Resumo: O presente artigo objetiva analisar aspectos no que tange a recente polêmica a respeito da tributação incidente sobre o serviço prestado por meio dos aplicativos de transporte, tendo como parâmetro o aplicativo UBER. Com ênfase no modo de instituição e cobrança do ISSQN, que se constitui como modalidade de imposto que incide sobre esse tipo de serviço. Diante da modernização dos serviços viabilizada pela evolução constante da tecnologia, verifica-se o surgimento de impasses provocados ainda pela dificuldade devido à ausência de leis ou lacuna legal, para a devida regulamentação do tema estudado, gerando posicionamentos divergentes quanto ao local de recolhimento do imposto devido sobre o serviço de transporte realizado fora do local em que se encontra a sede da empresa proprietária do aplicativo. Para tanto, buscou-se sintetizar as discussões e propostas, por meio de estudo adotando-se a metodologia referencial bibliográfica, utilizando-se de livros, legislação, artigos e jurisprudência que versam sobre o tema ora estudado. Dessa feita, o estudo almeja abordar a questão de maneira didática e esclarecedora, explicando conceitos e a trajetória dos debates fomentados para nortear a ainda distante solução que reclama o dilema atual acerca do assunto.
Palavras chave: ISSQN, aplicativos de transporte, incidência.
Abstract: This article aims to analyze aspects regarding the recent controversy regarding the taxation levied on the service provided by means of transport applications, using the UBER application as a parameter. With an emphasis on the method of institution and collection of the ISSQN, which constitutes a type of tax that is levied on this type of service. In view of the modernization of services made possible by the constant evolution of technology, there is the emergence of impasses caused by the difficulty due to the absence of laws or legal gap, for the proper regulation of the studied topic, generating divergent positions regarding the place of tax collection due on the transport service performed outside the location of the headquarters of the company that owns the application. Therefore, we sought to synthesize the discussions and proposals, through a study adopting the bibliographic referential methodology, using books, legislation, articles and jurisprudence that deal with the topic studied here. This time, the study aims to address the issue in a didactic and enlightening way, explaining concepts and the trajectory of the debates fostered to guide the still distant solution that claims the current dilemma on the subject.
Keywords: ISSQN, transport applications, incidence.
Sumário: Introdução. 1. Conceito do App UBER – Tecnologia inovadora. 2. Tributação do serviço de transporte - ISSQN. 3. A atual polêmica sobre a incidência da tributação do ISSQN sobre serviços prestados por meio do UBER. Conclusão. Referências.
Introdução
O presente artigo visa analisar o aparato legal vigente, aspectos doutrinários e jurisprudenciais, buscando verificar como está sendo regulamentada a tributação do ISSQN sobre o serviço de transporte intermediado pela empresa UBER. De fato, existem discussões a respeito da polêmica resultante da tributação do serviço inovador intermediado por meio de aplicativos de transporte. Assim, almeja-se destacar as principais soluções adotadas e não se pretende solucionar o impasse, já que se exigirá esforço para alcançar a satisfação de todas as partes envolvidas na operação, quais sejam o parceiro, a empresa, o cliente e o governo.
Inicialmente, buscou-se explicar como ocorre o funcionamento da plataforma online UBER, que proporciona a intermediação do serviço de transporte e vem se consolidando como tecnologia inovadora no ramo. A partir disso, destacou-se no Brasil, o ISSQN, que consiste no imposto incidente sobre essa modalidade de atividade e evidenciou-se o seu conceito, bem como suas particularidades.
Nesse sentido, foram abordadas as especificidades sobre o ISSQN com foco na sua tributação sobre o serviço de transporte, como também o levantamento de aspectos sobre a problemática acerca da definição da competência legal para o devido recolhimento. Visto que o mencionado serviço está sendo desempenhado por motoristas em vários municípios, não se entende justa a concentração do recolhimento do referido imposto apenas nas cidades em que existam sede ou escritórios da empresa proprietária do aplicativo eletrônico alvo da presente abordagem.
Além disso, verificou-se como está sendo feita a tributação e cobrança do serviço da UBER, como também do desenvolvimento dos modos de procedimento por parte de governos municipais, com ênfase na discussão sobre a exigência e cobrança do ISSQN devido pelo serviço prestado por parte do motorista. Dessa maneira, o presente trabalho restringe a análise sob essa perspectiva.
Portanto, vislumbra-se destacar os principais aspectos sobre a discussão do tema proposto, por meio de explicações conceituais e doutrinárias, além de apontar a legislação atual sobre assunto, esclarecendo sobre as perspectivas defendidas no âmbito acadêmico jurídico, e por fim, ressaltando atuais medidas adotadas pelas partes envolvidas nessa questão que desafia a dinâmica tributária no país. Ressalta-se que não se pretende suprir ou aprofundar em demasia um tema bastante recente e que ainda está sujeito a modificações tanto no meio legislativo, como no âmbito de decisões e entendimentos jurisprudenciais.
1. Conceito do aplicativo UBER e a tecnologia inovadora sobre o serviço de transporte
Os aplicativos para smartphones, nos dias de hoje, com o fim de melhorar a vida de usuários proporcionando maior comodidade e praticidade, já fazem parte da rotina de muitas pessoas, principalmente de passageiros e motoristas. Dentre eles, destaca-se o aplicativo de serviço de transporte privado da UBER, pois basta se ter um celular smartphone com internet e baixar o aplicativo que o serviço já pode ser aproveitado pelo usuário.
A empresa multinacional americana, UBER, que viabiliza o transporte individual em veículos automotores, foi fundada em São Francisco, nos Estados Unidos, em junho de 2010, e chegou ao Brasil 4 anos mais tarde, popularizando-se com a Copa do Mundo, em 2014, tendo como pioneira a cidade do Rio de Janeiro. Nos dias atuais, a maioria das grandes cidades brasileiras conta com esse tipo de serviço como principal instrumento para realização de transporte, sendo utilizado com destaque também nas regiões metropolitanas e cidades de porte médio. Com isso, além de oferecer comodidade aos passageiros, o aplicativo UBER também se tornou um meio de labor para muitas pessoas. Sendo cada vez maior o número de novos motoristas cadastrados no aplicativo, que fazem desse trabalho tanto um complemento ao seu salário quanto a sua única fonte de renda mensal.
Nessa toada, basta que o motorista realize um cadastro prévio na plataforma e comprove o cumprimento dos requisitos exigidos. Inicialmente, é preciso ser um motorista profissional, ou seja, ter a carteira de motorista ativa e regular perante os órgãos competentes, Detran, por exemplo. Após esse primeiro procedimento, é preciso realizar o cadastro no site da empresa para, a partir disso, passar pela checagem de informações e segurança. Essa checagem diz respeito à revisão dos antecedentes criminais nas esferas estadual e federal.
Outrossim, é necessário estar atento às diferentes categorias de carros oferecidas pela UBER para verificar se estão adequadas ao veículo do candidato. Nesse caso, no Brasil, ressalta-se o funcionamento das seguintes categorias: uberX, uberPOOL, UberSELECT, UberBLACK, e a mais recente, Uber Juntos. Na sequência, destaca-se características que os carros devem contemplar em cada uma dessas categorias: UberX: carros compactos, com 4 portas e ar condicionado; UberPOOL: serviço disponível apenas em São Paulo e no Rio de Janeiro, permite que o usuário divida a viagem com outro passageiro que vá percorrer um trajeto semelhante; UberSELECT: contempla carros mais confortáveis e espaçosos, com uma tarifa até 20% acima da tarifa cobrada pela UberX; UberBLACK: utiliza carros de modelo sedan (Toyota Corolla, Ford Fusion, Volkswagen Jetta etc), com ar condicionado e bancos de couro; e por fim, o Uber Juntos: a mais recente e polêmica modalidade criada pela empresa, pois trata-se de uma viagem compartilhada que pode custar até 50% menos que uma viagem de UberX.
Desse modo, cumpridos esses requisitos básicos, basta que o motorista inicie a realização do serviço após a ativação do aplicativo. Já que é o motorista quem escolhe o dia, a hora e o momento de parar o seu ofício, com total flexibilidade de horários e liberdade para desempenhar o serviço. Por isso, configura-se como um trabalho ideal para conciliar com outro e esse fato tem incentivado muitos brasileiros a utilizarem essa plataforma.
No momento em que o aplicativo começou a ser utilizado no país, muito se comentava sobre a legalidade dos serviços prestados pela UBER. Indagava-se, por exemplo, como uma empresa oferece um serviço de qualidade, com praticidade e, ao mesmo tempo, por um preço razoável, e, por isso, acessível a todas as classes sociais, em um país que possui carga tributária consideravelmente elevada, que é o caso do Brasil.
Contudo, a Carta Magna de 1988 e a Lei Federal 12.587/12, que trata sobre a Política Nacional de Mobilidade Urbana – PNMU, asseguram a legalidade dessa forma de prestação de serviço viabilizada pela UBER. Inclusive, vislumbra-se no artigo 1º da referida lei, sendo possível constatar a possibilidade de integração dos mais diversos tipos de transporte, com a finalidade de melhoria na acessibilidade e mobilidade dos cidadãos. Vejamos:
“Art. 1º. A Política Nacional de Mobilidade Urbana é instrumento da política de desenvolvimento urbano de que tratam o inciso XX do art. 21 e o art. 182 da Constituição Federal, objetivando a integração entre os diferentes modos de transporte e a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas no território do Município. ”
Ademais, a Lei 13.640/2018 alterou a Lei 12.587/2012, informando o conceito e disciplinando o transporte remunerado privado individual de passageiros. Essa recente lei promoveu alteração especifica no inciso X do art. 4º da mencionada lei, dispondo que o transporte remunerado privado individual de passageiros se constitui como aquele não aberto ao público, destinado à realização de viagens individualizadas ou compartilhadas solicitadas exclusivamente por usuários que possuam cadastro prévio em plataformas online ou aplicativos que permitem a comunicação em rede.
Desse modo, não restam dúvidas sobre a regularidade do funcionamento dos aplicativos, sendo admitido legalmente a prestação do serviço realizado pelos motoristas do UBER. Esse serviço é de cunho individual privado, conforme previsto pela referida legislação vigente. Outrossim, a empresa também recolhe os impostos pertinentes ao desempenho de suas atividades, tais como impostos federais PIS, Cofins, IRPF, bem como impostos municipais devidos, como o ISS e contribuições municipais requeridas por regulamentos locais.
Nesse sentido, o imposto sobre serviços de qualquer natureza, tratado no presente trabalho apenas sob a sigla ISSQN, é devido pela empresa já que ocorre o enquadramento da UBER na lista de serviços no subitem 1.03 “Processamento, armazenamento ou hospedagem de dados, textos, imagens, vídeos, páginas eletrônicas, aplicativos e sistemas de informação, entre outros formatos, e congêneres”, conforme redação dada pela Lei Complementar n. 157/2016.
Diante do exposto, em que pese o envolvimento do recolhimento dessas variadas modalidades de impostos, pretende-se, no presente estudo, explorar e enfatizar a análise da forma de exigência do imposto municipal ISSQN que incide sobre a modalidade de prestação de serviços em que se enquadra o serviço de transporte privado intermediado e fomentado pelo aplicativo da empresa UBER.
2. Tributação do serviço de transporte – ISSQN
A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, conforme dispõe o art. 4º, CTN. Em virtude disso, importa observar qual é o fato gerador presente na lei que instituiu o tributo. No caso do serviço de transporte, pode-se inferir que o ISSQN, conforme disposição legal, deve ser cobrado do prestador do serviço já que o tributo surge independentemente de qualquer atividade estatal relativa ao contribuinte. Com o intuito de promover elucidação didática, frise-se o ensinado pelo professor Rafael Novais:
“O Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) é de competência Municipal (art.156, III, da CF) e se caracteriza como tributo de forte finalidade fiscal, pois grande fonte de arrecadação aos cofres públicos. Outra importante observação inaugural seria a ausência de previsão do ISSQN no Código Tributário Nacional, pois quem exercerá o papel de norma geral desse imposto será a específica Lei Complementar 116/2003.”
Diante disso, o ISSQN, ou simplesmente ISS, cuja competência é atribuída aos Municípios, conforme art. 156, III, da Constituição Federal, bem como ao Distrito Federal devido a competência tributária híbrida que este ente possui, tem como fato gerador a prestação dos serviços taxativamente relacionados na lista de serviços constantes do anexo da sua lei, qual seja Lei Complementar n.º 116/2003, pois não há disposição sobre o referido imposto no Código Tributário Nacional. Em síntese, a Lei Complementar 116/03 dispõe que:
“Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. ”
Desse modo, apesar da nomenclatura, o ISSQN não incide sobre todo e qualquer serviço, mas apenas sobre aqueles tipos de serviços previstos na legislação própria, conforme interpretação literal e restritiva, inclusive recente modificação legislativa trazida pela Lei Complementar 157/2016 ampliou a lista de serviços tributáveis pelo ISSQN.
Esse imposto residual caracteriza-se pela eminente finalidade fiscal e possui notável representatividade financeira, principalmente por representar considerável fonte de arrecadação para os cofres dos grandes municípios. Todavia, o seu viés extrafiscal se verifica quando ocorre a redução nas alíquotas almejando atrair empresas prestadoras de serviços para o território municipal, já que a alíquota pode variar, sendo a mínima de 2%, conforme dispõe o art. 88 do ADCT, e a máxima de 5%, consoante fixado no art. 8º, II, da Lei Complementar n.º 116/2003, isso no intuito de padronizar a incidência nacional do ISSQN e a fim de atenuar os desagradáveis efeitos da guerra fiscal entre municípios.
Nesse sentido, nos termos da Lei Complementar nº 116/2003, estabelece de forma taxativa, que o referido imposto tem como fato gerador a prestação de serviços constantes de sua lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador, sendo o preço do serviço considerado como base de cálculo. Em que pese a taxatividade da lista, essa comporta interpretação ampliativa no caso de serviços congêneres. Sendo assim, de maneira a explicitar o detalhamento sobre o ISSQN, destaca-se o exposto pelo professor Marcus Abraham:
“Considera-se prestado o serviço e o respectivo imposto devido no local do estabelecimento prestador – onde o contribuinte desenvolva a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário, e que configure unidade econômica ou profissional – ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto em algumas das hipóteses previstas na lei. O contribuinte é o prestador do serviço e a responsabilidade pelo crédito tributário poderá ser atribuída por lei municipal a terceira pessoa, vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação, de maneira solidária, subsidiária ou por substituição tributária. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço e a alíquota mínima do ISS é de 2% e a máxima é de 5%.”
Com isso, vislumbra-se que cada tipo de serviço poderá ter uma alíquota específica, conforme disposição de legislação municipal. Contudo, o aspecto territorial do ISSQN continua sendo tema controverso nos estudos tributários. A divergência impera em identificar e estabelecer qual município seria o competente nos casos em que a empresa opera de maneira desconcentrada, restando a dúvida se compete para o recolhimento o ente local em que se tem a sede do estabelecimento prestador do serviço ou o município do local onde estaria sendo prestado o serviço.
Dessa feita, socorre-se do disposto art. 3º da LC 116/2003, que admite como regra geral que o ISSQN seja devido ao município onde estiver o estabelecimento do prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, sendo que as exceções de pagamento no local de prestação do serviço abrangem algumas hipóteses que geram bastante controvérsias, tais como: serviços de instalação de estruturas, varrição, coleta de lixo, vigilância, jardinagem dentre outros. Nesse aspecto, no que diz respeito ao local da prestação dos serviços para a incidência do ISS, destaca-se os ensinamentos de Leandro Pausen, que afirma:
“A existência efetiva do estabelecimento pode ser indicada pela conjugação, parcial ou total, de diversos elementos, tais com o (I) manutenção de pessoal, material, máquinas, instrumentos e equipamentos próprios ou de terceiros necessários à execução dos serviços; (II) estrutura organizacional ou administrativa; (III) inscrição nos órgãos previdenciários; (IV) indicação como domicílio fiscal para efeito de outros tributos; e (V) permanência no local, para a execução dos serviços, exteriorizada por meio de site na Internet, propaganda, publicidade, contas de telefone, de fornecimento de energia elétrica, água ou gás, em nome do prestador, seu representante ou preposto.”
Além disso, o contribuinte do imposto será o prestador do serviço, consoante art. 5º da LC 116/2003. Com isso, não se consideram contribuintes os sujeitos que prestem serviços em relação de emprego, trabalhadores avulsos, diretores e membros de conselho consultivo ou de conselho fiscal de sociedades e fundações, bem como dos sócios-gerentes e os gerentes-delegados, de acordo com art. 2º, II, da LC 116/2003.
Ademais, a regra de lançamento tributário desse imposto ocorre por homologação, consonante art. 150 do CTN, podendo existir atuação complementar do fisco de ofício, tal como informa o art. 149 do CTN. Cabe destacar ainda que algumas decisões judiciais na seara trabalhista reconheceram o vínculo de emprego entre o motorista cadastrado na plataforma do aplicativo e a empresa UBER. Sendo assim, conforme o exposto, considerado o vínculo trabalhista então o imposto não seria devido. Contudo, ressalta-se que a definição sobre a existência desse vínculo nesses casos ainda não foi pacificada na jurisprudência pátria.
“UBER E RELAÇÃO DE EMPREGO. MÁSCARA DE VÍNCULO. FRAUDE POR MEIO DE ALGORITMOS. A chamada uberização das relações de trabalho (não por casualidade originada no próprio nome da ré), no capitalismo de plataforma, gig economy, crowdwork, trabalho digital, etc., operam figuras derivadas da quarta revolução industrial (a tecno-informática) que pretensamente criariam "novas formas" de relações de trabalho quando, na verdade, os elementos que as compõem são exatamente os mesmos de uma relação de emprego, escamoteados por nomes pomposos (normalmente estrangeiros), que transmudam a figura do empregador no "facilitador", "gestor" ou "aproximador de pessoas"; a figura da pessoa trabalhadora no indivíduo microempreendedor de si mesmo ou no autônomo, que pretensamente não precisa "bater ponto" e não tem "patrão", mas cuja sobrevivência depende da prestação de serviços por longos períodos (normalmente acima de 10 horas de trabalho ao dia), sete dias por semana, trinta dias por mês e doze meses por ano, sem direito a adoecer (não há recolhimento previdenciário), sem férias, sem décimo terceiro, sem FGTS, sem nenhuma garantia, cuja avaliação e cobrança é feita pelo usuário da plataforma e repassada instantaneamente pelo algoritmo (o controle e a subordinação são mais eficazes do que na relação de trabalho tradicional). Portanto, só o que muda é a máscara, a fraude emprestada e aperfeiçoada pelo algoritmo que tenta (e muitas vezes com sucesso), confundir as pessoas para elidir o respeito aos Direitos Humanos do Trabalho e descumprir a legislação social. Obviamente, a forma de prestação de serviços não desnatura a essência da relação de emprego, fundada na exploração de trabalho por conta alheia, pois os meios de produção continuam na propriedade da plataforma. Por outras palavras, não há nada de novo nisso, a não ser o novo método fraudulento de engenharia informática para mascarar a relação de emprego. Sentença reformada e vínculo empregatício reconhecido.”
Dessa feita, entende-se que o ISSQN deve ser utilizado para a tributação do serviço de transporte privado realizado localmente por meio de plataforma eletrônica, já que, conforme explanado, seus requisitos são preenchidos quando o motorista particular utiliza o aplicativo UBER para prestar o serviço de transporte privado, caso prestado integralmente no território municipal, e em conformidade com as exigências legais, e de acordo com as condições determinadas pela empresa provedora do meio eletrônico que, por meio deste, possibilita a intermediação de contratação do serviço de transporte.
3. A atual polêmica sobre a incidência da tributação do ISSQN sobre serviços prestados por meio do UBER
Após a exposição das considerações a respeito da evidenciação da incidência do imposto devido sobre os serviços de transporte no mesmo município prestados por meio do aplicativo UBER, sendo perfeitamente enquadrado e com a devida cobrança do ISSQN, ainda persiste a discussão sobre qual seria o local competente para o recolhimento desse tributo. Inicialmente, prevaleceu a cidade de São Paulo, pois é o município que possui a sede da empresa UBER, sendo o foco da arrecadação do ISSQN devido sobre a sua receita bruta.
Tal receita é advinda de uma comissão cobrada da remuneração dos motoristas, mas já inserida no preço da passagem. Nesse contexto, o tomador do serviço da Uber é o motorista, e não o passageiro, sendo esse o tomador do serviço do motorista. Desse modo, a receita da Uber é constituída por uma comissão de 20%, no caso da modalidade Uber Black, e 25%, na modalidade Uber X, descontada do valor pago pelo usuário, que no caso é o passageiro, ao motorista que utiliza o aplicativo para realizar o serviço de transporte.
Nessa toada, reputa-se que, em relação aos motoristas, o ISS deverá ser pago no Município onde estiver estabelecido, no caso de Microempreendedor – MEI, ou domiciliado, no caso de pessoa física na modalidade profissional autônomo. Consoante entendimento no sentido de que os Municípios devem obedecer aos preceitos dispostos na Lei Federal n. 12.587/2012 com a redação atualizada pela Lei Federal n. 13.640/2018, abaixo descrita:
“Art. 4º da Lei 12.587/2012 (…): Para os fins desta Lei, considera-se:
X – transporte remunerado privado individual de passageiros: serviço remunerado de transporte de passageiros, não aberto ao público, para a realização de viagens individualizadas ou compartilhadas solicitadas exclusivamente por usuários previamente cadastrados em aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede. (Redação dada pela Lei nº 13.640, de 2018).
Art. 11-A. Compete exclusivamente aos Municípios e ao Distrito Federal regulamentar e fiscalizar o serviço de transporte remunerado privado individual de passageiros previsto no inciso X do art. 4º desta Lei no âmbito dos seus territórios. (Incluído pela Lei nº 13.640, de 2018). (grifei)
Parágrafo único. Na regulamentação e fiscalização do serviço de transporte privado individual de passageiros, os Municípios e o Distrito Federal deverão observar as seguintes diretrizes, tendo em vista a eficiência, a eficácia, a segurança e a efetividade na prestação do serviço: (Incluído pela Lei nº 13.640, de 2018)
I – efetiva cobrança dos tributos municipais devidos pela prestação do serviço; (Incluído pela Lei nº 13.640, de 2018)
II – exigência de contratação de seguro de Acidentes Pessoais a Passageiros (APP) e do Seguro Obrigatório de Danos Pessoais causados por Veículos Automotores de Vias Terrestres (DPVAT); (Incluído pela Lei nº 13.640, de 2018)
III – exigência de inscrição do motorista como contribuinte individual do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), nos termos da alínea h do inciso V do art. 11 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991. (Incluído pela Lei nº 13.640, de 2018)”
Nesse sentido, vários Municípios já implementaram leis ou estão discutindo projetos para regulamentar o transporte efetuado por meio do intermédio de aplicativos na cidade. Como exemplo, destaca-se o caso do Município de Juazeiro do Norte-CE, que foi o primeiro município do interior cearense a regulamentar a situação, por meio da publicação da Lei n. 5.045 de 30 de dezembro 2019 que disciplina o uso do sistema viário urbano municipal para exploração de serviço de transporte privado remunerado de passageiros, intermediado por aplicativos ou outras plataformas digitais de transporte, pela qual estabelece no art. 3º a obrigatoriedade de credenciamento dos motoristas junto ao Município.
Ademais, no art. 4º dessa lei municipal, define-se que compete aos aplicativos de transporte credenciados para operar o serviço, o recolhimento do ISSQN calculado sobre o valor da intermediação do serviço, conforme legislação municipal. Como também, no art. 8º, o decreto estabelece requisitos para o cadastramento dos motoristas junto aos aplicativos, e devido a isso os carros passaram a ser identificados com selos da respectiva plataforma digital que utilizam para prestar o serviço.
Essa tendência vai ao encontro da recente decisão do STF, datada de 08/05/2019, proferida pelos ministros durante a análise no julgamento do Recurso Extraordinário 1.054.110 e na Arguição de Preceito Fundamental (ADPF 449), de relatoria dos ministros Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, respectivamente, que em repercussão geral determinou a inconstitucionalidade da proibição ou restrição do uso de carros particulares no transporte remunerado de pessoas. Esse caso concreto envolveu a discussão sobre a validade de leis que almejavam a restrição dos aplicativos no município de Fortaleza, no Ceará, e na cidade de São Paulo
Com isso, essa decisão não deixa dúvidas a respeito da liberdade legal do uso de aplicativos como Uber e outros aplicativos semelhantes nos municípios brasileiros. Além disso, a Suprema Corte já havia declarado a inconstitucionalidade de leis municipais que proibiram o uso dos aplicativos, destaca-se que a decisão referenciada acima foi além, já que determina a proibição de aprovação de normas contrárias à lei federal, de maneira a preservar o respeito aos princípios constitucionais da livre concorrência e livre iniciativa.
Desse modo, ao contrário da perfeita incidência em relação aos motoristas prestadores do serviço de transporte, o local de incidência do ISSQN pela empresa de tecnologia gera dúvidas. Visto que impera a discussão sobre se o referido imposto seria devido no local onde se localiza a sede da empresa no Brasil, ou nos locais onde os seus escritórios estão localizados, ou mesmo se o ISSQN seria devido proporcionalmente em cada Município onde o serviço é prestado, conforme a localização de origem de cadastro dos motoristas prestadores dos serviços.
Nesse ínterim, sob uma perspectiva doutrinária, enfatiza-se o posicionamento do consultor Roberto Adolfo Tauil, que entende, em todos os casos, devida a tributação do ISSQN no Município no qual está localizada a sede da empresa UBER no Brasil, ou seja, na cidade de São Paulo, ou naqueles locais em que há instalação de escritórios de apoio, caso de grandes cidades como Belo Horizonte, de maneira a não provocar o maior incentivo a guerra fiscal que persiste no país. Dentre outras razões, a principal seria a de que, em diversas situações, o local da prestação coincide com o estabelecimento prestador, a servir de exemplos os hospitais, as escolas, dentre outros.
Entretanto, há variados casos em que a prestação do serviço é executada em local que nada tem a ver com o estabelecimento do prestador. Como exemplo elucidativo, cita-se o caso de uma empresa de consultoria sediada num certo município que pode ser contratada para prestar serviços em outros municípios, para o qual se dirigem os seus consultores e prestam o serviço no estabelecimento do tomador. Ainda que a nota fiscal seja emitida pela fazenda local em que se firmou o contrato, tal fato seria irrelevante em função do verdadeiro lugar onde o serviço foi prestado.
Nesses casos polêmicos, socorre-se da jurisprudência para solucionar o impasse, sendo assim, há decisões jurisprudenciais que disciplinam o recolhimento do ISSQN para que ocorra na cidade em que existe o núcleo do serviço, qual seja o local da atividade fim da empresa. Outrossim, o Superior Tribunal de Justiça, analisando recurso sobre a liberação de contratos de leasing firmados por instituição financeira com mais de um consumidor, firmou jurisprudência no sentido de que após a edição da LC 116/03, o ISSQN deveria ser cobrado no município em que efetivamente foi prestado o serviço.
Nesse contexto, no julgamento do Recurso Repetitivo (Temas 354 e 355) – REsp 1060210/SC, no STJ, de relatoria da lavra do Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, consta que o local da prestação é aquele em que o serviço é perfectibilizado, qual seja o local em que existe unidade econômica ou profissional do prestador no Município, admitido como sendo onde ocorre o fato gerador tributário, então ali deve-se recolher o tributo. Destaca-se ementa do referido:
“TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL FINANCEIRO. ART. 3o. DA LC 116/03: O MUNICÍPIO COMPETENTE PARA EXIGIR O ISS, A PARTIR DA LC 116/03, É AQUELE ONDE O SERVIÇO É EFETIVAMENTE PRESTADO, ONDE É PERFECTIBILIZADA A RELAÇÃO, ASSIM ENTENDIDO O LOCAL ONDE SE COMPROVE HAVER UNIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA COM PODERES DECISÓRIOS SUFICIENTES À CONCESSÃO E APROVAÇÃO DO FINANCIAMENTO - NÚCLEO DA OPERAÇÃO DE LEASING FINANCEIRO E FATO GERADOR DO TRIBUTO.4
RESP 1.060.210/SC, REL. MIN. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJE 5.3.2013, REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AGRAVO REGIMENTAL DO MUNICÍPIO DE CANOAS/RS DESPROVIDO. 1. Sobre a competência para a cobrança do ISS em questão, esta egrégia Corte Superior assentou o entendimento de que o Município competente para exigir referido imposto, a partir da LC 116/03, é aquele onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional da instituição financeira com poderes decisórios suficientes à concessão e aprovação do financiamento - núcleo da operação de leasing financeiro e fato gerador do tributo (REsp. 1.060.210/SC, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 5.3.2013). (grifei) 2. Agravo Regimental da Municipalidade desprovido. (STJ – AgRg no AgRg no REsp: 974767 RS 2006/0248560-5, Relator: Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Data de Julgamento: 21/03/2017, 1ª turma, Data de publicação: Dje 31/03/2017)”
Com efeito, sabe-se que o definido nesse julgamento cabe restritamente a casos semelhantes ao caso concreto enfrentado. Todavia, é possível entender o novo significado essencial do julgado exposto, qual seja o de que o ISSQN deve ser cobrado no local em que a relação efetivamente se perfectibiliza, onde o fato gerador acontece, já que nesse ocorre a prestação do serviço.
Ademais, em outra oportunidade, o STJ restou claro que essa é a nova orientação a ser adotada pela Corte, inclusive o recurso foi analisado também sob o rito dos recursos repetitivos, que serve de base como orientação na discussão da mesma matéria em outras instâncias. Por isso, confirma-se que ficou estabelecida a orientação não apenas para as hipóteses de leasing, assunto tratado no caso concreto do processo, mas também para qualquer espécie de serviço submetido à incidência do ISSQN. Destaca-se o referido precedente:
“TRIBUTÁRIO. ISS. LEI COMPLEMENTAR 116/2003. SERVIÇO DE INFORMÁTICA. COMPETÊNCIA PARA COBRANÇA. FATO GERADOR. MUNICÍPIO EM QUE O SERVIÇO É EFETIVAMENTE PRESTADO.
1. Cinge-se a controvérsia à competência para exigir o ISS incidente sobre serviços na área de informática.
2. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.060.210/SC, submetido à sistemática do art. 543-C do CPC/1973, fixou o entendimento de que a competência tributária ativa para a cobrança do ISSQN, no sistema da Lei Complementar 116/2003, recai, em regra, sobre o Município em que é efetivamente realizado o serviço, e não sobre aquele em que formalmente estabelecida a sede da prestadora, ocorrendo o inverso na vigência do Decreto-Lei 406/1968. (grifei)
3. No julgamento do mencionado Recurso Especial, foram estabelecidas as seguintes premissas: a) o sujeito ativo da relação tributária, na vigência do DL 406/1968, é o Município da sede do estabelecimento prestador (art. 12); e b) o sujeito ativo da relação tributária, a partir da LC 116/2003, é o Município onde o serviço é efetivamente prestado, onde a relação é perfectibilizada, assim entendido o local onde se comprove haver unidade econômica ou profissional da entidade prestadora. (grifei)
4. A nova orientação ficou estabelecida não apenas para as hipóteses de leasing, mas também para qualquer espécie de serviço submetido à incidência do ISS. Nesse sentido: AgRg no AREsp 466.825/MG, Rel. Ministro Olindo Menezes (Desembargador convocado do TRF 1ª Região), Primeira Turma, DJe 4.2.2016; AgInt no REsp 1.502.963/SC, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 12.5.2016; AgRg no REsp nº 1.390.900/MG, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 20.5.2014. (grifei)
5. Agravo Interno provido. (AgInt no AREsp 912524/BA, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, DJe 18/04/2017) STJ. EDcl no REsp 1380710/SC, rel. Ministro Og Fernandes. Julgado em 3/4/2014. DJe 9/4/2014 (entendimento expresso no voto, que é posterior ao recurso repetitivo analisado).”
Diante disso, percebe-se que o STJ, no caso em referência, fixou o local do estabelecimento do tomador como sendo o local da prestação principal na situação em que o local é diverso do estabelecimento da prestadora de serviços de informática. Com isso, estendeu-se o conceito de unidade econômica para além da sede da empresa prestadora, considerando também o estabelecimento do tomador de serviços. Isso ocorreu devido a incidência do princípio da territorialidade na interpretação para aplicação do art. 3º da LC 116/03 no caso concreto, e assim passa a ser considerado que o ISSQN deve ser cobrado no local em que ocorreu o fato gerador, e não mais no município em que se encontra o estabelecimento prestador, sendo assim, conforme detalhada análise de entendimento dos precedentes, conclui-se como sendo uma tendência de parâmetro a ser admitido em lides futuras.
Nesse sentido, também pode-se encontrar precedente no qual há definição do local do domicílio do prestador do serviço em situações concretas nas quais se verifica ausência de estabelecimento do prestador. O caso mencionado a seguir não trata especificamente acerca do ISSQN sobre aplicativo de transporte, porém pode ser mais um exemplo que evidencia uma tendência a ser seguida pela Corte Superior em futuras demandas sobre a questão tratada, adotando a lógica na qual o imposto somente será devido no domicílio do prestador se no local onde o serviço for prestado não houver estabelecimento do prestador (sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação). Vale destacar:
“TRIBUTÁRIO. ISS. SUJEITO ATIVO. LC 116/2003. AUSÊNCIA DE ESTABELECIMENTO PRESTADOR. MERO DESLOCAMENTO DE MÃO DE OBRA. LOCAL DO DOMICÍLIO DO CONTRIBUINTE. 1. Tendo em vista os efeitos infringentes pretendidos pela parte, os Embargos de Declaração podem ser processados como Agravo Regimental. Aplicação do princípio da fungibilidade recursal. 2. No julgamento do REsp 1.117.121/SP, submetido ao regime do art. 543-C do CPC, o STJ definiu o sujeito ativo do ISS incidente sobre serviço prestado na vigência da LC 116/2003 (arts. 3º e 4º), nos seguintes termos: 1º) como regra geral, o imposto é devido no local do estabelecimento prestador - compreendendo-se como tal o local onde a empresa que é o contribuinte desenvolve a atividade de prestar serviços, de modo permanente ou temporário - que se configure unidade econômica ou profissional, sendo irrelevantes para caracterizá-lo as denominações de sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação, contato ou quaisquer outras que venham a ser utilizadas; 2º) na falta de estabelecimento do prestador, no local do domicílio do prestador. Assim, o imposto somente será devido no domicílio do prestador se no local onde o serviço for prestado não houver estabelecimento do prestador (sede, filial, agência, posto de atendimento, sucursal, escritório de representação); 3º) nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, acima transcritos, mesmo que não haja local do estabelecimento prestador, ou local do domicílio do prestador, o imposto será devido nos locais indicados nas regras de exceção. 3. O simples deslocamento de recursos humanos (mão de obra) e materiais (equipamentos) para a prestação de serviços não impõe sujeição ativa à municipalidade de destino para a cobrança do tributo (AgRg no AREsp 299.489/MS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 18.6.2014). 4. In casu, não se pode afirmar que a mera realização de atividade na sede do contratante, equivalha a um estabelecimento prestador, razão pela qual compete ao Município de Belo Horizonte - local do domicílio do prestador - a cobrança do ISS. 5. Agravo Regimental não provido.? (EDcl no AgRg nos EDcl no REsp 1298917/MG, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, DJe 06/04/2015) (grifei)”
Dessa maneira, vislumbra-se que acerca da análise restaram duas perspectivas, a primeira, na qual os Municípios onde existem estabelecimentos (sede ou escritórios de apoio), admitida como sendo uma unidade profissional, neles o ISSQN da empresa será tributado em relação aos serviços ali prestados, conforme relação dos motoristas cadastrados no Município, o que poderá ser fornecido pela empresa, por estar inscrita no Município, se for o caso, podendo ser intimada a informar. E a segunda, o que estava prevalecendo no caso em questão, nos demais municípios em que não existem sede ou escritórios de apoio, e assim, o ISSQN da empresa passa a ser tributado no Município de São Paulo, onde se encontra a sede da empresa e, portanto, o local em que as operações são registradas e processadas.[1]
De certo, o Município em que houver serviços de transporte intermediado pela plataforma UBER sem o estabelecimento (escritório local ou sede) terá que efetuar diligências externas para contabilizar os sujeitos passivos do imposto devido. Com isso, essa fiscalização se dará junto aos motoristas que atuam por meio do aplicativo, e em muitos locais, devido ao exigido por lei municipal, aos que já possuem cadastro junto a fazenda local para atuar, confrontando com esses dados a empresa de tecnologia para que haja a cobrança do devido recolhimento local, para tanto, a fazenda municipal poderá utilizar recursos tecnológicos a fim de facilitar essa tarefa arrecadatória.
Consoante exposto, isso foi feito na cidade de Juazeiro do Norte, no Ceará, que regulamentou a matéria de modo que impôs a realização do cadastro dos motoristas junto à prefeitura, para que munidos desses dados possa cobrar o ISSQN devido pelos usuários motoristas, como também pela empresa. Frise-se que esse município localizado no interior cearense, possui população de 274.207 habitantes em 2019, estimada pelo IBGE, e conforme apontado em notícia extraída do jornal Diário do Nordeste, conta com número significativo de motoristas cadastrados em aplicativos de transporte.
Há de se considerar que temos um panorama no qual cada vez mais municípios estão adotando legislações próprias a fim de garantir o devido recolhimento do ISSQN e evitando a concentração da tributação em apenas um ou em poucos municípios onde há sede ou escritório da empresa. Tal concentração não se verifica justa, já que a plataforma online alcança muitos motoristas que, na maioria dos casos, prestam os serviços de transporte apenas nas cidades na qual residem.
Com efeito, devido a essa nova e vigente possibilidade de regulamentação por parte dos governos municipais, há discussões sobre eventual fomento à disputa fiscal entre municípios, visto que, conforme já comentado, se evidencia a guerra fiscal como realidade no país, todavia isso não pode prevalecer como argumento que sustente a concretização de situações de injustiça fiscal, além de constituir verdadeiro entrave motivando ou justificando o descumprimento de leis nacionais e municipais, bem como jurisprudência dos Tribunais pátrios.
De fato, admite-se que a questão ainda demandará esforços legislativos no intuito de promover melhores condições acerca da conformidade e adequação legal dos serviços de transporte por meio de aplicativos. Sendo assim, sublinha-se o projeto de lei n. 390/2017 de autoria do senador Pedro Chaves (PRB-MS), que tramita no Senado Federal, com o intuito de modificar as regras para a distribuição do tributo cobrado sobre o transporte efetuado por meio de aplicativos. De acordo com a proposta, o ISSQN deve ficar com município onde o passageiro iniciou a viagem, de modo que, caso seja esse projeto de lei aprovado, não haverá mais dúvidas em relação ao caso comentado.
Em contrapartida ao que vem ocorrendo na prática atual em que o ISSQN é repassado para a cidade onde o motorista está registrado, o autor do mencionado projeto PLS 390/2017 defende que o motorista de um serviço de aplicativo pode pegar um passageiro em uma cidade e transportá-lo a outra. Dessa feita, argumenta que como o motorista não tem obrigação de retornar sem passageiros ao município de origem do transporte, conforme o proposto, o motorista poderá assumir novas corridas em cidades diferentes daquela onde está registrado.
Diante do exposto, vislumbra-se que a questão está distante do alcance de uma solução consensual, já que além dos significativos e divergentes posicionamentos de estudiosos sobre o assunto, há também divergentes opiniões políticas sobre essa temática da incidência e cobrança acerca da tributação do ISSQN sobre o serviço de transporte prestado por meio de aplicativos. Dessa forma, evidencia-se que ainda serão necessários debates a respeito dessa problemática, que demandará maiores esforços legislativos e, também muita discussão na tomada de decisões por parte dos tribunais pátrios, de maneira a promover soluções adequadas as partes envolvidas nesse caso bastante polêmico e atual.
Conclusão
No presente estudo, pretendeu-se apresentar os aspectos principais sobre a recente polêmica acerca da incidência do ISSQN sobre o serviço intermediado por meio de aplicativos de transporte, com foco principal no aplicativo UBER. Bem como, foram esclarecidos de forma sucinta como esse aplicativo, verdadeiro expoente da tecnologia moderna, funciona e quais os impactos no âmbito do direito tributário pátrio diante da arrecadação e cobrança do imposto em questão.
A partir disso, o conceito do ISSQN foi explicado, com abordagem simples e direta visando a registrar considerações de fácil entendimento, bem como apontando a adequação da incidência do referido nessa nova modalidade de serviço. Consequentemente, apresentou-se os dilemas sobre a devida legalidade e pertinência da cobrança por parte dos municípios, ainda que não possuam sede ou escritório da empresa UBER, tendo em vista que o número de usuários do aplicativo cresce a cada dia no país, enquanto isso apenas havia alguns municípios concentrando o recolhimento do tributo em questão.
Dessa forma, a discussão foi resumida de modo que se pontuou posição majoritária a favor da continuidade do recolhimento do ISSQN devido nos municípios onde se localizam a sede ou escritório de apoio da empresa UBER, no intuito de não agravar ainda mais a quase inevitável guerra fiscal no país. Como também, enfatizou-se que os municípios brasileiros, a cada dia mais, regulamentam por meio de legislação própria o serviço e a cobrança do imposto devido pela fazenda local almejando participar dessa arrecadação anteriormente concentrada, o que se entende como medida adequada conforme justiça fiscal.
Em vista disso, ainda persistem discussões sobre a matéria que está longe de consenso e reclama maiores reflexões, sendo muito provável que, no futuro próximo, as Cortes Superiores enfrentem lides que buscam definitividade sobre o adequado local para o recolhimento do ISSQN na hipótese de serviço analisada nesse trabalho. Sendo assim, apesar das decisões jurisprudenciais neste apontadas, será preciso que ocorra a pacificação da matéria com a consolidação a respeito do recolhimento na situação em questão, visto que há possibilidade de entendimentos diversos se cada tribunal estadual analisar a questão, o que pode gerar jurisprudência confusa e diversificada, indo na contramão da promoção de segurança jurídica.
O que se espera é que, enquanto sociedade constituída sob o Estado de Direito e regida pelos princípios da Carta Cidadã de 1988, sejamos capazes de vencer tais questões, após reflexões devidas que o caso reclama e sem frear a arrecadação de serviços permitida em leis nacionais e locais, que estão sendo concretizados de forma moderna e representam resultado dos movimentos contínuos de mudança e inovação benéficos para a sociedade. Portanto, persiste o entendimento de que existe a urgência sobre a forma de encarar alternativas acerca de problemas advindos da possibilidade de tributação das modernas modalidades de prestação de serviços realizadas por meio de inovações tecnológicas que surgem a cada dia, de modo que sejam produzidas soluções eficazes e justas para esses desafios alcançados pelo Direito Tributário Brasileiro.
Referências Bibliográficas
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[1] TAUIL, A. ROBERTO. O ISS dos aplicativos eletrônicos de transporte – O Caso UBER. Consultor Municipal, 2019. Disponível em: http://consultormunicipal.adv.br/artigo/tributos-municipais/05-12-2019-o-iss-dos-aplicativos-eletronicos-de-transporte-o-caso-uber . Acesso em: 18/08/2020.
Bacharel em Direito pela Universidade Regional do Cariri-URCA. Especialista em Direito Penal e Criminologia (URCA), Direito Tributário e Direito Administrativo e Gestão Pública (UNIAMERICA).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARRETO, Keline Cajueiro Campos. Breves considerações acerca da incidência do ISSQN sobre o serviço de transporte realizado por meio do aplicativo UBER Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 jan 2022, 04:55. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58015/breves-consideraes-acerca-da-incidncia-do-issqn-sobre-o-servio-de-transporte-realizado-por-meio-do-aplicativo-uber. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: Roberto Rodrigues de Morais
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