ERIKA CRISTHINA NOBRE VILAR [1]
RESUMO: O presente trabalho tem como perspectiva o estudo acerca da possibilidade jurídica de confecção de cláusula de negociação coletiva que vede a terceirização da mão-de-obra. O problema da pesquisa diz respeito à viabilidade e validade de cláusula restritiva, haja vista as alterações sobre a terceirização no ordenamento jurídico, promovidas pelo advento das Leis nº 13.426/2017 e 13.467/2017. O presente trabalho tem como objetivos analisar a regulamentação jurídica sobre a terceirização, antes e depois das leis supracitadas, por meio da discussão da doutrina e jurisprudência no âmbito trabalhista e constitucional a respeito do tema. Os resultados obtidos com o presente trabalho expressam que a inclusão de cláusula permissiva de restrição de terceirização é completamente possível, no intuito de vedar a precarização das relações de trabalho, aplicando-se o princípio da adequação setorial negociada, para que não atinjam direitos de indisponibilidade absoluta, conforme entendimentos jurisprudenciais acerca do tema em comento.
Palavras-chave: Terceirização, negociação coletiva de trabalho, direito do trabalho, limitação.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Terceirização: Regramento Anterior à Lei nº 13.429/2017 e Lei nº 13.467/2017. 2.1 Do Aparecimento Da Terceirização No Ordenamento Jurídico Brasileiro: Breve Histórico. 3. Das Alterações Sobre Terceirização No Ordenamento Jurídico Laboral: Lei nº 13.429/2017 E Lei nº 13.467/2017. 4. Do Novo Modelo De Negociação Coletiva. 4.1 Da Prevalência Do Negociado Sobre Legislado. 4.2 Dos Limites Das Negociações Coletivas. 5. Da Possibilidade De Cláusula De Instrumento Coletivo Que Restrinja A Terceirização. 6. Conclusão. Referências.
1. INTRODUÇÃO
A terceirização é entendida, como o próprio nome sugere, como a intermediação de terceiros para a execução de força de trabalho e serviços. De forma genérica, a terceirização se define como a transferência de atividade à pessoa jurídica competente.
O ano de 2017, com o advento das Leis nº 13.429/2017 e 13.467/2017, foi determinante para acender a discussão acerca da terceirização da mão-de-obra, principalmente no tocante a terceirização de atividade-fim.
A Lei nº 13.429/2017, promulgada em 31/03/2017, conferiu maior amplitude das atividades passíveis de terceirização, no entanto, o texto da nova lei não soube precisar no tocante a terceirização de atividade-fim, em virtude do uso do verbo transitivo “poder”, dando a ideia de mera faculdade, tornando-se suficiente para defender que a lei não foi expressa quanto à possibilidade.
Contudo, em 13/07/2017, a Lei nº 13.467/2017, conhecida como “Reforma Trabalhista”, alterou a redação dos arts. 4º-A e 5º-A da Lei 6.019/1974, aumentando a abrangência da terceirização de serviços, trazendo expressamente a possibilidade de delegação da atividade fim da tomadora, acarretando em diversas discussões doutrinárias e jurisprudenciais, haja vista que a terceirização de atividade-fim gera a precarização da relação de trabalho, em face da redução dos custos da produção e aumento nos lucros da atividade empresarial, uma vez que reduzidos direitos e garantias trabalhistas dos trabalhadores terceirizados.
Assim como a possibilidade de terceirização de atividade-fim empresarial, a Reforma Trabalhista constituiu a valorização dos instrumentos coletivos de trabalho, sobrepondo a legislação e valorizando a autocomposição. Tal alternativa possibilitou que categorias profissionais pudessem vedar a precarização da relação de trabalho estipulando cláusula impeditiva de terceirização da mão-de-obra, ainda que legalmente permitido tal modelo de contratação.
O presente estudo corresponde a uma pesquisa bibliográfica ou revisão de literatura com abordagem dedutiva. Nesse sentido, o presente artigo baseou-se em materiais contidos em artigos de pesquisa e outros materiais legítimos que contém informações essenciais e precisas sobre o tema abordado. Com o advento da internet e do avanço dos meios de informação, a pesquisa também se adaptou a essa nova realidade, tendo em vista proporcionar a possibilidade de utilização de outras fontes de pesquisa.
O referido artigo inicia tratando da parte conceitual da terceirização, pontuando a regulamentação anterior e posterior as Leis nº 13.429/2017 e 13.467/2017. Após a abordagem histórica, traz-se à baila a discussão acerca da validação dos instrumentos coletivos de sobreporem a legislação vigente, para, no fim, ponderar a respeito da possibilidade de restrição da terceirização através de instrumentos de negociação coletiva, visando a não precarização da relação de trabalho entre as partes.
Por fim, são apresentados os entendimentos jurisprudenciais dos egrégios tribunais superiores acerca do tema.
2. TERCEIRIZAÇÃO: REGRAMENTO ANTERIOR À LEI Nº 13.429/2017 E À LEI Nº 13.467/2017.
A terceirização surgiu como um fenômeno para fomentar a atividade empresarial, por meio da transferência a empresas especializadas, denominadas empresas de prestação de serviços a terceiros, de atividades meramente instrumentais ou acessórias no processo produtivo.
Para Maurício Godinho Delgado:
Terceirização é o fenômeno pelo qual se dissocia a relação econômica de trabalho da relação justrabalhista que lhe seria correspondente, por meio do qual se insere o trabalhador no processo produtivo do tomador dos serviços sem que se estendam a este os laços justrabalhistas, que se preservam fixados com uma entidade interveniente. (DELGADO, 2014, p. 452)
Nota-se que, a partir da adoção do modelo de terceirização, a relação que a priori seria bilateral, entre empregador e empregado, passa a ser trilateral, sendo formada por empregado, tomador e prestador do serviço.
Tal modelo de relação de trabalho ocorreu pela primeira vez com essa configuração em meados dos séculos XVII e XIX, na Inglaterra, durante a Revolução Industrial, quando a produção econômica artesanal foi substituída pelo modo de produção fabril (HUBERMAN, 2010).
No entanto, o marco expressivo da criação da terceirização ocorreu por volta de 1940 nos Estados Unidos, em meio a Segunda Guerra Mundial, fenômeno conhecido como outsourcing. As indústrias bélicas não conseguiam suprir a demanda decorrente da guerra, razão pela qual se obrigaram a buscar novos meios de produção, capazes de aumentar a produção, bem como de aprimoração dos produtos, a fim de suprir a excessiva demanda daquela época (CASTRO, 2000).
Ante a demanda, a solução foi pela delegação de serviços secundários, porém necessários para o processo de produção, transferindo tais serviços para empresas terceiras, reduzindo assim os custos operacionais, aumentando a velocidade da produção e gerando mais lucros.
Sobre o tema, Castro (2000, p. 75) leciona:
A terceirização encontra sua origem durante a II Guerra Mundial, quando os Estados Unidos aliaram-se a países europeus para combater as forças nazistas e também o Japão. As indústrias de armamento não conseguiam abastecer o mercado, necessitando suprir o aumento excessivo da demanda e aprimorar o produto e as técnicas de produção. Essa necessidade demonstrou que a concentração da indústria deveria voltar-se para a produção e as atividades de suporte deveriam ser transferidas para terceiros, o que, sem dúvida, gerou um maior número de empregos na época.
Acerca deste quesito, Martinez (2012) entendeu que tal fato ocorrido durante a produção bélica estadunidense foi determinante para derrocada do sistema fordista como modelo de produção industrial, baseado na produção em massa. Notou-se a importância de focar na qualidade da produção, priorizando as demandas do mercado, originando o Toyotismo.
Com um modelo de produção industrial focado nas demandas do mercado, o quadro de trabalhadores sofria alterações. Quanto maior a demanda, maior a necessidade de mão-de-obra, sendo necessária a terceirização, para que não houvesse a vinculação posterior entre prestador do serviço e tomador do serviço em momentos de menos demanda, haja vista que o foco era a redução dos custos da operação e a aferição de lucros, não demorando a aparecer os primeiros esboços do modelo no Brasil e consequentemente no ordenamento jurídico pátrio.
2.1 DO APARECIMENTO DA TERCEIRIZAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: BREVE HISTÓRICO
A prática da terceirização no Brasil teve início em meados da década de 1950, em razão do aquecimento da atividade industrial no país, em especial da indústria automobilística através de montadoras multinacionais.
A abertura do território ao mercado internacional intensificou a necessidade de mão-de-obra industrial de baixo custo, tornando inviável a aplicação dos preceitos juslaborais presentes na recém editada Consolidação de Leis do Trabalho, haja vista a necessidade do crescimento econômico brasileiro.
Com a necessidade de iniciar a regulamentação da atividade terceirizada, leciona Castro (2000), que no final da década de 1960, início da década de 1970, foi promulgado o Decreto-Lei nº 200/67, estabelecendo em seu artigo 10º a descentralização de algumas atividades administrativas, bem como a Lei nº 5.645/70, que mencionava acerca da administração direta e indireta dos entes da federação.
O art. 10, §7º, do Decreto-Lei nº 200/1967 é um marco da regulamentação brasileira quanto a terceirização, descentralizando serviços não essenciais do ente para que possam ser executados por empresas terceiras:
Art. 10. A execução das atividades da Administração Federal deverá ser amplamente descentralizada.
[...]
§ 7º Para melhor desincumbir-se das tarefas de planejamento, coordenação, supervisão e controle e com o objetivo de impedir o crescimento desmesurado da máquina administrativa, a Administração procurará desobrigar-se da realização material de tarefas executivas, recorrendo, sempre que possível, à execução indireta, mediante contrato, desde que exista, na área, iniciativa privada suficientemente desenvolvida e capacitada a desempenhar os encargos de execução. (BRASIL, 1967, Art. 10, §7º)
A Lei nº 5.645/70, também considerada vanguardista quanto a terceirização no Brasil, elencou expressamente atividades passiveis de terceirização por autarquia federais, de acordo com o Art. 10, §7º da Decreto-Lei nº 200/1967:
Art. 3º Segundo a correlação e afinidade, a natureza dos trabalhos, ou o nível de conhecimentos aplicados, cada Grupo, abrangendo várias atividades, compreenderá:
[...]
Parágrafo único. As atividades relacionadas com transporte, conservação, custódia, operação de elevadores, limpeza e outras assemelhadas serão, de preferência, objeto de execução indireta, mediante contrato, de acordo com o artigo 10, § 7º, do Decreto-lei número 200, de 25 de fevereiro de 1967. (BRASIL, 1970, Art. 3º)
Com o passar dos anos, em um cenário de expansão econômica e entrada do capital estrangeiro no país, a terceirização foi se tornando cada vez mais frequente. Os diplomas legais previam apenas a terceirização relacionada ao setor público, no entanto, a iniciativa privada necessitava de alguma regulamentação, visto que a finalidade da atividade é a aferição de lucros.
Dito isto, entrou em vigor a Lei nº 6.019/1974, que dispunha sobre o Trabalho Temporário. Embora a lei não trate unicamente da terceirização, esta foi a primeira a tratar diretamente o tema, indicando a possibilidade de uma empresa terceira realizar trabalhos para empresa contratante:
Art. 4º Compreende-se como empresa de trabalho temporário a pessoa física ou jurídica urbana, cuja atividade consiste em colocar à disposição de outras empresas, temporariamente, trabalhadores, devidamente qualificados, por elas remunerados e assistidos.
O diploma supracitado teve como inspiração a Lei Francesa nº 72-1 de 1972, que tratou sobre o trabalho temporário e a possibilidade de terceirização da mão-de-obra de atividades-meio para empresas tomadoras de serviço.
Com o advento da Lei nº 6/019/1974, a relação de trabalho deixou de ser bilateral, figurando empregado e empregador, passando a ser trilateral, figurando agora uma nova figura, o tomador do serviço.
Os diplomas legais que validavam a terceirização possuíam viés econômico, no intuito de fomentar ainda mais a economia local, buscando desonerar a atividade empresarial. No entanto, o aspecto jurídico trabalhista encontrava-se fragilizado em relação a existência ou não de relação de emprego entre empregado da prestadora de serviço e tomadora de serviço.
Na realidade fática das relações, via-se empregados terceirizados exercendo as mesmas funções que empregados da tomadora e recebendo salários inferiores, atentando contra o princípio da igualdade das relações.
Sobre a precarização da relação, Amorim (2009, p. 32) destaca:
Na rigorosa concorrência interempresarial desencadeada por este mecanismo, o enxugamento dos custos da produção conduz à drástica contenção dos níveis de proteção social deferidos aos trabalhadores dito terceirizados (contratados pelas empresas fornecedoras dos serviços), submetidos a condições de trabalho proporcionalmente menos favoráveis quanto mais o seu trabalho se distancia da empresa principal
Em meio à inexistência de regulamentação em lei sobre os limites da terceirização, o Tribunal Superior do Trabalho editou em 31 de maio de 2011 a Súmula nº 331, estabelecendo os parâmetros e limites para a terceirização dos serviços:
CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011
I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974).
II - A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública direta, indireta ou fundacional (art. 37, II, da CF/1988).
III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta.
IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços quanto àquelas obrigações, desde que haja participado da relação processual e conste também do título executivo judicial.
V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.
VI – A responsabilidade subsidiária do tomador de serviços abrange todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral. (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Súmula nº 331)
Através da súmula, restou expresso a possibilidade da terceirização apenas à atividade-meio da tomadora de serviço, restringindo a atuação dos empregados terceirizados a atividades relacionadas a área de atuação da empresa contratante.
Observada a precarização nas relações de trabalho em razão da terceirização, verificou-se o aumento no número de processos trabalhistas sobre o tema após a edição da aludida súmula, conforme tabela abaixo:
ANO |
NÚMERO DE PROCESSOS |
2011 |
9.296 |
2012 |
16.181 |
2013 |
16.438 |
2014 |
15.082 |
Até abril de 2015 |
16.323 |
Fonte: Martins (2017, p. 26).
Verifica-se, portanto, que antes da edição das Leis nº 13.429/2017 e nº 13.467/2017, havia muitas incertezas acerca dos limites da terceirização, cabendo ao judiciário decidir à sua maneira sobre o tema, definindo seus limites e consequências, trazendo ainda insegurança jurídica as relações de trabalho.
Dessa forma, as alterações promovidas pelas Leis nº 13.429/2017 e nº 13.467/2017 foram indispensáveis para trazer os esclarecimentos necessários sobre os limites da terceirização no ordenamento jurídico brasileiro.
3. DAS ALTERAÇÕES SOBRE TERCEIRIZAÇÃO NO ORDENAMENTO JURÍDICO LABORAL: LEI Nº 13.429/2017 E LEI Nº 13.467/2017
A Lei nº 13.429/2017 e Lei nº 13.467/2017, trouxeram mudanças sensíveis à Lei nº 6.019/1974, instrumento legal que tratava da terceirização no Brasil. Embora não tratasse exclusivamente do tema, a lei da década de 1970 era a única que continha dispositivos, mesmo que genéricos, acerca do tema, causando dúvidas sobre os limites do fenômeno nas relações profissionais.
Como detalhado no tópico anterior, o Tribunal Superior do Trabalho editou em 2011 a Súmula nº 331 que implementou as diretrizes da terceirização no Brasil, sendo a principal delas a impossibilidade de terceirização das atividades principais das empresas, também chamadas atividades-fim, limitando-se apenas as atividades secundárias ou periféricas das empresas.
Em 31/03/2017 foi promulgada a Lei nº 13.429/2017, dispondo sobre mudanças no tocante ao trabalho temporário e a prestação de serviços a terceiros, objetos Lei nº 6.019/1974.
Além de detalhar aspectos formais, a lei supracitada conferiu maior amplitude das atividades passíveis de terceirização, não se limitando apenas a atividades-meio, como dispunha entendimento jurisprudencial pacificado nos tribunais.
No entanto, o texto da nova lei, da forma que foi publicado, trouxe uma série de incertezas quanto a real possibilidade de terceirização da atividade-fim das empresas, por conta da utilização do verbo transitivo “poder”, dando ideia de faculdade, mas, para aqueles que eram contra o novo entendimento, era o suficiente para argumentar que a lei não foi expressa quanto à possibilidade.
Assim, a nova lei, criada para sanar quaisquer dúvidas acerca do tema, causou mais embaraços, trazendo insegurança jurídica às relações trabalhistas, ante a imprecisão da norma.
O Tribunal Superior do Trabalho, aproveitando-se da falha legislativa, continuou a aplicar o entendimento da Súmula nº 331 mesmo após a edição da nova lei, conforme Informativo nº 162:
Instituição financeira. Telemarketing. Atividade-fim. Terceirização ilícita. Contrato de trabalho celebrado e extinto na vigência da Lei nº 6.019/74. Não incidência da Lei nº 13.429/2017.
A Lei nº 13.429/2017 não se aplica às relações de trabalho regidas e extintas sob a égide da Lei nº 6.019/1974, sob pena de afronta ao direito adquirido do empregado a condições de trabalho mais vantajosas. No caso, a reclamada insurgiu-se contra decisão da SBDI-I que, invocando a Súmula nº 331, I, do TST, estabeleceu que a prestação de serviços de cobrança a clientes de instituição financeira, mediante contato telefônico, se insere na atividade-fim bancária. Alegou que a Lei nº 13.429/2017, ao acrescentar o art. 4ª-A, § 2º, à Lei nº 6.019/74, afastou a ilicitude na terceirização dos serviços prestados e tem aplicação imediata. Todavia, por se tratar de contrato celebrado e findo antes da entrada em vigor da Lei nº 13.429/2017, prevaleceu o entendimento jurisprudencial firmado no item I da Súmula nº 331 do TST, amparado no antigo teor da Lei nº 6.019/1974. Sob esses fundamentos, a SBDI-I, por unanimidade, deu provimento a embargos de declaração apenas para prestar esclarecimentos. TST-ED-E-ED-RR-1144-53.2013.5.06.0004, SBDI-I, rel. Min. João Oreste Dalazen, 3.8.2017. (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Informativo nº 162)
Diante do cenário de insegurança jurídica ocasionado pela Lei nº 13.429/2017, restou necessária a edição de um novo dispositivo legal a fim de sanar as suas omissões e falhas, razão pela qual, em 13/07/2017, foi promulgada a Lei nº 13.467/2017, popularmente conhecida como Reforma Trabalhista, que alterou novamente a Lei nº 6.019/1974, agora prevendo expressamente a possibilidade de terceirização das atividades-fim das empresas.
A lei de julho de 2017 alterou o caput do artigo 4º-A e 5º-A da Lei nº 6.019/1974, que tratava das definições de terceirização e contratante de serviço terceirizado, trazendo clareza quanto à possibilidade de terceirização nas atividades-fim:
Art. 4o-A. Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução. (BRASIL, 2017, Art. 4º-A)
Art. 5o-A. Contratante é a pessoa física ou jurídica que celebra contrato com empresa de prestação de serviços relacionados a quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal. (BRASIL, 2017, Art. 5º-A)
Após a edição da reforma trabalhista e sanada as dúvidas acerca da possibilidade de terceirização das atividades-fim, a questão tornou-se tema de conflitos jurídicos quanto a constitucionalidade do dispositivo legal.
A corrente jurídica que entendia pela constitucionalidade da matéria, defendida pelo ministro Ives Gandra Martins Filho e demais políticos que votaram para aprovação da lei, argumentava que a lei promulgada percorreu todos os trâmites legais, passando pelas comissões constitucionais especializadas na Câmara e no Senado Federal, devendo ser respeitado princípio da legalidade.
A tese contrária, que trata da inconstitucionalidade, defendida pelos juristas Helder Santos Amorim e Gabriela Neves Delgado, em “A inconstitucionalidade da terceirização na atividade-fim das empresas” aduz que a terceirização da atividade principal da empresa reflete na precarização das relações de trabalho, atentando contra o princípio da proteção ao trabalhador, o princípio constitucional basilar nas relações de trabalho.
Em 30 de agosto de 2018, o Supremo Tribunal Federal, em julgamento do Recurso Extraordinário nº 958252 em repercussão geral, chancelou o entendimento trazido pela Lei nº 13.467/2017, reconhecendo a possibilidade de terceirização de atividade-fim nas empresas: “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”. (BRASIL, Supremo Tribunal Federal, Tema 725)
No entendimento do Supremo Tribunal Federal, a terceirização irrestrita das atividades ajuda a fomentar o mercado de trabalho, trazendo mais oportunidades de emprego a população, não trazendo nenhum prejuízo aos empregados, haja vista que respeitados todos os seus direitos.
Conclui-se, portanto, que no novo cenário da terceirização pós 2017, não há óbice para que as empresas terceirizem a mão-de-obra, sendo expressamente permitido por lei, independentemente de atividade principal ou secundária.
Com o novo cenário permissivo da terceirização, as negociações coletivas, que tiveram seus efeitos amplificados após a reforma trabalhista, ganharam destaque acerca de seus novos efeitos, limites e restrições.
4. DO NOVO MODELO DE NEGOCIAÇÃO COLETIVA.
As alterações trazidas acerca da terceirização, mais especificamente, na expressa autorização para terceirização de atividade-fim, a reforma trabalhista ampliou os poderes conferidos aos instrumentos coletivos de trabalho, garantindo maior poder de auto-composição entre as partes da relação jurídica coletiva.
Com o advento do artigo 611-A da CLT, criou-se o entendimento da prevalência do negociado sobre o legislado, aplicando o princípio da autonomia da vontade, presente no artigo 444 da CLT.
No entanto, resta salientar que tal prevalência não é absoluta, não podendo flexibilizar princípios constitucionais ou precarizar as condições de trabalho, encontrando limites inclusive no artigo 611-B da CLT.
4.1 DA PREVALÊNCIA DO NEGOCIADO SOBRE LEGISLADO.
Os instrumentos coletivos de trabalho possuem papel primordial para reger as relações de trabalho de cada categoria, observando suas particularidades. Em meados da década de 1980, as negociações coletivas começaram a ganhar relevância, ante o período de redemocratização do país e constitucionalização de direitos trabalhistas, garantindo novos direitos, como, por exemplo, o direito a greve.
Desde então, a negociação coletiva tornou-se indispensável, haja vista que a legislação por muitas vezes é genérica, não acompanhando eventuais necessidades específicas de determinada categoria.
Acompanhando a evolução no panorama negocial, a Lei nº 13.467/2017 garantiu maior amplitude aos instrumentos coletivos de trabalho, de modo a flexibilizar as normas aplicáveis, para garantir a manutenção dos empregos.
O Art. 611-A da CLT é expresso ao tratar dos temas passíveis de sobrepujar o texto legal, verificando-se a já citada extensão da amplitude dos instrumentos coletivos.
Ricardo Souza Calcini trata da autonomia concedida as negociações coletivas, sempre observado o patamar mínimo das relações de trabalho:
Por essa razão, procurou-se enfatizar a valorização da autonomia negocial coletiva como instrumento hábil a estabelecer regras e condições mais propícias à realidade dos sujeitos da relação de emprego, sem descurar do respeito ao princípio da adequação setorial negociada, segundo o qual as partes convenentes, na alteração de normas de indisponibilidade relativa, devem sempre prever disposições que elevem os direitos trabalhistas previstos em lei.
De mais a mais, em nenhum momento se pactuou aqui com a violação ao patamar mínimo civilizatório dos trabalhadores, entendido como arcabouço de direitos de indisponibilidade absoluta previstos especialmente no art. 7º da CRFB, além daqueles estabelecidos em tratados e convenções internacionais, como também os correspondentes à proteção da saúde, medicina e segurança.
Logo, pugna-se por uma proposta na defesa do incremento da própria negociação coletiva, na forma do que preceituam as Convenções n. 98 e 154 da OIT, que foram ratificadas pelo Brasil. Tais normatizações internacionais dão respaldo à negociação coletiva, a qual constitui instrumento propulsor de diálogo social e requer a observância do princípio da adequação setorial negociada. (CALCINI, 2017, p. 125)
Verifica-se, portanto, a ampliação da abrangência atribuída à negociação entre classes através da negociação, desde respeitados os limites estabelecidos pelo art. 611-B, da CLT.
4.2 DOS LIMITES DAS NEGOCIAÇÕES COLETIVAS.
Ante a elevação do patamar dos instrumentos coletivos de trabalho, indaga-se quais seriam os limites dessas negociações, ante a impossibilidade de sobrepor direitos constitucionalmente garantidos.
Para Maurício Godinho Delgado, a negociação trabalhista encontra limite no chamado princípio da adequação setorial:
Pelo princípio da adequação setorial negociada, as normas autônomas juscoletivas construídas para incidirem sobre certa comunidade econômico-profissional podem prevalecer sobre o padrão geral heterônomo justrabalhista, desde que respeitados certos critérios objetivamente fixados. São dois esses critérios autorizativos: a) quando as normas autônomas juscoletivas implementam um padrão setorial de direitos superior ao padrão geral oriundo da legislação heterônoma aplicável; b) quando as normas autônomas juscoletivas transacionam setorial parcelas justrabalhistas de indisponibilidade apenas relativa (e não de indisponibilidade absoluta). (DELGADO, 2017, p. 1497-1498)
Em outras palavras, segundo o referido princípio, é vedada a negociação que implique em renúncia de direitos indisponíveis, que afrontem princípios e garantias constitucionais, de modo a não precarizar a relação.
Ricardo Souza Calcini reitera o posicionamento supracitado:
Essa é a razão pela qual a jurisprudência da Corte Superior Trabalhista faz a distinção entre normas de indisponibilidade absoluta e normas de indisponibilidade relativa. As primeiras, como acima mencionado, englobam o patamar mínimo civilizatório dos trabalhadores, insuscetíveis, portanto, de modificação pela via da negociação coletiva. Já as segundas conferem efetividade ao princípio da adequação setorial negociada, mas para sua legitimação é necessário garantir ao menos um mínimo de contraprestação, além de se estabelecer um patamar superior de direitos, de acordo com o princípio constitucional da progressividade dos direitos sociais.
Dessa forma, do cotejo entre os instrumentos coletivos de trabalho (normas autônomas) e a legislação consolidada (normas heterônomas), há de se aplicar o princípio da criatividade jurídica, traduzido na função normogenética da negociação coletiva, em harmonia com o citado princípio da adequação setorial negociada. (CALCINI, 2017, p. 125)
Além disso, o próprio artigo 611-B da CLT dispõe sobre matérias cuja disposição é vedada por negociação coletiva, servindo como cláusula de barreira ou contenção, como a possibilidade de habilitação no programa de seguro-desemprego em caso de dispensa imotivada, valor do salário mínimos, dentre outros.
Contudo, apesar do referido artigo usar a expressão “exclusivamente” no caput, Cassar (2017) entende que o referido artigo não é taxativo, mas sim exemplificativo, em razão da não inclusão de princípios, direitos e valores constitucionalmente garantidos, não sendo permitidas suas violações.
Desse modo, conhecendo a amplitude das negociações coletivas, bem como seus limites, resta o exame no que concerne a possibilidade de restrição da terceirização através de instrumento de negociação coletiva.
5. DA POSSIBILIDADE DE CLÁUSULA DE INSTRUMENTO COLETIVO QUE RESTRINJA A TERCEIRIZAÇÃO
Os tópicos anteriores trataram de todo processo evolutivo do fenômeno da terceirização até chegar à Lei nº 13.467/2017, que expressamente autorizou a sua utilização irrestrita no âmbito trabalhista, inclusive para atividades-fim das empresas.
Como também já citado, tal permissivo legal gerou dúvidas quanto as relações de trabalho, ante o receio pela sua precarização, sendo necessária a chancela do Supremo Tribunal Federal para ratificar a matéria e declarar a inexistência de qualquer prejuízo ao trabalhador, analisados os princípios da proteção e da norma mais favorável.
Ainda com as mudanças ocasionadas pela Lei nº 13.467/2017, restou incorporado ao texto legal a prevalência do negociado em face do legislado, dando autonomia e liberdade as categorias de classes e as empresas, representadas ou não por seus sindicatos, convencionarem sobre as obrigações a serem seguidas pelas categorias de trabalho, flexibilizando a aplicação das leis, devendo respeito aos princípios norteadores do direito do trabalho.
Em razão da força concedida aos instrumentos coletivos de trabalho, cingiu-se a discussão acerca da validade de cláusula normativa em negociação coletiva que restrinja à terceirização, principalmente no tocante a sua vedação na contratação de empregados terceirizados para realização de atividade-fim da empresa.
Em março de 2018, o Tribunal Superior do Trabalho, por meio do Informativo nº 174, entendeu ser nula a cláusula que vedasse limitações a terceirização, decidindo que a cláusula restritiva versava contra o artigo 170, inciso IV, da Constituição Federal, que trata do princípio da livre concorrência:
Ação anulatória. Cláusula convencional que proíbe os condomínios de contratarem empregados terceirizados. Nulidade. Ofensa ao princípio constitucional da livre concorrência.
A SDC, por unanimidade, conheceu de recurso ordinário e, no mérito, por maioria, deu-lhe provimento para declarar a nulidade de cláusulas de convenções coletivas de trabalho que proíbem aos condomínios residenciais e comerciais a contratação de mão de obra terceirizada para a execução de serviços definidos pelas partes como atividade fim. Na espécie, prevaleceu o entendimento de que as referidas cláusulas, ao impedir que as atividades de zelador, de porteiro, de vigilante e de serviços gerais, entre outras, sejam executadas por empresas terceirizadas, além de afastar o permissivo da Súmula n° 331 do TST, limitaram a iniciativa empresarial para a consecução de objetivo considerado regular e lícito, em desacordo, portanto, com o princípio da livre concorrência consagrado no art. 170, IV, e parágrafo único, da CF. Vencidos os Ministros Mauricio Godinho Delgado, Kátia Magalhães Arruda, Maria de Assis Calsing e Fernando Eizo Ono. TST-RO-121-39.2014.5.10.0000, SDC, rel. Min. Mauricio Godinho Delgado, red. p/ acórdão Min. Dora Maria da Costa, 12.3.2018 (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Informativo nº 174)
No entanto, em junho de 2018, três meses após a decisão supracitada, o próprio Tribunal Superior do Trabalho, por meio do Informativo nº 180, entendeu por ser válida pactuação em instrumento coletivo de cláusula que veda a terceirização de atividade-fim, haja vista a autonomia do instrumento coletivo e a não precarização das relações de trabalho, aplicando-se ainda o princípio da adequação setorial, in verbis:
Ação anulatória. Cláusula convencional que proíbe os condomínios de contratarem empregados terceirizados. Validade. Princípio da adequação setorial negociada.
São válidas cláusulas de termo aditivo de convenção coletiva de trabalho que proíbem aos condomínios residenciais e comerciais a contratação de mão de obra terceirizada para a execução de serviços definidos pelas partes como atividade fim (zelador, garagista, porteiro, trabalhador de serviços gerais e faxineiro). Na espécie, registrou-se que as normas firmadas pelos convenentes apenas vedam a utilização de empresas interpostas nos serviços de limpeza, portaria, etc, sem adentrar na questão da validade ou não da terceirização das referidas atividades. Ademais, pelo princípio da adequação setorial negociada, as normas autônomas, oriundas de negociações entre as categorias profissional e patronal, prevalecem sobre as regras estatais de proteção ao trabalho, desde que não avancem sobre direitos de indisponibilidade absoluta. De outra sorte, não há falar em ofensa ao princípio constitucional da livre iniciativa, pois a opção dos convenentes tem aplicação restrita às categorias representadas, sem imposição direta a terceiros. Sob esses fundamentos, a SDC, por maioria, conheceu dos recursos ordinários e, no mérito, negou-lhes provimento para manter a decisão do Tribunal Regional que julgara improcedente a ação anulatória. Vencidos os Ministros Emmanoel Pereira, Aloysio Corrêa da Veiga, Ives Gandra Martins Filho e Dora Maria da Costa. TST-RO-332-46.2012.5.10.0000, SDC, rel. Min. Kátia Magalhães Arruda, 11.6.2018. (BRASIL, Tribunal Superior do Trabalho, Informativo nº 180)
Nota-se que o tema não possui entendimento pacificado, havendo argumentos para fundamentar as duas teses. No entanto, percebe-se a fragilidade do argumento que fundamenta a declaração de nulidade da cláusula.
Como já citado, tal nulidade é pautada pelo desacordo com o princípio da livre concorrência, implicando que a situação prevista prejudica o acesso ao trabalho pelos eventuais empregados, minando as oportunidades.
Todavia, a restrição não prejudica as oportunidades ou as relações, mas sim garantem a relação bilateral entre empregado e empregador, retirando a figura do tomador do serviço, visando a não precarização da mão-de-obra.
Acerca da temática, dispõe Mauricio Godinho Delgado:
Para a Constituição, em consequência, a terceirização sem peias, sem limites, não é compatível com a ordem jurídica brasileira. As fronteiras encontradas pela experiência jurisprudencial cuidadosa e equilibrada para a prática empresarial terceirizante, mantendo esse processo disruptivo dentro de situações manifestamente delimitadas, atende, desse modo, o piso intransponível do comando normativo constitucional. (DELGADO, 2014, p. 463)
Ainda corroborando com a precarização da mão-de-obra através da terceirização, entende o doutrinador Grijlabo Coutinho:
Ora, a terceirização dilapida conquistas sociais previstas em diplomas jurídicos nacionais e internacionais, sendo responsável pelo aumento dos índices de trabalho escravo contemporâneo, mortes e mutilações relacionadas ao trabalho. Trata-se de veículo empresarial hoje utilizado com maior ênfase para liquidar ou mitigar Direitos Humanos da classe trabalhadora. Verifica-se, pois, a sua incompatibilidade com o princípio da proibição do retrocesso social inerente ao Direito do Trabalho, incorporado de maneira expressa ao ordenamento jurídico nacional (CRFG, art. 7ª) e internacional. (COUTINHO, 2015, p. 233)
A flexibilização das leis laborais através de instrumento coletivo não serve apenas para beneficiar as empresas ou sindicatos patronais, mas também os assistidos por determinada categoria profissional.
A edição de cláusula neste sentido garante aos trabalhadores a relação direta bilateral com a empresa, seguindo assim os ditames dos princípios da proteção e da continuidade das relações de emprego, evitando ainda o enfraquecimento da representação sindical.
Os juristas Cristiano Paixão e Ricardo Lourenço Filho (2014) destacam que com a terceirização, criou um obstáculo para identificar e atrair os trabalhadores de categoria sujeitos a mudanças de tomadoras de serviço, haja vista a ausência de condições fundamentais para o agir coletivo, como a igualdade de lutas, reivindicações, perspectivas, interesses.
O princípio da proteção é a base das relações de emprego. A terceirização de atividade-fim visa exclusivamente o lucro, descontruindo as relações de emprego e precarizando a mão-de-obra, de modo a remunerar menos os colaboradores a fim de auferir maiores rendimentos.
Ao final, os empregados tornam-se descartáveis, tornando o trabalho uma mera mercadoria, em dissonância com a Declaração de Filadélfia da Organização Internacional do Trabalho de 1946.
Conclui-se que, conforme os preceitos legais acerca do negociado prevalecendo sobre o legislado, não há que se falar em nulidade de cláusula de restrição de terceirização, em especial de atividade finalística da empresa, haja vista que a disposição não fere qualquer princípio constitucional, bem como não se encontra presente na cláusula de barreira do artigo 611-B da CLT.
6. CONCLUSÃO
É possível observar que desde o fim da segunda guerra mundial, a terceirização tornou-se fundamental para fomentar a economia e reconstruir os estados afetados pela guerra, incluindo o Brasil.
Durante muito tempo, o Brasil não possuía uma legislação para tratar sobre o tema, embora rotineiro durante o dia-a-dia, ficando a cargo do Tribunal Superior do Trabalho, por meio da Súmula nº 331, regulamentar e limitar a matéria.
No entanto, o ano de 2017 foi fundamental para regularização da terceirização no país, com o advento das Leis nº 13.429 e nº 13.467, trazendo expressamente as regulamentações e limitações do tema, sendo a principal delas a possibilidade de terceirização de atividade-fim das empresas, ou seja, de forma irrestrita, vedada anteriormente pela súmula do Tribunal Superior do Trabalho.
A terceirização irrestrita trouxe insegurança jurídica para as relações laborais, ficando suscetíveis a precarização. A temática foi julgada em repercussão geral pelo Supremo Tribunal Federal, que entendeu pela constitucionalidade da terceirização de atividade-fim, com o fundamento de maior oportunidade de integração ao mercado de trabalho, haja vista o maior número de vagas de emprego.
Além da mudança quanto a mão-de-obra terceirizada, a Lei nº 13.467/2017 inovou no tocante a força dos instrumentos coletivos, prevalecendo sobre os dispositivos legais.
Diante disso, ante a possível precarização das relações de emprego pela terceirização de atividade-fim das empresas, chancelada pelo Supremo Tribunal Federal, os sindicatos representantes dos empregados acharam por bem convencionar em instrumento coletivo, cláusula de vedação de terceirização de mão-de-obra, a fim de garantir o cumprimento dos princípios constitucionais ligados ao trabalho, além da dignidade da pessoa humana.
Conclui-se, a priori, pela possibilidade de confecção de cláusula nos termos citados, visto que tal norma não afronta nenhum princípio juslaboral ou constitucional, sendo plenamente possível a estipulação de cláusula nos termos supracitados.
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[1] Bacharel em Direito. Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (2015). E-mail: [email protected]
Acadêmico do Curso de Bacharelado em Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: JESUS, Leonardo Rodrigues de. Terceirização e reforma trabalhista: possibilidade de inclusão de cláusula em instrumento coletivo que limite a terceirização Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2021, 04:11. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57767/terceirizao-e-reforma-trabalhista-possibilidade-de-incluso-de-clusula-em-instrumento-coletivo-que-limite-a-terceirizao. Acesso em: 23 dez 2024.
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