Resumo – a aplicação de medidas socioeducativas possui como fundamento a acolhida do adolescente para que, em ambiente adequado, possa reestabelecer o curso de seu desenvolvimento em momento único da vida. O debate acerca do fundamento punitivo é intenso, mas fato é que não é possível ignorar sua função ressocializadora e educativa. No curso da execução são várias as situações em que pode se encontrar o adolescente, sendo a reclassificação de sua situação uma destas hipóteses. No tocante a substituição de medida socioeducativa o Superior Tribunal de Justiça sentiu por bem editar enunciado de súmula de n° 265 em que determina a necessidade de contraditório nesse procedimento.
Palavras-chave – Direito Constitucional. Direito Processual Civil. Direito da Criança e do Adolescente. Medidas socioeducativas. Adolescente em confronto com a lei. Ato infracional análogo a crime. Regressão e substituição. Contraditório e ampla defesa.
Sumário – Introdução. 1 Breve introdução ao histórico evolutivo do Direito da Criança e do Adolescente. 2 Dos princípios aplicáveis as medidas socioeducativas. 2.1 Da dualidade da finalidade punitiva e da finalidade pedagógica. 2.2 Plano individual de atendimento. 3 Dos termos da Súmula 265 do Superior Tribunal de Justiça. 3.1 Oitiva. 3.2 Menor infrator. 3.3 Regressão. Conclusão
INTRODUÇÃO
O presente artigo procura esclarecer os termos do enunciado de súmula 265 do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula 265 – É necessária a oitiva do menor infrator antes de decretar-se a regressão da medida socioeducativa.
O enunciado procura estabelecer o requisito de observância do contraditório quando da determinação de regresso em aplicação de medida socioeducativa. Porém, como se verá adiante, engana-se, data venia, o Superior Tribunal de Justiça no que toca o uso da terminologia empregada.
Não se trata de preciosismo jurídico, já que é notória a utilização de precedentes e enunciados de súmula como fonte de interpretação do Direito. Em que pese crítica a essa utilização, já que em tese os enunciados de súmula devem ser lidos à luz dos casos que serviram para sua edição, de forma restritiva portanto, fato é que a prática jurídica mostra que tais dispositivos normativos são aplicados de forma ampla em casos distintos dos originais.
Logo, evidente o interesse em compreender mais precisamente os termos jurídicos empregados pelo Superior Tribunal de Justiça, à luz do microssistema normativo de aplicação de medidas socioeducativas à adolescente em conflito com a lei: Lei 8.069/90; Lei 12.594/12; Resolução 113/06 do CONANDA; e Resolução 119/06 do CONANDA.
1 BREVE INTRODUÇÃO DO HISTÓRICO EVOLUTIVO DO DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
No cenário internacional, em especial após a primeira e segunda guerras mundiais (1918/1945), ocorreu alteração de paradigma no campo jurídico, que orientou a reformulação de todo o ordenamento.
Vários documentos internacionais foram desenvolvidos a finalidade de promover a proteção dos direitos humanos, nomeadamente aqueles que envolviam o direito da criança e do adolescente (Declaração de Genebra de 1924, Declaração Universal dos Direitos Humanos, Convenção Americana sobre os Direitos Humanos).
Chegou-se à conclusão de que uma sociedade justa e solidária dependeria de uma atenção maior ao desenvolvimento integral de toda criança e adolescente. Rompeu-se com a doutrina anterior da situação irregular, segundo a qual só mereciam proteção o carente, o abandonado e o infrator.
Esse rompimento, em nosso país, ocorreu com o advento da Constituição Republicana de 1988. Estava em vigor, até esse momento, o denominado Código de Menores (Lei n. 6.697/79). Incidia, em especial, ao menor em situação irregular. Nessa toada, a criança e o adolescente eram tratados, pela legislação e órgãos públicos, como objetos de tutela.
Com o advento da Constituição da República, cria-se um novo vértice normativo e interpretativo no art. 227[1], o de que a infância e a juventude têm de ser tratadas com absoluta prioridade e proteção, tornando o Código de Menores incompatível com a nova ordem constitucional. O Estatuto da Criança e do Adolescente – Lei 8.069/90[2] – é editado então pensando na alteração desse paradigma.
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
O legislador infraconstitucional passa a adotar expressamente a doutrina da proteção integral.
As crianças e os adolescentes, de objeto de tutela, transformam-se em sujeitos de direito, desde seu nascimento, garantido o acesso a diversos direitos fundamentais por meio da aplicação direita e não restringível de disposições constitucionais.
2 DOS PRINCÍPIOS APLICÁVEIS AS MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS
Inicialmente cumpre esclarecer que independentemente de rol expresso da Lei do SINASE, os princípios gerais do ECA[3] (inclusive aqueles relacionados às medidas de proteção) são aplicáveis a todos os institutos jurídicos que versem sobre direitos da criança e do adolescente.
Art. 100. Parágrafo único. São também princípios que regem a aplicação das medidas: (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
I – condição da criança e do adolescente como sujeitos de direitos: crianças e adolescentes são os titulares dos direitos previstos nesta e em outras Leis, bem como na Constituição Federal; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
II – proteção integral e prioritária: a interpretação e aplicação de toda e qualquer norma contida nesta Lei deve ser voltada à proteção integral e prioritária dos direitos de que crianças e adolescentes são titulares; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
III – responsabilidade primária e solidária do poder público: a plena efetivação dos direitos assegurados a crianças e a adolescentes por esta Lei e pela Constituição Federal, salvo nos casos por esta expressamente ressalvados, é de responsabilidade primária e solidária das 3 (três) esferas de governo, sem prejuízo da municipalização do atendimento e da possibilidade da execução de programas por entidades não governamentais; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
IV – interesse superior da criança e do adolescente: a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do adolescente, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
V – privacidade: a promoção dos direitos e proteção da criança e do adolescente deve ser efetuada no respeito pela intimidade, direito à imagem e reserva da sua vida privada; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
VI – intervenção precoce: a intervenção das autoridades competentes deve ser efetuada logo que a situação de perigo seja conhecida; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
VII – intervenção mínima: a intervenção deve ser exercida exclusivamente pelas autoridades e instituições cuja ação seja indispensável à efetiva promoção dos direitos e à proteção da criança e do adolescente; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
VIII – proporcionalidade e atualidade: a intervenção deve ser a necessária e adequada à situação de perigo em que a criança ou o adolescente se encontram no momento em que a decisão é tomada; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
IX – responsabilidade parental: a intervenção deve ser efetuada de modo que os pais assumam os seus deveres para com a criança e o adolescente; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
X – prevalência da família: na promoção de direitos e na proteção da criança e do adolescente deve ser dada prevalência às medidas que os mantenham ou reintegrem na sua família natural ou extensa ou, se isso não for possível, que promovam a sua integração em família adotiva; (Redação dada pela Lei nº 13.509, de 2017)
XI – obrigatoriedade da informação: a criança e o adolescente, respeitado seu estágio de desenvolvimento e capacidade de compreensão, seus pais ou responsável devem ser informados dos seus direitos, dos motivos que determinaram a intervenção e da forma como esta se processa; (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
XII – oitiva obrigatória e participação: a criança e o adolescente, em separado ou na companhia dos pais, de responsável ou de pessoa por si indicada, bem como os seus pais ou responsável, têm direito a ser ouvidos e a participar nos atos e na definição da medida de promoção dos direitos e de proteção, sendo sua opinião devidamente considerada pela autoridade judiciária competente, observado o disposto nos §§ 1 o e 2 o do art. 28 desta Lei. (Incluído pela Lei nº 12.010, de 2009) Vigência
Por sua vez a Lei do SINASE elenca os seguintes princípios expressos:
Art. 35. A execução das medidas socioeducativas reger-se-á pelos seguintes princípios:
I – legalidade, não podendo o adolescente receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto;
II – excepcionalidade da intervenção judicial e da imposição de medidas, favorecendo-se meios de autocomposição de conflitos;
III – prioridade a práticas ou medidas que sejam restaurativas e, sempre que possível, atendam às necessidades das vítimas;
IV – proporcionalidade em relação à ofensa cometida;
V – brevidade da medida em resposta ao ato cometido, em especial o respeito ao que dispõe o art. 122 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente);
VI – individualização, considerando-se a idade, capacidades e circunstâncias pessoais do adolescente;
VII – mínima intervenção, restrita ao necessário para a realização dos objetivos da medida;
VIII – não discriminação do adolescente, notadamente em razão de etnia, gênero, nacionalidade, classe social, orientação religiosa, política ou sexual, ou associação ou pertencimento a qualquer minoria ou status; e
IX – fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários no processo socioeducativo.
No que toca aos princípios acima expostos, faz-se pertinente destacar alguns pontos específicos da execução de medidas socioeducativas.
2.1 DA DUALIDADE DA FINALIDADE PUNITIVA E DA FINALIDADE PEDAGÓGICA
Historicamente, como tratado no capítulo introdutório, crianças e adolescentes em perigo e perigosos eram tratados como objeto de tutela, ou seja, a finalidade social das ações interventivas se sobrepunham aos interesses individuais dessas pessoas em especial estágio de desenvolvimento.
A ideia de supervalorização da finalidade pedagógica autoriza regressar ao modelo de objeto de tutela, ao invés do modelo de sujeito de direito. Considerando a medida socioeducativa um benesse ao adolescente perigoso, fundamenta-se restrições a direitos fundamentais (liberdade, expressão, associação) como medida curativa e essencial.
Termina, essa linha de raciocínio, em reanimar a doutrina da situação irregular, em que os interesses individuais da criança e adolescente são reificados sob a justificativa de favorecimento pela intervenção estatal.
A finalidade pedagógica é, sim, importante, mas não é preponderante, tampouco sustenta, sozinha, a manutenção de uma medida socioeducativa, sob pena de subversão do princípio da proteção integral e da prioridade absoluta em prejuízo daqueles que deveria beneficiar.
2.2 PLANO INDIVIDUAL DE ATENDIMENTO
O Plano Individual de Atendimento (doravante PIA) destina-se ao cumprimento das medidas socioeducativas, em regime de prestação de serviços à comunidade, liberdade assistida, semiliberdade ou internação, contemplando a participação dos pais ou responsáveis, os quais têm o dever de contribuir com o processo ressocializador do adolescente, sendo esses passíveis de responsabilização administrativa, nos termos do art. 249 da Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), civil e criminal[4].
O PIA será elaborado sob a responsabilidade da equipe técnica do respectivo programa de atendimento, com a participação efetiva do adolescente e de sua família, representada por seus pais ou responsável.
Segundo a Lei do SINASE, deve constar no PIA: os resultados da avaliação interdisciplinar; os objetivos declarados pelo adolescente; a previsão de suas atividades de integração social e/ou capacitação profissional; atividades de integração e apoio à família; formas de participação da família para efetivo cumprimento do plano individual; e as medidas específicas de atenção à sua saúde[5].
Por fim, vale ressaltar que a realização da finalidade do PIA é motivo expresso para extinção da medida socioeducativa, sendo o PIA o eixo central da execução da medida, do início ao fim.
3 DOS TERMOS DA SÚMULA 265 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Diz o enunciado de súmula 265 do STJ: “É necessária a oitiva do menor infrator antes de decretar-se a regressão da medida sócio-educativa.”
São termos que serão destacados para análise: oitiva; menor infrator; regressão.
3.1 OITIVA
Conforme já narrado tanto o ECA como o SINASE possuem diversos princípios expressos aplicáveis às medidas socioeducativas, de forma específica ou por se trata de princípios gerais do sistema normativo de proteção à infância e juventude.
Contudo, a oitiva do adolescente nada mais é do que expressão do princípio constitucional do contraditório e ampla defesa. Não seria razoável esperar do judiciário postura passiva de apenas ouvir o adolescente submetido a medida socioeducativa. Deve ser oportunizado o acompanhamento por defesa técnica e caso não a apresente, nomeado curador especial ou defensor dativo, a depender da situação.
Vale ressaltar, a necessidade de oitiva do adolescente para que seja decretado o regresso da medida não significa que este não possa ser apreendido e, somente após esse ato imediato de contenção, seja então apresentado à autoridade judicial.
CRIMINAL. HABEAS CORPUS. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ATO INFRACIONAL ANÁLOGO AO DELITO DE ROUBO QUALIFICADO. INTERNAÇÃO.PROGRESSÃO PARA A SEMILIBERDADE. EVASÃO POR DUAS VEZES. EXPEDIÇÃO DEMANDADO DE BUSCA E APREENSÃO. POSSIBILIDADE. REGRESSÃO DA MEDIDASOCIOEDUCATIVA. OITIVA PRÉVIA DO MENOR. SÚMULA 265 STJ. HIPÓTESE DIVERSA. ADOLESCENTE NÃO APREENDIDO. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. I. A jurisprudência desta Corte é pacífica no sentido de que a decretação de internação de adolescente que se encontrava cumprindo medida de semiliberdade, por consistir em regressão da medida socioeducativa, requer a prévia oitiva do menor infrator. Súmula nº 265 do STJ. II. A expedição de mandado de busca e apreensão para fins de localizar e trazer ao Juízo o adolescente que não se apresenta espontaneamente está embasado no art. 184, § 3º, do ECA, sendo que, após sua apreensão, deverá ser designada audiência especial, para que o menor apresente suas justificativas, a partir das quais a Autoridade Judiciária estará apta a analisar a necessidade de alteração da medida socioeducativa imposta ao paciente. III. Não havendo notícias de que o paciente tenha sido apreendido depois de sua segunda fuga, não há que se falar em ofensa ao disposto na Súmula n.º 265/STJ, por não ter sido determinada a regressão da medida socioeducativa de semiliberdade sem sua prévia oitiva, não se vislumbra o constrangimento ilegal apontado. IV. O que a Súmula n.º 265/STJ prescreve é que não seja determinada a regressão da medida socioeducativa antes de se dar oportunidade ao adolescente de se justificar acerca de seus atos, o que, por outro lado, não impede a expedição de mandado de busca e apreensão em desfavor daquele que não se apresenta espontaneamente, tampouco obsta a regressão da medida quando, mesmo determinada a oitiva do adolescente, o ato não se realiza por motivos a ele atribuíveis” (HC 236650/RJ, DJe 01/08/2012).
Ou seja, a Súmula “fala” menos do que deveria. Não apenas dá a entender que trata-se de mera oitiva (o que não é), bem como sobre seu enunciado pesa divergência no que toca o momento da oitiva, prevalecendo que sua realização após o mandado de busca e apreensão não viola a garantia do contraditório e ampla defesa.
3.2 MENOR INFRATOR
“Menor infrator” é termo reducionista. Ao mesmo tempo que não esclarece se apenas adolescente é “menor”, também o equipara a infrator, em evidente regresso à nomenclatura do Código de Menores[6].
Art. 1º Este Código dispõe sobre assistência, proteção e vigilância a menores:
I – até dezoito anos de idade, que se encontrem em situação irregular;
II – entre dezoito e vinte e um anos, nos casos expressos em lei.
Atualmente a infância e juventude é segregada em mais de um momento temporal distinto. De forma genérica são reconhecidos dois grandes marcos temporais para fins jurídicos: criança, com menos de 12 anos completos e adolescente dos 12 anos completos aos 18 anos incompletos.[7]
Art. 2º Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Após essa data inicia-se a vida adulta, com responsabilidade criminal, inclusive.
Art. 228. São penalmente inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às normas da legislação especial.
Por sua vez, os marcos psicológicos do desenvolvimento possuem momentos distintos, com efeitos jurídicos mais específicos. Podem ser classificados como marcos temporais relevantes na vida da pessoa natural: a primeira infância; a infância da criança; a adolescência; a juventude; a vida adulta; a velhice; e a proteção especial aos idosos de maior idade.
A primeira infância se inicia com o nascimento e termina 6 anos ou 72 meses de vida, se acordo com a Lei 13.257/16.[8]
Art. 2º Para os efeitos desta Lei, considera-se primeira infância o período que abrange os primeiros 6 (seis) anos completos ou 72 (setenta e dois) meses de vida da criança.
Como já referido a infância finaliza aos 12 anos e a adolescência aos 18 anos de idade. A juventude perdura dos 15 anos até os 29 anos de vida, na forma da Lei 12.852/13.
Art. 1º Esta Lei institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude – SINAJUVE.
§ 1º Para os efeitos desta Lei, são consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos de idade.
A vida adulta se inicia aos 18 e perdura até os 59, quando então se inicia a velhice (ou vida idosa), dos 60 em diante, com especial proteção conferida aos maiores de 80 anos, na forma do Estatuto do Idoso[9].
Art. 1o É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.
Art. 3o - § 2º Dentre os idosos, é assegurada prioridade especial aos maiores de oitenta anos, atendendo-se suas necessidades sempre preferencialmente em relação aos demais idosos.
Vale ainda esclarecer que o ECA é aplicável a quem possui até 21 anos, em casos específicos, incluído o regime de medidas socioeducativas. Tal determinação legal foi encampada pela jurisprudência do STJ, resultando inclusive em entendimento sumulado nesse sentido.
Art. 2º Parágrafo único. Nos casos expressos em lei, aplica-se excepcionalmente este Estatuto às pessoas entre dezoito e vinte e um anos de idade.
Súmula nº 605 – A superveniência da maioridade penal não interfere na apuração de ato infracional nem na aplicabilidade de medida socioeducativa em curso, inclusive na liberdade assistida, enquanto não atingida a idade de 21 anos.
Nota-se que o legislador procurou estabelecer organização própria para a incidência de direitos e garantias de acordo com a idade. Logo, a definição jurídica do que é um “menor infrator” é de extrema importância.
Caso adotada interpretação literal do termo “menor”, resta sem sentido a Súmula 605 do STJ, e inaplicável o ECA aos maiores de 18 anos.
Fato é que a intenção do STJ e a jurisprudência que aplica a Súmula não têm sido no sentido de afastar o ECA dos maiores de 18 e menores de 21, porém é inegável que o termo apresenta equívoco científico e merece revisão. Em especial no regime protetivo do ECA, à luz da evolução pós CR/88, a terminologia empregada carrega alta carga valorativa que merece a devida atenção.
3.3 REGRESSÃO
A primeira celeuma que surge é: o que é regressão? De acordo com a doutrina especializada em Direito Processual Penal, regressão de regime ocorre quando o condenado retorna a regime mais gravoso que o atualmente determinado. Portanto, em tema de Execução Penal, a regressão ocorre entre regimes, autorizada inclusive a regressão per saltum.
O regime de aplicação dos institutos de direito processual penal às medidas socioeducativas obedece ao princípio da legalidade previsto na Lei do SINASE, ou seja, não pode o adolescente receber tratamento mais gravoso do que o conferido ao adulto.
Tal princípio não significa a aplicação integral e irrestrita da Lei de Execução Penal aos adolescentes em conflito com a lei, tratando-se, na verdade, de limite máximo de aplicação de disposições próprias previstas na Lei do SINASE. Ou seja, o que quer que o SINASE determine, tal definição encontra limite no instituto respectivo de direito processal penal.
Isso significa que os institutos de execução de medida socioeducativa menos gravosos independem do princípio da legalidade.
No caso da execução de medida socioeducativa o eixo de cumprimento é o PIA, como já referido. Logo, cumprido o PIA, ainda que parcialmente, não há que se falar em regresso a medida mais gravosa.
Diante desses argumentos duas correntes se formam: pela possibilidade de regressão de medida menos gravosa para medida mais gravosa; e pela impossibilidade de regressão de medida socioeducativa, ressalvada apenas a chamada internação sanção.
Na jurisprudência aponta como corrente majoritária a possibilidade de regressão de medida socioeducativa, sendo a Súmula em atual análise a síntese dessa compreensão.
A determinação de regressão de medidas reclama a oitiva do menor-infrator, para que se manifeste a respeito do descumprimento da medida de semiliberdade originariamente determinada e que deu causa a regressão à medida de internação mais rigorosa, em observância ao caráter educacional de exceção da legislação incidente e ao princípio constitucional da ampla defesa. (HC 11302 SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 08/02/2000, DJ 20/03/2000).
Porém, desponta na doutrina especializada e em algumas instituições essenciais à justiça entendimento diverso.
Tese Institucional n.º 21 da DPE-SP: “É ilegal, no curso da execução, substituir-se medida mais branda pela internação ou semiliberdade com limite máximo de três anos”.
A leitura conjunta e sistemática do regime normativo do PIA como eixo de execução, seu cumprimento como forma de extinção das medidas socioeducativas e a internação-sanção como hipótese excepcional de medida de internação limitada ao prazo máximo de 3 meses, determina que o instituto da regressão não se coaduna com a execução de medidas aplicadas ao adolescente em conflito com a lei.
Não havendo regressão no sistema do ECA e SINASE conclui-se que atingida a finalidade do PIA, deve ser extinto o processo, salvo cumprimento parcial.
Tese Institucional n.º 119 da DPE-SP: “A Lei n.º 12.594/2012 não estabelece um sistema progressivo de cumprimento de medidas socioeducativas, somente podendo as mais gravosas ser substituídas por medidas mais brandas, em vez de determinar-se a extinção do processo de execução, quando as metas do Plano Individual de Atendimento não forem integralmente atingidas durante o prazo máximo de reavaliação, por conduta atribuível ao adolescente, e a finalidade socioeducativa remanescente estiver devidamente caracterizada no relatório conclusivo da entidade de atendimento”.
Novamente, vale ressaltar que esse entendimento não obsta a internação sanção como medida excepcional, sem, contudo, justificar a existência do regime da regressão.
CONCLUSÃO
Percebe-se, portanto, que o enunciado de Súmula 265 do Superior Tribunal de Justiça, em que pese de grande valia acerca da aplicação efetiva do contraditório e ampla defesa, peca ao utilizar terminologia inadequada e ao chancelar a regressão de regime socioeducativo.
As medidas socioeducativas servem única e exclusivamente no interesse da pessoa em especial estágio de desenvolvimento. Reconhecer que o Plano Individual de Atendimento está cumprido é reconhecer que seu interesse foi atendido. Ressalte-se que essa compreensão deve ser aplicada também para o cumprimento parcial do PIA.
Logo, autorizar a regressão da medida é supervalorizar a finalidade educacional em detrimento do interesse do adolescente, bem como flagrante violação ao devido processo legal, na medida em que será imputado a novo ato medida socioeducativa gravosa sem representação específica do Ministério Público.
Em que pese a jurisprudência pacífica em aplicar a regressão de regime ao processo de execução do SINASE, tem-se que o controle rigoroso do PIA por equipe interdisciplinar e participação ativa dos demais atores processuais (incluído o magistrado) atende de forma mais satisfatória a reeducação e ressocialização do adolescente, em vez de simples agravamento de sua situação.
A complexidade do sistema normativo no que tange os marcos especiais de desenvolvimento de crianças, adolescentes e jovens adultos importa em reconhecer que a importação desmedida de institutos típicos da execução penal é violação grave ao atual regime da proteção integral.
REFERÊNCIAS
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______. Lei nº 6.697/79. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/l6697.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
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______. Lei nº 12.594/12. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12594.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
______. Lei nº 12.852/13. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12852.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
______. Lei nº 13.257/16. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade. Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 11ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente – Doutrina e Jurisprudência. 21ed. Bahia: Juspodivm, 2021.
[1] BRASIL. Constituição Federal da República de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[2] ______. Lei nº 8.069/90. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[3] ______. Lei nº 8.069/90. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[4] ______. Lei nº 8.069/90. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[5] ______. Lei nº 12.594/12. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12594.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[6] ______. Lei nº 6.697/79. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1970-1979/l6697.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[7] ______. Lei nº 8.069/90. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[8] ______. Lei nº 13.257/16. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13257.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
[9] ______. Lei nº 10.741/03. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.741.htm> Acesso em 23 mar. 2022.
Graduado pela Universidade Estácio de Sá. Advogado. Pós-graduado em Direito Público e Privado pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LIMA, Paulo Figueiredo Fonseca. Os termos da Súmula 265 do Superior Tribunal de Justiça Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 abr 2022, 04:40. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58202/os-termos-da-smula-265-do-superior-tribunal-de-justia. Acesso em: 23 dez 2024.
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