ressocialização, principalmente aplicada aos adultos infratores, tem-se o seguinte conceito:
Ressocialização, conforme já explicitado, nada mais é, grosso modo, que a uma nova socialização do indivíduo, uma nova habituação aos preceitos, costumes e valores da sociedade. O instituto da ressocialização se dá, de forma ampla e, sobretudo na abordagem do presente estudo, quando o cidadão é retirado da sociedade por um lapso temporal significativo, o que ocorre quando é condenado e cumpre uma pena restritiva de liberdade em regime fechado, pela prática de um delito (CARVALHO, 2019, p. 84).
Essa ressocialização permite determinar que o indivíduo criminoso delinque devido a um determinado desvio de conduta, que faz com que ele não identifique uma compatibilidade com a sociedade e com o contexto em que se desenvolve, não sentindo a necessidade de respeitar os direitos alheios. Neste sentido, a punição atua como promotora da adequação social do indivíduo, no intuito de torná-lo um cidadão que respeita os direitos do outro e cumpre a lei. A esse respeito:
A prisão é uma parte de um continuam que inclui família, escola, assistência social, a organização cultural do tempo livre, preparação profissional, universidade e educação adulta. O tratamento na penitenciária e a assistência pós-penitenciária previstos pelas novas leis, são um setor altamente especializado deste continuam, tendente a recuperar os atrasos em socialização que indivíduos marginais têm sofrido, do mesmo modo como as escolas especiais ajudam a recuperar terreno aquelas crianças que provam ser inaptas para as escolas normais (TRINDADE, 2018, p. 31).
Dentro desse contexto, percebe-se a função do Estado como promotor da conduta esperada pela sociedade para o adolescente, deixando claro seu “dever ser”, mesmo que no seio familiar não tenha sido instilado. Conforme Nucci:
Em suma, os bons pais protegem e educam seus filhos, incluindo nesse processo as necessárias sanções, cuja finalidade não é punir para reprimir, mas sancionar para impor limites, fazer preponderar o respeito e a disciplina. Há, no entanto, uma forte liga entre pais e filhos, que é o amor, além da troca constante de afeto e a permanente mostra de afinidade. Esse quadro, quando projetado ao Estado em confronto com crianças e adolescentes, que cometem atos infracionais, torna-se mais complexo, pois entram em cena diversos operadores do Direito, além de profissionais ligados a variadas áreas técnicas – e não há o amálgama da família, que é o sentimento positivo. Eis a dificuldade para se conseguir visualizar os infantes e os jovens, que não são filhos, mas estranhos, como destinatários da mesma compreensão, tolerância, paciência e insistência para proteger, educar e tutelar. Em tese, o poder público necessitaria tratar as crianças e adolescentes como os pais cuidam de seus filhos, mas esse ideal não se coaduna com a realidade, surgindo inúmeros pontos de conflito, que causam as opiniões tão díspares na área da infância e juventude. O rigor, em si mesmo, não é um aspecto negativo, desde que utilizado para promover a boa formação de crianças e jovens. A difícil busca pela concretização do meio-termo é a missão do operador do Direito nessa área, garantindo-se a dignidade do menor de 18 anos, ao mesmo tempo em que não se ignora o desrespeito à lei (NUCCI, 2019, p. 194).
Observa-se que a norma brasileira oferece várias formas de medidas socioeducativas, que visam inicialmente educar e, posteriormente, punir ao indivíduo infrator. O artigo 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê as medidas socioeducativas, organizadas pelo legislador desde o menor grau até o maior grau de interferência na esfera jurídica, conforme visto a continuação:
Art. 112. Verificada a prática de ato infracional, a autoridade competente poderá aplicar ao adolescente as seguintes medidas:
II - obrigação de reparar o dano;
III - prestação de serviços à comunidade;
V - inserção em regime de semi-liberdade;
VI - internação em estabelecimento educacional;
VII - qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI.
§ 1º A medida aplicada ao adolescente levará em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração.
§ 2º Em hipótese alguma e sob pretexto algum, será admitida a prestação de trabalho forçado.
§ 3º Os adolescentes portadores de doença ou deficiência mental receberão tratamento individual e especializado, em local adequado às suas condições (BRASIL, 1990).
Neste sentido é importante ressaltar que não se aplica um princípio de correspondência entre o ato infracional e a medida socioeducativa a ser aplicada, como no caso dos crimes, cabendo aos sujeitos jurídicos (magistrado e representante do Ministério Público) definirem a melhor medida para sancionar ao adolescente infrator, a depender das circunstâncias particulares do caso.
Assim, percebe-se que perante a lei, a medida socioeducativa não atua como uma pena, devido a sua finalidade predominantemente educativa, assim, a medida deve ser aplicada gradualmente, a depender da condição do adolescente infrator. Neste sentido:
Como o ato infracional não é crime e a medida socioeducativa não é pena, incabível fazer qualquer correlação entre a quantidade ou qualidade (se reclusão ou detenção) de pena in abstrato prevista para o imputável que pratica o crime e a medida socioeducativa destinada ao adolescente que pratica a mesma conduta, até porque inexiste qualquer prévia correlação entre o ato infracional praticado e a medida a ser aplicada, nada impedindo - e sendo mesmo preferível, na forma da Lei e da Constituição Federal - que um ato infracional de natureza grave receba medidas socioeducativas em meio aberto. A aplicação das medidas socioeducativas não está sujeita aos parâmetros traçados pelo CP e doutrina penalista para a "dosimetria da pena", sendo assim inadmissível a utilização, bastante comum, da análise das circunstâncias judiciais do art. 59 do CP. A aplicação das medidas socioeducativas está sujeita a princípios e regras específicas, previstas nos arts. 112, §1º e 113 c/c arts. 99 e 100, caput e par. único, todos do ECA (vide). As medidas socioeducativas devem, em regra, corresponder a um programa socioeducativo e este, por sua vez, deve estar inserido numa política socioeducativa mais ampla, devidamente articulada (cf. art. 86, do ECA) com outros programas e serviços públicos disponíveis na “rede de proteção à criança e ao adolescente” que todo município deve dispor (DIGIÁCOMO, 2015, p. 157).
Passando à análise das normas sob o viés punitivo, não se pode olvidar que o atual modelo de imposição de medidas socioeducativas é pouco efetivo, tanto para a socialização quanto para a educação dos menores responsáveis pelo cometimento de atos infracionais quanto do ponto de vista de dar a devida retribuição à lesão ao bem jurídico ofendido pelo ato infracional. Entende-se, portanto, que a medida socioeducativa representa uma faculdade própria do juiz e do promotor, em relação ao menor infrator.
Neste sentido, considerando o princípio da proteção integral à criança e ao adolescente, previsto no art. 227 da CF e o dispositivo sancionado no art. 6º da Lei no8.069, de 13 de julho de 1990, que garante que seja considerada na interpretação da lei “a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento” (BRASIL, 1990), temos que a aplicação de medida socioeducativa não deve ser considerada como sanção, mas como uma forma de proteger o adolescente. O que se verifica, na prática, é que somente é aplicada essa medida socioeducativa quando o infrator é contumaz, ou quando o crime é cometido com o uso de violência ou grave ameaça. A seguir apresenta-se a jurisprudência aplicável:
PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL.NÃO CABIMENTO. ECA. ATO INFRACIONAL EQUIPARADO AO DELITO DE ROUBO MAJORADO TENTADO. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA DE INTERNAÇÃO. CRIMECOMETIDO COM VIOLÊNCIA E GRAVE AMEAÇA. PREVISÃO NO ART. 122, I, DO ECA. INEXISTÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. HABEAS CORPUS DENEGADO.1. Dispõe o art. 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente que a aplicação de medida socioeducativa de internação é possível nas seguintes hipóteses: em razão da prática de ato infracional praticado mediante grave ameaça ou violência contra a pessoa; pela reiteração no cometimento de outras infrações graves; ou pelo descumprimento reiterado e injustificado de medida anteriormenteimposta.2. A medida socioeducativa de internação imposta ao paciente ostenta fundamentação idônea, em razão de o paciente ter tentado praticar crime de roubo, mediante grave ameaça exercida com o emprego de embranca (facão).3. Habeas corpus denegado.
O STJ decidiu também que:
APELAÇÃO CÍVEL. ATO INFRACIONAL. FURTO QUALIFICADO E AMEAÇA. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. CONCESSÃO DE REMISSÃO. SUSPENSÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. AUTORIA COMPROVADA. EXCLUDENTES DE ILICITUDE E CULPABILIDADE. INEXISTÊNCIA. MEDIDA SOCIOEDUCATIVA de LIBERDADE ASSISTIDA. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MEDIDAS MAIS BRANDAS.
1. Tendo o feito permanecido suspenso no período compreendido entre a concessão e a revogação da remissão, não se operou a prescrição, porquanto não transcorrido o lapso temporal de um dois anos (arts. 109, VI, e 115, ambos do CP) entre as datas do recebimento da representação e da concessão da remissão, bem como entre as datas da revogação do benefício e da publicação da sentença. Inteligência do art. 126, parágrafo único, do ECA, combinado com o art. 89, § 6º, da Lei n.º 9.099/95. Preliminar rejeitada.
2. A prática pelo adolescente das condutas descritas no art. 155, caput, e 147, caput, ambos do CP, está comprovada pelas provas produzidas durante a instrução processual.
3. Inexistindo elementos a indicar que o representado repeliu agressão injusta, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, não há falar que sua conduta se deu sob o abrigo da excludente de ilicitude da legítima defesa (art. 25 do CP).
4. Diante de supostas ameaças de agressão, não levadas jamais ao conhecimento da autoridade policial, inescusável a ação de subtrair uma arma de fogo para se defender. Impossibilidade de reconhecimento da excludente de culpabilidade da inexigibilidade de conduta diversa.
5. Considerando a gravidade das infrações e as condições pessoais do implicado, com envolvimento em diversos outros atos infracionais, inviável o abrandamento da medida socioeducativa de liberdade assistida imposta na origem. APELAÇÃO DESPROVIDA.
Finalmente, mais recentemente o STF decidiu:
EMENTA
Agravo regimental em habeas corpus. Processual penal. Ato infracional equiparado a roubo agravado pelo concurso de agente. Aplicação da medida socioeducativa de internação. Alegada falta de fundamentação idônea para justificar a medida extrema. Impetração dirigida contra decisão monocrática em que se indeferiu liminar em habeas corpus requerido ao Superior Tribunal de Justiça. Incidência da Súmula nº 691/STF. Inexistência de ilegalidade flagrante capaz de temperar o rigor do enunciado. Agravo regimental não provido. 1. A hipótese narrada nos autos não enseja a superação do enunciado da Súmula nº 691 da Suprema Corte. A decisão ora hostilizada não merece reparos, pois a questão foi resolvida nos exatos termos da pacífica jurisprudência da Corte. 2. O Supremo Tribunal Federal já assentou como adequada a medida socioeducativa de internação quando fundamentada na “gravidade do ato infracional praticado – análogo ao delito de roubo com emprego de arma de fogo – somada a aspectos psicossociais desfavoráveis constantes do relatório interdisciplinar” (RHC nº 115.077/MG, Segunda Turma, Relator o Ministro Gilmar Mendes, DJe de 9/9/13). 3. Agravo regimental ao qual se nega provimento.
Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
Assim, entende-se que uma das preocupações do Poder Judiciário e do Ministério Público é contribuir com a preservação da infância e adolescência, o que decorre em medidas menos punitivas e mais educativas, ainda que seja mais rigorosa, mas sempre visando preservar o desenvolvimento integral dos adolescentes.
Tal situação, embora louvável do ponto de vista da possibilidade de socialização, nem sempre tem se tornado um benefício à sociedade, redundando principalmente na ausência de uma ressocialização e educação efetiva dos adolescentes em conflitos com a lei, conforme já demonstrado estatisticamente.
2.3 A POSSIBILIDADE JURÍDICA DE REDUÇÃO DA MAIORIDADE PENAL
Por fim, cumpre-se analisar a viabilidade jurídica da redução da maioridade penal. Dessa forma, perpassa-se sobre os principais argumentos de cunho jurídico que são favoráveis à redução da maioridade penal. O primeiro argumento comumente levantado pelos defensores da redução da maioridade penal já foi explicitado acima: A legislação (não a penal, mas a civil, trabalhista e eleitoral) já dispõe várias faculdades e direitos que podem ser exercidos pelos menores de dezoito anos, denotando assim a possibilidade de estes assumirem responsabilidades próprias da vida adulta.
Dessa forma, temos que os indivíduos entre dezesseis e dezoito anos podem votar (art. 14, II, “c” da CRFB/88), serem admitidos como testemunhas de negócios jurídicos (art. 228, Código Civil – CC), casar-se (mediante autorização dos pais ou judicial, na forma do art. 1.517 e seguintes do Código Civil) apresentar declaração de última vontade através de testamento (art. 1.860, parágrafo único, CC) e trabalhar em serviços diurnos ou não considerados perigosos ou insalubres (art. 5º, XXXIII, CRFB/88).
De acordo com essa linha de raciocínio, Lenza aduz ser aceitável a alteração do critério etário, obstando somente a questão que diz respeito a retirada do direito à inimputabilidade, o que inevitavelmente iria contra a Constituição:
“A sociedade evoluiu, e, atualmente, uma pessoa com 16 anos de idade tem total consciência de seus atos, tanto é que exerce os direitos de cidadania, podendo propor a ação popular e votar. Portanto, em nosso entender, eventual PEC que reduza a maioridade penal de 18 para 16 anos é totalmente constitucional. O limite de 16 anos já está sendo utilizado e é o fundamento no parâmetro do exercício do direito de votar e à luz da razoabilidade e maturidade do ser humano” (...) (LENZA, 2018, p. 763).
Para Rogério Greco:
“Apesar da inserção no texto de nossa Constituição Federal referente à maioridade penal, tal fato não impede, caso haja vontade para tanto, de ser levada a efeito tal redução, uma vez que o mencionado art. 228 não se encontra entre aqueles considerados irreformáveis, pois que não se amolda ao rol das cláusulas pétreas elencadas nos incisos a IV, do § 4º, do art. 60 da Carta Magna. A única implicação prática da previsão da inimputabilidade penal no texto da Constituição Federal, é que, agora, somente por meio de um procedimento qualificado de emenda a menoridade penal poderá ser reduzida, ficando impossibilitada tal redução via lei ordinária” (...) (2018, p. 400).
Assim, ter-se-ia que a inimputabilidade deveria ser mitigada, tendo em vista a própria evolução da sociedade, é notório que o adolescente de hoje não é mais o mesmo de tempos pretéritos, a lei o direito deve acompanhar a evolução da sociedade e se moldar a ela. Outro forte argumento é o desejo da população, decorrente da grave deficiência na segurança pública, cujas estatísticas incluem os adolescentes como autores de delitos.
Segundo pesquisas de 2015, 87% da população entrevistada apontou estar a favor da redução da maioridade penal. A pesquisa foi conduzida pelo instituto Datafolha em 174 cidades brasileiras (GRECO, 2018). Assim, e considerando que, segundo a Constituição Federal, todo o poder emana do povo, manifestando-se nisso a vontade popular, justificada estaria a adoção da medida. Mais adiante, temos o caráter pedagógico da pena: uma vez sabendo que podem ser presos se cometerem alguma infração penal, essas pessoas estariam, em tese, menos propensas ao cometimento de delitos de qualquer natureza.
Atingindo limite de tempo que fora determinado em sentença o adolescente deverá ser liberado e colocado em regime de semiliberdade e liberdade assistida, além disso atingindo 21 anos de idade esse deverá ser liberado compulsoriamente, tudo isso com base nos princípios orientadores da aplicação das medidas socioeducativas previstas no ECA, como o princípio da excepcionalidade da medida, que estabelece como regra, que a medida de internação, deverá ser aplicada somente nos casos em que não há cabimento para aplicação de outras medidas socioeducativas e o princípio da brevidade estabelece que a internação deve ser breve, atingindo o menor tempo possível na vida do adolescente, valorando sua condição de pessoa em desenvolvimento.
Miguel Reale aponta que:
“Tendo o agente ciência de sua impunidade, está dando justo motivo à imperiosa mudança na idade limite da imputabilidade penal, que deve efetivamente começar aos dezesseis anos, inclusive, devido à precocidade da consciência delitual resultante dos acelerados processos de comunicação que caracterizam nosso tempo” (REALE, 1998, p. 161).
Dessa forma, como explicitado no parágrafo anterior esse prazo se torna inócuo para socializar o adolescente em conflito com a lei, em tese não incutindo nesse a reflexão acerca do erro em sua conduta. Por último, podemos destacar a provável diminuição no aliciamento de menores por parte de organizações criminosas. Assim, e tendo em vista que os menores passariam a ser apenados como se maiores fossem, haveria menor propensão de que estes viessem a ser recrutados como “longa manus” das organizações criminosas em atuação no país. Analisados os argumentos favoráveis, necessário se faz verificar os demais percalços que podem dificultar a adoção desta medida.
Baseando-se em todos os dados coletados, e fazendo uma profunda análise jurídica sobre o tema, verifica-se que a redução da maioridade penal deve ser observada e planejada com cautela pela comunidade jurídica, tendo em vista que, se mal conduzida, além de não gerar os esperados efeitos na diminuição da criminalidade, pode trazer justamente o efeito contrário.
Resta consignado, contudo, que há a possibilidade jurídica de tal redução, especialmente com a alteração do art. 228 da Constituição Federal, a fim de acomodar a possibilidade jurídica de apenamento de menores de 18 anos. Deve-se ter um especial cuidado em relação à execução penal, aos estabelecimentos onde deverão ser cumpridas as penas, e em relação ao caráter pedagógico da pena, no intuito de punir com um rigor adequado (e não desproporcional) aos adolescentes infratores.
No próprio sistema jurídico brasileiro, vemos muitas situações que denotam que punir mais não necessariamente implica numa diminuição da criminalidade. Assim, vê-se uma necessidade em que não se trata de uma punição mais excessiva, mas em adequação entre a conduta e uma punição mais adequada. É necessário criar em nossos jovens a consciência sobre seus atos em sociedade, e principalmente, demonstrar a incorreção de suas ações quando cometem atos infracionais.
Ademais, a diminuição da criminalidade deve ser enfrentada em suas causas, e não somente em suas consequências. É preciso enfrentar as desigualdades sociais, garantir educação de qualidade a todos, e fazer com que as crianças e os adolescentes tenham um desenvolvimento familiar saudável, de modo a incutir neles uma melhor noção de seu papel na sociedade.
Cabe ao Estado, o poder executivo fazer valer os direitos consagrados na Constituição Federal e no ECA, dar prioridade para o desenvolvimento de políticas públicas, como construção de mais escolas, cursos profissionalizantes, educação de tempo integral, geração de emprego e renda para explorar de forma positiva a mão- de obra desses jovens em favor da sociedade
Não há fórmula fácil para o enfrentamento da criminalidade, tampouco pode o problema ser resolvido com soluções de curto prazo. Embora achemos que o debate é positivo, e a dialética entre os grupos antagônicos – conforme tratado em tópico neste trabalho – seja um primeiro passo na direção de uma solução, entende-se que a redução da maioridade penal não seria suficiente para melhorar o já caótico quadro da segurança pública no país, mas tão somente uma medida paliativa de efeito imediato de forma a auxiliar o combate a criminalidade
Todavia, analisando-se os argumentos, e tendo-se em escopo a possibilidade de cumprimento da pena em observância aos ditames do ECA em relação à consideração ao adolescente como uma pessoa em processo de desenvolvimento, entende-se como positiva a redução da maioridade penal.
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Graduando(a) do Curso de Direito do Centro Universitário FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GONZAGA, Francioney da Silva. A questão moral na possibilidade jurídica de redução da maioridade penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 nov 2021, 04:22. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57376/a-questo-moral-na-possibilidade-jurdica-de-reduo-da-maioridade-penal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
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Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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