Resumo: o corrente artigo visa abordar as contradições entre o direito do nascituro na percepção do direito civil e a luta pela legalização do aborto, apresentando conceitos, fatos, pareceres e entendimentos sobre o assunto perante o ordenamento jurídico brasileiro, as questões morais e a compreensão da mulher diante do assunto abordado.
Palavras chave: nascituro, aborto, contradições, direito civil.
Abstract: The current article aims to address the contradictions between the right of the unborn child in the perception of civil law and the struggle for the legalization of abortion, presenting concepts, facts, opinions and understandings on the subject before the Brazilian legal system, moral issues and the understanding of women given the subject discussed.
Keywords: unborn child, abortion, contradictions, civil law.
Sumário: 1.Introdução; 2. Dos direitos do nascituro; 3. Entre direito e moral; 4.Legalização do aborto; 5. Considerações Finais; Referencias.
Introdução
A situação jurídica do nascituro no Brasil inicia-se na esfera do direito civil, no momento em que a condição cabe dentro dos estudos da temática sobre personalidade civil. Os direitos do nascituro, portanto, se enquadram e vem de encontro com a grande importância do tema sobre concepção e legalização do aborto que vem sendo destaque tanto na legislação quanto na doutrina, ganhando um capitulo inteiro no Código civil.
Em contrapartida, muito se tem discutido tanto na esfera jurídica brasileira como nos debates leigos sobre a legalização do aborto, seus prós e contras, além da contradição entre os direitos do nascituro e o entendimento dado pelo STF, pelos juristas e o direito da mulher sobre seu próprio corpo. Nesse ponto, a lei e o próprio ordenamento entram em contraste, tendo em vista, a lei que regula o aborto no Brasil que vai de encontro com as transformações sociais presentes na hodiernidade. Também entram aqui questões religiosas e morais, que de um ponto de vista jurídico não deveriam estar presentes, já que, segundo a constituição federal de 1988, vigente em nosso país, o estado é laico, ou seja, existe uma separação entre o estado e a religião, não estando sobre poder da religião o direito de impor achismos diante das leis. Dessa forma deveria acontecer também com o judiciário, mas o que é muito visto, são pareceres impregnados de parcialidade religiosa, muito forte e presente no Brasil. Os cidadãos que deveriam receber tratamento igualitário sem distinção de cunho religioso, de forma contrária, o que tem-se visualizado na sociedade brasileira é aprisionamento nos preceitos religiosos, em principal o da igreja católica, que defende a ideia do aborto como sendo pecado e um ato imoral, por vezes atacando diretamente o direito de liberdade que a constituição federal defende, no momento em que o pensamento contrario a opinião desse grupo pode acarretar em rechaçamento e até mesmo agressões físicas e morais. Ainda assim, a criminalização não impede as mulheres de abortarem no Brasil e no mundo, e um assunto que deveria ser tratado pela perspectiva da saúde pública é mantido somente nas letras do Código Penal e Civil.
1- Dos direitos do nascituro
De inicio, é importante salientar o conceito de personalidade no meio jurídico e como foi dado seu inicio. Durante muitos anos a personalidade, direito de todos, era atributo daqueles que possuíam bens, eram livres e cidadãos, e assim foi na Grécia e Roma antigas, fato marcante que evidencia a ausência de personalidade daquele que não possuía liberdade como o exemplo dos escravos que, apesar de serem considerados seres humanos, eram tidos como objeto de propriedade, podendo ser libertados, negociados ou até mortos, objetificados e apenas tratados como pessoas quando existia o favorecimento das pessoas a quem pertenciam. Existem diversas teorias que tentam explicar o início da vida ou da personalidade humana, tendo em vista que tal fato muito pode influenciar para outras questões como, por exemplo, a permissão ou não para se abortar. No ordenamento jurídico brasileiro é dada grande importância às teorias que dizem respeito ao inicio dos direitos e deveres dos cidadãos, sendo as mais aceitas e citadas a teoria natalista, teoria concepcionista e teoria da personalidade condicional. Segundo o Código Civil brasileiro e a teoria natalista adotada por este, "a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro". Portanto, entende-se que o marco inicial da personalidade é o nascimento com vida, mas passando também a respeitar os direitos do nascituro desde sua concepção, não sendo o nascituro totalmente portador de direitos e deveres. Segundo Neves (2012, p. 27):
“para os adeptos dessa teoria, a personalidade civil começa do nascimento com vida, e isso porque só a pessoa pode ter personalidade, e o produto da concepção não é a pessoa, é apenas uma parte do corpo da mulher”.
Segundo a doutrina da teoria natalista, o nascituro não é considerado pessoa e somente tem expectativa de direito, desde a sua concepção, para aquilo que lhe é juridicamente proveitoso, uma vez que, os direitos só lhes serão repassados se comprovado que este respirou. O nascituro não tem personalidade jurídica e também lhe falta capacidade de direito, porque a lei apenas protegerá os direitos que possivelmente ele terá. Para a teoria natalista utilizada nessa exposição o nascituro ainda não é pessoa, e não possui personalidade jurídica, mas expectativa de direito, se não nascer com vida, às relações jurídicas que o envolvem não se concretizam, como se o feto nunca tivesse sido concebido, é desconhecido dessa teoria também o fato de o feto possuir funções como ondas cerebrais ou batimentos cardíacos, dado que, estudos científicos na área demonstram a falta dessas atividades que caracterizariam o ser humano como capaz de direitos e deveres.
Fundamental esses estudos realizado por médicos do Royal College of Obstetricians and Gynaecologists, na Grã-Bretanha, resultou na conclusão de que no período inicial da concepção, o feto não tem terminações nervosas e por isso não sente qualquer tipo de dor até completarem 24 semanas de formação. Também nesse sentido, a neurologia trás o entendimento que o inicio da vida ocorre quando o sistema nervoso passa a ter capacidade de resposta ao meio, ou seja, após o terceiro mês.
Muito se fala sobre os métodos anticoncepcionais, que por vezes são utilizados por grupos pró-vida para fundamentar seus preceitos, a ciência nos trás sobre isso uma questão controversa, já que, nenhum método é considerado plena e totalmente seguro para evitar a gestação, não há aqui algo que previna em totalidade a gravidez, havendo casos onde mesmo com a utilização a então figura feminina acaba por engravidar, por vezes uma gravidez indesejada ou em um lar onde não é propicia a continuação de tal situação.
O marco mais importante para os estudos sobre o início da vida humana se iniciou somente no século XVII, após a criação do microscópio, sendo este o principal momento onde as pesquisas acerca da forma como ocorria a fertilização começaram a alavancar. Inicialmente, sobre o direito à vida, deve haver algumas ponderações. Este direito, garantido aos indivíduos pela Constituição Federal, não deveria ser cegamente garantido ao nascituro. O fato é que há mais de um entendimento, alguns deles diretamente opostos, inclusive apresentados neste artigo, sustentados com bases científicas, sobre o início da vida. Desta maneira, seria muito precipitado entregar ao nascituro, que nem ser vivo se pode, por ora, saber se é, garantia incondicional à vida. Portanto, este direito deveria ser flexibilizado para o nascituro, condicionado ao arbítrio de quem melhor pode prever suas possibilidades psicológicas, afetivas, econômicas e sociais pós-nascimento, a quem sabidamente interessa qualquer condição do nascituro: sua mãe. Não se trata de ofender direito fundamental. Em uma análise jurídica, principalmente no tocante aos direitos fundamentais presentes na Constituição, se não há certeza quanto à existência de um bem jurídico a ser tutelado no caso concreto, recorra-se à garantia fundamental que lhe segue, ou seja, recorra-se ao direito à liberdade, a mulher como possuidora de liberdade sobre seu próprio corpo e sobre suas decisões, não sendo um papel do estado impor sobre a figura feminina a obrigação de conviver com algo que não lhe é de desejo, podendo acarretar em problemas posteriores que o estado se abstém de tratar.
2- Entre direito e moral
Durante o período grego, o considerado pai da filosofia, Platão, considerou que não haviam problemas morais em interromper a gravidez de mulheres com idades acima de 40 anos, com o entendimento de proteger a saúde da mulher e indo além, em suas perspectiva os casais apenas deveriam gerar filhos até um certo período de tempo.
Existem no assunto de direitos do nascituro e a interrupção da gravidez a questão moral, já que, há a parte da sociedade que defende a criminalização total do aborto, já que, o artigo 128 do código penal brasileiro apenas prevê a parcial, excluindo os casos quando a gravidez resulta de estupro, de outra forma de violência sexual ou se o feto for anencefálico. Por vezes, as mulheres são retratadas apenas como um receptáculo para o feto, não sendo reconhecidos por esses grupos extremistas o seu direito a liberdade perante as escolhas sobre seu próprio corpo. Distanciando todos os seus direitos previstos na constituição e códigos e tratando o corpo feminino como se fosse apenas um produto para além delas mesmas, esse pensamento vem a cada dia se tornando mais errôneo, já que, todos tem direitos sobre o próprio corpo e a vontade da mulher nesse sentido deve ser levada em plena consideração pelo legislador. O Direito surge e evolui de acordo com a própria sociedade e que é diretamente interligado a ela. Habermas na obra “Direito e Democracia: Entre Facticidade e Validade” já afirmava que fato e norma não se dissociam, estão em constante tensão representados pela facticidade e validade das normas. Miguel Reale, jurista brasileiro, também defendeu com sua teoria tridimensional, que o Direito se constrói tridimensionalmente, possui um aspecto normativo, um fático e um axiológico, isso implica dizer, que não basta que haja normas se estas não possuem uma correlação com a realidade, com o fato e valorativa vivida socialmente, esses elementos atuam em conjunto como num processo, tornando o Direito uma interação dialética entre eles (REALE, 2011).
A matéria em questão aparenta carregar em seu seio aspectos morais de uma parte da sociedade, principalmente, num discurso religioso de sacralização da vida, que perpetua a dinâmica social patriarcal, apesar das grandes conquistas femininas. Volta-se a afirmar, o direito deve acompanhar as transformações da sociedade “o papel do conhecimento não é somente a interpretação do mundo, mas também sua transformação” (BARROSO, 2008, p 279).
3- Legalização do aborto
Entende-se por aborto a remoção ou expulsão prematura de um embrião ou feto do útero. Etimologicamente, a palavra aborto consiste na privação do nascimento advindo do latim, onde ab significa privação e ortus, nascimento. “Sinteticamente, podo ser definida como a interrupção da gravidez, resultando na morte do produto da concepção (JARDIM, 2006)”. Há ainda vários tipos diferentes de aborto, citando alguma como o terapêutico, que é aquele feito quando a gravidez coloca em risco a vida da gestante; o sentimental, quando a gestação é resultado de um estupro; o eugênico, que consiste em abortar quando o feto apresenta alguma anomalia; e, por último, o social, que é quando a mãe não possui condições econômicas de sustentar seu filho. Dentre os tipos citados, atualmente apenas dois são aceitos pelo ordenamento jurídico brasileiro.
A legalização do aborto vem sendo palco para diversas discussões na atualidade é importante fulgurar que alguns dos pontos de vista que demonstram a percepção positiva desse assunto é o extermínio de clínicas clandestinas, que assim gerariam uma diminuição no número de óbitos femininos. O aborto intencional, quando feito em clinicas clandestinas podem vir a gerar futuros problemas para a mulher, já que, a grande maioria não são realizados da forma correta, quando como feito em clinicas especializadas, que diminuem os riscos de consequências negativas, podendo estas ser físicas ou emocionais. Estima-se que pelo menos 70 mil mulheres perdem a vida anualmente em consequência de abortos realizados em condições precárias
“(...) a legalização do aborto, diferentemente do que muitos querem fazer crer, não vai contra o respeito à vida humana, mas ao seu favor “. Para que haja uma comprovação de que o ato abortivo quando praticado da forma correta é algo positivo, é importante ressaltar que o mesmo, quando praticado clandestinamente, “(...) é o terceiro causador de mortes maternas no Brasil (KATIHARA, 2010) “.
Diferentemente do que muitos pressupõem sem nenhum estudo do debate, os defensores do aborto não querem que o mesmo seja tido como legal em qualquer circunstância, ou seja, que qualquer aborto deva ser aceito por lei. Eles reivindicam, principalmente, a proposta que está presente no Senado Federal, à chamada SUG 15/2014. Esta consiste em regulamentar o atendimento às mulheres que queiram interromper a gravidez, desde que essa interrupção ocorra dentro das doze primeiras semanas da gestação. “É importante quebrar o silêncio sobre o tema aborto, pois as mulheres têm o direito de decidir se querem ou não serem mães (PORTAL FÓRUM, 2015)”. O número de abortos clandestinos também é vultoso, tanto no Brasil quanto mundialmente: uma mulher aborta a cada 33 segundos, e a cada dois dias ocorre um aborto clandestino.
Pode-se pressupor que essa medida constituiria uma melhora considerável na vida das mulheres, visto que desse modo, suas escolhas seriam respeitadas, de modo que não estariam contrariando pensamentos religiosos, morais e éticos, mas sim, estariam escolhendo praticar ou não, um ato com seu próprio corpo. Diante dessa situação, surgem duas vertentes diferentes no ordenamento jurídico brasileiro, que constantemente batem de frente. De um lado, grupos religiosos e evangélicos que defendem o aborto como crime absoluto, e que acreditam que o mesmo não deva ser aceito por lei, em nenhuma circunstância; e de outro, o movimento feminista, que acredita que a liberdade de escolha das mulheres, deva ser respeitada e aceita, de modo que estas possam fazer do seu corpo, o que lhes aprouver. Acredita-se que a sociedade brasileira do século XXI prefira primeiramente se ater a preceitos religiosos e conservadores, sem antes analisar as consequências e condições precárias a que inúmeras mulheres se submetem praticando o aborto, ignorando que esse processo ocorre em todo o Brasil, preferem “fechar os olhos” e não se aterem a realidade da situação, o aborto acontece com ou sem legalização e diferente da crença desses grupos sua legalização não faria com que todas as mulheres queiram realizar, visto que, é um dever do governo apresentar e conscientizar sobre os fatores negativos de se realizar o aborto, cabendo à escolha a mulher. É fulcral salientar que nenhum sistema de saúde entrou em colapso depois da despenalização do aborto, como é o caso de boa parte da América e Europa.
Outro argumento utilizado em favor da legalização do aborto é a situação social da mulher que deseja realizar o ato, muitas vezes sendo elas de origem humilde, sem condições financeiras favoráveis, sem acesso a educação básica e a educação sexual, já que, no Brasil, essa instrução vem se mostrando cada vez mais precária, é necessário um ensino de educação sexual digno para impedir uma gravidez indesejada, a falta deste favorece o equívoco e a carência de conhecimento da mulher em relação ao próprio corpo ou as formas de prevenção corretas, acarretando em gravidez indesejada, que muitas vezes podem vir a gerar consequências negativas da vida da mulher, como transtornos psicológicos que perduram pela vida inteira.
“Sem dinheiro as mulheres pobres e negras são submetidas à clinicas clandestinas que não oferecem o mínimo de cuidado, um acompanhamento profissional necessário e acabam por ter suas vidas colocadas em risco. Assim, falar em aborto é falar principalmente na violação dos direitos dessas mulheres, violação ao seu direito reprodutivo, sexual e à sua autonomia (GALDINO; ROCHA, 2015) “.
“A maioria das escolas não tem educação sexual no currículo. Em grande parte porque grupos conservadores barram esse tipo de conteúdo, com medo de que as crianças sejam “estimuladas” a fazer sexo antes da hora. Mal sabem que as crianças desde muito cedo expressam sua sexualidade, sentem prazer com seus corpos e seria ótimo que não fossem reprimidas. Nas aulas de biologia, quando o assunto é abordado, geralmente é tratado como algo terrível que só dissemina doenças sexualmente transmissíveis (BLOGUEIRAS FEMININAS, 2014) “.
Outro argumento dos movimentos feministas é a influência do sistema patriarcal na sociedade brasileira. O Estado prefere criminalizar o aborto e expor as mulheres a inúmeros riscos, pois alega que este é inconcebível e sob nenhuma hipótese deva ocorrer. Este pensamento é oriundo de preceitos morais e religiosos, porquanto que, nada que vá de encontro aos bons costumes pregados por essa parte é sequer considerado, o mesmo parece ocorrer com a legislação, que se mostra impregnada dessas convenções, quando na sua letra defende uma postura laica.
“(...) é possível entender porque as leis que optam por criminalizar a prática abortiva escondem, na verdade, um posicionamento ideológico sexista, legitimado por um direito patriarcal, que tolhe o exercício da livre sexualidade da mulher, condicionando-a tão somente para fins reprodutivos e criminalizando socialmente e penalmente as mulheres que escolhem pela sua autonomia”.
Nota-se, portanto, que não é respeitado o direito de escolha da mulher e, sequer defendida a garantia ao direito à privacidade que está especificado como um dos direitos fundamentais do ser humano na Constituição da República. Inclusive, a Corte Interamericana de Direito Humanos decidiu, em 2012, que o art. 4º, 1 da CADH que narra que a proteção da vida deve se dar a partir da concepção, na verdade, foi criado e serve com o intuito de proteger os direitos da mulher grávida. Não foi criado para proteger os fetos. Afirmando também acerca que o direito à vida desde a concepção não é argumento para proibir a possibilidade da interrupção da gestação nem para impedir o respeito, a proteção e a garantia dos direitos reprodutivos das mulheres, pois a elas cabe o direito de decidir se querem ou não engravidar ou manter o processo gestacional. Nessa oportunidade, lembra-se que na Convenção de Cairo de 1994, da ONU, um marco para os direitos feministas, veio à tona a máxima de que as mulheres têm direito “ao controle sobre a sua sexualidade”, “à garantia de sua saúde sexual e reprodutiva, à livre decisão, sem coerção, discriminação ou violência e de decidir sobre o exercício da maternidade”.
As decisões do STF parecem contraditórias em alguns momentos, sendo omissos muitas vezes a teoria natalista que esta plenamente presente na letra da lei do Código civil, já que, ora deferem entendimentos a favor de uma teoria concepcionalista. Apesar disso, a decisão de um caso concreto da primeira turma do STF no ano de 2016 foi considerada uma vitória a causa da legalização, tendo em vista a decisão de que cometer aborto nos três primeiros meses de gestação não é delito. Os ministros Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber tornaram visível a definição de que não é crime a interrupção espontânea da gestação realizada no primeiro trimestre. Na visão do ministro Luís Roberto Barroso, defendeu que:
"Em temas moralmente divisivos, o papel adequado do Estado não é tomar partido e impor uma visão, mas permitir que as mulheres façam a sua escolha de forma autônoma. O Estado precisa estar do lado de quem deseja ter o filho. O Estado precisa estar do lado de quem não deseja – geralmente porque não pode – ter o filho. Em suma: por ter o dever de estar dos dois lados, o Estado não pode escolher um".
Apesar dessas vitorias para as defensoras dos direitos femininos, a ideia de igualdade parece muito distante de ser efetiva, pela liberdade restrita que elas sofrem em razão da perpetuação de dogmas religiosos, conservadorismo em detrimento da saúde, em desencontro com o alcance de uma sociedade mais tolerante, equilibrada e justa.
Considerações finais
Como foi apresentada, a manutenção da conduta de interrupção voluntária da gravidez como crime se encontra cada dia mais insuportável para o direito, para o Estado e para a sociedade. Trata-se de anseio no mínimo hipócrita e até injusto. Isto porque, falar em descriminalização do aborto não é banalizar ou ignorar sua prática, tampouco incentivá-la, mas sim tratar de um tema que muito vem ganhando espaço. O sentimento que alguns têm sobre a prática do aborto é íntimo e seus motivos devem ser respeitados, como qualquer opinião que se tenha numa democracia, mas não se deve aceitar que preceitos morais de uma parcela da população interfiram em um processo que visa não apenas o interesse individual de cada um, mas a saúde geral. Todavia, criminalizar a conduta não garantirá êxito algum contra sua recorrência, apenas fará com que a população brasileira continue a ignorar sua pratica, enquanto todos os dias mulheres morrem em decorrência da omissão estatal e judiciaria. Ademais, a criminalização do aborto só vem contribuir para marginalizar milhares de casos de sua ocorrência, que como foi visto durante essa explanação, não deixam de ser praticados por força de lei ou moral, mas que, apenas são ocultados, principalmente quando não há outra opção para a grávida, que prefere tirar seu filho a tê-lo em meio que pouco oferece à sua dignidade. Para Além, um estado que mal propicia o cumprimento de seus direitos fundamentais, a alimentação, educação, bem privado, onde o nível de extrema pobreza cresce a cada dia, a população luta por uma vida digna, que nem sempre possibilita a criação eminente de uma criança.
Fechando este rol exemplificativo, está a principal e mais digno fundamento: a liberdade. Não há que se falar em plenitude da liberdade se não está sendo assistido o direito de escolha sobre o próprio corpo, sobre a própria vida ou sobre a permissão da possibilidade (fato futuro e condicionado) de existência de uma pessoa, que por hora ainda é um objeto de direito que nem vivo se sabe pode afirmar estar.
Pode-se notar que o ordenamento jurídico brasileiro ainda sofre com vícios, como existentes no século XV, onde o catolicismo e a religião sustentavam toda a pirâmide social, o direito ao contrario disso, deve crescer e ter a sapiência de se modificar em conjunto com as mudanças sociais, além disso, é importante que o legislador desenvolva seu trabalho pensando sempre no bem coletivo e não em suas convicções individualistas, como se pode notar durante o presente texto. Os códigos brasileiros ainda carecem de mudanças e discussões realizadas com muita seriedade sobre o assunto, posto que o próprio código civil se contradiz na questão da defesa da corrente adotada, por vezes natalista e por vezes concepcionista. É necessário que haja mudanças na legislação vigente, para que as duvidas sejam apaziguadas e debates mais precisos ocorram sobre os verdadeiros direitos de um nascituro.
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Graduanda do curso de Direito pela Universidade Estadual do Piaui - UESPI.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VIEIRA, Maria Lorena Gomes. O direito dos nascituros e a legalização do aborto Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 06 jan 2022, 04:17. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57981/o-direito-dos-nascituros-e-a-legalizao-do-aborto. Acesso em: 23 dez 2024.
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