MICHAEL LUCAS COUTINHO DUARTE
(Orientador)
RESUMO: A presente obra tem por escopo a conceituação e caracterização do crime de furto, levando em consideração a ineficácia da pena frente ao alto índice de criminalidade, sendo que, para delimitar este ponto, será apresentado um pouco a respeito da evolução do Direito Penal Romano e Germânico, os quais foram fundamentais para a formulação do Direito Penal como um todo. Ademais, será apresentado todos os pontos importantes a respeito do crime de furto, bem como seus casos de aumento e diminuição de pena. Por fim, será apresentado acerca do Projeto de Lei n. 643/2020, o qual tem por finalidade o aumento de pena no crime de furto em tempos de calamidade pública e/ou desastres, tendo em vista ser um período onde a população encontra-se em estado total de necessidade. Assim, conclui-se o quão necessário é uma modificação penal no intuito de agravar a pena no crime de furto, para fazer com que o infrator cogite não o cometer. Será utilizada nesta obra a metodologia de ensino qualitativa de natureza explicativa, tendo como base, a legislação penal, doutrinas, jurisprudências e notícias. Esta obra se justifica pela necessidade de se ter justiça para aqueles que tem seus patrimônios suprimidos pelos agentes criminosos, ficando à mercê do Estado, que acaba por não ceder a salva guarda necessária.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Penal. Furto. Punição.
ABSTRACT: The present work has as its scope the conceptualization and characterization of the crime of theft, taking into account the ineffectiveness of the penalty in view of the high crime rate, and, to delimit this point, a little about the evolution of the Roman and Criminal Law will be presented. Germanic, which were fundamental for the formulation of Criminal Law as a whole. Furthermore, all the important points regarding the crime of theft will be presented, as well as its cases of increasing and decreasing the sentence. Finally, it will be presented about Bill n. 643/2020, which aims to increase the penalty in the crime of theft in times of public calamity and/or disasters, considering that it is a period where the population is in a total state of need. Thus, it is concluded that a penal modification is necessary in order to aggravate the penalty in the crime of theft, to make the offender consider not committing it. The qualitative teaching methodology of an explanatory nature will be used in this work, based on penal legislation, doctrines, jurisprudence and news. This work is justified by the need to have justice for those who have their assets suppressed by criminal agents, leaving them at the mercy of the State, which ends up not yielding the necessary safeguards
KEYWORDS: Criminal Law. Theft. Punishment.
INTRODUÇÃO
O crime de furto (art. 155 do Código Penal), tem por escopo a pratica do ato de subtrair para si ou outrem, coisa alheio móvel, ou seja, comete este crime aquela pessoa que, se apossa indevidamente de um objeto de terceiro, sem o emprego de grave ameaça ou violência, usando ou não artifícios para facilitar sua conduta delitiva.
Este crime está presente na humanidade desde os primórdios, sendo citado inclusivamente em relatos bíblicos e até mesmo na tábua dos dez mandamentos. Assim, percebe-se que este crime, apesar de antigo, perdurou-se por toda a essência da humanidade, passando por inúmeras gerações e povos.
Assim, é foco deste trabalho, de prima face, exemplificar um pouco a respeito de como era o Direito Penal e o dever punitivo do Estado ao longo dos tempos, usando como base o Direito Romano e Germânico, haja vista que o crime de furto passou por todos estes povos e nações.
Ademais, será conceituado e caracterizado de maneira ampla o referido crime, ao passo que serão delimitadas todas suas possibilidades dentro do Código Penal, desde o furto simples, até o furto com emprego de explosivos, ou o furto de veículos com intuito de levar a outro estado ou País.
Sendo abordado ainda o quão necessária é a mudança na lei penal com relação ao crime de furto, tendo em vista que fora necessária a criação de um Projeto de Lei (PL 643/2020), para aumentar a penalização nos crimes de furto e roubo em duas vezes durante o período em que vigorar o estado de calamidade pública e/ou desastre.
Assim, percebe-se que é dever do Estado e do legislador propor novas mudanças no que diz respeito a penalização do crime de furto, pois na atual formulação em que se encontra, o agente criminoso não teme pela imputação penal que é apresentada no artigo 155.
Para formular esta obra a metodologia aplicada foi a qualitativa de natureza explicativa, onde os meios de embasamento utilizados foram a legislação penal, a doutrina, jurisprudência e notícias.
Esta obra se justifica em razão do alto índice criminal em todo território nacional, principalmente no que condiz ao crime de furto, que mesmo em uma pandemia mundial, teve um aumento exponencial, prejudicando inúmeros trabalhadores e pessoas de bem.
1. BREVE HISTÓRICO ACERCA DO DIREITO PENAL E DO DEVER PUNITIVO DO ESTADO
Antes de adentrar ao que diz respeito a evolução do Direito Penal, necessário é expor do que se trata esse instrumento jurídico utilizado pelo Estado para punir aqueles que infringirem determinadas regras que são ditadas através dos costumes, que posteriormente se transformaram na legislação penal.
Conforme explica Santiago Mir Puig (2010, p. 42/43), o Direito Penal, de um lado, é compreendido como sendo um conjunto de normas, as quais tem o objetivo a determinação de condutas que são consideradas como sendo de natureza penal, aplicando a essas condutas as sanções que lhes são cabíveis, com findo a proteger os bens jurídicos tutelados pelo Estado. Doutro giro, o Direito Penal pode ser apresentado como sendo um conjunto de valorações e princípios que tem a finalidade de orientar a aplicação e interpretação das normas penais.
Essas normas aplicadas a toda a sociedade tem uma finalidade muito simples, a qual seja, a tentativa de uma convivência humana plena, sem atritos, sem violência ou qualquer outro tipo de ato atentatório contra a vida ou o patrimônio de alheio, devendo serem utilizadas apenas em casos concretos onde há a comprovação do ato atentatório, onde se fara necessária a observação de rigorosos princípios jurídicos, os quais podem variar dependendo do país onde o crime fora cometido.
Para Zaffaroni (1991, p. 41), Direito Penal pode ser classificado como um conjunto separado de duas coisas destintas, sendo estas, o conjunto de leis penais (legislação penal) e, o sistema interpretativo dessa legislação (aplicabilidade da lei pelo sistema jurídico do Estado). Welzel (1987, p. 11), por sua vez, explica que, o Direito Penal, “é aquela parte do ordenamento jurídico que fixa as características da ação criminosa, vinculando-lhe penas ou medidas de segurança”.
Assim, nota-se que o Direito Penal não é uma norma que deve ser aplicada em todo caso, pois sua conjuntura de ações aplicadas ao infrator do ato é de cunho limitador, ou seja, aquele que for preso em infração confirmada, caso condenado, ficará restrito em cárcere privado, ato este que suprime um dos maiores direitos tutelados pelo Estado, o direito de ir e vir.
Apresentado um pouco a respeito do conceito do Direito Penal, passa-se agora ao um breve relato sobre sua evolução dentro da humanidade, tendo como foco o Direito Penal Romano e Germânico.
1.1 Direito Penal Romano
Pode-se dizer que o Direito Romano foi um dos principais, se não o principal norteador dos princípios que regem o Direito Penal em todo mundo nos tempos atuais. Roma é considerada como sendo o Estado que mais ofereceu ciclos jurídicos completos, com uma abrangente fonte de instrumentos jurídicos, que, mesmo com o passar dos tempos, ainda proporciona aplicações certas ao direito.
Na época de fundação de Roma (753 a.C.), a utilização do direito punitivo tinha por regente a figura do Rei e do Sacerdote, ambos com poderes ilimitados, na mais pura demonstração de caráter sacral, o que demonstrava a mistura de direito e religião da época em questão (BITENCOURT, 2021).
Os relatos históricos apontam que o primeiro código romano escrito foi a Lei das XII Tábuas (séc. V a.C.), que acabou por resultar a luta entre patrícios e plebeus na época em questão. É de fato que a referida lei foi a pioneira para o início do período dos diplomas legais, havendo assim, a imposição necessária que limitou a vingança privada, admitindo-se a composição, e adotando a Lei de Talião (MOMMSEN, 1976).
Foi nesse período inicial da realeza que surgiu a então distinção entre os crimes públicos e privados, os quais eram punidos pelos ius publicum e ius civie, respectivamente. Os crimes denominados como públicos eram aqueles que atentavam o Estado, ou seja, a traição ou conspiração politica com findo a desestabilizar o governo regente, bem como os crimes de assassinato.
O julgamento dos crimes públicos era realizado pelo próprio Estado através da figura do magistrado em seções dos tribunais especiais, onde a sanção aplicada era uma só, a pena de morte. Apesar de ser muito severa a punição neste caso, o Estado detinha o poder de aplica-la sem qualquer subjecção de terceiro, fato que acarretou na execução de diversos criminosos no período do direito romano.
Já os crimes que eram considerados como sendo privados eram aplicados em casos particulares, ou seja, consistia em uma ofensa ao indivíduo, eram crimes privados o furto, dano, injuria e afins. Nestes casos, o Estado concedia o direito punitivo ao ofendido, onde a interferência do Estado ficava em apenas regular o ato de punição do ofendido para com o ofensor.
Conforme aponta Luiz Régis Prado e Cezar Bitencourt (1995, p. 21), ainda houve a criação de mais uma modalidade de crimes, a qual ficou conhecida como crimina extraordinária, a qual era “fundada nas ordenações imperiais, nas decisões do Senado ou na prática da interpretação jurídica, que resulta na aplicação de uma pena individualizada pelo arbítrio judicial à relevância do caso concreto”.
O núcleo do Direito Penal Romano clássico surge com o conjunto de leis publicadas ao fim da República (80 a.C.), com as leges Corneliae e Juliae, que criaram uma verdadeira tipologia de crimes, para a sua época, catalogando aqueles comportamentos que deveriam ser considerados criminosos. As leges Corneliae preocuparam-se basicamente com aqueles crimes praticados nas relações interpessoais dos cidadãos — patrimoniais, pessoais etc. —, enquanto as leges Juliae preocuparam-se, fundamentalmente, com os crimes praticados contra o Estado, seja pelos particulares, seja pelos próprios administradores, destacando-se os crimes de corrupção dos juízes, do parlamento, prevaricação, além de alguns crimes violentos, como sequestro, estupro etc (BITENCOURT, 2021, p. 42).
A vingança privada só veio a desaparecer do direito penal romano após cerca de duas ou três décadas antes de Cristo, sendo ela substituída pela administração estatal, que passou a adotar e exercer o ius puniendi, lembrando que, apesar desta mudança o pater familiae continuou existindo, contudo, com restrições aos seus portadores.
No século segundo depois de Cristo foram instituídos os crimes extraordinários, os quais englobavam o furto qualificado, extorsão, estelionato, exposição de infante, aborto, dentre outros, com o surgimento destes crimes a pena de morte, que até então havia praticamente desaparecido do rol punitivo do Estado Romano passou a ser utilizada de maneira mais ampla, e corriqueira.
Outros crimes que foram englobados nos casos extraordinários foram aqueles que afrontavam diretamente a religião, como Roma era em si, o antro da religião na época por conta do Papa, haviam diversos crimes que se enquadravam como sendo de cunho religioso, sendo estes a blasfêmia, heresia, bruxaria e outros.
No que diz respeito a prisão nesta época, os relatos históricos versam que não havia em si um local denominado como tal, mas sim uma espécie de prisão custodia, onde o condenado iria aguardar, após ser sentenciado a morte, por sua execução, assim, estes locais não detinham presos por longos períodos, tendo em vista as execuções que ocorriam diariamente (BITENCOURT, 2021).
Já nesta época Roma tinha o total domínio sobre os institutos jurídicos penais do Dolo e da Culpa, bem como as questões inerentes aos agravantes e atenuantes dos crimes, o que prova o quão avançados eram os romanos nas questões inerentes ao Direito Penal, tendo tais institutos prosperado ao longo dos tempos.
O ilustríssimo doutrinador Heleno Fragoso (1985, p. 30), aponta que, “o Direito Penal Romano aparece no Corpus Juris Civilis do imperador Justiniano, especialmente nos livros 47 e 48 do Digesto (533 d.C.), chamados libri terribiles, e no livro IX do Codex (534 d.C.). Igualmente, no livro IV, das Institutas, título 1 a 5 e 18”.
O que se sabe a respeito disto é que o poder, bem como o direito repressivo do Estado, exposto nessa compilação é basicamente o que era utilizado na época clássica do Direito Penal, onde a base legal foi focada nas leis de Sila, Cézar e Augusto, criando assim, o direito repressivo em questão.
Assim, pode-se dizer que o Direito Penal Romano foi um dos pioneiros no que se tratou do direito punitivo do Estado, bem como nas formas como as penas deveriam ser aplicadas em cada caso em questão, além de criar institutos que perduraram até o Século XXI.
1.2 Direito Penal Germânico
Assim como o Direito Romano, o Direito Germânico também foi fundamental para a composição das questões penais em todo o mundo, contudo, ao contrário do romano, o Direito Germânico, em especial o primitivo, não era composto por leis escritas, mas sim por espécies de regras morais, que ditavam o que poderia e o que não poderia ser feito.
O Direito Germânico primitivo não era composto de leis escritas, caracterizando-se como um Direito consuetudinário. O Direito era concebido como uma ordem de paz e a sua transgressão como ruptura da paz, pública ou privada, segundo a natureza do crime, privado ou público. A reação à perda da paz, por crime público, autorizava que qualquer pessoa pudesse matar o agressor. Quando se tratasse de crime privado, o transgressor era entregue à vítima e seus familiares para que exercessem o direito de vingança, que assumia um autêntico dever de vingança de sangue (JESCHECK, 1981, p. 128).
Este conceito de política criminal adotado pelo povo germânico gerou, em sim, uma verdadeira guerra familiar, que só pode ser contida no século IX, onde houve uma evolução do direito pessoal, sendo que está “guerra”, só foi realmente contida com o advento da Paz Territorial Eterna, que ocorreu em meados de 1495, onde houve o banimento por completo da política criminal germânica originaria.
Segundo aponta Luiz Régis (1993), o povo germânico também foi adepto do que ficou conhecido como “vingança de sangue”, a qual só teve seu findo com o controle total do poder estatal nas questões penais, havendo a substituição desse instituto pela composição voluntaria e, em sequência, pela obrigatória.
O instituto que ficou conhecido como “compositio” consistiu, em si, no dever do autor em compensar o prejuízo que ocasionou acrescido de uma certa importância em pecúnia, havendo assim, uma supressão da vingança privada, que não só era um direito, mas também um dever da vítima em vingar as ofensas sofridas (LISZT, 1929).
As leis bárbaras que eram aplicadas nesta época detinham uma classificação bem detalhada dos quesitos aplicados, tanto na forma, meios, tarifas e locais de pagamento, na conformidade da qualidade da pessoa, sendo observadas as questões ligadas a sexo, idade, e natureza da lesão sofrida.
Conforme explica Heleno Cláudio Fragoso (1985), as leis bárbaras que foram fundamentais para formar o perfil do Direito Germânico do século VI, são as seguintes, a Lex Salica, Lex Rupiaria, Pactus e, Lex Alamannorum, as quais são caracterizadas por um sistema de composição peculiar e cabalmente delineado, sendo responsáveis por todo o sistema punitivo do Direito Germânico.
Dito isto, observa-se que a composição no Direito Germânico tinha duplo papel de imputação, sendo uma imputação criminal (pena) e uma imputação de reparação (ressarcimento do dano), onde parte desta imputação era devido a vítima ou aos familiares dela, e a outra parte era devida ao tribunal ou ao rei, o que simbolizava o preço de se ter paz.
Insta salientar que, para os infratores que não detinham ou não podiam pagar por seus crimes, a pena aplicada era substituída, sendo o infrator condenado a quitar sua dívida com penas corporais, como eram os casos dos açoites e demais torturas.
Conforme aponta Bitencourt (2021), somente após muito tempo que o Direito Germânico acabou adotando os princípios da Lei de Talião, muito por influência do Direito Romano e do Cristianismo. Junto a isto, ficou evidenciado que o povo germânico também era adepto da responsabilidade objetiva do direito, muito por se encaixar nas premissas deste povo.
Segundo as regras da responsabilidade objetiva do Direito Germânico, o que mais importava para análise jurídica do caso criminal era o resultado causado pelo autor do fato, sem nenhum questionamento acerca do dolo ou da culpa, ou se ainda o fato resultante foi proveniente de um caso fortuito.
Foi somente com a evolução do pensamento, e com influência do Direito Romano, que o Direito Germânico passou a levar em consideração as questões psicológicas ao analisar cada caso concreto, fato que pode evidenciar o quanto influente foi o Direito Romano dentre as épocas e povos.
2. O CRIME DE FURTO
O crime de furto, assim como o crime de homicídio, acompanha a humanidade desde os seus primórdios, tendo sido tal crime exposto em relatos históricos ao longo de toda a evolução da humanidade. Este crime consiste numa premissa básica, sem muita dificuldade de entendimento, definindo-se por ser um crime de natureza patrimonial, onde o autor do delito irá subtrair para si ou para outrem bem alheio móvel sem emprego de grave ameaça ou violência.
Magnum Koury Eltz (2019, p. 113), aponta que, “o furto se caracteriza como toda conduta que objetiva a subtração de coisa móvel sem uso de violência. No caso do Direito brasileiro, a proteção recai sobre a coisa alheia e comum, ou seja, quando pertence a mais de uma pessoa”.
Este crime está presente no artigo 155 do Código Penal, sendo apresentado da seguinte maneira, “subtrair, para si ou para outrem, coisa alheia móvel”. Assim, percebe-se que o referido crime tem como fator gerador a subtração de um bem, sendo este de natureza móvel, nunca imóvel, de forma a qual a vítima do fato não perceba que fora furtada.
Segundo aponta Castro (2014), o ato entendido como “subtração” tem um significado bem certo, que é o de tomar para si aquilo que não é de sua propriedade, ou que não seja de sua legitima posse, sendo este objeto móvel. O Direito Penal define como sendo móvel aquilo que é natural, ou seja, todo aquele objeto material que pode ser removido ou movido de um local para o outro, mesmo se esta coisa estiver incorporada ao solo.
Gonçalves (2012), entende que o crime de furto é formado por quatro elementos, os quais sejam, a conduta típica do agente no momento da subtração do bem; o elemento normativo do tipo, ou seja, a necessidade de ser uma coisa alheia subtraída; o objeto material, que é o bem móvel a ser subtraído; e, o elemento subjetivo do tipo, qual seja, a intenção de posse do bem, para si ou para outrem.
Em conexão com esta afirmativa, Guilherme de Souza Nucci (2011, p. 721-722), afirma que,
Subtrair significa tirar, fazer desparecer ou retirar. É verdade que o verbo furtar tem um alcance mais amplo do que subtrair e justamente por isso o tipo penal preferiu identificar o crime como sendo furto e a conduta que o concretiza como subtrair, seguida, é lógico, de outros importantes elementos descritivos e normativos. Assim o simples fato de alguém tirar coisa pertencente a outra pessoa não quer dizer, autonomicamente, ter havido um furto, já que exige, ainda, o ânimo fundamental, que não lhe pertence. Coisa é tudo aquilo que existe, podendo tratar-se de objetos inanimados ou de semoventes. No contexto de delitos contra o patrimônio (conjunto de bens suscetíveis de apreciação econômica), cremos ser imprescindível que a coisa tenha, para seu dono ou possuidor, algum valor algum valor econômico.
A pena de reclusão do crime de furto simples é compreendida como sendo de um a quatros e multa, contudo, este crime ainda possui aumentos de pena para determinados casos onde o autor do fato pratica o crime de furto utilizando de artifícios para facilitar a subtração do bem.
Assim, deve-se levar em consideração no momento de aplicação da pena, como o infrator atuou na conduta criminosa, para que a penalidade aplicada tenha efetiva função esperada pela doutrina penal. Neste sentido, como primeiro aumento de pena no caso de furto, tem-se o que é exposto no §1º do artigo 155, que versa, “A pena aumenta-se de um terço, se o crime é praticado durante o repouso noturno”.
Tanto a doutrina quanto a jurisprudência já firmaram o entendimento de que o repouso noturno é aquele onde é compreendido, ou entende-se que a maior parte da população de determinado local já estão a descansar, ou seja, em determinados locais o repouso noturno pode ser entre as 22h até as 05h, e em outros entre as 21h até as 06h.
PENAL. HABEAS CORPUS. SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NÃO CABIMENTO. ART. 155, § 1.º, DO CÓDIGO PENAL. DELITO COMETIDO EM ESTABELECIMENTO COMERCIAL. APLICAÇÃO DA CAUSA ESPECIAL DE AUMENTO DO CRIME COMETIDO DURANTE O REPOUSO NOTURNO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. SUBSTITUIÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. PRETENSÃO DE CONVERSÃO DA PENA CORPORAL EM UMA PENA SUBSTITUTIVA E MULTA. IMPOSSIBILIDADE. PRETENSÃO DEDUZIDA EM DESACORDO COM A SÚMULA 171 DESTA CORTE SUPERIOR. EXECUÇÃO PROVISÓRIA DAS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE TRÂNSITO EM JULGADO. WRIT NÃO CONHECIDO. ORDEM CONCEDIDA DE OFÍCIO.
[...]
III - Incide a majorante prevista no § 1.º do art. 155 do Código Penal, quando o crime é cometido durante a madrugada, horário no qual a vigilância da vítima é menos eficiente e seu patrimônio mais vulnerável, o que ocorre inclusive para estabelecimentos comerciais.
IV - A causa especial de aumento de pena do furto cometido durante o repouso noturno pode se configurar mesmo quando o crime é cometido em estabelecimento comercial ou residência desabitada, sendo indiferente o fato de a vítima estar, ou não, efetivamente repousando. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.
[...]
Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida, de ofício, para, confirmando a liminar anteriormente concedida (fls. 308-312), suspender a execução das penas restritivas de direitos impostas ao paciente, até o trânsito em julgado da condenação.
(HC 501.072/SC, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 06/06/2019, DJe 11/06/2019) (Grifei).
Insta salientar que, equipara-se à coisa móivel, conforme aponta o §3º deste artigo, o furto de energia elétrica ou qualquer outra que tenha valor econômico, tendo em vista que a premissa do ato se encaixa nos parâmetros do caput do artigo 155 do Código Penal, sendo assim, considerados como furtos.
Além deste aumento de pena, tem-se ainda os que estão expostos a partir do §4º do artigo 155, que são as qualificadoras do crime de furto, os quais tendem a aumentar a pena, antes de um até quatro ano, para penas superiores a 10 anos de reclusão em determinados casos.
§ 4º - A pena é de reclusão de dois a oito anos, e multa, se o crime é cometido:
I - com destruição ou rompimento de obstáculo à subtração da coisa;
II - com abuso de confiança, ou mediante fraude, escalada ou destreza;
III - com emprego de chave falsa;
IV - mediante concurso de duas ou mais pessoas.
§ 4º-A A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se houver emprego de explosivo ou de artefato análogo que cause perigo comum.
Assim como no §1º, o §4º do artigo 155 traz um rol de atitudes que pode o infrator tomar para que a conduta criminosa fique mais facilitada, ou seja, o criminoso usa de artifícios para que sua conduta tenha o final deseja, o qual seja, a subtração do bem da vítima.
O inciso I versa acerca da destruição e/ou rompimento de obstáculo para a subtração da res furtiva, dito isto, fica compreendido como artificio para a pratica do crime de furto, enquadrado no inciso I, o arrombamento de uma porta ou cadeado, a destruição de uma janela, vidraça ou parede/muro de madeira ou alvenaria, dentre outros.
Esses obstáculos devem ser estranhos à coisa a ser subtraída. Se fizerem parte da coisa Furtada, perdem a condição qualificadora. São exemplos o agente que arromba a fechadura do veículo para subtrair celular que se encontra ali dentro (furto qualificado) e o agente que arromba fechadura do veículo para furtar o próprio veículo (furto simples) (ELTZ, 2019, p. 118).
Já o inciso II é composto por quatro pontos destintos, sendo estes o abuso da confiança, que nada mais é que aproveitar-se da inocência da vítima ou de terceiros para a consumação do fato criminoso; mediante fraude, que é a pratica de iludir ou ludibriar a vítima ou terceira para que este cometa erro com findo a facilitar a conduta; mediante escalada, que consiste na pratica de saltar um muro ou subir por cima de uma residência ou edifício; ou ainda, mediante destreza, que nada mais é que a pratica de artifícios como utilização de “pakour” ou outros meios para alcançar locais não alcançáveis por pessoas normais.
O inciso III trata dos casos onde o autor do fato, por ajuda de terceiro ou por própria maestria, utiliza de chave falsa ou de apetrechos (gazua para fechadura) para facilitar sua entrada em determinado local. Nestes casos, sendo constatado que o infrator teve ajuda de terceiro, e este sabia ou deveria saber da possível pratica do crime, poderá o terceiro incorrer também no crime de furto.
Por fim, no §4º tem-se o inciso IV, que nada mais é que o concurso de pessoas, onde, duas ou mais pessoas se unem para a pratica do crime de furto, ambas irão incorrer neste inciso, pois tem-se a noção de que quanto mais houverem pessoas no ato delitivo, maior será a chance de sucesso do crime.
O §4º-A versa acerca do furto com emprego de artefatos explosivos (dinamites, granadas, explosivos plásticos, dentre outros), ou seja, quando o infrator utiliza de qualquer artefato que tenha por intenção destruir ou obstruir determinado local com findo a facilitar a subtração do bem desejado, assim como explica Magnum Koury Eltz (2019, p. 119),
Um dos fatos que ensejou o acréscimo dessa qualificadora se dá especialmente em razão da crescente onda de furtos mediante estouro de caixas eletrônicos. Essa conduta inegavelmente é capaz de gerar perigo de dano comum. Obviamente a qualificadora atinge não somente emprego de explosivo em caixas eletrônicos, mas em qualquer objeto material do furto.
Ademais, insta salientar que no ano de 2021 fora promulgada a Lei nº 14.155, a qual acrescentou ao Código Penal os §4-B e 4-C, que tratam dos crimes cometidos por meio de dispositivos eletrônicos, como celulares, computadores, dentre outros. Contudo, a promulgação destes parágrafos ocorreu de forma muito tardia, tendo em vista que tais crimes já ocorriam com demasiada frequência.
Versam os §4º-B e 4-C do artigo 155 do Código Penal,
§ 4º-B. A pena é de reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa, se o furto mediante fraude é cometido por meio de dispositivo eletrônico ou informático, conectado ou não à rede de computadores, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento análogo.
§ 4º-C. A pena prevista no § 4º-B deste artigo, considerada a relevância do resultado gravoso:
I – aumenta-se de 1/3 (um terço) a 2/3 (dois terços), se o crime é praticado mediante a utilização de servidor mantido fora do território nacional;
II – aumenta-se de 1/3 (um terço) ao dobro, se o crime é praticado contra idoso ou vulnerável.
Observa-se que, em nenhum momento é citado que é necessário que tenha violação a um mecanismo de segurança ou até mesmo a utilização de qualquer programa malicioso como um vírus, não é necessário nem mesmo que o mecanismo esteja conectado à internet, basta apenas que a fraude seja realizada por meio de um dispositivo eletrônico ou informático, não importando como seja feito.
Em relação ao §4-C, tem-se alguns pontos que devem ser levados em consideração, onde é possível notar que no inciso I o aumento de pena se dá em fato da dificuldade gerada na hora da investigação, tendo em vista que o criminoso utilizou de servidores fora do território nacional.
Já o inciso II trata dos casos onde o crime é cometido contra idoso ou pessoa vulnerável, tendo em vista que estas pessoas tendem a ser mais descuidas e propícias ao cometimento do erro, o que gera a facilitação da atitude criminosa.
Importante frisar que, o furto mediante fraude jamais deve se confundir com o crime de estelionato (art. 171 do CP), pois o crime de furto mediante fraude tem por finalidade a diminuição da vigilância da vítima sobre o patrimônio para facilitar a subtração deste, já o crime de estelionato tem a finalidade de induzir a vítima ao cometimento do erro para que seja subtraído o bem.
Em continuidade aos estudos acerca do art. 155 do Código Penal, tem-se ainda os casos de aumento de pena expostos nos parágrafos §5º, 6º e 7º, que são respectivamente os casos de furto de veículos, semovente domesticável de produção e de substâncias explosivas ou acessórias, conforme segue,
§5º A pena é de reclusão de três a oito anos, se a subtração for de veículo automotor que venha a ser transportado para outro Estado ou para o exterior.
§6º A pena é de reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos se a subtração for de semovente domesticável de produção, ainda que abatido ou dividido em partes no local da subtração.
§7º A pena é de reclusão de 4 (quatro) a 10 (dez) anos e multa, se a subtração for de substâncias explosivas ou de acessórios que, conjunta ou isoladamente, possibilitem sua fabricação, montagem ou emprego.
No primeiro caso (§5º), temos o crime de furto onde o autor irá subtrair para si ou outrem um veículo automotor, o qual venha transportado para outro estado da federação brasileira ou ainda para o exterior, como são os constantes casos de veículos transportados para desmanches na Bolívia e Paraguai.
Sobre isto, Magnum Koury Eltz (2019, p. 120), aponta que, “para configuração exata desse crime, o agente, desde a execução do furto, deve ter a intenção de levar o veículo para outro Estado ou exterior. O agente que furta o veículo, mas sofre perseguição policial, não se enquadrará nessa qualificadora”.
Já a hipótese presente no §6º expõe o que ficou denominado como sendo o “furto de gado”, onde os criminosos passaram a furtar bovinos de sítios e fazendas, gerando enorme prejuízo aos proprietários destes. Este crime de certo modo é muito facilitado pois nestes locais não há apoio dos órgãos de segurança pública, tampouco ficam grandes quantidades de pessoas que possam vir a impedir ou presenciar os atos criminosos.
No art. 155, §6º, o legislador buscou proteger o proprietário ou os possuidores de animais e tipificou o crime de furto de animais de forma mais grave, aplicando a pena de reclusão de 2 a 5 anos, se o semovente for domesticável e de produção.
Essa proteção envolve inclusive animais mortos, abatidos e divididos em partes, desde que estas últimas ações sejam feitas no local onde o animal foi subtraído (ELTZ, 2019, p. 120).
Por fim, tem-se os casos previstos no §7º, os qual seja, a subtração de substâncias explosivas ou acessórios que possam vir a ser utilizados para a fabricação destes produtos. Esta medida teve de ser tomada em conjunto com a premissa do §4-A, que foram os inúmeros casos de furtos de caixas eletrônicos com emprego de explosivos.
2.1 Casos de diminuição de pena e extinção da punibilidade
Após apresentados os casos de aumento de pensa, passasse então aos casos onde haverá a diminuição desta ou até mesmo a desconsideração da pena, onde o sujeito será inocentado de seu crime em razão da conduta perpetrada. O primeiro caso se encontra no §2º do artigo 155, que versa o seguinte, “Se o criminoso é primário, e é de pequeno valor a coisa furtada, o juiz pode substituir a pena de reclusão pela de detenção, diminuí-la de um a dois terços, ou aplicar somente a pena de multa”.
Este caso em especifico é denominado como “furto privilegiado”, e tende a diminuir a pena do acusado em razão de alguns critérios jurídicos, assim como aponta Guilherme de Souza Nucci, (2021, p. 658),
Difundiu-se o entendimento de ser a figura prevista no § 2.º um furto privilegiado. Por vezes, no entanto, pode implicar apenas uma causa de diminuição da pena. Poder-se-ia, então, falar em “privilégio em sentido amplo”. A autêntica figura do privilégio haveria de representar uma nova faixa para a fixação da pena, diminuindo-se o mínimo e o máximo, em abstrato, estabelecidos pelo legislador no preceito sancionador do tipo penal. Entretanto, analisando-se a especial circunstância prevista, conclui-se significar uma causa obrigatória de diminuição da pena em limites variáveis entre um a dois terços. Por outro lado, a substituição da pena de reclusão pela de detenção e da pena privativa de liberdade pela de multa configuraria um autêntico privilégio, pois a pena em abstrato altera-se completamente para menor.
Outro caso onde o réu será beneficiado é o caso da aplicação do principio da insignificância, onde não haverá uma diminuição de pena, mas sim uma extinção da punibilidade. Conforme explica Masson (2015), o princípio da insignificância tem uma grande aplicabilidade nos crimes de furto, sendo este uma causa de excludente de tipicidade, onde, para que seja configurado este princípio, a conduta delitiva deve possuir, a mínima ofensividade; o reduzido grau de reprovabilidade; a ausência da periculosidade social e, o comportamento inexpressivo de lesão ao bem tutelado.
Habeas corpus. 2. Furto simples de blusa de frio, marca Adidas, no valor de R$ 99,00. Sentença absolutória reformada pelo Tribunal. 3. Réu, à época da condenação, primário. 4. Aplicação do princípio da bagatela. Possibilidade. Precedentes. Peculiaridades do caso. 5. Reconhecida a atipicidade da conduta. 6. Ordem concedida para restabelecer a sentença de primeiro grau que aplicava o princípio da insignificância.
(HC 139738 AgR, Relator(a): EDSON FACHIN, Relator(a) p/ Acórdão: GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 08/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-153 DIVULG 31-07-2018 PUBLIC 01-08-2018).
Assim, uma vez que o réu preenche os requisitos, poderá ser usufruidor do princípio da insignificância, onde haverá a extinção da punibilidade do ato, sendo o caso arquivado e o réu inocentado.
3. A APLICAÇÃO DA PL 643/20 DURANTE O PERÍODO PANDÊMICO
O crime de furto é algo que prejudica em muito o detentor do patrimônio que fora furtado, pois, este pode depender do bem subtraído para, por exemplo, levar o sustento até sua família, como são os casos de furtos de veículos vinculados a taxistas ou motoristas de aplicativo móvel.
Dentre outras esferas, também se tem os casos de furtos em lojas ou residências que tendem a ser muito prejudicais também, pois o detentor do bem, pode necessitar em muito do que fora roubado, seja um objeto ou valores específicos.
Com o advento da pandemia ocasionada pelo SARS-COV-19 (Covid-19), muitas pessoas tiveram prejuízos com os inúmeros lockdowns e inseguranças econômicas, tendo o Governo Federal que criar mecanismos de amparo monetário social para custear o alimento de muitas famílias em todo o país.
Assim, nota-se que devido a pandemia, a necessidade de bens e valores se tornou prioridade máxima para muitas famílias, que necessitam manter seus sustento e de seus filhos, que só é possível através da salvaguarda destes patrimônios que o detentor possui.
Contudo, percebeu-se que apesar de o País estar em crise, com a decretação de estado de calamidade pública o índice de criminalidade não diminuiu, ao contrário, teve um aumento exponencial, assim como aponta o portal de notícias da Globo (G1), do Estado de São Paulo (2021, p. 1),
O número de casos de latrocínio cresceu 46% no estado de São Paulo no mês de setembro, enquanto o de furtos subiu 39%, e roubos, 27%, segundo os dados mensais da Secretaria de Segurança Pública (SSP).
De acordo com as estatísticas, o estado registrou 22 casos de latrocínio – que é o roubo seguido de morte - no mês passado, contra 15 do mesmo período de 2020.
Em relação aos furtos, o total de crimes registrados passou de 30.571 em setembro de 2020 para 42.722 no mesmo período deste ano (Grifei).
Diante este cenário onde o cidadão brasileiro além de ter que se preocupar com o sustento de sua residência, também precisa se procupar em não ser furtado e perde aquilo que mais precisa, o deputado Janio Amaral (PSL-MG) propôs a Câmara dos Deputados o Projeto de Lei n. 643/2020, o qual tem por finalidade o aumento de pena nos crimes de furto e roubo durante o período de vigência da calamidade pública nacional.
O Projeto de Lei 643/20 amplia a pena de quem se aproveitar de calamidade pública ou desastre, como inundação e acidente de carro, para furtar um objeto. O texto tramita na Câmara dos Deputados.
Pela proposta, esse tipo de furto passará a ser considerado qualificado, com pena de reclusão de 2 a 8 anos e multa, o dobro da prevista para furto simples (reclusão de 1 a 4 anos e multa), conforme o Código Penal (BRASIL, 2020, p. 1).
O referido Projeto de Lei ainda tramita no Congresso Nacional, tendo como ultima movimentação a aprovação do texto legal pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ), conforme aponta o site da Câmara dos Deputados (2021, p. 1),
A Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) da Câmara dos Deputados aprovou, nesta quarta-feira (12), o aumento de penas para quem furtar, roubar ou cometer peculato valendo-se da ocasião de incêndio, naufrágio, inundação, desastre, estado de calamidade pública, epidemia ou pandemia. O texto segue para a análise do Plenário.
[...]
O substitutivo cria a qualificadora para o crime de furto quando o agente se vale de incêndio, naufrágio, inundação, desastre, estado de calamidade pública, epidemia ou pandemia declaradas pelas autoridades competentes. A pena para furto qualificado é de reclusão de dois a oito anos e multa. Ainda de acordo com o texto, a pena é aumentada de um terço até a metade se a subtração for de bem, insumo ou equipamento médico, hospitalar, terapêutico, sanitário ou vacinal, durante estado de calamidade pública, epidemia ou pandemia declarados pelas autoridades competentes.
Apesar de muito benéfico a toda sociedade, o referido Projeto de Lei só serviu para demonstrar o quão ineficaz é a aplicação penal nos casos de furto, onde a pena, independentemente do que fora furtado, seja uma quantia de 500 reais ou de 1 milhão, será a de um a quatro anos, caso se enquadre na teoria do furto simples.
Com isso, é notório que é dever do Estado postular por novas medidas e diretrizes que tornem o crime de furto mais grave para aqueles que o pratiquem, com o findo a tentar desestabilizar a conduta criminosa e fazer com que o infrator não se sinta tentado a cometer o ato.
3.1 Políticas criminais necessárias para fazer valer a penalização no crime de furto
Conforme apontado anteriormente, fica evidente que aplicação de pena nos crimes de furto simples são muito brandas e propicias ao cometimento do crime, pois o autor do fato, ao perceber que sua pena máxima chega a apenas quatro anos de reclusão, isso na pior hipótese, tende a cometer o crime por ser deveras vantajoso a ele.
Essa penalização é baseada nos primórdios do Código Penal e nas características da Constituição Federal de 1988, ou seja, já transcorreu um período de mais de 70 anos desde a promulgação do Código Penal, havendo uma evolução exponencial tanto nas questões tecnológicas, quanto comerciais e também sociais.
Assim, percebe-se que a lei também deve evoluir nas conformidades em que a nação evolui, pois a 70 anos o nível empregado de tecnologia em casos de furto eram em si, inexistentes. Observa-se que nos dias atuais, a facilidade no cometimento de diversos crimes abre a possibilidade para a imputação de medidas mais severas, as quais devem ser adotas.
De prima face, é necessário que o legislador faça alterações no texto legal com findo a modificar a penalização nos casos de furto comum, aumentando a pena no mínimo ao dobro da atual, fazendo com que o agente criminoso cogite a possibilidade do não cometimento do crime por medo da penalização gravosa.
Outro ponto importante é a questão dos casos de diminuição de pena, os quais devem ser reanalisados com findo a deixarem de serem aplicados ou que ainda tenham uma aplicação mais rigorosa, não possibilidade que o infrator fique amparado de meios para não ser punido pelos crimes ora cometidos.
Estes são os principais pontos que devem ser abordados para que o agente criminoso tenha consciência da ilicitude do fato, e venha a reconsiderar o cometimento do crime, pois uma vez que se percebe que sua liberdade poderá ser cessada por dois, três ou quatro anos, a vontade delitiva tende a diminuir gradualmente.
CONCLUSÃO
Conforme foi apresentado nesta obra, o crime de furto tem diversas vertentes, as quais podem proporcionar diversos aumentos ou diminuições de pena, caso o autor do fato venha a cometer o crime, a exemplo, com emprego de material explosivo, haverá um aumento de pena considerável em contra posição ao crime comum de furto.
Contudo, apesar de deter diversos aumentos penais, o caput deste artigo é muito brando, e chega a ser no mínimo inaplicável de maneira eficaz, pois a pena máxima para o crime de furto comum é de apenas quatro anos, e em muitos casos o autor do fato, ao menos tem a pena privativa de liberdade aplicada.
O crime de furto é sim um crime que proporciona um prejuízo inestimável tanto para o cidadão quanto para o Estado, pois o bem subtraído pode, em muitos casos, ser a fonte de renda da vítima, como são os casos de furtos de veículos vinculados a aplicativos de transporte.
Não obstante a isto, tem-se ainda os furtos que ocorrem em residências e em comércios, que também podem ser deveras prejudicais as vítimas, principalmente no cenário em que a sociedade vive atualmente em razão da pandemia de Covid-19.
Assim, fica evidente o quão necessário é que o Estado tome partido no que diz respeito a penalização nos crimes de furto, principalmente nos furtos comuns, que possuem pena mais branda, que em muitos casos nem mesmo chegam a ser aplicadas contra o autor do fato delitivo.
Dito isto, é fundamental e emergente que as mudanças sejam feitas, seguindo o exemplo do Projeto de Lei n. 643/2020, o qual propôs pelo aumento penal nos crimes de furto em casos de calamidade pública e/ou desastres.
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Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário São Lucas de Ji-Paraná
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MASSINHAM, Fernando Duarte. Crime de furto: ineficácia da pena frente ao alto índice de criminalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 nov 2021, 04:13. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57492/crime-de-furto-ineficcia-da-pena-frente-ao-alto-ndice-de-criminalidade. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
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