EDNAN GALVÃO SANTOS
(orientador)
RESUMO: Este trabalho tem como sustentação os resultados colhidos em uma pesquisa bibliográfica, tendo como objetivo a análise da prescrição penal a partir da Lei n° 12.234/2010 e seus conceitos coadjuvantes. Utilizou-se de análise documental de artigos e demais trabalhos acerca da regulamentação nacional que remete ao tema prescrição penal, no período compreendido entre os anos de 2010 a 2020. As fontes literárias foram livros e artigos, disponibilizados em meio eletrônico e físicos, com temática específica sobre a prescrição penal no âmbito da legislação brasileira. Frente à complexidade desse tema, é possível denotar que o debate acerca deste assunto ganhou relevância e destaque com a revisão da prisão em segunda instância por parte do Supremo Tribunal Federal. Nesse sentido, verifica-se que a prescrição penal se alicerça sobre outros sistemas e dispositivos de punibilidade, logo, falar de prescrição requer partir para seu outro extremo, que é a punição, pois é dela que são oriundas as mais diferentes estratégias institucionais de controle e vigilância dos indivíduos. Ficou demonstrado que a prescrição penal é produzida por orientações coletivas, reforçadas não somente em regulamentações oficiais, mas também por diferentes práticas sociais que enfatizam ações jurídicas, e, por isso, a prescrição penal não pode ser entendida separadamente das práticas de punibilidade decorrentes da ação penal cabível.
Palavras-Chave: Prescrição; Penal; Punição.
ABSTRACT: This work is supported by the results collected in a bibliographic research, with the objective of analyzing the criminal prescription from Law n° 12.234/2010 and its supporting concepts. Documentary analysis of articles and other works about national regulations that refer to the criminal statute of limitations was used, in the period between 2010 and 2020. The literary sources were books and articles, available in electronic and physical media, with thematic on the criminal statute of limitations under Brazilian law. Faced with the complexity of this issue, it is possible to denote that the debate on this subject has gained relevance and prominence with the review of the arrest in second instance by the Federal Supreme Court. In this sense, it appears that the criminal prescription is based on other systems and devices of punishment, therefore, talking about prescription requires going to its other extreme, which is punishment, since it is from this that the most different institutional control strategies come from. and surveillance of individuals. It was demonstrated that the criminal prescription is produced by collective guidelines, reinforced not only in official regulations, but also by different social practices that emphasize legal actions, and,therefore, the criminal prescription cannot be understood separately from the practices of punishment resulting from the action penal applicable.
Keywords: Prescription; criminal; Punishment.
1 INTRODUÇÃO
O conteúdo disposto no presente trabalho de conclusão de curso tem como objetivo primário demonstrar os efeitos jurídicos e as consequências diretas da prescrição penal no direito brasileiro. A escolha pela análise dessa matéria se deu em decorrência da sua importância e relevância social. Com isso, buscou-se um melhor entendimento dos diferentes sentidos da prescrição penal a partir da Lei n° 12.234/2010 alojados na estrutura jurídica brasileira.
Foi necessário reunir um conjunto de documentos oficiais, textos, artigos, dissertações e anotações de seminários, palestras e conferências sobre este tema, o que gradativamente configurou a explicitação dos propósitos investigativos do estudo em tela.
A problematização desse trabalho se debruçou em analisar a Lei n° 12.234/2010, como um movimento de contradições e paradoxos, como um dos mecanismos de poder que controla, normatiza e pune os indivíduos. Deixa evidente, na medida do possível, que a mudança na legislação está na ordem da lei e que sua reprodução também é controlada, selecionada e redistribuída por procedimentos que apontam para sua busca de eficiência.
Em sua delimitação, enquanto vinculação ao projeto investigativo já enunciado, decidiu-se, como recorte, dimensionar a Lei n° 12.234/2010, sobre prescrição penal no Brasil, no período compreendido entre os anos de 2010 a 2020, tendo como foco as nuances dessa legislação. Nesse sentido, cabe salientar que, no dia 06 de maio de 2010, entrou em vigor a Lei 12.234/2010. Referida lei apresenta apenas quatro artigos, mas que alteram consideravelmente algumas modalidades de prescrição no Direito Penal brasileiro, alterando, assim, os artigos 109 e 110 do Código Penal.
No que tange ao conceito de prescrição, pode-se dizer que é uma das modalidades de extinção da punibilidade. É de conhecimento que o Estado tem o poder de punir. Assim sendo, na medida em que ocorre uma infração penal, surge para o Estado a responsabilidade de investigar e logo em seguida punir com o menor lapso de tempo o autor dessa conduta.
Atualmente a legislação brasileira prevê quatro modalidades de prescrição, sendo três delas relacionadas à prescrição da pretensão punitiva (PPP) – quais sejam: prescrição em abstrato (ou propriamente dita), prescrição intercorrente (ou interveniente) e prescrição retroativa – e uma de prescrição da pretensão executória (PPE), que ocorre quando o Estado perde o poder punitivo em decorrência do tempo, a execução de uma pena já aplicada.
Espera-se que os resultados deste estudo possam subsidiar novas pesquisas que contribuam para melhoria do sistema jurídico penal, além de oferecer elementos de análise de políticas públicas nesta área.
2 A FUNÇÃO CONSTITUCIONAL DA PRESCRIÇÃO PENAL
Haja vista que o presente artigo se esmera em analisar a função constitucional do instituto da prescrição penal, se faz necessário evidenciar, neste primeiro momento, que a Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB/88, não discorre sobre a prescrição propriamente dita, isto é, não apresenta a “missão” dessa possibilidade de extinção da punibilidade e tampouco discorre sobre as suas modalidades, supramencionadas.
Dessa forma, para alcançar o entendimento do que vem a ser a função constitucional da prescrição penal, importa fazer o caminho inverso e esclarecer que a CRFB/88 prevê quais são os crimes imprescritíveis, são eles: “a prática do racismo” (Art. 5º, XLII) e “a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático” (Art. 5º, XLIV).
Diante disso, é válido salientar que aqueles previstos também no Art. 5º, mas no inciso XLIII, não fazem parte do rol de crimes imprescritíveis, visto que a CRFB/88 somente os considera inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia, quais sejam: “a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos”.
Ante a previsão, no Art. 5º da CRFB/88, de quais crimes são imprescritíveis, tem-se duas constatações: a primeira é de que a imprescritibilidade de tais condutas expressa a preocupação do legislador em proteger determinados direitos fundamentais, à título de exemplo, veja-se:
(...) a determinação constitucional expressa de que o racismo deve ser criminalizado (art. 5º, XLII) visa à tutela do direito fundamental à igualdade, da liberdade e da dignidade da pessoa humana. Esse sentido é reforçado pelo art. 5º, XLI, que determina: “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”. (Tavares, 2012, p. 352. Grifo nosso).
A segunda, por sua vez, é de que a prescrição – a perda do direito de punir ante a inércia do Estado, também é um direito fundamental no ordenamento jurídico brasileiro e diz respeito à necessidade de preservação da segurança das relações sociais, vez que não seria coerente admitir que o Estado pudesse, como regra, punir um indivíduo em qualquer momento, não considerando o tempo transcorrido desde o cometimento de determinada conduta criminosa.
Daí que, em se tratando da função constitucional da prescrição, depreende-se que visa evitar que os indivíduos se tornem reféns da punição estatal (evita a eternização da persecução penal), além de incentivar, por exemplo, que o Ministério Público cumpra com os seus encargos em tempo oportuno.
Interessa mencionar que a doutrina entende que o tempo é o elemento crucial para justificar o instituto da prescrição, assim escreve Magalhães Noronha:
O tempo, que tudo apaga, não pode deixar de influir no terreno repressivo. O decurso de dias e anos, sem punição do culpado, gera a convicção da sua desnecessidade, pela conduta reta que ele manteve durante esse tempo. Por outro lado, ainda que se subtraindo à ação da justiça, pode aquilatar-se de sua intranquilidade, dos sobressaltos e terrores que passou, influindo esse estado psicológico em sua emenda ou regeneração. (2001, p. 362)
Magalhães Noronha conclui o seu raciocínio explicando que “é indisfarçável que, ao menos aparentemente – e, portanto, com reflexos sociais nocivos – a pena tão tardiamente aplicada surgiria sem finalidade, e antes como vingança”. (2001, p. 362)
Do exposto, sem adentrar às teorias que explicam a aplicação da prescrição (teoria do esquecimento, da expiação moral, da emenda e teoria psicológica), infere-se que a CRFB/88 ao dispor apenas sobre as exceções à regra de prescritibilidade da pena, defendeu o direito de a pessoa que praticara conduta criminosa, não tendo sido devidamente punida no tempo previsto, se portadora de conduta reta e não mais reincidente, não se torne mero objeto de vingança estatal.
Não se pode esquecer, igualmente, que a inércia estatal que culmina na prescrição em estudo não se confunde com a renúncia ao direito de ação, uma evidência disso é a alternativa de ajuizamento da ação penal subsidiária da pública, ocasião em que não tendo o Ministério Público ajuizado a ação penal no prazo cabível, abre-se a possibilidade de a própria pessoa ofendida apresentar a denúncia. (TEIXEIRA, 2016)
A prescrição do direito de punir configura-se como verdadeira garantia processual penal, neste sentido, Morais leciona que o Direito Penal é instrumentalizado por meio do Processo, que fora dele “não tem realidade concreta” (2018, p.24). Nesta senta, Aury Lopes Júnior (2016,) postula que o processo penal é o caminho necessário para a pena e, principalmente, um caminho que condiciona o exercício do poder de penar (...) à estrita observância de uma série de regras que compõe o processo penal.
O processo penal é regido pelo princípio da garantia do “devido processo legal”, que pode ser compreendido como um conjunto de garantias mínimas que devem ser observadas com o intuito de promover a seguridade dos direitos inerentes a toda pessoa humana, bem como efetivar os direitos e garantias constitucionais que são inerentes à condição de justiça.
Neste aspecto, o Processo e o Direito Penal, triangulados com a garantia de prescrição não devem mais ser visto com um instrumento do poder punitivo, mas sim um limitador do jus puniendi, e também, com um escudo que guarnece o indivíduo a ele submetido. (LOPES JÚNIOR, 2016)
Aury Lopes Júnior, explica ainda que “o processo penal é um caminho necessário para se chegar legitimamente à pena. Daí por que somente se admite sua existência quando ao longo do caminho forem rigorosamente observadas as regras e garantias constitucionais asseguradas”. (2016, p. 34)
Destaca-se por oportuno, ante todo o exposto, que a função constitucional da prescrição penal de forma alguma diz respeito a qualquer pretensão de impunidade de eventuais responsáveis por condutas delitivas, colocando em perigo o conceito de justiça, pelo contrário, o que se buscou foi evitar condenações injustas, desprovidas de material probante suficiente e sem máculas, além de incentivar o Estado a proceder com dedicação ao que lhe cabe quando das investigações, oferecimento de denúncias e o exercício de seu direito de punir.
Adiante se serão examinadas as características da pretensão punitiva conferida ao Estado, tal como os limites legais de tal pretensão.
3 POSSIBILIDADE DA EXTINÇÃO PUNITIVA
Pois bem. Ainda que se considere o fato de o ente estatal ter tomado para si a prerrogativa do direito punitivo, onde trouxe para si todas as responsabilidades pertinentes à persecução penal, a referida entidade teve o cuidado de condicionar esse poder, por meio da instituição no ordenamento jurídico, das causas que possibilitam a extinção do poder punitivo.
Tais causas extintivas da punibilidade, como estão descritas, tem previsão no rol não taxativo do artigo 107 do Código Penal. Sendo a inicial, o óbito do agente, que se fundamenta no princípio mors omnia solvit, que significa dizer que após a morte do agente delituoso tudo é apagado ou dissolvido, considerando a impossibilidade de aplicação da sanção penal a quem for descendente do praticante do ato ilícito, em que pese o princípio constitucional de que nenhuma pena será transferida para outrem.
Outras formas de extinção da punição são a anistia, o indulto e a graça. A anistia decorre por meio de lei, onde o ato ilícito é eliminado, o indulto, se caracteriza por excluir somente a possibilidade de punição de um aglomerado de agentes condenados e não o ato ilícito, no caso da graça, a exclusão da punição, é dada de forma total ou parcial para um agente determinado.
Outra forma extintiva da pena é a abolitio criminis, ou retroatividade legal. Essa teoria não entende um fato criminoso como tal, e se encontra amparada no artigo 107 inciso III, no Código Penal.
A possibilidade é extinta ainda, por meio da prescrição, pela decadência, que se faz pela perda, pelo não cumprimento do prazo legal, da ação penal privada ou da representação, e pela forma peremptória, ou seja, por meio de uma sanção aplicada ao ente por omitir a promoção de ato que lhe compita, durante um período de tempo determinado, estando tal princípio baseado no artigo 60, da Lei Penal.
Além disso, repiso, o elenco do artigo 107 do Código Penal, não é taxativo, sendo possível encontrar em dispositivos diversos, outras causas que extinguem a punibilidade, tais como o ressarcimento do dano no peculato culposo (artigo 312, parágrafo 3º, Código Penal) e o cumprimento do período de prova no livramento condicional (artigo 90, Código Penal), e, ainda, em leis especiais, veja-se, pois, a extinção de punibilidade no sursis processual (artigo 89, § 5º, da Lei n° 9.099/95).
A questão da prescrição em vigência no sistema jurídico penal brasileiro, tem sua fundamentação baseada em três fundamentos: O decurso do tempo (teoria do esquecimento do fato), reeducação do apenado e negligência da autoridade.
Após a transcursão temporal, é considerada a inexistência de interesse por parte do Estado em solucionar um fato ocorrido há muito tempo, ou de punir o agente. As prevenções gerais e específicas provenientes da resposta emitida por meio da aplicação da pena, com o passar dos anos, perde a validade e eficiência.
Denota-se que a prática de novo ato delituoso pelo apenado determina a não reeducação do mesmo, porém, se após o primeiro delito não é cometido um segundo, tem-se a presunção da correção do agente. Dessa forma, o transcurso temporal sem que haja reiteração delituosa faz se presumir a capacidade do agente em ser reintegrado ao convívio social, não existindo mais a razão para a imposição de sanção em decorrência do primeiro ato infracional. A fundamentação dessa análise encontra-se em texto do Código Penal, no artigo 117, inciso VI, que dá previsão de interrupção da prescrição da pretensão executória por meio de reincidência.
A jurisdição penal trata da inércia da autoridade pública, no exercício do jus persequendi in juditio ou do jus executionis, por meio da punição no decurso do prazo prescricional. Ou seja, é uma punição para atos de negligência do ente estatal. Esse preceito foi reafirmado na reforma do Código Penal no ano de 1977, através da lei nº. 6.416/77, que deu previsão na legislação brasileira para a prescrição retroativa, com punição na mora do trâmite processual criminal com a eliminação da pretensão executória da pena principal, com base no parágrafo 2° do artigo 110 do Código Penal.
A prescrição só tem poder de extinção da pretensão punitiva ou executória, não recaindo sobre a tipicidade e antijuridicidade do fato. No mesmo sentido, a prescrição não exclui o juízo de culpabilidade. Em face dela, o fato subsiste típico e ilícito, e autoria de um agente com eventual culpa. A possibilidade legal de imposição penal, no entanto, é extinta pelo decurso do tempo.
Sabe-se que a prescrição penal conceitualmente pode variar segundo o doutrinador jurídico. Dessa maneira, optou-se em apresentar algumas abordagens acerca dessa conceituação.
Fragoso (1992, p. 403) entende que: “prescrição é a perda de um direito pelo decurso do tempo sem que ele seja exercido. A prescrição penal faz desaparecer o direito de punir do Estado (pretensão punitiva), ou o seu direito à execução da pena imposta”.
Por conseguinte, pode-se dizer que a prescrição é a perda da pretensão punitiva ou da pretensão executória do Estado, que extinguirá o ius puniendi em concreto, em virtude do transcurso do tempo, sendo matéria de ordem pública que não pode ser renunciada pelo acusado.A prescrição pode ocorrer no momento da pretensão punitiva ou na fase da pretensão executória, dependendo de sua espécie. Com a prescrição se impede que com o transcurso de determinado lapso temporal se efetive a pretensão punitiva ou a pretensão executória contra a pessoa.
É importante salientar que esse fenômeno chamando pretensão punitiva tem sua gênese atrelada a ocorrência de um crime, surgindo nesse momento para o Estado o ius puniendi. Cabe, no entanto, lembrar que as exceções previstas no art. 5º, incisos XLII (prática de racismo) e XLIV (ação de grupos armados, civis e militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático) da Constituição Federal, a pretensão punitiva não pode eternizar-se.
Sabendo-se que a legislação penal brasileira estabelece critérios que limitam o exercício do direito de punir do estado, a partir da fixação de um lapso temporal dentro do qual poderá a pena ser perseguida e/ou executada, o qual varia de acordo com a gravidade do crime e a sanção aplicada, conforme art. 109 do Código Penal.
Como foi dito sistemática legal do Código Penal distingue duas espécies de prescrição: a 1) prescrição da pretensão punitiva (PPP), também conhecida impropriamente como prescrição da ação penal, que ocorre antes do trânsito em julgado, devendo ter como efeito a cessação da persecução penal ou a declaração de impossibilidade de seu início; e a 2) prescrição da pretensão executória (PPE), impropriamente conhecida como prescrição da condenação ou prescrição da pena, que se dá após ao trânsito em julgado da condenação. Nesta última, o Estado perde o dever-poder de executar a sanção imposta na decisão definitiva. A prescrição da pretensão punitiva possui três espécies expressamente previstas: I) prescrição pela pena de prisão máxima em abstrato (art. 109, caput, do Código Penal); II) prescrição superveniente ou intercorrente (art. 110, § 1º, do Código Penal); e III) prescrição retroativa (art. 110, § 2º, do Código Penal).
3.1 A relevância da teoria prescritiva no direito penal brasileiro
A Prescrição é uma ferramenta jurídica, por onde o poder estatal perde o direito punitivo sobre o agente delituoso ou de executar o ato punitivo, pelo não exercício em determinado prazo de tempo, tudo isso com previsão dada pelo Código Penal em seus artigos 109 e 110, que determina a perda por parte do ente estatal do direito punitivo, fazendo com que venha a ocorrer a extinção da punibilidade, pois esta para ser realizada deve satisfazer todos os requisitos, onde o ente estatal deve agir conforme os prazos determinados.
Nesse sentido têm-se as seguintes determinações:
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo disposto nos parágrafos 1° e 2° do artigo 110 deste Código Penal Brasileiro, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
I - em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a 12 (doze);
II - em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) anos e não excede a 12 (doze);
III - em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) anos e não excede a 8 (oito);
IV - em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não excede a 4 (quatro);
V - em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é superior a 1 (um) ano ou, sendo superior, não excede a 2 (dois);
VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano. (Redação alterada pela lei 12.234/10 de 5 de maio de 2010)
Art. 110. A prescrição depois de transitar em julgado a sentença condenatória regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no artigo anterior, os quais aumentam de 1/3 (um terço), se o condenado é reincidente.
Parágrafo 1° A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo em nenhuma hipótese, ter por termo inicial, data anterior a da denúncia ou queixa. (Redação alterada pela lei 12.234/10 de 5 de maio de 2010)
Parágrafo 2° A prescrição de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.
A prescrição se coloca como uma ferramenta jurídica de grande importância para a legislação penal brasileira, pois o legislador não pode buscar a vida inteira apenar um ente em decorrência da prática de um ato delituoso cometido em uma determinada época, ou seja, um delito praticado no passado, considerando que o tempo por si só tem o poder de corrigir a pessoa do apenado, impossibilitando que este perpetue um fato em desvantagem ao apenado.
No transcorrer do tempo foram surgindo várias bases de fundamentação justificando a necessidade do instituto da prescrição, com destaque para o esquecimento relativo à infração penal, a supressão da necessidade de exemplificação junto à sociedade, a perda e dispersão das provas, além do fator de tranquilidade para aquele que praticou uma infração penal há anos atrás, pois um erro cometido no passado não pode perdurar e perseguir o autor da infração para sempre.
Conforme descrever Greco (2009), a prescrição penal é um instituto jurídico pela qual o Estado, por não ter apresentado capacidade de fazer valer o seu poder punitivo em determinado espaço de tempo determinado legalmente, fez com que ocorresse a extinção da possibilidade de punição.
Bitencourt (2002, p. 176), ensina que: "Para o ordenamento jurídico brasileiro, contudo, é instituto de direito material, regulado pelo Código Penal, e , nessas circunstancias, conta-se o dia do início."
Como pode ser visto, existem controvérsias quanto à natureza jurídica recaída sobre a prescrição penal. A Legislação Penal brasileira dá duas previsões para a questão, a primeira é a punição e a segunda a execução da punição do agente delituoso, sendo assim, surgem as duas formas principais da prescrição, sendo a pretensão punitiva e prescrição da pretensão executória.
3.2 Tipos de prescrição no processo penal
A sistemática legal do Código Penal distingue duas espécies de prescrição: a 1) prescrição da pretensão punitiva (PPP), também conhecida impropriamente como prescrição da ação penal, que ocorre antes do trânsito em julgado, devendo ter como efeito a cessação da persecução penal ou a declaração de impossibilidade de seu início; e a 2) prescrição da pretensão executória (PPE), impropriamente conhecida como prescrição da condenação ou prescrição da pena,que se dá após ao trânsito em julgado da condenação prescrição da pretensão punitiva possui três espécies expressamente previstas: I) prescrição pela pena de prisão máxima em abstrato (art. 109, caput, do Código Penal); II) prescrição superveniente ou intercorrente (art. 110, § 1º, do Código Penal); e III)prescrição retroativa (art. 110, § 2º, do Código Penal).
O Código Penal Brasileiro adota dois grandes grupos de prescrição, quais sejam, a prescrição da pretensão executória e prescrição da pretensão punitiva, sendo cinco modalidades de prescrição penal no ordenamento jurídico brasileiro: a) prescrição penal pela pena máxima em abstrato; b) Prescrição superveniente ou intercorrente; c) prescrição retroativa; d) prescrição virtual ou antecipada ou em perspectiva; e) prescrição da pretensão executória. Contudo, é na prescrição em sua modalidade retroativa que deve-se orientar as principais mudanças e críticas com a nova roupagem dada pela lei 12.234/10.
Quanto a Prescrição Retroativa, esta trata-se de uma prescrição contada para trás, após a prolação da sentença condenatória com trânsito em julgado para a condenação. A prescrição retroativa era fundamentada pelo § 2º do art. 110 do Código Penal. Tal dispositivo, hoje revogado, rezava que a prescrição, de que trata o parágrafo anterior, pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa. Assim, arrematando a via de entendimento desta modalidade de prescrição.
Segundo Greco (2005, p. 818):
Diz-se retroativa a prescrição quando, com fundamento na pena aplicada na sentença penal condenatória com trânsito em julgado para o Ministério Público ou para o querelante, o cálculo prescricional é refeito, retroagindo, partindo-se do primeiro momento para sua contagem, que é a de fato.
Admitindo que a prescrição penal apresente algumas espécies já mencionadas, será tratado a seguir de dois tipos a saber: prescrição de pretensão executória e prescrição de pretensão punitiva.
3.3 Prescrição de pretensão executória
Conceitualmente a prescrição da pretensão executória ocorre após o trânsito em julgado da sentença condenatória. O seu prazo é determinado pela pena imposta na sentença condenatória. O reconhecimento da prescrição da pretensão executória impede que o estado execute a pena ou medida de segurança imposta, subsistindo os efeitos da condenação, como custas, reincidência etc. Sendo que a mesma pode ser executada no juízo cível com o intuito de reparar os danos causados pelo ato lesivo.
Assim sendo, os prazos de prescrição de acordo com o artigo 115 do Código Penal são reduzidos de metade, se na data do fato, ou seja, da execução do crime ou da contravenção, o agente era menor de 21 anos ou maior de 70 anos na data da sentença.
Abaixo aponta-se alguns pressupostos característicos da prescrição executória a saber:
● Inocorrência de Prescrição da Pretensão Punitiva (PPP) em quaisquer de suas modalidades;
● Sentença condenatória irrecorrível – atingindo a acusação e a defesa. Surge após o trânsito em julgado da sentença condenatória;
● Não satisfação da pretensão executória estatal: só inicia o prazo quando prejudicada está a pretensão executória. Não corre enquanto o Estado está executando a pena imposta.
Quanto ao Termo inicial o Art. 112 do Código Penal dispõe que do dia em que transita em julgado a sentença condenatória para a acusação: 1º) Evasão após prolação da sentença condenatória – sem cumprimento de um só dia de pena – surge com o trânsito em julgado para acusação e defesa; mas se conta do dia em que se torna definitiva para acusação – dies a quo: Ministério Público não recorre da sentença; ocorre com o transcurso do prazo in albis da apelação, que é de 05 dias. Ministério Público recorre da sentença – dá-se o trânsito em julgado com o transcurso do último recurso disponível (Especial e Extraordinário = 15 dias). Não conta o dia do início, uma vez que em matéria de recursos, os prazos são processuais. 2º) Evasão após cumprimento de parte da pena: inicia a cumprir pena e foge: no dia da fuga inicia o prazo prescricional que transcorrerá até quando se efetive a captura. A base do prazo prescricional aqui é o restante da pena a cumprir.
O debate relativo ao termo inicial da prescrição da pretensão executória ganha notória relevância, já que, conforme o caso em julgo bem como a posição adotada pelo tribunal julgador, poderá ter a consideração de extinta/anulada ou não, a imposição penal de punição do réu. Nesse contexto tem-se a jurisprudência do STJ:
PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA. TERMO INICIAL. TRÂNSITO EM JULGADO PARA A ACUSAÇÃO. ART. 112, INCISO I, DO CÓDIGO PENAL. 2. RECURSO EM HABEAS CORPUS PROVIDO. 1. É assente no Superior Tribunal de Justiça que o "prazo prescricional da pretensão executória é contado do dia em que transitou em julgado a sentença condenatória para a acusação (art. 112, I, do CP)" (AgRg no HC 323.036/SC, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, Sexta Turma, julgado em 01/03/2016, DJe 17/03/2016). 2. Recurso em habeas corpus provido para reconhecer da prescrição da pretensão executória (BRASIL, 2016).
Assim, a Prescrição Executória começa a correr do dia em que se interrompe a execução, ou seja, quando o Estado não estiver satisfazendo a sua pretensão executória. Exceção: quando o tempo de interrupção deva ser computado na pena – art. 41 do Código Penal, e por força do art. 42 do Código Penal, computa-se o tempo em que o condenado doente mental permaneceu internado; pois, não houve fuga.
Revogação da suspensão condicional da pena: seja a revogação obrigatória ou facultativa, transitada em julgado a decisão que revoga os sursis, inicia-se a contagem do prazo prescricional da pretensão executória.
A base está no total da pena imposta, uma vez que revogado o Sursis, o réu deve cumprir toda a pena.
Exceção: Art. 161 do Código Penal – sursis tornado sem efeito – aplica-se a 1º regra e não a 2º, descritas acima. O prazo tem início, assim, do trânsito em julgado para o MP, pois não houve revogação do Sursis; ele foi tornado sem efeito.
Revogação do livramento condicional (LC): tempo é o restante da pena a ser cumprida.
Revogação por infração cometida antes do LC – desconta o período em que esteve em LC. O marco inicial do prazo é a data do trânsito em julgado da decisão que revoga o LC, e leva em conta o restante da pena.
Revogação por infração cometida durante o LC – perde o tempo que cumpriu LC – deve cumprir todo o restante da pena.
A contagem do prazo nessa esfera prescritiva se dá pela seguinte via: a) tomar a pena privativa de liberdade imposta na sentença; b) obter o prazo, de acordo com o art. 109 do Código Penal; c) causas modificadoras descritas no art. 115 do Código Penal, mais a reincidência, com o prazo sendo então majorado em 1/3 se a reincidência for reconhecida na sentença, porém, aplicando-se apenas à PPExecutória); d) verificar se entre o termo inicial e as interrupções transcorreu o prazo. Se não fluiu o prazo, conta-se novo prazo obtido de acordo com o resto da pena.
Quanto a causa suspensiva da Prescrição de pretensão executória, preceituada no parágrafo único, do artigo 116 do Código Penal, a mesma não corre enquanto o condenado está preso por outro motivo – toda e qualquer prisão que não seja a da sentença condenatória – prisões processuais e irrecorríveis de outros feitos, inclusive, civil.
HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. LESÃO CORPORAL LEVE PRATICADA COM VIOLÊNCIA FAMILIAR CONTRA A MULHER. INAPLICABILIDADE DA LEI 9.099/95 E, COM ISSO, DE SEU ART. 89, QUE DISPÕE SOBRE A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. PARECER MINISTERIAL PELA DENEGAÇÃO DO WRIT. ORDEM DENEGADA. "1. O art. 41 da Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha) afastou a incidência da Lei 9.099/95 quanto aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, o que acarreta a impossibilidade de aplicação dos institutos despenalizadores nela previstos, como a suspensão condicional do processo (art. 89 da Lei 9.099/95). "2. Ademais, a suspensão condicional do processo, no caso, resta obstada pela superveniência da sentença penal condenatória. Precedentes do STF. "3. Parecer ministerial pela denegação do writ. "4. Ordem denegada". (HC 142017/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 19/11/2009, DJe 01/02/2010).
Necessário se faz esclarecer que, o art. 41 do Código Penal determina que para os crimes praticados no âmbito doméstico contra familiares ou contra a mulher, independentemente de qual seja pena a ser aplicada, não há de se adotar os ditames da Lei nº. 9099/95, pois não é admitida a suspensão condicional do processo nos casos em que haja violência no seio doméstico e familiar contra a mulher, mesmo que a pena mínima aplicada ao fato não seja inferior a um ano (JESUS, 2020)
3.4 Prescrição de Pretensão Punitiva
Acontecido o fato surge para o Estado à pretensão punitiva, ou seja, a persecução penal, que a faz através do poder judiciário, que aplicara o direito penal objetivo, por meio da ação penal. Verifica-se desta maneira que o Estado é o titular da pretensão punitiva.
Transitando em julgado a sentença condenatória a direito de punir transforma-se em direito de executar a sanção imposta pela sentença, seja ela pena ou medida de segurança.
Na prescrição da pretensão punitiva, o Estado perde do direito de punir e ocorre antes da sentença de 1º instancia transitar em julgado, fazendo com que aconteça a extinção da punibilidade. Ela é regulada pela in abstrato, ou seja, aquela que o Código Penal (parte especial) comina, variando de acordo com o Maximo da pena imposta in abstrato, que deverá ser colocada em dos incisos do artigo 109 do Código Penal, para se verificar o prazo prescricional de cada fato típico e antijurídico.Nesse sentido a contagem do prazo prescricional segundo o art. 10, Código Penal (computando o dia do começo e contando os meses e anos pelo calendário comum) esse prazo fatal e improrrogável. Logo, a base de cálculo do prazo prescricional é feita em função da pena privativa de liberdade, verificando-se o prazo constante da tabela existente no art. 109 do Código Penal, tendo como parâmetro o máximo da pena cominada abstratamente.
Tabela do Art. 109 do Código Penal
Pena |
Prazo prescricional |
Menor que 1 ano |
2 anos |
De 1 a 2 anos |
4 anos |
Mais de 2 até 4 |
8 anos |
Mais de 4 até 8 |
12 anos |
Mais de 8 até 12 |
16 anos |
Mais de 12 |
20 anos |
Fonte: desenvolvido pelo autor (2022)
Outro ponto a ser observado nesse estudo são as circunstâncias judiciais, agravantes e atenuantes. Estas não influem no cálculo da PPP pela pena em abstrato. Sendo que nesse caso as exceções se referem a agente menor de 21 anos na data do fato ou maior de 70 anos na data da sentença: reduz o prazo prescricional pela metade (art. 115, Código Penal).
Existem ainda algumas causas suspensivas (sustam o prazo prescricional, fazendo com que recomece a correr apenas pelo que restar, aproveitando o tempo anteriormente decorrido) que se enquadram nas seguintes circunstâncias: Enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o conhecimento da existência do crime.
3.5 Prescrição da medida de segurança
A prescrição da medida de segurança é aplicável aos inimputáveis e semi-inimputáveis com previsão dada no artigo 26 do Código Penal, ou seja, aos indivíduos que não são integralmente capazes ou incapazes de compreender a natureza ilícita do fato, com objetivo de eliminar a periculosidade que tem o agente na prática de determinados delitos, de modo que este não reincida nesse tipo de ato, ou seja, apresenta natureza preventiva assistencial, com tratamento necessário a eliminação da periculosidade do delinquente.
Em relação à medida de segurança se tornam aplicável ao inimputável, três posições características:
● Quando se aplica a prescrição da pretensão punitiva: porque para a executória exige-se a fixação da pena, o que não acontece na medida de segurança. Portanto antes da decisão, é possível haver prescrição; depois, não;
● A aplicação decorre de ambas as prescrições (pretensão punitiva e prescrição executória). No caso da executória, porque não a pena e sim medida de segurança, calcula-se a prescrição pela pena em abstrato fixada ao crime;
● Pode-se aplicar geralmente, a prescrição da pretensão punitiva: antes da decisão; após, diante da inércia da lei, verificando antes da efetivação da medida de segurança de internação ao agente delituoso, quando seu estado permanecer igual, ou seja, se continuar cometendo atos criminosos. Caso tenha eliminado os níveis de periculosidade, não mais se cumpre a medida de segurança. (NUCCI,2008, p. 545).
Ao se tratar de sentença absolutória, em face da inimputabilidade do agente, o tempo prescricional se mantém regulado pela pena em abstrato. Não existe tempo para prescrição específica em medida de segurança, estando esta condicionada a comprovação de que a periculosidade do agente praticante do delito foi cessada, endo a regulamentação da matéria dada pelo artigo 96, parágrafo único do Código Penal.
4 PRESCRIÇÃO COM BASE NA LEI N° 12.234/2010
O objeto de análise do presente item será as inovações na Lei 12.234/2010 e seus desdobramentos no Código Penal Brasileiro.
Situando em uma linha temporal tem-se que em 5 de maio de 2010 entrou em vigor a lei 12.234, que alterou os arts.109 e 110 do Código Penal. É o conteúdo dessa lei:
Art. 1º. Esta Lei altera os arts. 109 e 110 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal.
Art. 2º. Os arts. 109 e 110 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, passam a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se: ... VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.
“Art. 110.... § 1º. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, § 2o. (Revogado).” (NR)
Art. 3º. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 4º. Revoga-se o § 2o do art. 110 do Código Penal.
Analisando assim, tem-se a matéria estabelecida no art. 109 do Código Penal com a nova redação dada pela lei 12.234/2010:
Art. 109 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
I - em 20 (vinte) anos, se o máximo da pena é superior a 12 (doze);
II - em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é superior a 8 (oito) anos e não excede a 12 (doze);
III - em 12 (doze) anos, se o máximo da pena é superior a 4 (quatro) anos e não excede a 8 (oito);
IV - em 8 (oito) anos, se o máximo da pena é superior a 2 (dois) anos e não excede a 4 (quatro);
V - em 4 (quatro) anos, se o máximo da pena é igual a 1 (um) ano ou, sendo superior, não excede a 2 (dois);
VI - em 3 (três) anos, se o máximo da pena é inferior a 1 (um) ano.
A partir do que foi exposto acima percebe-se que a lei 12.234/2010 trouxe alterações que prejudicam os interesses do indiciado/réu (novatio legis in pejus), pois a prescrição é instituto que existe em desfavor do Estado, acarretando a extinção da punibilidade.
Sendo norma penal mais gravosa que a anterior, a lei 12.234/10 não pode alcançar fatos que tenham sido cometidos antes da sua entrada em vigor, ou seja, somente se aplica a partir de 6 de maio de 2010, ou seja, a lei estabeleceu a não retroatividade no cômputo prescricional considerando não a data do fato, mas a data do oferecimento da denúncia.
Desta maneira, quanto ao direito intertemporal, a prescrição retroativa continuará sendo regida pela redação anterior dos § 1º. e 2º do art. 110 do Código Penal, para crimes cuja conduta ocorreu até a data de 5 de maio de 2010, porque a nova redação é mais gravosa para o réu, tratando-se, pois, de "lex gravior".
4.1 Prescrição antes de transitar e julgado a sentença
Como citado em item anterior, o Código Penal brasileiro, diz em seu artigo 109, que a prescrição deve considerar alguns prazos antes do trânsito em julgado da sentença final, com exceções descritas nos parágrafos 1º e 2º do artigo 110 do Código Penal, que atribui à dosimetria o máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime,
Como se pode notar até aqui, a prescrição antes de transitar e julgar a sentença absorveu mudanças em sua forma em detrimento da Lei 12.234/2010. O que leva a pensar o impacto dessa lei na estrutura penal brasileira. Obviamente, os doutrinadores do direito penal tais como Mirabete (2020), fazem uma leitura extremamente criteriosa dessas mudanças, mas esses aspectos estarão discorrendo nas próximas linhas desse trabalho.
Nesse momento, será focada a atenção para os aspectos formais da prescrição retroativa e intercorrente.
4.2 Prescrição retroativa e intercorrente
A prescrição retroativa é espécie de prescrição da pretensão punitiva e sua configuração resultava da combinação, nos moldes da lei 7209/84, dos parágrafos 1º e 2º do art. 110 e do art. 109, todos do Código Penal. Antes da lei 12.234/2010, estava prevista no § 2º do art. 110: A prescrição, de que trata o parágrafo anterior [a prescrição prevista no parágrafo anterior, § 1º, é a prescrição superveniente], pode ter por termo inicial data anterior à do recebimento da denúncia ou da queixa.A lei 12.234/2010 tentou exterminar do sistema jurídico a prescrição retroativa. Estabeleceu em seu art. 1o. a alteração dos arts. 109 e 110 do Código Penal para excluir a prescrição retroativa, e revogou expressamente (art. 4º) o § 2º do art. 110: “Art. 4o Revoga-se o § 2o do art. 110 do Código Penal”.
No entanto, essa tentativa do legislador foi mal realizada, pois deu sobrevida à prescrição retroativa ao estabelecer o seguinte acréscimo no § 1o: não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. Utilizando uma interpretação a contrario sensu, percebe-se que essa parte final torna possível a retroação da prescrição superveniente, exceto no período primordial que ocorre da data do fato até à acusação (denúncia ou queixa). A prescrição retroativa é a própria prescrição superveniente só que aplicada para trás, retroativamente. Assim, para a análise da prescrição retroativa leva-se em consideração a pena aplicada e não a pena de prisão máxima em abstrato. Se, em grau de recurso, a pena for diminuída pelo Tribunal, será levado em conta esse quantum.
O prazo prescricional é contado retroativamente, ou seja, verificando-se se houve extinção em um dos períodos abrangidos anteriores ao período da prescrição superveniente. Em suma, a prescrição retroativa podia, antes da mudança da lei12.234/2010 ser declarada observando o transcorrer do prazo em um dos períodos prescricionais anteriores ao período da prescrição superveniente, que eram os seguintes:
1) da data do início do prazo (111) até o recebimento da denúncia ou da queixa (117 I);
2) da data do recebimento da denúncia ou queixa (117 I) até a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis (107 IV);
3) da publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis até o trânsito em julgado para a acusação.
Crimes da competência do Tribunal do Júri:
1) da data do início do prazo (111) até o recebimento da denúncia ou da queixa (117 I);
2) da data do recebimento da denúncia ou queixa (117 I) até a publicação da pronúncia (117 II);
3) havendo recurso da pronúncia, da data de sua publicação (117 II) até a publicação do acórdão confirmatório (117 III);
4) da data da publicação da pronúncia (117 II) ou do acórdão confirmatório(117 III), até a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis (117 IV);
5) da publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis até o trânsito em julgado para a acusação;
Com a nova redação dada ao art. 110, § 1º. ficou vedado apenas o reconhecimento da prescrição retroativa desde a época do fato até a denúncia ou queixa. A prescrição retroativa não pode ser declarada quando há recurso pendente da acusação que objetive o aumento da pena de prisão e que influencie no prazo prescricional. Se o recurso visa situação diversa da agravação da pena de prisão, ela pode ser declarada. Não é necessário que haja recurso da defesa para sua decretação.
A prescrição retroativa pode ser reconhecida em primeiro grau, desde que a pena fixada tenha transitado em julgado para a acusação. Essa solução prestigia o princípio da celeridade, dando efetividade ao princípio da presunção de inocência e dignidade da pessoa humana pela suspensão imediata da persecução penal, que se configura em constrangimento ao acusado. Os efeitos da prescrição retroativa são os próprios de prescrição da pretensão punitiva. Como não ocorreu condenação com trânsito em julgado, os efeitos condenatórios não surgem. Se eventualmente tiver ocorrido o trânsito em julgado, esta prescrição rescinde a decisão condenatória, desfazendo a coisa julgada.
A redação dada ao art. 110, § 1º, do Código Penal pela lei 7.209/1984 (Nova Parte Geral) era: “a prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada”.
A nova redação dada pela lei 12.234/2010 acrescenta uma parte final a essa redação estabelecida pela Nova Parte Geral, o que limitou a aplicação da prescrição retroativa.
§ 1º. A prescrição, depois da sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação ou depois de improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa. (Redação dada pela Lei nº 12.234, de 2010).
Esta prescrição é dita superveniente por ter sua existência e aplicabilidade condicionada à superveniência de condenação. Seu cálculo se dá pela pena em concreto e é espécie de prescrição da pretensão punitiva, embora esteja prevista no art. 110.
A prescrição superveniente ou intercorrente conta-se da publicação da decisão condenatória com trânsito em julgado para a acusação até a data do trânsito em julgado final. Pressupõe trânsito em julgado para a acusação no que se relaciona com a pena de prisão aplicada, o que implica que a condenação, quanto à quantidade da pena de prisão, não pode mais ser alterada em prejuízo da defesa, mesmo tendo esta recorrido.
Não se exige recurso da defesa para que possa ocorrer a prescrição superveniente, pois ela pode ocorrer com o recurso da acusação que não almeje aumento da pena de prisão. Somente impede a aplicação da prescrição superveniente o recurso da acusação que vise o aumento da pena privativa de liberdade imposta. Desta forma, não constitui óbice a decretação da prescrição a apelação da acusação que pretende - conformando-se com a quantidade da pena de prisão - a imposição da pena de multa, a impugnação do sursis ou outra situação jurídica que não seja aumento da pena de prisão. Além do mais, se a apelação da acusação que visava o aumento da pena de prisão for improvida ou, mesmo se provida, não alterar o prazo prescricional, o próprio Tribunal deverá decretar a prescrição superveniente.
Eventual recurso da acusação poderá evitar a prescrição superveniente, caso o recurso, que almeje o aumento da pena, for provido pelo Tribunal e a pena for aumentada alterando o prazo prescricional.
Os efeitos da prescrição superveniente são os próprios de uma prescrição da pretensão punitiva. Assim, como não houve o trânsito em julgado da decisão, não ocorre os efeitos da decisão condenatória, e se por acaso tiver transitado a sentença em julgado, a PPP superveniente fará rescindir a condenação.
Com base e todos os argumentos até aqui expostos, nos leva a reflexão no tocante a prescrição intercorrente como sendo um instrumento jurídico, que sofreu mudanças significativas dada a nova redação da Lei 12.234/2010. Nesse sentido, é fundamental esclarecer que essas mudanças impactaram as deliberações dos tribunais por todo país.
Existiu a preocupação em delinear as mudanças ocorridas a partir da Lei 12.234/2010 e seus desdobramentos na estrutura jurídica atual. Pontuando ainda que de forma breve discutiu-se sobre os conceitos de prescrição retroativa e prescrição intercorrente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A elaboração do presente artigo demonstrou os desdobramentos ocasionados com a entrada em vigor da Lei nº. 12.234/2010, especialmente no que se refere a prescrição.
Compulsando a história jurídica da prescrição no Brasil, é possível perceber que, com o advento da Lei 12.234/2010, são verificáveis três alterações nas regras prescricionais. A prescrição intercorrente (ou superveniente) e a prescrição da pretensão executória (PPE) não sofreram mudanças e continuam sendo aplicadas da mesma forma. A nova lei não alterou as cinco modalidades de prescrição, apenas a prescrição pela pena máxima em abstrato, a prescrição retroativa e a prescrição virtual.
A partir de sua vigência, a Lei nº 12.234, de 5 de maio de 2010, desapareceu da ordem jurídica criminal o instituto da prescrição retroativa no período que vai da data do fato até "a denúncia ou queixa". Esse desaparecimento parcial da prescrição retroativa, vedou a utilização da prescrição antecipada nesse período (período extrajudicial da pretensão punitiva), impedindo pedidos de arquivamentos de investigações ou rejeições de iniciais com base na prescrição retroativa virtual (prescrição antecipada, em perspectiva, projetada).
Esse instituto de direito material é, portanto, inaplicável. Contudo, para a finalização do ius puniendi nesse período, que vai da data do fato até "a denúncia ou queixa", o argumento processual da falta de justa causa para a ação penal.
A prescrição virtual não foi abolida completamente, pois pode-se utilizá-la no período que ocorre da data do recebimento da denúncia ou queixa (art. 117, I, do Código Penal) até a publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis (art. 107, IV, do Código Penal).
Para as infrações penais ocorridas até o dia 05/05/2010 incide a redação antiga dos parágrafos 1º e 2º do art. 110 do Código Penal – disposições que admitem a prescrição retroativa no período da data do fato até o recebimento da denúncia ou queixa. Em decorrência, a prescrição antecipada ainda incidirá até 05/05/2010 no aludido período prescricional.
A nova redação do parágrafo 1º do art. 110 foi omissa quanto à data da denúncia ou da queixa-crime, não estabelecendo se seria a data do oferecimento ou recebimento. Para quem entende que a lei nova adota a data do oferecimento surgirão duas datas importantes para fins prescricionais: 1) a do oferecimento da inicial acusatória, unicamente para impedir a retroação da prescrição a data anterior a esse ato; 2) a do recebimento da inicial (art. 117, I, do Código Penal), para a finalidade já tradicional de interrupção da prescrição.
Tomando como base tudo que foi escrito e argumentado ao longo desse trabalho, entende-se que a problemática a qual se tinha levantado, foi contemplada ao longo da pesquisa. Sobretudo no que tange a seus aspectos atuais, esclarecendo ainda, que as hipóteses norteadoras desse estudo foram comprovadas no sentido de demonstrar a Lei 12.234/2010 é alvo de críticas por conta de suas aplicabilidades na prescrição.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Código de Processo Penal (1941). Código de Processo Penal. São Paulo: Saraiva, 2020.
BRASIL. Código Penal (1940). Código Penal. São Paulo: Saraiva, 2020.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 2018.
CAMPOS JÚNIOR, Nadir de. et al. Prescrição Após a Lei Nº 12.234 de 05/05/2010. APMP, São Paulo, 2010.
CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 23 ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
DELMANTO Jr., Roberto; Delmanto, Roberto; Delmanto, Celso. Código Penal Comentado. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2010.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Nascimento da Prisão. Rio de Janeiro: Petrópolis, 1987.
GAGLIANO, Pablo Stolze; FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil, volume I. 8 ed.; São Paulo: Saraiva, 2006.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal – Parte Geral, volume I. 20 ed. Niterói - RJ: Impetus, 2018.
JAWSNICKER, Francisco Afonso. Prescrição Penal Antecipada. 2 ed. Curitiba: Juruá, 2018.
JESUS, Damásio de. Prescrição Penal. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2020.
LA ROSA, Mariano R. La Prescripción en el Derecho Penal. Buenos Aires: Astrea, 2008.
LOPES JÚNIOR, Aury. Direito Processual Penal: 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
LOZANO JR., José Júlio. Prescrição Penal. São Paulo: Saraiva, 2012.
MACHADO, Fábio Guedes de Paula. Prescrição Penal, Prescrição Funcionalista. São Paulo: RT, 2000.
MAGALHÃES, E. Noronha, Direito Penal: Saraiva, 2011.
MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. Volume I, 29. ed.; São Paulo: Atlas, 2020.
MORAIS, Andrea Cardinale Urani Oliveira de. O saber crítico-criminológico na atuação da magistratura criminal a partir da análise de sentenças proferidas no estado do Tocantins durante o ano de 2016. 2018. Dissertação (Mestrado profissional e interdisciplinar em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos) – Universidade Federal do Tocantins, Programa de Pós-Graduação em Prestação Jurisdicional em Direitos Humanos, Palmas, 2018.
NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Penal: parte geral. 3. ed. Rio de Janeiro: Editora Forense Ltda, 2019.
TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. – 10. ed. rev. e atual. – São Paulo : Saraiva, 2012.
Acadêmico do curso de Direito do Centro Universitário Católica do Tocantins. [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VIEIRA, Lucas Rabelo Dorneles. Função constitucional do instituto da prescrição penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 17 jun 2022, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57880/funo-constitucional-do-instituto-da-prescrio-penal. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: LUIZ ANTONIO DE SOUZA SARAIVA
Por: Thiago Filipe Consolação
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Por: Helena Vaz de Figueiredo
Precisa estar logado para fazer comentários.