Resumo: O presente artigo tem por escopo o estudo da justiça restaurativa e seu potencial de transformação, observados os princípios e os valores que a norteiam. Será utilizada, como pano de fundo, a discussão sobre a crise punitiva retributiva e preventiva, na busca de alternativas eficientes ao enfrentamento da criminalidade e da insegurança que afligem a sociedade do século XXI. Em que pese os avanços da justiça restaurativa, há desafios a serem enfrentados, com ênfase na participação das vítimas, da comunidade e na reparação dos danos. É fundamental que a justiça restaurativa seja inserida no ordenamento jurídico para assumir seu papel de potência transformadora de um sistema punitivo em crise, de maneira a integrar a restauração do dano causado pela violação do bem jurídico tutelado, observados os princípios e os valores que a norteiam, sem com isso impedir a intervenção estatal nos casos legalmente previstos.
Palavras-chave: Justiça restaurativa; Crise punitiva; Transformação punitiva; Alternativas penais; Reparação de danos.
Abstract: This article aims to study restorative justice and its potential for transformation, observing the principles and values that guide it. The punitive, retributive and preventive crisis will be used as a background, in the search for efficient alternatives to face crime and insecurity that afflict society in the 21st century. Despite the advances in restorative justice, there are challenges to be faced, with an emphasis on the participation of victims, the community and the repair of damages. It is essential that restorative justice be inserted in the legal system to assume its role as a transformation potential of a punitive system in crisis, in order to integrate the restoration of the damage caused by the violation of the protected legal good, observing the principles and values that guide it, without thereby preventing state intervention in cases legally provided for.
Keywords: Restorative justice; Punitive crises; Punitive transformation; Penal alternatives; Damage reparation.
Sumário: 1. Introdução. 2. Considerações gerais sobre as finalidades das penas. 3. A crise do paradigma punitivo no Brasil. 4. Justiça Restaurativa. 4.1 Breve esboço histórico. 4.2 Conceito de Justiça Restaurativa. 4.3 A teoria das lentes de Howard Zehr. 4.4 Algumas práticas e metodologias restaurativas. 4.4.1 Programa de reconciliação vítima-infrator. 4.4.2 Conferência restaurativa. 4.4.3 Círculos de Paz. 4.5 A situação da Justiça Restaurativa no Brasil. 5. Conclusão. 6. Referências.
1 Introdução
O presente artigo tem por objeto o estudo da justiça restaurativa e seu potencial transformador, observados os princípios e os valores que a norteiam. Será utilizada, como pano de fundo da discussão proposta, a crise do paradigma punitivo retributivo e preventivo, na busca de alternativas eficientes para o enfrentamento da criminalidade e da insegurança que afligem a sociedade do século XXI.
O direito social à segurança está previsto no artigo 6º da Constituição Federal de 1988[1]; a segurança pública enquanto dever do Estado, no seu artigo 144[2]. Por outro lado, o art. 4º, VII, da Carta de 1988 estabelece que a República Federativa do Brasil é regida nas suas relações internacionais pela solução pacífica dos conflitos, disposição essa que também deve ser aplicada ao âmbito interno e ao âmbito penal, nos limites fixados pelo ordenamento jurídico.
O estudo utiliza em sua metodologia de pesquisa os métodos dedutivo e descritivo-argumentativo, além da técnica de pesquisa bibliográfica, por meio do levantamento de fontes legislativas, doutrinárias e relatórios de pesquisa.
Na seção 2, são tecidas considerações gerais sobre as finalidades das penas, abordando brevemente as disposições constitucionais acerca das penas proibidas, a evolução histórica das penas corporais, as teorias tradicionais sobre as funções das penas e a teoria adotada pela legislação penal brasileira.
Na seção 3, o estudo aborda a crise do paradigma punitivo no Brasil, enfatizando as elevadas taxas de encarceramento, que colocaram o país em 3º lugar dentre os países com maior população carcerária do mundo, e as diretrizes das Nações Unidas, já incorporadas ao direito positivo de alguns países ocidentais, no sentido de que somente deve haver privação da liberdade nos crimes mais graves, quando não for possível aplicar nenhuma outra medida menos gravosa. Assim, as medidas alternativas ao cárcere implementadas no Brasil foram insuficientes para conter a criminalidade ou atender às finalidades da pena, o que determina a reflexão sobre o sistema penal do século XXI.
Na seção 4, o estudo traz um breve esboço histórico da justiça restaurativa, algumas concepções apresentadas por doutrinadores e pesquisadores sobre seu conceito, que ainda está em desenvolvimento, o referencial teórico básico de Howard Zehr, considerado autoridade mundial no restaurativismo, inclusive no Brasil, algumas práticas e metodologias restaurativas e a situação atual da Justiça Restaurativa no Brasil. Nesse contexto, foram descritos o marco normativo brasileiro de justiça restaurativa consistente na Resolução n. 225/2016, do Conselho Nacional de Justiça, seus princípios e algumas conclusões da pesquisa Pilotando a Justiça Restaurativa – O Papel do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça, que trouxeram uma visão panorâmica da justiça restaurativa no Brasil.
Espera-se, dessa forma, proporcionar a visão de conjunto da crise envolvendo os sistemas retributivo e preventivo das penas e das alternativas propostas pela justiça restaurativa, no sentido de construir soluções para incrementar a eficiência da resposta penal, sobretudo, considerando a necessidade de reparar os danos causados às vítimas. A ênfase da pesquisa é demonstrar a importância da inserção da justiça restaurativa no ordenamento jurídico brasileiro como instrumento de integração ao sistema penal, sem com isso impedir a intervenção estatal nos casos legalmente previstos.
2 Considerações gerais sobre as finalidades das penas
A prática de uma infração penal tem como consequência a imposição pelo Estado de uma pena que consiste no exercício do jus puniendi estatal.
O Estado Democrático de Direito tem como um de seus fundamentos o princípio da dignidade da pessoa humana (artigo 1º da Constituição Federal de 1988). Em razão disso, malgrado o Estado tenha o dever/poder de aplicar a pena àquele que infringiu o ordenamento jurídico-penal, ela deve ser ministrada em consonância com os princípios expressos ou implícitos na Constituição Federal.
Assim, nos termos do artigo 5º, XLVII, da Carta de 1988, não haverá: a) penas de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX, da Constituição Federal; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento e; d) cruéis.
Historicamente, ao menos até o século XVIII, as penas consistiam em severos castigos corporais, conforme se vê abaixo:
A história das penas é, sem dúvida, mais horrenda e infamante para a humanidade do que a própria história dos delitos: porque mais cruéis e talvez mais numerosas do que as violências produzidas pelos delitos têm sido as produzidas pelas penas e porque, enquanto o delito costuma ser uma violência ocasional e às vezes impulsiva e necessária, a violência imposta por meio da pena é sempre programada, consciente, organizada por muitos contra um[3].
Com o do decorrer do tempo e das transformações dele advindas, pelo menos nos países ocidentais, vários diplomas visando preservar a dignidade humana trataram de afastar dos ordenamentos jurídicos as penas degradantes e cruéis.
Citemos a Organização das Nações Unidas (ONU), em 1945, logo após o fim da Segunda Guerra Mundial, e a Declaração Universal dos Direitos Humanos, aprovada pela Assembleia-Geral das Nações Unidas, em 1948.
No entanto, para a aplicação da sanção, o sistema penal formulou teorias que a legitimaram, como uma manifestação racionalmente planejada do poder, e não como uma manifestação de violência arbitrária.
A fim de justificar a atuação coercitiva extrema, as teorias tradicionais outorgaram ao direito penal a coerência interna necessária, mas muito ainda se discute sobre as funções das penas.
As teorias absolutas sustentam a tese da retribuição, enquanto as teorias relativas sustentam a tese da prevenção.
São teorias absolutas todas aquelas doutrinas que concebem a pena como um fim em si própria, ou seja, como “castigo”, “reação”, “reparação” ou, ainda, “retribuição” do crime, justificada por seu intrínseco valor axiológico, vale dizer, não um meio, e tampouco um custo, mas, sim, um dever ser metajurídico que possui em si seu próprio fundamento. São, ao contrário “relativas” todas as doutrinas utilitaristas, que consideram e justificam a pena enquanto meio para a realização do fim utilitário da prevenção de futuros delitos[4].
O caráter retributivo da pena, segundo a teoria absoluta, consiste na reprovação. Enxerga na pena tão-somente um mal imposto ao infrator do ordenamento jurídico, ou seja, um castigo aplicado a quem cometeu alguma conduta entendida como delituosa, e tem como base um sentimento social de justiça.
Como um de seus defensores, Emmanuel Kant sustentava ser a retribuição a única finalidade da pena, sendo que sua aplicação impunha-se ao Estado como um imperativo categórico. Nesse sentido, afirmou Kant que “o malfeitor deve ser julgado digno de punição antes que se tenha pensado em extrair de sua pena alguma utilidade para ele ou para seus concidadãos”[5].
É certo que a concepção totalmente retributiva do direito penal traz em si um problema que dificulta sua formulação lógica, consistente em encontrar correspondência quantitativa entre dois elementos heterogêneos: o mal da pena para o mal do crime.
A teoria relativa ou preventiva, em contrapartida, objetivou conferir à pena uma real finalidade. Assim, em oposição à teoria meramente retributiva, enxergou na pena um caráter orientado para o futuro, de modo a evitar, dessa forma, a reiteração criminosa.
A teoria preventiva se divide em prevenção especial negativa e positiva, e em prevenção geral negativa e positiva.
A prevenção especial tem intrínseca relação entre o agir do Estado e a pessoa do delinquente, enquanto a prevenção geral tem intrínseca relação com a coletividade, tendo em vista a influência que a aplicação da pena exerce sobre a sociedade. A prevenção especial negativa diz respeito ao fato de existir uma neutralização, decorrente da exclusão da sociedade, do indivíduo que praticou a infração penal, que acontece com seu encarceramento, de modo a impedi-lo de cometer novos delitos. Já a prevenção especial positiva, por seu turno, visa evitar a reincidência, trazendo a ideia da ressocialização da pena, por meio da reflexão do agente sobre o delito, de forma a permitir seu retorno ao convívio social com um comportamento conforme o direito.
A prevenção geral negativa ou prevenção por intimidação, por sua vez, relaciona a aplicação da pena a um indivíduo como exemplo, reverberando sobre toda a sociedade e incitando os demais integrantes da coletividade a se comportarem de acordo com o direito.
A prevenção geral positiva ou prevenção integradora implica na reafirmação do ordenamento jurídico perante todos os membros da coletividade, de maneira que a aplicação da pena é necessária para afirmar a vigência da norma violada, ratificando a obrigatoriedade do respeito às normas e promovendo a integração social. As teorias mistas ou ecléticas, por fim, atribuem à pena tanto o caráter retributivo quanto preventivo geral e especial.
Ao analisarmos o artigo 59 do Código Penal, concluímos que a lei brasileira adotou a teoria mista, ao dispor que o juiz estabelecerá a pena conforme seja necessária e suficiente para reprovar e prevenir o crime.
3 A crise do paradigma punitivo no Brasil
Originariamente a pena privativa de liberdade foi criada como pena principal, como alternativa mais humana aos castigos corporais, posto que as penas tinham uma natureza aflitiva, visto que o corpo do infrator recebia horrendas punições, a exemplo da tortura, do açoite, da crucificação e do esquartejamento.
Anos depois da implementação das prisões, o escopo original, que consistia em atender às necessidades sociais de punição, proteção e ressocialização dos condenados, perdeu seu objeto, na medida em que as prisões se transformaram em depósitos de seres humanos, instalando-se uma verdadeira crise nas teorias da pena. Trata-se de situação decorrente da inegável ineficiência do Estado em garantir a segurança pública, mesmo diante do elevado número de encarceramentos.
Atualmente, o Brasil está em 3º lugar dentre os países com maior população carcerária do mundo em termos absolutos. Segundo dados divulgados pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2020, de 744.216 presos no país (2018), passou-se para 755.274 (2019), o que representa uma taxa de 359,4 presos por 100 mil habitantes; dentre eles, 261.017 eram presos provisórios em 2018 e em 2019 eram 229.823[6].
Entre 2018 e 2019, houve uma estabilização da população carcerária, mas o Brasil continua sendo um país com taxas altíssimas de superlotação carcerária com déficit de vagas e condições precárias de encarceramento. Em 2019, 305.660 presos não possuíam vagas adequadas ao sistema, refletindo um quadro pior que o do ano anterior, cujo déficit era de 270.449[7].
Não se olvida o aumento da criminalidade, sobretudo da criminalidade organizada, além da maior capacitação das forças de segurança pública, mas o excessivo número de prisões cautelares demonstra que essa modalidade não tem sido utilizada conforme a função estabelecida pela lei.
Diante dessas constatações, sobretudo das críticas ao modelo sistemático de encarceramento e de seus efeitos maléficos, houve uma tendência mundial à adoção de alternativas penais.
Em 1990, foi realizado o Congresso das Nações Unidas sobre Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente, que resultou na elaboração das Regras das Nações Unidas sobre Medidas Não Privativas de Liberdade, conhecidas internacionalmente como Regras de Tóquio. Suas diretrizes são fruto de um “processo histórico de crítica, estudos e discussões (Gênova, 1955; Londres, 1960; Kioto, 1970; Estocolmo, 1975; Caracas, 1980; Milão, 1985; e Havana, 1990)”[8].
Estamos diante, portanto, de diretrizes das Organizações das Nações Unidas (ONU) que já foram incorporadas ao direito positivo de alguns países ocidentais quanto ao direcionamento de que somente deve haver a privação cautelar da liberdade nos casos mais graves, quando não for possível aplicar nenhuma outra medida menos gravosa.
Como alternativas penais, na legislação brasileira, citamos a Lei dos Juizados Especiais Criminais (Lei n. 9.099/1995), que definiu as infrações de menor potencial ofensivo e criou institutos despenalizadores; as penas alternativas incorporadas ao Código Penal (prestação pecuniária, perda de bens e valores; prestação de serviços à comunidade; interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana – art. 43, do Código Penal); os acordos de colaboração premiada com confissão (Lei n. 12.850/2013) e, mais recentemente, os acordos de não persecução penal introduzidos pela Lei n. 13.964/2019 (Pacote Anticrime), previstos no artigo 28-A, do Código de Processo Penal.
Nada obstante, as alternativas penais brasileiras foram insuficientes para conter a criminalidade ou atender às finalidades retributiva e preventiva do crime.
As populações carcerárias continuam a crescer ao mesmo tempo em que as “alternativas” também crescem, aumentando o número de pessoas sob o controle e supervisão do Estado. A rede de controle e intervenção se ampliou, aprofundou e estendeu, mas sem efeito perceptível sobre o crime e sem atender às necessidades essenciais da vítima e ofensor[9].
Do exposto, é imperioso repensar o sistema penal do século XXI, visto que todas as iniciativas levadas a efeito não foram suficientes para refrear a criminalidade e seus deletérios efeitos a vítimas e infratores.
4. A Justiça Restaurativa
Analisaremos a seguir a justiça restaurativa, a partir de um breve esboço histórico, para, posteriormente, aprofundarmos o estudo sobre seu conceito, referencial teórico, práticas e metodologias restaurativas, incluindo sua atual situação no Brasil.
4.1 Breve esboço histórico
Atribui-se ao psicólogo Albert Eglash, em 1958, o uso da expressão Restorative Justice ou Justiça Restaurativa nos textos em que sugeria a existência de três tipos de justiça criminal: a justiça retributiva, baseada na punição; a justiça distributiva, baseada no tratamento terapêutico dos infratores, e a justiça restaurativa, baseada na restauração/reparação[10]. Albert Eglash pontuou que tanto o sistema retributivo quanto o sistema distributivo focavam nas ações dos infratores, negavam a participação da vítima, enquanto o infrator participava de maneira passiva. Em contrapartida, a justiça restaurativa focava nas consequências da ação do infrator e envolvia ativamente a vítima e o infrator no processo restaurativo[11].
A crise do paradigma retributivo da pena privativa de liberdade experimentada nas décadas de 1960 e 1970 nos Estados Unidos propiciou o surgimento das ideias de restituição e de reconciliação. Foram criadas duas propostas político-criminais, o retribucionismo renovado e o movimento reparador, que focavam na vítima da infração[12].
No entanto, foi a partir da segunda metade do século XX, que os países anglo-saxônicos comandaram a expansão da justiça restaurativa, tendo como norte a experiência das comunidades Maoris da Nova Zelândia[13]. Assim, o tema justiça restaurativa, de inspiração teórica anglo-saxônica, se desenvolveu e se expandiu na década de 1990 e irrompeu nos Estados Unidos, posteriormente difundido no continente europeu como movimento social emergente para as reformas da justiça criminal.
Muitos valores, processos e práticas da justiça restaurativa, que serão abordados mais adiante, eram desenvolvidos por comunidades do Oriente e do Ocidente, por meio da justiça comunitária, antes mesmo de ser denominada justiça restaurativa, sem a existência de técnicas judiciais ou de aparatos legais[14].
Howard Zehr é reconhecido mundialmente como um dos pioneiros da justiça restaurativa porque a concebeu como uma tentativa de olhar o crime e a justiça através de novas lentes, na tentativa de desenvolver novas abordagens e intervenções. Em sua obra Changing lenses: a new focus for crime and justice, em 1990, criticou o sistema de justiça criminal e consolidou sua teoria em artigos, discursos, livros e ensinamentos. Outros autores contribuíram para o desenvolvimento da justiça restaurativa, dentre eles, Martin Wrigth´s com a obra Justice for Victims and Offenders, de 1991; Virginia Mackey, por meio do Dicussion Papper sobre justiça restaurativa para o programa de justiça criminal da Igreja Presbiteriana em 1992 e, no mesmo ano, Wesley Cragg’s, com The Practice of Punishment. Braithwaite foi aclamado como o principal acadêmico da área, em 1989, ao tratar das teorias relativas à causa e à consequência do crime em Crime, Shame and Reintegration, além de Van Ness e Ashworth, em 1993, com seus escritos publicados na revista Criminal Law Forum[15].
A Resolução n. 12/2002, do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, tratou dos princípios básicos para a utilização de programas de justiça restaurativa em matéria criminal. Delimitou princípios e valores basilares como forma de recomendar aos Estados-partes a aplicação da justiça restaurativa em procedimentos criminais.
A justiça restaurativa, inclusive, possui princípios básicos oficiais enunciados na Resolução do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, de 13 de agosto de 2002, conforme a seguir enumerados:
1. Programa Restaurativo – se entende qualquer programa que utilize processos restaurativos voltados para resultados restaurativos.
2. Processo Restaurativo – significa que a vítima e o infrator, e, quando apropriado, outras pessoas ou membros da comunidade afetados pelo crime, participam coletiva e ativamente na resolução dos problemas causados pelo crime, geralmente com a ajuda de um facilitador. O processo restaurativo abrange mediação, conciliação, audiências e círculos de sentença.
3. Resultado Restaurativo – significa um acordo alcançado devido a um processo restaurativo, incluindo responsabilidades e programas, tais como reparação, restituição, prestação de serviços comunitários, objetivando suprir as necessidades individuais e coletivas das partes e logrando a reintegração da vítima e do infrator[16].
4.2 Conceito de Justiça Restaurativa
Inexiste um conceito definido de justiça restaurativa, visto que sua concepção ainda se encontra em processo de desenvolvimento.
Segundo Renato Sócrates Gomes Pinto:
A Justiça Restaurativa baseia-se num procedimento de consenso, em que a vítima e o infrator, e, quando apropriado, outras pessoas ou membros da comunidade afetados pelo crime, como sujeitos centrais, participam coletiva e ativamente na construção de soluções para a cura das feridas, dos traumas e perdas causados pelo crime.
Trata-se de um processo estritamente voluntário, relativamente informal, a ter lugar preferencialmente em espaços comunitários, sem o peso e o ritual solene da arquitetura do cenário judiciário, intervindo um ou mais mediadores ou facilitadores, e podendo ser utilizadas técnicas de mediação, conciliação e transação para se alcançar o resultado restaurativo, ou seja, um acordo objetivando suprir as necessidades individuais e coletivas das partes e se lograr a reintegração social da vítima e do infrator[17].
Sob o aspecto criminológico, podemos afirmar que o modelo restaurativo pode ser visto como uma síntese dialética, na medida em que, sem afetar os direitos e as garantias constitucionais, a busca da ressocialização dos infratores e a reparação das vítimas têm, potencialmente, condições de tornar o sistema mais eficiente, o que consiste num reclamo da sociedade.
Entretanto, alguns doutrinadores e pesquisadores apresentam concepções diversas sobre o tema. Para Tony Marshall, “a justiça restaurativa é um processo através do qual todas as partes interessadas em um crime específico se reúnem para solucionar coletivamente como lidar com o resultado do crime e suas implicações para o futuro”[18]. Já Howard Zehr descreve:
A justiça restaurativa...1. tem foco nos danos e consequentes necessidades (da vítima, mas também da comunidade e do ofensor). 2. Trata das obrigações resultantes desses danos (obrigações do ofensor mas também da comunidade e da sociedade). 3.Utiliza processos inclusivos e cooperativos. 4. Envolve todos os que têm um interesse na situação (vítimas, ofensores, a comunidade, a sociedade). 5. Busca corrigir os males[19].
Paul Maccold e Ted Wachtel formularam uma teoria conceitual de justiça que buscou levar em conta os fatores emocionais e sociais suportados pelas vítimas, que são desconsiderados pela simples punição. Assim, sustentam que as vítimas precisam restaurar o trauma emocional, os sentimentos e os relacionamentos positivos, cujos resultados podem ser alcançados pela justiça restaurativa, que visa com mais ênfase diminuir o impacto dos crimes sobre os cidadãos, em detrimento da própria criminalidade.
Em sua teoria conceitual, Paul Maccold e Ted Wachtel acenam com três indagações fundamentais: a) quem foi prejudicado? b) quais as suas necessidades? c) como atender a essas necessidades? Segundo os autores,
crimes causam danos a pessoas e relacionamentos; a justiça restaurativa não é feita porque é merecida e sim porque é necessária, através de um processo cooperativo que envolve todas as partes interessadas principais na determinação da melhor solução para reparar o dano causado pela transgressão – a justiça restaurativa é um processo colaborativo que envolve aqueles afetados mais diretamente por um crime, chamados de “partes interessadas principais”, para determinar qual a melhor forma de reparar o dano causado pela transgressão[20].
Em síntese, no modelo restaurativo, o olhar está focado no futuro, na restauração dos relacionamentos, os quais são baseados em valores, procedimentos e resultados, sem olvidar que somente será possível se o infrator houver assumido a autoria dos fatos e se houver o consentimento das partes, que pode ser revogado a qualquer momento. Nunca é demais lembrar que a participação dos envolvidos em um programa jamais poderá ser usada como prova no processo penal, se houver.
4.3 A teoria das lentes de Howard Zehr
Partindo da premissa da crise do paradigma punitivo e da expansão da justiça restaurativa, vale a pena adentrarmos no referencial teórico básico de Howard Zehr, por se tratar de referência mundial no restaurativismo, inclusive no Brasil.
Em sua obra Changing lenses: a new focus for crime and justice, traduzida para o português por Tônia Van Acker (Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça), o autor propõe a escolha de novas lentes para examinar os pressupostos sobre o crime e a justiça.
Assim, se nossa reação diante do delito não estiver em descompasso com a experiência do crime ou com as raízes judaico-cristãs, poderemos enxergar formas alternativas de ver o problema e a solução[21].
Howard Zehr traz alguns princípios bíblicos porque é menonita[22] e trabalha como professor de sociologia e justiça restaurativa no curso de graduação Transformação de Conflitos, ministrado na Eastern Mennonite University, em Harrisonburg, Virgínia, nos Estados Unidos. Importante ressaltar o papel da igreja no desenvolvimento de uma das experiências pioneiras em justiça restaurativa.
Segundo o autor, até o momento não é possível afirmar que tenha sido criado um novo paradigma com as práticas restaurativas, o que demandaria uma teoria bem articulada, combinada a uma sólida gramática e uma física de aplicação, além de certo grau de consenso[23].
Sustenta, outrossim, que houve a construção de visões alternativas fundamentadas em princípios e experiências, que podem contribuir para o encontro de soluções à crise atual do punitivismo.
Sua sugestão é de que a abordagem deve ser identificar o significado do crime e o que deveria ocorrer quando ele for praticado, reconhecendo que muitos ofensores são extremamente perigosos e precisam permanecer custodiados. Destarte, a partir da compreensão bíblica do crime e da forma como temos a experiência da situação, ou seja, dentro da visão de que o delito é um dano e uma violação de pessoas e relacionamentos.
Na medida em que representa uma violação de relacionamentos, o dano afeta nossa confiança no outro, trazendo sentimentos de suspeita, estranheza, e até racismo, afetando, igualmente, o relacionamento com todos que nos cercam, além de um relacionamento despedaçado entre vítima e ofensor.
Howard Zehr, então, traz uma concepção de crime como “uma violação cometida contra outra pessoa por um indivíduo que, por sua vez, também pode ter sido vítima de violações. Trata-se de uma violação do justo relacionamento que deveria existir entre indivíduos”[24].
Nesse contexto, considerando que o crime é um dano, a justiça deve ser a restauração, ainda que não seja possível uma restauração total, mas a possibilidade do início desse processo.
As violações, segundo Howard Zehr, “representam as quatro dimensões básicas do mal cometido: 1) à vítima; 2) aos relacionamentos interpessoais; 3) ao ofensor; e 4) à comunidade”[25].
No âmbito dessas dimensões, o primeiro objetivo consiste na reparação e na cura para as vítimas, abrangendo um senso de recuperação e de esperança em relação ao futuro, e jamais como forma de minimizar a ofensa. Implica num sentimento para a vítima de que ela fechou o ciclo, que ela está segura e no controle.
Outro importante objetivo consiste em reparar o relacionamento entre vítima e infrator, num movimento de reconciliação, se assim for a vontade das partes. Envolve arrependimento espontâneo do infrator e perdão da vítima. A cura, ainda que parcial desse relacionamento, é um avanço para a cura individual. Então, a justiça deve oferecer a possibilidade de que a reconciliação aconteça, sem qualquer coação.
A cura também envolve o infrator, que deve ser responsabilizado pela violação, o que pode ser um passo em direção à mudança, sem olvidar de suas outras necessidades. Assim como os envolvidos, a comunidade também precisa de tratamento e cura.
Sabemos que nem sempre as partes têm a sensação de plenitude de justiça. Embora possam ocorrer muitas situações, como a negativa de autoria ou a não identificação do ofensor, ainda assim, a comunidade pode auxiliar a vítima em seu processo de cura, por meio de uma escuta qualificada e de sua valorização:
O primeiro passo na justiça restaurativa é atender às necessidades imediatas, especialmente as da vítima. Depois disso, a justiça restaurativa deveria buscar identificar necessidades e obrigações mais amplas. Para tanto, o processo deverá, na medida do possível, colocar o poder e a responsabilidade nas mãos dos diretamente envolvidos: a vítima e o ofensor. Deve haver espaço também para o envolvimento da comunidade. Em segundo lugar, ela deve tratar do relacionamento vítima-ofensor facilitando sua interação e a troca de informações sobre o acontecido, sobre cada um dos envolvidos e sobre suas necessidades. Em terceiro lugar, ela deve se concentrar na resolução dos problemas, tratando não apenas das necessidades presentes, mas das intenções futuras[26].
Além desses passos, o empoderamento da vítima é fundamental porque a perda de poder é um elemento central da violação, de sorte que é imprescindível para a recuperação e a justiça.
A busca da justiça também não pode esquecer que a comunidade tem um papel importante na resposta restaurativa.
4.4 Algumas práticas e metodologias restaurativas
As práticas e metodologias restaurativas são diversificadas nos diferentes países, modificadas e adaptadas conforme as necessidades locais. Neste estudo, serão abordadas algumas formas mais debatidas, como os programas de mediação vítima-infrator, as conferências restaurativas e os círculos de paz.
4.4.1 Programa de reconciliação vítima-infrator
Trata-se de uma forma de justiça restaurativa associada às formas de mediação entre as vítimas e os infratores. A experiência pioneira ocorreu em 1974, em Kitchener, Ontario, Canadá, pela comunidade Mennonite.
O modelo enfatiza a mediação direta e focaliza a cura de ferimentos e a assistência às vítimas, ajudando os infratores a mudar suas vidas e restabelecer relações. A necessidade de humanizar o sistema de justiça criminal foi uma forte motivação por trás do programa, assim como a idéia de que os programas de justiça restaurativa baseados na igreja são a melhor proteção contra a cooptação do programa[27].
A introdução e a moldagem dos programas de mediação entre vítima e infrator nos Estados Unidos e no Reino Unido contaram com o movimento das vítimas para sua consolidação.
Nessa prática, os envolvidos no conflito (vítima e ofensor) são convidados por um mediador imparcial para um encontro, visando a obter uma restituição, uma compensação ou uma reparação adequada aos danos causados. O mediador atua como facilitador visando ao diálogo entre os envolvidos. O encontro pode ocorrer direta ou indiretamente, quando o mediador atua como emissário entre as partes.
Mais de 500 programas de mediação vítima-infrator estão atualmente em funcionamento nos EUA e no Canadá (Bazemore e Griffiths, 2003:77).[28] A vasta maioria baseia-se na comunidade ou na igreja. A mediação parece estar imparcialmente distribuída com igualdade pelo processo de justiça criminal. A maioria dos casos são agressões, roubos e crimes juvenis de menor gravidade. Os esquemas de mediação ingleses se baseiam mais na mediação indireta, usando abordagens de “mensageiros” (go-between) em comparação à inclinação por encontros “cara a cara” entre as vítimas e os infratores nos EUA (Crawford e Newburn 2003:25)[29]. Devido às leis de compensação relativamente generosas para vítimas, a restituição financeira tem sido uma preocupação menor na Inglaterra que nos EUA. A maioria dos esquemas de mediação ingleses funcionam na fase de advertência ou após a condenação, mas antes da sentença final. Os esquemas têm sido tipicamente de pequena escala e limitados a uma gama relativamente estreita de crimes de menor gravidade (Crawford e Newburn 2003:25-27)[30]. Comparados aos programas de reconciliação vítima-infrator, os esquemas de mediação vítima-infrator têm tipicamente tirado a ênfase da reconciliação e enfatizado a cura das vítimas, a responsabilidade dos infratores e a restauração das perdas[31].
4.4.2 Conferência restaurativa
As conferências de grupos familiares (family group conferences) são originárias da Nova Zelândia e foram introduzidas na década de 1980, em razão de as minorias Maoris[32] infratoras terem sido transferidas para instituições estatais. No entanto, os indígenas entendiam que estavam sendo vítimas de racismo institucional porque o Estado violava sua identidade cultural, desconsiderando suas tradições. Diante disso, foram empreendidas reformas na justiça da Nova Zelândia visando oferecer uma resposta da justiça criminal apropriada aos jovens Maoris.
Assim, os movimentos de justiça restaurativa se relacionaram ao resgate de práticas de resolução de conflitos indígenas. Os encontros restaurativos com grupos de familiares foram introduzidos como parte do programa nacional, uma alternativa aos tribunais, como na forma de um guia para as sentenças:
A FGC pode ser conceituada como um tipo de procedimento de tomada de decisões que envolve um encontro face a face entre ofensor, sua família, as vítimas e suas pessoas de apoio, um representante da polícia, e, se o caso requerer, outras pessoas. Em outras palavras, temos os intervenientes que funcionam como pessoas de apoio à vítima e ao infrator (delegação de poder à família e a amigos), a autoridade policial, pessoas ligadas ao menor infrator e aqueles que possam ter interesse na resolução do conflito. Ao final, é elaborado um plano de recuperação, que depende da anuência unânime de todos os participantes da conferência. A FGC é composta de três fases: preparatória (abrange a análise de sua viabilidade e adequação da medida); encontro (menores e advogados, a vítima, quando decidir participar, a autoridade policial, o coordenador da Justiça de Menores e, se for o caso, o Youth and Family Service e assistentes sociais); e o acompanhamento (abrange o cumprimento e o acompanhamento do plano de reparação)[33].
Essa prática é utilizada como metodologia em casos envolvendo a proteção da infância, a disciplina escolar e a justiça criminal de adultos e jovens, adaptada em outros países (Austrália, Irlanda do Norte, África do Sul, Noruega e Bélgica), com maior êxito em relação aos casos envolvendo menores de idade[34].
A pena privativa de liberdade, então, funciona como última alternativa para os casos em que houver impossibilidade de adoção de plano restaurador da infração penal.
4.4.3 Círculos de Paz
Os Círculos de Paz, também conhecidos como círculos decisórios (sentencing circles) têm sua origem nas tradições indígenas das tribos do Canadá e dos Estados Unidos. Segundo Kay Pranis, são “uma forma de ser e se relacionar grupalmente que leva ao empoderamento individual e coletivo daquelas pessoas que participam deles”[35].
A participação comunitária nos círculos é maior do que nos encontros restaurativos com grupos de familiares promovidos entre vítimas e infratores porque reúne não só os envolvidos com suas famílias, mas também outras pessoas importantes que possam convencer os infratores a aceitarem as responsabilidades por seus atos, modificando, dessa forma, suas vidas.
A participação no sentencing circle é franqueada a todos os cidadãos que desejem apoiar vítima e/ou infrator, e tem por escopo a pacificação da sociedade, a restauração do dano causado à vítima e à comunidade, a ressocialização do infrator e a fixação de diretivas para conflitos futuros semelhantes. O guardião do círculo (circle keeper) pode ser um facilitador, juiz ou membro respeitado dentro da comunidade. Tem por função incentivar os membros do círculo a se esforçarem para obter a resolução do conflito[36].
As partes reunidas em círculo dialogam por meio do “objeto da fala” (talking piece), que tem por função marcar qual o sujeito que está com a palavra. O facilitador primeiramente o entrega para a vítima e infrator, seguido pela oitiva de familiares, amigos, profissionais do sistema de justiça, autoridade policial, profissionais de diversos ramos, membros destacados da comunidade, voluntários e representantes de organizações. As perguntas realizadas pelo circle keeper à vítima e ao infrator devem ser respeitadas, devendo elas abordar seus sentimentos mais profundos e despertar um sentimento de culpabilidade no infrator. O desenvolvimento do procedimento será livre e prosseguirá até que se obtenha um plano de sentença que ponha fim ao conflito[37].
Os Círculos de Paz são utilizados para crimes graves e admitem apenas infratores que realmente desejem modificar suas vidas; o aspecto punitivo, no entanto, permanece preservado, na medida em que o juiz obriga um acordo sobre uma sentença que redundará em uma condenação e, consequentemente, a um antecedente criminal.
Como se vê, há uma diversidade de práticas restaurativas, das quais abordamos apenas três, que visam promover os valores restaurativos; todavia, em regra, os programas restaurativos recebem os conflitos depois de caracterizados como infrações penais.
4.5 A situação atual da Justiça Restaurativa no Brasil
A Resolução do Conselho Nacional de Justiça n. 225/2016, a qual dispõe sobre a Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providências, foi aprovada e promulgada em 31 de maio de 2016, em Sessão Plenária do Conselho Nacional de Justiça, por votação unânime dos conselheiros. Consiste no marco normativo e referência nacional sobre a matéria, que vem norteando a construção da política de justiça restaurativa em todos os tribunais estaduais e federais do país, em atenção às recomendações da Organização das Nações Unidas (ONU), expressas nas Resoluções n. 1999/26, n. 2000/14 e n. 2002/12[38].
A Resolução n. 225/2016 tem 8 capítulos e 30 artigos, nos quais estabelece: a definição e os princípios da justiça restaurativa (arts. 1º e 2º); as atribuições do Conselho Nacional de Justiça (arts. 3º e 4º); as atribuições dos Tribunais de Justiça (arts. 5º e 6º); os fluxos para a derivação dos conflitos judicializados para as práticas restaurativas (arts. 7º ao 12); requisitos, atribuições e vedações ao facilitador restaurativo (arts. 13 ao 15); diretrizes gerais para formação e capacitação (arts.16 e 17); linhas gerais sobre o monitoramento e a avaliação dos projetos de justiça restaurativa (arts.18 a 20) e outras providências (arts. 21 a 30).
Obedecidos os parâmetros da Resolução n. 225/2016 do CNJ, nos termos do art. 2º, são princípios que orientam a justiça restaurativa: corresponsabilidade, reparação dos danos, atendimento às necessidades dos envolvidos, informalidade, voluntariedade, imparcialidade, participação, empoderamento, consensualidade, confidencialidade, celeridade e urbanidade.
Nesse contexto, destacamos algumas conclusões da pesquisa Pilotando a Justiça Restaurativa – O Papel do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça, realizada em 2017, sob a presidência da Ministra do Supremo Tribunal Federal, Cármen Lúcia Antunes Rocha, que refletem o panorama da justiça restaurativa no Brasil.
A pesquisa confirmou a existência de um protagonismo do Poder Judiciário, seus atores e outros órgãos (Ministério da Justiça, Secretaria da Reforma do Judiciário, Conselho Nacional de Justiça, sistema de justiça, juízes, desembargadores, psicólogos, assistentes sociais, equipes técnicas), na construção de uma justiça restaurativa no Brasil, num movimento considerado “ativismo” judicial. No entanto, trata-se de um protagonismo personalizado, liderado principalmente por pessoas e equipes específicas, das quais têm dependido, em grande medida, a sustentabilidade dos programas[39].
Em relação ao rosto teórico-prático da justiça restaurativa judicial brasileira, a pesquisa detectou que são diversificados os marcos teóricos, conceitos, metodologias e técnicas utilizadas nos programas, mas observou-se a preponderância internacional de Howard Zehr (teoria das lentes) e Kay Pranis (Círculos da Paz) como marcos teórico-metodológicos, conjuntamente com Dominic Barter e Marshall Rosemberg (comunicação não violenta), que tem como pano de fundo a cultura da paz[40].
Observou-se a influência etnocêntrica, sobretudo euroamericana no processo de tradução judicial da justiça restaurativa no Brasil e a influência de pensadores e programas nacionais, mas não houve reprodução de modelos estrangeiros, apenas contínua (re)criação de programas, que foram lapidando o modelo de justiça restaurativa brasileira. Constatou-se, por exemplo, que o marco teórico de Howard Zehr, referencial dominante no Brasil, pareceu limitado para dar conta das especificidades dos projetos em curso porque as práticas não se revelaram majoritariamente adequadas ao conceito de Zehr de justiça restaurativa[41].
Dessa forma, de acordo com uma base teórica mais ampliada, contrastada com a empiria dos programas restaurativos brasileiros, a pesquisa constatou: a) que o “encontro” é um objetivo buscado pelos programas, mas muitas vezes não concretizado por vários motivos, principalmente pela ausência das vítimas; b) quando atingido, o “encontro” ocorre no próprio espaço do sistema de justiça, nos fóruns, que é o lugar menos apropriado; c) a reparação dos danos é residual e não central, dentro da predominância do modelo de resolução de conflitos com foco preventivo, inclusive, tendo como objetivo a prevenção especial positiva, focada na ressocialização e na reintegração do ofensor, que consiste em função explícita da prisão, de sorte que o punitivismo aparece remodelado no desempenho do restaurativismo; e d) a transformação, tanto das pessoas (subjetividade) quanto de sua forma (violenta) de comunicação e relação estão presentes, seja como objetivo às vezes assumido, às vezes residual, com contornos muito diferenciados[42].
A pesquisa concluiu que os programas operam no trânsito resolução-prevenção-pacificação e, para além da resolução, humanização e transformação, operam em maior ou menor medida em alguns desses aspectos. E, só secundariamente, na reparação de danos[43].
No que diz respeito à competência, no âmbito criminal existe um limite legal para se ampliar a justiça restaurativa, por força do princípio da indisponibilidade da ação penal, cuja titularidade pertence ao Ministério Público. Diante disso, os programas só podem ser aplicados nos juizados especiais criminais, que relativizaram o princípio, na justiça infanto-juvenil ou infracional, alocados em seus respectivos espaços físicos. Excepcionalmente, alguns juizados de violência doméstica e familiar contra a mulher implementaram programas, embora, em relação a eles, vigore o princípio da obrigatoriedade da ação penal[44].
Além desses programas no âmbito processual, cujo encaminhamento ocorre após o oferecimento da denúncia ou em fase de instrução, foram identificados programas de justiça restaurativa em nível pós-processual, em fase de execução penal, medidas alternativas à prisão e execução de medidas socioeducativas com acompanhamento de partes e de famílias de presos e internados, e, em fase pré-processual em escolas, guardas municipais, serviços públicos e cidades[45].
O poder discricionário de inserção nos programas incumbe aos juízes e aos promotores de justiça, que selecionam as condutas e as pessoas que poderão ingressar no procedimento restaurativo judicial, realizando um filtro seletivo. Também os policiais, defensores públicos, psicólogos e assistentes sociais das equipes técnicas, os advogados das partes ou as próprias partes, nas situações em que podem procurar diretamente a justiça restaurativa[46].
Digna de destaque na pesquisa, a questão de que, em regra, a instauração do procedimento restaurativo não interrompe ou suspende o curso do procedimento criminal ou infracional, cujo modelo traduz o paradigma da ideologia punitiva em nossa sociedade, o que compromete a essência da justiça restaurativa, na medida em que as partes não têm sido empoderadas para dizer a justiça, pois o poder decisório se concentra nas mãos do juiz[47].
Malgrado os desafios a serem enfrentados, os indicadores de resultados mostraram dentre os projetos e programas visitados, relatos da maioria dos profissionais de que a justiça restaurativa tem servido para: a) resolver conflitos; b) responsabilizar os ofensores pelos seus atos (reinserção social); c) que os ofensores não reiterem na prática de crimes; d) empoderar o ofendido e a comunidade; e) promover práticas para um convívio mais pacífico e/ou pacificação social; f) restabelecer vínculos comunitários/familiares; g) aprender uma nova forma de relação e transformar pessoas e relações[48].
A pesquisa revelou que a justiça restaurativa vem avançando significativamente no Brasil, ganhando espaços judiciais e não judiciais importantes, acumulando conhecimento e experiência na justiça juvenil e de adultos, e constituindo comunidades restaurativas de marcada sensibilidade. Nada obstante, muitos desafios precisam ser superados, por exemplo, os limites legais, que definem a residualidade da competência da justiça restaurativa; os limites de ordem operacional e de sustentabilidade dos recursos materiais e humanos, que são insuficientes; os limites de ordem democrática, que envolvem as dificuldades de participação das vítimas nas práticas restaurativas, em prejuízo do encontro e do diálogo, além da presença da comunidade e na realização do ciclo completo de justiça restaurativa, prejudicando a última etapa, do pós-círculo; e os limites epistemológicos, culturais e ideológicos em face da resistência oferecida pelos próprios profissionais do sistema de justiça às transformações invocadas de um paradigma emergente[49].
Em que pesem os desafios a serem enfrentados, a justiça restaurativa é uma realidade brasileira, que vem avançando e conquistando espaços, conforme demonstrou a pesquisa, com inúmeros programas que trazem em si desenhos diversificados, que configuram nosso modelo, cujo foco é responsabilizar o ofensor, prevenir e pacificar os conflitos.
É fundamental que a justiça restaurativa seja inserida no ordenamento jurídico brasileiro, a fim de efetivamente assumir seu papel de potência transformadora de um sistema punitivo em crise, de maneira a integrar a restauração do dano causado pela violação do bem jurídico tutelado, sem com isso impedir a intervenção estatal nos casos legalmente previstos.
5 Conclusão
Diante do exposto, concluímos que a teoria mista adotada pelo legislador no artigo 59 do Código Penal, que consagrou a concepção retributiva e preventiva da pena, se revela insuficiente para garantir a segurança pública, mesmo diante do elevadíssimo número de encarceramentos e de penas alternativas.
Em face dessas constatações, sobretudo das críticas ao modelo sistemático de encarceramento e seus efeitos maléficos, houve uma tendência mundial de se adotar alternativas penais, que foram introduzidas no ordenamento jurídico brasileiro, as quais também foram insuficientes para conter a criminalidade ou atender às finalidades retributiva e preventiva do crime.
Nesse contexto de crise do paradigma retributivo da pena privativa de liberdade houve o surgimento e a expansão da justiça restaurativa, cujos valores, processos e práticas foram desenvolvidos em diversos países, até que a Resolução n. 12/2002, do Conselho Econômico e Social da ONU editou os princípios básicos para o uso dos programas de justiça restaurativa em matéria criminal.
O marco normativo e referencial sobre justiça restaurativa no Brasil, até o momento, é a Resolução n. 225/2016, do Conselho Nacional de Justiça, que vem norteando a construção da política da justiça restaurativa em todos os tribunais estaduais e federais do país, em atenção às recomendações da ONU, expressas nas Resoluções n. 1999/26, n. 2000/14 e n. 2002/12.
Este estudo partiu de referenciais teóricos internacionais sobre o que é justiça restaurativa e a inexistência de um conceito definido, que está em processo de construção, e de alguns modelos de práticas restaurativas. Por outro lado, a pesquisa Pilotando a Justiça Restaurativa, elaborada pelo Conselho Nacional de Justiça, demonstrou que diante dos diversificados marcos teóricos, conceitos e metodologias dos programas brasileiros, houve a preponderância internacional de Howard Zehr (teoria das lentes) e Kay Pranis (Círculos da Paz) como marcos teórico-metodológicos, juntamente com Dominic Barter e Marshall Rosemberg (comunicação não-violenta), que tem como pano de fundo a cultura da paz.
A pesquisa revelou ainda que malgrado a influência euroamericana no desenvolvimento da tradução judicial da justiça restaurativa, entre nós não houve exatamente a reprodução de modelos estrangeiros, mas uma contínua (re)criação de programas que foram lapidando o modelo de justiça restaurativa brasileiro. Ressalta-se que o referencial de Howard Zehr pareceu limitado em vista das especificidades dos projetos em curso porque eles não se mostraram perfeitamente adequados ao seu conceito.
Em síntese, a pesquisa demonstrou que, no Brasil, a justiça restaurativa tem se desenvolvido no interior do sistema de justiça, nos limites permitidos pelo atual ordenamento jurídico, adstritos aos juizados especiais criminais, à justiça infanto-juvenil e infracional e às varas de execução criminal, nos espaços em que o princípio da indisponibilidade da ação penal foi relativizado, que operam no trânsito resolução-prevenção-pacificação, humanização e transformação, e agem secundariamente na reparação dos danos.
No entanto, permanece no ordenamento jurídico brasileiro a ideologia punitiva, posto que o procedimento restaurativo não interrompe ou suspende o procedimento criminal ou infracional instaurado.
Portanto, a despeito dos avanços da justiça restaurativa, desafios precisam ser enfrentados, com ênfase na participação das vítimas, da comunidade e na reparação dos danos. É fundamental que a justiça restaurativa seja inserida no ordenamento jurídico para assumir seu papel de potência transformadora de um sistema punitivo em crise, de maneira a integrar a restauração do dano causado pela violação do bem jurídico tutelado, observados os princípios e os valores que a norteiam, sem com isso impedir a intervenção estatal nos casos legalmente previstos.
Referências
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CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017.
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ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008.
[1] BRASIL. Constituição Federal (1988). “Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.
[2] BRASIL. Constituição Federal (1988). “Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos: I– polícia federal; II – polícia rodoviária federal; III – polícia ferroviária federal; IV – polícias civis; V– polícias militares e corpos de bombeiros militares; VI – polícias penais federal, estaduais e distrital”.
[3] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 355.
[4] FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2. ed. São Paulo: RT, 2006, p. 236.
[5] KANT, Immanuel apud Doutrina do Direito. Trad. Edson Bini. 2. ed. São Paulo: Ícone, 1993, p. 176. In: FRANCO, Alberto Silva; STOCO, Rui. Código Penal e sua interpretação: doutrina e jurisprudência. 8. ed. São Paulo: RT, 2007, p. 338.
[6] FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Atualizado em 15 jul. 2021. Disponível em: http//www.forumseguranca.org.br/anuariobrasileiro-segurancapublica/. Acesso em: 21 out. 2020.
[7] FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública. Atualizado em 15 jul. 2021. Disponível em: http//www.forumseguranca.org.br/anuariobrasileiro-segurancapublica/. Acesso em: 21 out. 2020.
[8] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Manual de gestão para as alternativas penais. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2020.
[9] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008, p. 62.
[10] NESS, Daniel W.Van; STRONG, Karen Heetderks. Restoring justice: an introducing to restorative justice. Oxon: Routledge, 2008, p. 23 apud WOLLMANN, Renata Rodrigues Guimarães. A (im)possibilidade do uso de práticas restaurativas no âmbito da violência doméstica conjugal. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais). Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2018, p. 47.
[11] NESS, Daniel W. Van; STRONG, Karen Heetderks. Restoring justice: an introducing to restorative justice. Oxon: Routledge, 2008, p. 23 apud WOLLMANN, Renata Rodrigues Guimarães. A (im)possibilidade do uso de práticas restaurativas no âmbito da violência doméstica conjugal. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais). Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2018, p. 47.
[12] PALLAMOLLA, Raffaella da Porciuncula. Justiça restaurativa: da teoria à prática. São Paulo: IBCCRIM, 2009, p.34.
[13] A comunidade Maori era pautada pelo modelo de reunião da família e da comunidade e tinha por finalidade a resolução de conflitos relacionados aos jovens nativos carentes de proteção ou com comportamento antissocial. O descontentamento com o sistema penal neozelandês (retributivo) ocorreu em virtude dos regramentos impostos pelos estrangeiros que desconsideraram as tradições e costumes das comunidades nativas. Ainda, é importante destacar que os procedimentos de justiça comunitária não eram fundados em apenas práticas violentas e arbitrárias – evoluindo-se para o que conhecemos hoje como justiça restaurativa. Em 1989, o governo da Nova Zelândia promulgou o Children, Young Persons and Their Families Act, com a finalidade de dar mais atenção aos Maoris e passou a conceder a estas famílias a responsabilidade inicial para a solução dos conflitos envolvendo a justiça juvenil. Assim, através das tradições desta comunidade, foi adotado o modelo restaurativo das reuniões familiares, que visam celeridade para maior proteção destes jovens. Assim, as formas alternativas de solução de conflitos ganharam força e atenção dos pesquisadores. WOLLMANN, Renata Rodrigues Guimarães. A (im)possibilidade do uso de práticas restaurativas no âmbito da violência doméstica conjugal. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais). Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2018, p. 47.
[14] PALLAMOLLA, Raffaella da Porciuncula. Justiça restaurativa: da teoria à prática. São Paulo: IBCCRIM, 2009, p. 34.
[15] NESS, Daniel W. Van; STRONG, Karen Heetderks. Restoring justice: an introducing to restorative justice. Oxon: Routledge, 2008, p. 23 apud WOLLMANN, Renata Rodrigues Guimarães. A (im)possibilidade do uso de práticas restaurativas no âmbito da violência doméstica conjugal. Dissertação (Mestrado em Ciências Jurídico-Criminais). Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Coimbra, 2018, p. 48.
[16] Documentos no site http://www.restorativejustice.org/rj3/rjUNintro2.html apud PINTO, Renato Sócrates Gomes. Justiça restaurativa é possível no Brasil? In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 23.
[17] PINTO, Renato Sócrates Gomes. Justiça restaurativa é possível no Brasil? In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 20.
[18] Marshall, T.F. 1999. Restorative justice: an overview. London: Home Office Research and Development Statistics Directorate apud FROESTAD, Jan; SHEARING Clifford. Prática da justiça – o modelo Zwelethemba de resolução de conflitos. In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 79.
[19] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008, p.257.
[20] MCOLD, Paul Wachtel; ACHTEL, Ted Achtel. Em busca de um paradigma: uma teoria de justiça restaurativa, 2003. Disponível em: http://restorativepractices.org/library/paradigm_port.html. Acesso em: 08 fev. 2005, p. 22.
[21] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008, p. 169.
[22] Menonitas são denominações cristãs que descendem diretamente do movimento anabatista surgido na Europa, no século XVI, na mesma época da Reforma Protestante. A Reforma Luterana causou uma profunda divisão no Cristianismo e, nesse contexto, surgiram novas correntes, dentre elas a anabatista, que defendia o batismo de adultos e não entre os recém-nascidos. Um dos líderes religiosos deste movimento foi o holandês Menno Simons, considerado o fundador do movimento menonita (a palavra menonita vem precisamente do nome do fundador). Vivem em comunidades e se dedicam a atividades agrícolas e pecuárias organizadas através de cooperativas. Não utilizam tecnologia e se vestem de forma muito simples. Seu estilo de vida tem base na austeridade, disciplina, trabalho duro e frequência semanal à igreja. O ensino é rudimentar e a Bíblia serve como livro de leitura. Embora cada país fale sua língua nativa, os menonitas mantém sua língua original, que é um dialeto do alemão. Foi uma comunidade perseguida ao longo da história, especialmente pelo regime comunista da União Soviética.
[23] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008, p. 169.
[24] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008, p. 172.
[25] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008. Acesso em: 21 out. 2020, p. 173.
[26] ZEHR, Howard. Trocando as lentes. Um novo foco sobre o crime e a justiça. Trad. Tônia Van Acker. São Paulo: Palas Athena, 2008, p. 192.
[27] MCOLD, 2001, p. 43; UMBREIT et al. 2001 apud FROESTAD, Jan; SHEARING Clifford. Prática da justiça – O modelo Zwelethemba de resolução de conflitos. In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 81.
[28] BAZEMORE; GRIFFITHS, 2003, p. 77 apud FROESTAD, Jan; SHEARING Clifford. Prática da justiça – O modelo Zwelethemba de resolução de conflitos. In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 82.
[29] CRAWFORD; NEWBURN, 2003, p. 25 apud FROESTAD, Jan; SHEARING Clifford. Prática da justiça – O modelo Zwelethemba de resolução de conflitos. In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 82.
[30] CRAWFORD; NEWBURN, 2003, p. 25-27 apud FROESTAD, Jan; SHEARING Clifford. Prática da justiça – O modelo Zwelethemba de resolução de conflitos. In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 82.
[31] MCOLD 2001:44 apud FROESTAD, Jan; SHEARING Clifford. Prática da justiça – O modelo Zwelethemba de resolução de conflitos. In: SLAKMON, C., DE VITTO, R.; GOMES PINTO, R. (org.) Justiça restaurativa. Brasília-DF: Ministério da Justiça e Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento PNUD, 2005, p. 82.
[32] Maoris são os povos originários na Nova Zelândia e até hoje têm sua cultura preservada e difundida no país. Há uma porcentagem no congresso neozelandês para os representantes desse povo.
[33] SANTOS, Celeste Leite dos. Injusto penal e os direitos das vítimas de crimes. Curitiba: Juruá, 2020, p. 187-188.
[34] SANTOS, Celeste Leite dos. Injusto penal e os direitos das vítimas de crimes. Curitiba: Juruá, 2020, p. 187-188.
[35] SANTOS, Celeste Leite dos. Injusto penal e os direitos das vítimas de crimes. Curitiba: Juruá, 2020, p. 194.
[36] SANTOS, Celeste Leite dos. Injusto penal e os direitos das vítimas de crimes. Curitiba: Juruá, 2020, p. 194-195.
[37] MIGUEL BARRIO, Rodrigo. Justicia restaurativa y justicia penal: nuevos modelos: mediación penal, conferencing y sentencing circles. Barcelona: Atelier Libros Juridicos, 2019, p. 160-215 apud SANTOS, Celeste Leite dos. Injusto penal e os direitos das vítimas de crimes. Curitiba: Juruá, 2020, p. 195.
[38] BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Resolução CNJ n. 225/2016. “Art. 1º. A Justiça Restaurativa constitui-se como um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados, de modo estruturado da seguinte forma: I – é necessária a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como, das suas famílias e dos demais envolvidos no fato danoso, com a presença dos representantes da comunidade direta ou indiretamente atingida pelo fato e de um ou mais facilitadores restaurativos; II – as práticas restaurativas serão coordenadas por facilitadores restaurativos capacitados em técnicas autocompositivas e consensuais de solução de conflitos próprias da Justiça Restaurativa, podendo ser servidor do tribunal, agente público, voluntário ou indicado por entidades parceiras; III – as práticas restaurativas terão como foco a satisfação das necessidades de todos os envolvidos, a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a ocorrência do fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade da reparação do dano e da recomposição do tecido social rompido pelo conflito e suas implicações para o futuro”.
[39] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 22.
[40] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 22-23.
[41] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 23-24.
[42] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 24.
[43] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 25.
[44] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 26.
[45] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 26.
[46] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 26.
[47] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 27.
[48] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 29.
[49] CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Sumário Executivo. Justiça Pesquisa. Pilotando a Justiça Restaurativa. O papel do Poder Judiciário. Brasília: Conselho Nacional de Justiça, 2017, p. 37-39.
Mestranda na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), no Programa de Pós-Graduação em Direito, Núcleo de Pesquisa em Direito Processual Penal. Especialista em Direito Penal pela Escola Paulista da Magistratura. Professora da Escola Paulista da Magistratura. Juíza de Direito Aposentada do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CAVALCANTE, Elaine Cristina Monteiro. A crise do paradigma punitivo no Brasil e o potencial transformador da Justiça Restaurativa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 fev 2022, 04:29. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58079/a-crise-do-paradigma-punitivo-no-brasil-e-o-potencial-transformador-da-justia-restaurativa. Acesso em: 23 dez 2024.
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