ROGÉRIO SARAIVA XEREZ [1]
(orientador)
RESUMO: o presente artigo aborda a quebra da cadeia de custódia e as consequências para o processo penal, utilizando-se, precipuamente, a metodologia dedutiva e bibliográfica. Para tanto, busca realizar um exame mais aprofundado do significado da cadeia de custódia e sua relevância como meio de garantir a confiabilidade das provas produzidas, desde o início da persecução penal até a valoração pelo magistrado, permitindo, assim, a verificação cronológica existencial e tentando garantir um julgamento justo. Primeiramente, discorreu-se sobre a prova no processo penal, depois explica os procedimentos do instituto da cadeia de custódia, sua importância e como as alterações do pacote anticrime implicam na resolução dos fatos durante a persecução penal, e por último, desenvolveu-se sobre a quebra da cadeia de custódia e como esse acontecimento pode levar a dúvidas razoáveis quanto à confiabilidade da prova para o julgamento do processo. Conclusivamente, verifica-se que não só a quebra da cadeia de custódia torna-se um problema ao processo penal, mas a ausência de centrais de custódia para o processamento, análise e armazenamento das provas torna-se um defeito ao processo por um todo.
Palavras-chave: Cadeia de Custódia. Procedimento. Confiabilidade da prova.
1. INTRODUÇÃO
Um dos maiores problemas enfrentados dentro do processo penal é a existência de nulidades nas provas que acabam afetando o mérito do processo, isso porque, por vezes, o vício é insanável. Em decorrência dessa realidade, as provas no processo tornam-se um tema de suma importância para o procedimento penal, uma vez que através delas é possível comprovar a existência da verdade de um fato e até influenciar diretamente no convencimento do julgador.
Por essa razão, o legislador através da Lei nº 13.964/2019 introduziu no Código de Processo Penal o instituto da cadeia de custódia através dos artigos 158-A a 158-F, deixando clara a importância da preservação da prova para o processo penal.
Conforme será abordado no presente trabalho de pesquisa, a cadeia de custódia, conhecida até então apenas pela doutrina, passou a ser um instituto explicito no CPP, sendo por ele regulamentada. Desse modo, com a inclusão desse novo procedimento, muito há que se discutir quanto à inserção dessa nova modalidade de preservação dos vestígios para o processo penal, visto que é um instituto que busca garantir a preservação dos elementos de convicção do juiz.
Neste sentido, a temática central do estudo visa analisar quais as consequências do desrespeito das normas previstas na cadeia de custódia ao processo penal. Objetiva-se, desse modo, explicar os procedimentos do instituto da cadeia de custódia, sua importância e como as alterações do pacote anticrime implicam na resolução dos fatos durante a persecução penal, além de buscar identificar se a quebra no procedimento pode levar a dúvidas razoáveis quanto à confiabilidade da prova para o julgamento do processo.
Deste modo, a metodologia a ser aplicada será bibliográfica do tipo dedutiva, onde será feito uma busca qualitativa com o intuito de se aproximar da resposta para a problemática estabelecida, a fim de trazer uma abordagem mais compreensiva e detalhada através de fontes doutrinárias constantes em livros e na internet. Para tanto, o presente artigo foi dividido em 3 capítulos.
O primeiro capítulo trará aspectos sobre as provas no processo penal, seu conceito, finalidade e espécies e, ainda, mostrará as perícias como elemento essencial para averiguação dos fatos que deixam vestígios.
O segundo capítulo trará aspectos formais do instituto da cadeia de custódia, seu conceito e finalidade, bem como a diferença entre o instituto da cadeia de custódia e a cadeia de custódia da prova, além das alterações no Código Processual Penal pelo Pacote Anticrime.
O terceiro e último capítulo trata sobre as consequências jurídicas que decorrem da quebra do instituto da cadeia de custódia, explicando o que é e quando ocorre à quebra da cadeia de custódia, como a falta de uma fase do procedimento pode influenciar no julgamento.
Além disso, também discorre sobre a ilicitude da prova decorrente da quebra da cadeia de custódia e uma abordagem sobre as garantias constitucionais tais como o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa e principalmente a presunção de inocência em caso de dúvida razoável decorrente do lastro probatório anexado aos autos processuais.
2. PROVA NO PROCESSO PENAL
2.1 Conceito de prova
A prova pode ser definida com meio instrumental que os sujeitos de um processo utilizam para comprovar os fatos da causa em discussão. É um elemento utilizado tanto pela defesa como pela acusação, fornece no processo, o conhecimento dos fatos, gera no outro a convicção ou não de determina situação.
De acordo com o vocabulário jurídico, a palavra prova origina-se do latim probatio, emanando do verbo probare, significando demonstração, reconhecimento ou formação de juízo. Em termos técnicos, como conotação jurídica, entende-se que prova trata-se da demonstração que é feita, pelos meios processualmente permitidos, da existência ou veracidade de um fato.
Sobre o tem definiu Rangel,
A produção de provas se dá quando as partes exercem o contraditório sobre os meios de provas que foram elegidos pelas partes, sendo o momento de maior tensão probatória, em que as partes, dentro do processo justo, discutem a veracidade, idoneidade, credibilidade e legalidade das provas, ou seja, as provas que as partes indicaram são submetidas ao crivo do contraditório (RANGEL, 2017, p. 512)
Nesse sentido, a prova é utilizada nos processos como meio de aproximar o julgador da verdade de um fato, auxiliando no convencimento do magistrado. Lopes Jr (2020, p. 421) explica que a prova influenciará a convicção do julgador e legitimará a sentença. Isso acontece porque, em regra, ela é produzida durante toda a persecução penal.
Frente à importância da finalidade da prova, tem se que o ordenamento jurídico pátrio através do Código de Processo Penal (CPP) contém um título próprio sobre as provas na persecução penal objetivando explicar como se dá o processo e a inclusão das provas e apontar prejuízos jurídicos em caso de nulidades total ou parcial, que causem prejuízo para a acusação e defesa, definindo o tempo de preclusão para argui-las e ainda a extensão de sua afetação.
A posição do autor mencionado encontra correlação com o art. 155 do CPP que prevê:
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. (BRASIL, 2019).
Em se tratando das provas utilizadas no procedimento penal, cumpre esclarecer que a livre apreciação da prova pelo magistrado permite que tanto a acusação como a defesa possam contraditar as provas e ainda produzi-las.
Esse direito é um desdobramento do direito de ação, por isso, caso haja um indeferimento judicial injustificável quanto a um pedido de produção de determinada prova, os interessados podem utilizar um mandado de segurança como remédio constitucional, já que a prova como definida é um meio instrumental do processo.
Isso ocorre porque conforme definido, os objetos de prova são os fatos, inerentes à resolução da demanda, assim, tudo que importa ao conflito ajudará a formar o convencimento do magistrado, seja o depoimento das testemunhas, os objetos no local do crime, laudos de exames e outros e podem ser utilizados como fontes ou meios de provas.
Logo, a vinculação das provas acompanhadas de outros sujeitos e fatores formam o “processo”, que limitam-se a “um conjunto de atos legalmente ordenados para apurar um fato, autoria e possibilitar a aplicação da lei ao final como forma de justiça” (Lopes Jr., 2020, p. 422). Apesar disso, a justiça humana não é uma garantia absoluta já que se constrói sobre juízos probabilísticos alcançados durante a instrução.
2.2 Finalidade da prova
A finalidade da prova é o convencer o juiz, que é o seu destinatário. Neste sentido,
O objetivo ou finalidade da prova é formar a convicção do juiz sobre os elementos necessários para a decisão da causa. Para julgar o litígio, precisa o Juiz ficar conhecendo a existência do fato sobre o qual versa a lide. Pois bem: a finalidade da prova é tornar aquele fato conhecido do Juiz, convencendo-o da sua existência. As partes, com as provas produzidas, procuram convencer o Juiz de que os fatos existiram, ou não, ou, então, de que ocorreram desta ou daquela forma ( RANGEL, 2017, p.515).
Após o conhecimento sobre os fatos, o julgador chega o momento de valoração da prova, é a fase em que o juiz com base no material anexado aos autos pode exercer seu poder instrutório, utilizando seu critério avaliativo sobre as provas que possui para fundamentar sua decisão.
As provas que são produzidas durante a instrução penal serão valoradas, no entanto, há a possibilidade de durante a instrução tomar-se conhecimento de provas ilícitas ou ilegítimas. Diante dessa situação, deverão ser desentranhadas e só depois de feito isso, o julgador deverá formar seu juízo de convicção baseado em sua liberdade de decidir o caso.
Adotando para isso um dos três sistemas de valoração da prova: a íntima convicção do juiz; a verdade legal ou formal ou o livre convencimento motivado.
Consoante o primeiro sistema – a íntima convicção do juiz – tem o juiz a ampla liberdade de decidir, se convencendo da verdade dos fatos por critérios de valoração íntima, independentemente do que conste ou não nos autos, sem obrigação de fundamentar (CAGLIARI, 2020, p. 13). É o sistema comum do tribunal do júri, já que os jurados não são obrigados a mencionarem suas razões, limitando-se a responderem sim ou não aos quesitos apresentados. Esse sistema é inconveniente ao processo penal pois gera uma enorme inseguraça jurídica.
O segundo sistema – da verdade legal ou formal – é diametralmente oposto ao anterior. Cada prova tem seu peso e valor, ficando o juiz vinculado dosimetricamente às provas apresentadas(CAGLIARI, 2020, p. 13). Esse sistema, durante a evolução histórico jurídica, representa a reação extremada ao sistema da convicção íntima, que se constituiu em instrumento de arbítrio, uma vez que de nada valia a prova consistente e produzida corretamente se, ao depois, poderia o juiz decidir segundo sua própria consciência.
A união desses dois sistemas evoluiu para a construção do terceiro – o do livre convencimento motivado –, livre do perigo do arbítrio judicial que o sistema da convicção íntima causava, e sem restringir os movimentos do juiz para investigar a verdade, como se verificava no sistema das provas. Por este sistema, mantém-se ao juiz a liberdade de apreciação e valoração das provas, mas vincula o seu convencimento ao material probatório constante dos autos, e o obriga a fundamentar sua decisão (CAGLIARI, 2020, p. 13).
Assim, ainda que o magistrado possa decidir o caso com base na sua convicção, existe um dever de fundamentar suas razões. Em razão disso, um elemento se torna essencial para auxiliá-lo, o conhecimento técnico sobre determinado assunto ou crime, para exemplificar, traremos adiante explicações acerca das provas que exigem perícia.
2.3 Espécies de prova
As provas são classificadas quanto ao valor, objeto, sujeito e forma. Quanto ao valor refere-se ao grau de certeza ou incerteza gerado pela apreciação da prova, podendo dividir-se em prova plena ou não plena; quanto ao objeto exprime a relação da prova com o fato a ser provado, podendo ser um objeto direto ou indireto. Com relação ao sujeito dividem-se em reais e pessoais, real pois consiste em algo externo, como o lugar e o pessoal consiste na revelação de alguém, depoimento, por exemplo.
Nesse sentido, em razão do princípio da liberdade das provas adotado pelo Código de Processo Penal, existe autorização para que os sujeitos ligados a determinado fato possam produzir provas, desde que se atentem a moral e a dignidade da pessoa humana (CAGLIARI, 2020, p. 10). Ainda que não fiquem atreladas às provas previstas em lei, em regra, as partes não podem utilizar-se de provas ilícitas, exceto quando é necessária e a única maneira de inocentar um réu.
Essa exceção decorre do princípio da proporcionalidade e razoabilidade, que deve observar as circunstâncias do conflito, por isso, existem situações que a doutrina e a jurisprudência tendem a admitir a prova ilícita ou derivada da ilícita para que não seja prejudicado o direito de locomoção de um inocente ou pela relevância ao interesse público a ser protegido (LOPES JR, 2020, p. 35)
Diante do exposto, uma das espécies de prova mais discutida dentro do instituto da cadeia de custódia é a prova pericial e o exame de corpo de delito.
A perícia é um meio de prova que leva ao conhecimento do juiz os fatos constatados por exames realizados nos vestígios deixados no corpo ou local do crime, é um dos meios probatórios que possui maior credibilidade. Por se tratar de uma prova que carece de base científica e técnica para analisar a circunstância encontrada no local do crime, além de permitir, muitas vezes, a reconstituição dos fatos.
Imperioso destacar que a perícia não é imune a erros, por isso mesmo, é suscetível a demonstrar um grau maior ou menor de um aspecto do crime. Por tal relativismo desta espécie de prova é que se torna oportuno mencionar o que consta da Exposição de Motivos do CPP, verbis: “todas as provas são relativas; nenhuma delas terá, ex vi legis, valor decisivo, ou necessariamente maior prestígio que outras”.
Por isso, o magistrado não fica adstrito ao laudo pericial, podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte (art. 182, CPP, 2019), no entanto, o laudo torna-se imprescindível em alguns casos, principalmente quando a perícia é realizada através do exame de corpo de delito.
A realização do exame de corpo de delito ocorre quando os crimes deixam marcas visíveis e podem identificar os autores do crime através do estudo das circunstâncias. O artigo 158 do CPP trouxe a obrigatoriedade do exame de corpo de delito para infrações que deixarem vestígios com o objetivo de fundamentar a decisão, com provas pertinentes, quando o fato exigir a interpretação de elementos físicos para se chegar à autoria da prática criminosa (BRASIL, 2019)
Logo, se o crime deixar vestígio, necessário se faz que o inquérito esteja acompanhado do exame de corpo de delito, pois o laudo pericial é requisito essencial, não podendo ser substituído pela prova testemunhal ou confissão. Os crimes que são objetos de prova pericial tendem a ser mais gravosos, com sinais físicos em que se ofende diretamente a integridade da pessoa, por exemplo, os crimes sexuais.
Nesses crimes, apesar da valoração que é dada a palavra da vítima, esta não se sobrepõe as condições para o ajuizamento da ação penal, o que deve ter um suporte mínimo de prova, pois sem isto, a acusação carecerá de admissibilidade.
Por essas razões, as pericias devem ser valoradas diferentes das outras provas admitidas no processo penal. Para Greco Filho (2016, p. 207), os exames são importantes para trazer credibilidade à prova. Ele afirma que “os exames ou perícias em geral são verificações elaboradas por técnicos ou pessoas com conhecimento do objeto do exame”.
Por isso, visando à idoneidade da prova, o exame de corpo de delito é realizado por perito oficial e com conhecimento na área de atuação, bem como na análise do vestígio encontrado para transparecer ao juiz expertise na conclusão do laudo.
A perícia é importante e muitas vezes necessária para esclarecer os fatos controvertidos que exigem conhecimento técnico-científico especializado. Através dela é possível buscar a elucidação do crime, para que assim, o juiz julgue de forma justa os fatos do processo penal.
Embora tenha sido mencionado apenas o exame de corpo de delito, faz-se mister explicar que existem outros tipos de perícias, que podem ser realizadas no local do crime, em laboratórios, no DNA e outros, mas a estas é facultado a autoridade judicial ou às partes a sua realização.
Nesse sentido, a prova pericial é materializada através dos mais diversos exames periciais e podem ocorrer em qualquer fase processual penal, tanto no inquérito como na instrução.
Ressalta-se ainda uma das características mais importantes da prova pericial, qual seja, a impossibilidade de repetição de um exame pericial no processo porque se trata de uma prova não repetível, e por isso possui uma credibilidade única, pois esse tipo de prova é menos suscetível a influência humana quando comparado com outras provas subjetivas, por exemplo, a prova testemunhal que sofre de influência externa.
Portanto, a prova pericial baseia-se na coleta dos vestígios deixados no local do crime ou até mesmo na vítima, no caso de homicídio, por exemplo, para a posterior avaliação científica, para auxiliar na solução de uma infração penal. À vista disso, é notável que o legislador brasileiro considerou de grande relevância a realização da perícia, podendo ser nulo o processo na ausência deste exame, conforme o CPP:
“Art. 564. A nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
[...] III - por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
[...] b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado o disposto no Art. 167” (BRASIL, 2019).
Portanto, visando respeitar aos aspectos técnicos da prova pericial, principalmente, surgiu para o direito um instituto que busca preservar a idoneidade das provas colhidas na persecução penal, o chamado instituto da cadeia de custódia, tema principal deste estudo e será abordado adiante;
3. A CADEIA DE CUSTÓDIA
O tema que diz respeito à cadeia de custódia da prova não possuía expressa regulamentação na legislação processual penal, embora a Secretaria Nacional de Segurança Pública já houvesse regulamentado a matéria pela portaria 82, de 16 de julho de 2014 e a doutrina a identificasse no art. 6º, inc. I e III do CPP por meio de interpretação sistemática, sempre houve um empecilho na prática.
Por conseguinte, serão abordados dentro deste capítulo o conceito de cadeia de custódia, a cadeia de custódia das provas, que apesar de serem palavras homônimas tem significados distintos e as alterações legislativas trazidas pelo pacote anticrime (Lei nº 13.964/2019).
3.1 Conceito de cadeia de custódia
A cadeia de custódia é um instituto utilizado para denominar um processo de registro metódico, cronológico e detalhado do caminho dos vestígios coletados no local de um crime, que posteriormente serão analisados e apresentados em forma de laudo pericial para instruir um processo.
O conceito de cadeia de custódia possui natureza legal e está elencado no art. 158-A do CPP:
Art. 158-A. Considera-se cadeia de custódia o conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para rastrear sua posse e manuseio a partir de seu reconhecimento até o descarte. (BRASIL, 2019)
Logo, a cadeia de custódia da prova é um procedimento de suma importância para a garantia e transparência na investigação criminal no momento da apuração da prova material, isso porque “abarca todo o caminho que deve ser percorrido pela prova até sua exata análise e escorreita inserção no processo, sendo que qualquer interferência durante o trâmite processual pode resultar na sua imprestabilidade” (MARGRAF, A.F; PESCH, N.M., 2018, p. 241)
Trata-se de um relato fiel de todas as ocorrências da evidência, que vinculam os fatos e cria um lastro de autenticidade jurídica entre o tipo criminal, o autor e a vítima. Melhor esclarecendo, Geraldo Prado assinala que “a cadeia de custódia, objetiva-se a autenticidade da prova com o fim de minorar os riscos de erro judiciário” (PRADO, 2019, p. 95).
Cabe ressaltar que apesar de não ser um instituto novo, a cultura de cumprimento da cadeia de custódia é pouco conhecida, ante a ausência do hábito de cumprimento fiel aos preceitos técnicos e científicos já evidenciados pelo legislador de forma esparsa no CPP.
Apesar disso, a cadeia de custódia da prova pericial é construída por vários atos interligados, sem lacunas, visando à segurança e confiabilidade do processo em que os vestígios estão submetidos.
3.2 A cadeia de custódia das provas
A cadeia de custódia da prova discute não o instituto, mas o manuseio dos indícios, serve para garantir a fiabilidade da prova encontrada ou trazida ao processo. Nas palavras de Geraldo Prado: “A cadeia de custódia da prova nada mais é que um dispositivo dirigido a assegurar a fidelidade do instrumento probatório, ao colocá-lo sob a proteção de interferências capazes de falsificar o resultado da atividade probatória”(2018, p. 86).
O instituto da cadeia de custódia tem o objetivo principal de estabelecer protocolos, procedimentos e metodologias, por meio de edição de normas, padronizando as perícias criminais. Por outro lado, a cadeia de custódia da prova cuida do manuseio dos indícios, buscando assegurar a originalidade, autenticidade e integridade deles, o que garantirá a idoneidade e transparência na produção da prova técnica.
Segundo Baldasso (2017, p. 22) “o valor agregado da prova é medido pela normativa que demonstra o seu manejo idôneo”. Ou seja, tudo importa ao caso, desde o momento da colheita dos vestígios na cena do crime até a elaboração do laudo e posterior armazenamento, tudo deve ser registrado. Que agente recolheu, quem acondicionou, que produtos foram usados, se foi reaberto ou qualquer outro motivo.
Todo o procedimento mencionado serve para que haja fiabilidade das provas, por isso é preciso que o caminho do vestígio seja o mais curto possível, assim como deve ainda haver o preparo ideal das peças para os exames. Ainda nas palavras da autora Baldasso(2017, p. 24) “o registro no laudo pericial das alterações no estado original das coisas evitarão interpretações errôneas a respeito da dinâmica dos fatos”.
Por essa razão, o ideal é que o material usado para a cadeia de custódia da prova seja dos mais sofisticados e resistentes para que, futuramente, caso seja necessário, seja possível reanalisar a prova, reconstruindo todo o histórico da elaboração da perícia em evidência, por isso a necessidade que tudo seja documentado.
A cadeia de custódia do material probante surge, no acervo dogmático, como o direito das partes conhecerem todo o percurso da fonte de prova ou meio de investigação, para acautelar o preceito da ampla defesa verificando a legalidade nas fases da custódia.
O manuseio correto e de qualidade do material nos atos da perícia não irá evitar todos os erros que ocorrem nos tribunais brasileiros, porque, de tempos em tempos, os consensos científicos se atualizam e o que hoje é verdade, no futuro deixa de ser. No entanto, pode evitar que a população seja submetida a processos e prisões por conta de graves problemas que inviabilizam as provas e geram duvidas ao julgador.
3.3 Alterações no Código de Processo Penal pelo Pacote Anticrime
Com a inclusão de seis novos artigos no CPP, a cadeia de custódia foi inserida no ordenamento pátrio. Em síntese, o legislador pátrio estabeleceu todo o percurso da prova penal, desde seu surgimento até seu perecimento, com isso, houve uma profissionalização da cadeia de custódia da prova, que foi um dos maiores avanços normativos do pacote anticrime, tendo em vista a preocupação de pormenorizar o procedimento de preservação da prova.
Isso pode ser evidenciado pela leitura dos seguintes dispositivos contidos no art. 158-A do CPP:
§ 1º O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência de
vestígio.
§ 2º O agente público que reconhecer um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação.
§ 3º Vestígio é todo objeto ou material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à infração penal (BRASIL, 2019).
Observa-se que o legislador se preocupou em destacar como o profissional que irá atender a ocorrência deve se comportar a fim de preservar a credibilidade das provas. Percebe-se que a inclusão desse procedimento faz com que tenha ao menos mecanismos para questionar o Estado com relação as cautelas necessárias para a manutenção da identidade do material apreendido.
Nesse sentido, importante elencar o artigo 158-B do CPP, que compreende o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas:
I - reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial interesse para a produção da prova pericial;
II - isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local de crime;
III - fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local de crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento;
IV - coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial, respeitando suas características e natureza;
V - acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento;
VI - transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro, utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem como o controle de sua posse;
VII - recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de procedimento e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame, tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu;
VIII - processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em laudo produzido por perito;
IX - armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número do laudo correspondente;
X - descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial. (BRASIL, 2019).
Em suma, o dispositivo estabeleceu todo o percurso da prova penal, a fim de garantir a preservação da integridade da prova, documentando, inclusive, os agentes estatais que tiverem contato com a prova.
No artigo 158-C do CPP, conferiu-se a preferência ao perito oficial para a coleta dos vestígios, tipificando o crime de fraude processual a remoção de qualquer vestígio do crime antes da liberação pelo perito responsável. Impôs-se ainda que o material recolhido seja acondicionado, com numeração individualizada (art. 158-D, §1º do CPP), somente podendo ser aberto pelo perito que fará a análise e, motivadamente por pessoa autorizada (art. 158-D, §4º do CPP).
Os novos dispositivos preocuparam-se em impor que os Institutos de Criminalística passem a ter obrigatoriamente uma central de custódia para a guarda e controle dos vestígios em um local que se preserve as características originais da prova.
Todo esse procedimento descrito, desde a coleta tem o intuito de observar as garantias constitucionais. Apesar de não haver previsão legal das consequências para os agentes em caso de descumprimento desses dispositivos, para o processo, desrespeitar os procedimentos causa a chamada quebra da cadeia de custódia que pode até mesmo anular um processo.
Nesse sentido, o princípio do devido processo legal é o que protege a plenitude da defesa no decorrer dos procedimentos processuais evitando que as partes tenham eventuais prejuízos por ação incorreta no procedimento da cadeia de custódia. Esse princípio garante no âmbito do processo sancionatório penal à vinculação do estado a padrões normativos que regulam e limitam, através de leis, o poder do Estado.
Esses padrões normativos impostos dentro do procedimento da cadeia de custódia tornam-se um meio de proteção ao processo. Isso porque apesar da imposição ao órgão acusador do ônus da prova, autoriza ao réu, sob a égide do contraditório, contraditar todos os elementos probatórios produzidos e até buscar anulações que o beneficiem.
Por essa razão, o ônus da prova torna-se elemento importante dentro da persecução penal na busca da verdade real quando fundamentado no instituto da cadeia de custódia. Contudo, muito se discute quanto a possibilidade das partes se inserirem no processo, como sujeitos ativos.
Na pratica, é comum os casos em que algumas autoridades e prepostos das investigações descartam fontes, apagam registros de celulares e computadores apreendidos em troca de beneficios, principalmente financeiros. Em suma, tornam a prova imprestável.
Percebe-se em contrapartida que não há nada mais rasteiro, em termos processuais, do que analisar o procedimento com o olhar exclusivamente acusatório, por essa razão a cadeia de custódia permite maior transparência e filtragem inquisitorial no vestígio.
4. QUEBRA DA CADEIA DE CUSTÓDIA E CONSEQUÊNCIAS PARA O PROCESSO PENAL
4.1 A quebra da cadeia de custódia
Conforme fora explicado no capítulo anterior, a prova quando sujeita ao instituto da cadeia de custódia deve obedecer a um procedimento limitado por fases, a ausência ou descaso com uma das fases gera uma quebra ao procedimento. A quebra da cadeia de custódia é representada pela carência de comprovação válida e suficiente em relação à custódia da prova em qualquer momento, desde a coleta ou recebimento.
De acordo com os ensinamentos do prof. Geraldo Prado (2018, p. 12), na esfera penal, a quebra da cadeia de custódia pode acarretar a imprestabilidade da prova em virtude da existência de suspeita insanável quanto à lisura, higidez, fiabilidade e integridade da prova não corretamente custodiada.
De Acordo com Lima (p. 718, 2020):
Se houve a quebra da cadeia de custódia das provas, pouco importando se causada de boa ou má-fé, surge inevitável dúvida quanto ao grau de fiabilidade das evidências colhidas pelos órgãos persecutórios, dúvida esta que há de ser interpretada em favor do acusado à luz da regra probatória do in dubio pro reo, daí por que tal evidência deve ser excluída dos autos.
Desse modo, quando há fundadas dúvidas sobre a identidade de uma prova, sua credibilidade e ou falta de documentação de apreensão da prova. Verifica-se o desrespeito à cadeia de custódia que acarreta em consequências processuais, como por exemplo, o reconhecimento da ilicitude da prova ou o poder de modificar sua valoração.
Assim, nota-se que uma das feições mais difíceis na obtenção das fontes de prova é conseguir preservar a integridade de todo um processo, realizado minuciosa e sigilosamente, caso se não for preservado, compromete todo o conjunto de elementos que foram colhidos o que pode servir para minorar a situação do réu ou até mesmo inocentá-lo.
Tal dificuldade decorre ainda da falta de orçamento para implantar em todas as cidades uma central de custódia, como prevista na própria lei. Contudo, não vista no contexto prático.
Em consequência, a comprovação da quebra da cadeia de custódia ou a impossibilidade de demonstração de sua incoerência cria necessariamente dúvida razoável quanto à mesmidade da evidência, pois se trata de critério jurídico de creditação da prova (PRADO, 2018, p. 12).
Por essa razão, a cadeia de custódia exige grande incentivo por parte do Estado, de cunho financeiro, que permita aos agentes do estado material adequado e agentes capacitados, objetivando preservar a prova desde a coleta à análise.
Quanto a manipulação das provas, quanto menor número de pessoas em contato com o material há uma menor manipulação, conduzindo a uma menor exposição. Uma exposição menor é sinônimo de proteção e defesa da credibilidade do material probatório.
Tudo isso com uma única finalidade, evitar a quebra do instituto, porque quando ocorre não há mais como saber se a prova foi ou não manipulada por sujeitos processuais de má-fé com o intuito de induzir peritos ou magistrados a erro.
Logo, a consequência da quebra da cadeia de custódia, dever ser a exclusão física da prova e de todas dela derivadas. Com isso, em caso de dúvida razoável deverá se impor o in dubio pro reo. Assim, não sendo possível à afirmação categórica de que efetivamente houve a adulteração, é consectário lógico da presunção de inocência que tal situação jurídica configura dúvida razoável quanto à confiabilidade da prova.
4.2 A ilicitude da prova em decorrência da quebra da cadeia de custódia e as garantias constitucionais
Há que se observar ainda que as provas trazidas ao processo tornam-se imprescindíveis para buscar a verdade real. No entanto, nos termos da Constituição da República Federativa do Brasil, as provas obtidas em desrespeito as regras são inadmissíveis no processo, comprovadamente ilícitas.
Desse modo, devido ao direito de não ser processado com a utilização de provas obtidas por meios ilícitos, como com a quebra da cadeia de custódia, há uma impossibilidade de rastrear as fontes de prova para identificação e análise de licitude do meio de sua obtenção. As provas nesse contexto devem ser consideradas também inadmissíveis no processo penal e desentranhadas dos autos.
Nesse sentido, há que se observar que se a prova for declarada ilícita, surge o denominado direito de exclusão, decorrente do conflito entre a defesa social e o respeito aos direitos fundamentais que enquadram essas em provas vedadas, apontadas no Código de Processo Penal da seguinte maneira:
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em violação a normas constitucionais ou legais.
§ 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
§ 2o Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. (BRASIL, 2019).
A vedação pode ser estabelecida por uma lei ou decorrer dos princípios gerais do direito. Por isso, as provas que se produzem afrontando o ordenamento são ditas ilegítimas e as provas que infringirem tais vedações são chamadas de ilícitas. A Constituição Federal ainda dita em seu art. 5º, inciso LVI que “são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos (BRASIL, 1988).
Por conseguinte, quando no procedimento da cadeia de custódia há uma irregularidade, o processo pode ser prejudicado, pois a fiabilidade da prova torna-se questionável, trazendo vícios que podem ser insanáveis, por essa razão a quebra da cadeia de custódia pode ser determinante para o resultado do processo.
Assim, em caso de quebra do instituto, deve-se desconsiderar todo o conhecimento advindo da apreciação do elemento probatório contaminado que piore a situação do réu. Isso ocorre, pois caso recaia dúvida razoável quanto à procedência e mesmidade da prova que demonstre um de seus elementos (ex.: tipicidade) ou ainda, caso não se possa comprovar sua procedência e mesmidade devido à quebra da cadeia de custódia -, por conta da presunção de inocência, a dúvida impõe o dever do magistrado de prolatar decreto absolutório em favor do réu.
De Acordo com Souza e Vasconcellos ( p.06, 2019):
O cuidado com a prova produzida encontra fundamento nos princípios norteadores do processo penal: devido processo legal, ampla defesa, paridade de armas, presunção de inocência, contraditório e direito à prova lícita, visando garantir ao acusado condições de se defender e evitar arbítrios estatais.
Dito isto, resta claro a importância dos princípios constitucionais norteadores do processo. Por essa razão, o princípio do Devido Processo legal evidencia que na ausência de qualquer fato comprovado, prevalece à presunção de inocência. Assim diz o art. 5º, LVII da CF/88:“’’ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória” (BRASIL, 1988).
Por conseguinte, resta claro que é de responsabilidade do Estado o ônus da prova quanto à culpa do indivíduo, ou seja, provar a autoria e materialidade de determinado fato, cumprindo a acusação de demonstrar os fatos articulados com tal finalidade, visto que, constitucionalmente, até que se prove o contrário, o indivíduo é considerado inocente.
Em razão do Princípio da Presunção de Inocência, o Estado só pode impor uma pena ao acusado depois de exauridas todas as vias recursais, quando não restarem mais dúvidas quanto a sua culpabilidade ou inocência. O Princípio da Presunção de Inocência reflete diretamente na instrução, pois nessa oportunidade, se colhe elementos suficientes para que, através das provas, o magistrado forme seu convencimento.
Nesse contexto, a obrigação do Estado é garantir a todo e qualquer acusado que as provas obtidas durante a persecução penal sejam devidamente acondicionadas, custodiadas e posteriormente periciadas, a fim de possibilitar o contraditório diferido sobre elas ou autorizar o questionamento sobre sua credibilidade através da defesa técnica do réu. Com isto, surge o Princípio do contraditório e ampla defesa.
O princípio do contraditório e da ampla defesa exprime a garantia de que ninguém poderá sofrer os efeitos de uma sentença sem ter tido a oportunidade de ser parte do processo e contraditar as imputações que lhes estão sendo feitas, ou seja, ter uma real participação na formação da decisão judicial (direito de defesa). Derivado da frase latina Audi altera partem ou audiatur et altera pars, que significa “ouvir o outro lado” ou “deixar o outro lado ser ouvido bem”.
Esse princípio implica na dualidade de partes, que apoiam posições jurídicas opostas, fazendo com que o tribunal que instrua o caso, ao proferir as decisões ou sentenças, não assuma nenhuma posição no litígio, sendo, portanto, imparcial, além disso, admitindo todos os meios de defesa admitidos no direito, pois o contraditório e a ampla defesa são recursos inerentes aos litigantes, conforme preceitua o art. 5º, inciso LV da CRFB (BRASIL, 1988).
Logo, o respeito às formalidades legais possibilita ao réu, dentro de uma demanda judicial, utilizar meios e recursos aptos a provarem sua inocência, bem como contradizer provas reconhecidamente nulas ou anuláveis por desrespeito às leis ou princípios, como a ausência da salvaguarda da integralidade do material colhido na investigação, a conhecida quebra do instituto da cadeia de custódia.
Portanto, é certo que o contraditório e a ampla defesa são os meios mais aptos de defesa do réu, os quais sugerem-se o uso da paridade das armas para se defender, podendo exercer esse direito pessoalmente e através de sua defesa técnica. Sendo que, tal direito é imprescindível para acompanhar e fiscalizar todo o andamento processual, com intuito de prevenir ilegalidades durante a produção de provas que podem vir a contaminar parcialmente ou até totalmente o processo, distanciando assim, o direito a um julgamento justo e dentro das formalidades legais.
De qualquer forma, a cadeia de custódia quando violada gerará a exclusão do material probante colhido sem o respeito aos procedimentos definidos por etapa em lei, de modo que naturalmente não haverá o que ser valorado pelo magistrado, em virtude da necessidade de exclusão física da prova e das vinculadas a essa, pois do contrário subsistirá vício originário que contaminará as atividades do órgão persecutório.
5 CONCLUSÃO
Embora muitos estudos tenham tratado de analisar a cadeia de custódia sob seus diversos aspectos, no presente artigo, a discussão perpassou o conceito, funções e finalidades, pois explicou as alterações trazidas pelo conhecido pacote anticrime, incluindo todas as fases procedimentais e suas obrigatoriedades.
Demonstrou ainda que apesar das alterações trazerem em seus dispositivos inúmeras fases para o manuseio de uma prova colhida, atualmente, na prática, pouco se sabe quanto a sua efetivação.
Primeiro porque inúmeros municípios do país não possuem o suporte necessário para a implantação da cadeia de custódia da prova, isso porque os institutos de criminalística em sua maioria se concentram nas capitais, e os crimes ocorrem a todo momento e em qualquer lugar.
Desse modo, a probabilidade de uma prova vir a ser contaminada ao longo do processo é bastante expressiva, já que de modo geral existe uma falha estatal em implantar ambientes especializados para atuar na proteção dos vestígios de um crime, esses que, posteriormente serão provas valoradas em uma lide.
Quanto à valoração das provas, ao longo dos estudos percebeu-se que o sistema de valoração da prova atualmente denominado livre convencimento motivado do julgador empreende esforços para evitar injustiças, porque apesar de fornecer liberdade ao julgador, o limita ao conteúdo dos autos, devendo fundamentar sua decisão.
Contudo, mesmo que na teoria seja preciso limitar-se aos autos, a aplicação prática é visivelmente falaciosa, pois, apesar de todos os esforços legislativos em suprir as necessidades sociais e dar uma solução aos problemas jurídicos, a realidade é equidistante do contexto legislado.
No caso da alteração legislativa quanto ao instituto da cadeia de custódia, os representantes deveriam terem disposto sobre de onde seria retirado o orçamento para implantar em todos os municípios uma central de custódia e sobre a contratação de peritos oficiais para que esse instituto houvesse eficácia plena.
Assim, não só a quebra da cadeia de custódia torna-se um problema ao processo penal, a ausência de centrais de custódia para o processamento, análise e armazenamento das provas torna-se um defeito ao processo por um todo, pois prejudica o devido processo legal, impedindo a análise minuciosa da veracidade dos fatos e a valoração adequada a prova.
Entende-se que não basta legislar na tentativa de auxiliar o poder judiciário nas controvérsias é preciso proporcionar meios adequados para que o processo seja justo a todos os sujeitos, pois a dúvida razoável impõe-se a benesse ao réu. Todavia, a dúvida não deve ser ocasionada por falha do sistema estatal em não manter os procedimentos e os responsáveis pela salvaguarda das provas na cadeia de custódia.
REFERÊNCIAS
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[1] Professor do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho – UNIFSA, Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS. E-mail: [email protected].
Acadêmico do Curso de Direito do Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIMA, João Alberto Leal de. A quebra da cadeia de custódia e as consequências para o Processo Penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 dez 2021, 04:19. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57904/a-quebra-da-cadeia-de-custdia-e-as-consequncias-para-o-processo-penal. Acesso em: 23 dez 2024.
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