ERICK VINICIUS COSTA DE ANDRADE
(orientador)[1]
RESUMO: O presente trabalho tem por objetivo evidenciar a seletividade penal como ilusão da sociedade. De fato, o sistema penitenciário brasileiro é formado, em sua maioria, por pobres, negros e favelados que muitas vezes não tem o apoio jurídico necessário fora da cadeia e após o cumprimento da pena não sentem-se ressoailizados, pelo contrário, correm um sério risco de fazerem parte de alguma facção criminosa como forma de manter-se vivo dentro da instituição prisional. A relevância social do presente estudo está relacionada a toda uma sociedade, haja vista, alguns concordam e outros discordam que a prisão pode vir a ressocializar os condenados. O grande aumento da criminalidade e a falência do sistema prisional, estando ambos relacionados, acarretam um dos fenômenos mais característicos da sociedade moderna, a superlotação carcerária e, consequentemente, o preconceito gerado para aquele que sai da prisão alinhado à falta de ressocializar torna difícil o retorno do apenado à sociedade que antes fazia parte. Em relação à metodologia, trata-se de uma pesquisa foi exploratória e bibliográfica, por meio de livros, artigos de autores especialistas na temática ora abordada. Após a pesquisa, conclui-se que diante das mazelas enfrentadas pelo sistema penitenciário brasileiro, pode-se encontrar saídas reais para atingir as finalísticas da pena privativa de liberdade. Portanto, é necessário que o condenado tenha todos os seus direitos e garantias respeitados durante a execução da pena no intuito de retornar à sociedade sem voltar para a vida delituosa.
Palavras-chave: Sistema prisional. Pena. Ressocialização. Presos.
ABSTRACT: The present work aims to highlight criminal selectivity as an illusion of society. In fact, the Brazilian penitentiary system is made up, for the most part, by the poor, blacks and favelados who often do not have the necessary legal support outside the prison and after serving their sentence do not feel reassured, on the contrary, they run a serious risk of being part of a criminal faction as a way of staying alive inside the prison institution. The social relevance of the present study is related to an entire society, given that some agree and others disagree that the prison can re-socialize the convicts. The great increase in crime and the failure of the prison system, both being related, lead to one of the most characteristic phenomena of modern society, prison overcrowding and, consequently, the prejudice generated for those who leave prison aligned with the lack of resocialization makes it difficult to return of the convict to the society he was previously a part of. Regarding the methodology, this is an exploratory and bibliographical research, through books, articles by authors specializing in the subject addressed here. After the research, it is concluded that in the face of the ills faced by the Brazilian penitentiary system, one can find real solutions to reach the finalistics of the custodial sentence. Therefore, it is necessary for the convict to have all his rights and guarantees respected during the execution of the sentence in order to return to society without returning to a criminal life.
Keywords: Prison system. Pity. Resocialization. prisoners.
1.INTRODUÇÃO
Em decorrência de um longo caminho percorrido de maneira equivocada na forma de se executar a pena, a sociedade brasileira contemporânea enfrenta como um de seus maiores desafios sociais e econômicos, a precariedade do sistema carcerário brasileiro, situação que apresenta causas, sobretudo ligadas à falta de estrutura, bem como à ineficiência da ressocialização por conta disso o maior desafio para o sistema carcerário brasileiro é a promoção integral do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, expresso no art. 1º, da Constituição Federal, a série de problemas compõem essa crise, como: a superlotação dos presídios, a falta de condições básicas de sobrevivência e infraestrutura das cadeias, o aumento crescente da população carcerária, fugas, rebeliões e a repressão violenta aos detentos. De certa forma, a ausência de medidas ressocializadoras nos presídios fomenta a criminalidade, pois o apenado permanece ocioso em grande parte do tempo, não produzindo nada que irá trazer um retorno para a sociedade e ao próprio indivíduo, seja através do trabalho ou qualquer outra atividade que traga ao preso um retorno para a sociedade e ao próprio indivíduo, seja através do trabalho ou qualquer outra atividade que traga ao preso um sentimento de dignidade e cidadania.
Consequentemente, desta maneira é importantíssimo o respeito à dignidade da pessoa humana nos presídios brasileiros, porque como ressocializar alguém com tratamento desumano e cruel? Percebe-se que fica muito difícil a recuperação do preso se o mesmo for tratado meramente como coisa. O Estado deve observar e respeitar as garantias fundamentais, para que de certa forma alcance a regeneração daquele que veio a praticar um crime.
Disto isso, o egresso do sistema prisional ao retornar ao convívio social, traz consigo um estigma, por ser um ex-presidiário, não sendo aceito totalmente na sociedade, que tem um preconceito e uma desconfiança desse cidadão que cometeu um crime e pagou com seu bem mais precioso, a liberdade, e que somente quer uma nova oportunidade para ter uma vida com dignidade.
O trabalho apresenta o seguinte problema: O encarceramento excessivo de pobres, pretos e favelados, muitas vezes, resultado da guerra às drogas permite a ressocialização? Atualmente a população carcerária brasileira já ultrapassa a marca de 720 (setecentos e vinte) mil detentos, sendo que destes, 95% são homens e 5% são mulheres. A grande maioria é negra ou parda e de classe econômica baixa ou miserável, detentos que mal sabem ler ou escrever e que viram no mundo do crime uma oportunidade de desfrutar do dinheiro fácil, tendo em vista que numerosa parcela dos encarcerados cumprem pena por tráfico de drogas, roubos e homicídios.
Considera-se pertinente este trabalho que tem como objetivo geral evidenciar a seletividade penal como ilusão da sociedade. A partir disso, destaca-se os seguintes objetivos específicos: Apresentar de forma sintetizada a origem e evolução das penas, bem como as espécies de Pena; Identifica os regimes de pena conforme o ordenamento jurídico brasileiro; Compreender o objetivo da Lei de Execução Penal e a importância da ressocialização dos apenados.
2.ORIGEM E EVOLUÇÃO DAS PENAS
É importante iniciar esse capítulo informando que as penas sempre foram aplicadas como uma forma de vingança. Ao delinquente e/ou criminoso era imposto o mesmo dano ou mal que ele tinha causado a uma pessoa, o método é conhecido até os dias de hoje, sendo conhecido como “Oculum pro óculo–dentem pro dente”.
Em outras palavras o criminoso teria que passar ou ter um sofrimento semelhante ao que causou à sua vítima (RESSEL, 2007). Martins nos apresenta alguns tipos de penas:
Vigia a lei do mais forte, do que detinha maior poder, que não encontrava limites para o alcance ou forma de execução da reprimenda que entendia em aplicar, aí incluída a morte, a escravização, o banimento, quando não atingia toda a família do infrator (MARTINS, 2005, p. 15).
Dessa forma, as penas sempre tiveram como objetivo principal o pagamento do mal na mesma moeda, ou seja, o delinquente teria que sofrer o mal praticado por ele próprio. Contudo, nem sempre as penas foram interpretadas e/ou aceitas pelos juristas, filósofos e pensadores do direito.
Ambos, com o passar dos anos, evoluíram seus conceitos a respeito do tema e a consequente evolução desta tendência punitiva, ou seja, algumas discussões foram realizadas a respeito de novas modalidades punitivas e isso acabou gerando a possibilidade para que outras formas ou maneiras fossem fluindo normalmente.
Neste sentido, acaba que da mesma maneira que a pena de morte e os castigos físicos foram superados em um dado momento na história pela pena de prisão, também continua sendo objeto de estudos e consequentes questionamentos desde o início do século, pois não surtiu o efeito necessário, tornando-se praticamente inútil na contenção da criminalidade (MARTINS, 2005).
Todavia, foi na Idade Média onde ocorreu ações de extrema crueldade na repressão, assim, penas capitais e tortura, como por exemplo, amputações de orelhas, nariz, órgãos genitais, além de fazer da mesma forma com o gado nos dias de hoje, uma marcação com ferro quente, cegamento, dilacerações dos membros até a morte, todos esses castigos ou punições eram empregadas com bastante frequência, não sendo utilizado somente como um procedimento padrão, mas como de fato uma forma de penalidade (RESSEL, 2007).
Além disso, não sendo o bastante a aplicação desses castigos cruéis, os condenados ainda teriam que passar por tudo isso de forma pública, sendo expostos para toda sociedade, através de cerimônia, com o objetivo de impressionar o povo e mostrar o poder dos governantes. Tratava-se de cerimônias bem longas, uma espécie de ritual, onde os participantes, incluindo o condenado eram obrigados a realizar um passeio pelas ruas carregando uma tocha até o local da execução, além disso, tinham que carregar cartazes onde estava escrito o crime cometido pelo condenado, juntamente a confissão pública nas portas das igrejas, leitura da sentença de condenação, esses são somente alguns procedimentos feitos com os condenados (JESUS, 2005).
Com o passar dos anos, a sociedade foi acreditando e espalhando a ideia de que o simples e cruel prazer de punir não causavam mais o horror esperado, assim a pena não poderia se tratar somente de vingança pública, pois, em cada homem, sendo ele quem for ou o que tenha praticado, ainda lhe restava alguma humanidade, e esta deveria ser respeitada.
É lógico que a Igreja teve forte influência nesse processo e serviu para amenizar a aplicação das penas, mas sua participação somente teve efeito considerável por volta da primeira metade do séc. XIX que os vários tipos de suplícios (castigo corporal), com seus castigos são definitivamente rejeitado e banidos (RESSEL, 2007).
Oliveira Filho comenta sobre a carência que um Poder Judiciário fazia naquela época:
O Poder Judiciário ainda não havia se estruturado na alta Idade Média. A tarefa de resolver os litígios e proceder com a liquidação cabia aos indivíduos, e aos senhores soberanos somente o papel de atestar a regularidade do procedimento. A acumulação de riqueza e do poder das armas e a constituição do poder judiciário nas mãos de alguns, ambos partes de um mesmo processo histórico ligado ao momento medieval, só vem a amadurecer no final do século XII com a formação da primeira grande monarquia medieval (OLIVEIRA FILHO, 2013, p. 13).
Dessa forma, a justiça acabou sendo direcionada do alto, ou seja, quando havia a ofensa a um indivíduo a mesma passou a ser considerada também uma ofensa ao Estado, a ordem, a lei e ao poder soberano. Sendo assim, segundo Oliveira Filho (2013, p. 1) “A reparação já não pode concluir-se com a satisfação do ofendido, sendo necessária a reparação da ofensa contra o soberano, razão do surgimento dos mecanismos de multas e confiscações”.
Diante disso, através desse processo de estatização da justiça penal contemplado ao longo da Idade Média ocorreu também a abertura de um espaço importante para o surgimento da “sociedade disciplinar”. Assim compreendida por Foucault (2005, p. 79):
Surge no fim do século XVIII e início do século XIX com a reorganização do sistema judiciário e penal na Europa. Influenciada por autores como Beccaria, Bentham e Brissot, o sistema teórico da lei penal passa a ter como princípio fundamental o crime, no seu sentido técnico, cortando relação com a falta moral ou religiosa. A infração vem atrelada a ideia de violação a uma lei, devidamente formulada e cumprida por um poder político. Outra mudança é a ideia da lei penal como protetora do que é mais importante pra sociedade, e da necessidade de ser clara a definição do crime. Nesse período, ocorre o surgimento do Direito Penal moderno, um direito codificado atribuindo penas a crimes específicos com uma metodologia de aplicação da lei. Sua principal fonte e o contratualismo, em especial com Locke. Ligada a crença no indivíduo e sua liberdade individual, abriu espaço para a transformação do direito de punir com base na vontade divina ou do senhor para um direito de ser punido na medida da responsabilidade sobre violação ao pacto social.
Dessa maneira, subentende-se que a futura centralidade que terá a pena de prisão acaba por reforçar a ideia de que houve sim uma contrarreforma. O professor Louk Hulsman (2003,
p. 70) a chama de “filha da escolástica”, trata-se especificamente da sua relação através de uma visão religiosa sobe o mundo.
Por outro lado, ainda completa com a seguinte afirmação “A centralidade de ambos é a existência de um ponto absoluto, onipotentes e onisciente, que se apresenta ou como Deus ou como a lei”. (HULSMAN, 2003, p. 102). A aceitação quase que natural do elemento inocente- culpado pode ser explicada pela filosofia religiosa.
Em se tratando dessa relação, Pasukanis explica que:
A Igreja quer associar ao momento material da indenização o motivo ideológico da expiação e, portanto, fazer do direito penal, baseado sobre o princípio de vingança privada, um meio eficaz de manutenção da disciplina pública, isto é, da dominação de classe (PASUKANIS, 1989, p. 149).
Portanto, a partir da reforma do sistema penal, somente é considerado criminoso aquele que rompe o pacto com a sua própria sociedade. Assim, como penalidade em descumprir esse contrato o criminoso é reconhecido como um inimigo da sociedade.
Dessa forma, quando ocorre uma perturbação da vida em sociedade o crime é automaticamente configurado, na visão dos penalistas da reforma, por exemplo, acabaram defendendo que a pena precisa atuar na reparação da perturbação.
Os penalistas ainda sugerem que a punição deveria abandonar a tentativa de redenção de pecados ou exercer a vingança propriamente dita, pois deveria provocar um desincentivo para que outros membros rompam o pacto social (OLIVEIRA FILHO, 2013). Diante disso, na época da reforma da penalidade quatro tipos possíveis de punições foram levantados:
A deportação; o desprezo público, que se tratava de expor publicamente a falta cometida buscando a humilhação do autor; a reparação forçada do dano, sendo inclusive apontada a ideia de trabalho forçado; e, por fim, a pena de talião, que trata- se de responder ao infrator na medida exata do dano (OLIVEIRA FILHO, 2013 on- line).
A reforma buscou atribuir um caráter bem mais técnico às penas, ou seja, procurava a adoção de penas mais humanas e se tratando da tortura, que esta fosse de fato abolida, por exemplo, penas corporais e infamantes, das execuções capitais barbaras, etc. A pena com caráter cruel e desumano passa a ser vista como uma verdadeira afronta ao pacto social, sendo caracterizada como prática normal dos Estados absolutistas (HULSMAN, 2003).
Dessa forma, o Estado não abrindo mão ainda reforça seu patrimônio em continuar exercendo ou praticando seu poder de punir. Com isso, o Estado acredita que a eterna vigilância e a certeza da punição continuariam sendo o método mais eficaz que a dor corporal.
Nesse sentido, um dos autores mais expressivos dessa época, Beccaria (apud OLIVEIRA FILHO, 2013, p. 17) afirma “Não é o rigor do suplício que previne os crimes com mais segurança, mas a certeza do castigo, o zelo vigilante do magistrado e essa severidade inflexível que só é uma virtude no juiz quando as leis são brandas”.
Entretanto, e infelizmente, a abolição ou eliminação das penas corporais não ocorreu em todo lugar, o açoite, por exemplo, na Inglaterra ainda continuaria, o castigo corporal aos presidiários na França também, e até a introdução de castigos corporais para alguns delitos na Dinamarca de 1905. Na visão de Pasukanis, após a queda da república soviética da Hungria, já em 1919, o acoite acabou sendo usado como pena para certos delitos contra a pessoa e a propriedade (PASUKANIS, 1989, p. 30).
Essa é a real história de como “constituiu-se progressivamente o complexo amalgama do direito penal moderno, no qual pode-se distinguir sem dificuldade as raízes históricas que lhe deram origem” (PASUKANIS, 1989, p. 151).
2.1 Espécies de penas
De acordo com Nucci (2014, p. 316) “as penas se classificam de acordo com o objeto de interesse a ser analisado, a propósito, importa observar que existem vários tipos de classificação da pena, a doutrinária, constitucional e a classificação de acordo com o Código Penal vigente”. Todavia, merece destaque nesse estudo especialmente, a classificação de acordo com o código penal vigente, que em seu art. 32 prevê as seguintes espécies de penas: Privativa de liberdade, Restritiva de direito e multa.
2.1.1 Penas Privativas de Liberdade
As penas privativas de liberdade, como o próprio nome sugere, são aquelas em que o sujeito vê cerceada sua liberdade de ir e vir, de se locomover para onde queira; tal é o caso da reclusão, da detenção e da prisão simples. Para Nucci (2014, p. 317) “Existem três espécies de penas privativas de liberdade – reclusão, detenção e prisão simples – que, na realidade, poderiam ser unificadas sob a denominação de pena de prisão”.
Em outras palavras o seu objetivo consiste em promover a restrição do direito a liberdade, “pena privativa de liberdade é a que restringe o direito de ir e vir do condenado, lhe infringido um determinado tipo de prisão” (BARROS, 2004, p. 439). Da mesma forma ensina Mirabete (1999, p. 78) “A pena privativa de liberdade é aquela que restringe, com maior ou menor intensidade, a liberdade do condenado, consistente em permanecer em algum estabelecimento prisional, por um determinado tempo”.
A reclusão é a mais grave, e normalmente seu cumprimento tem início no regime fechado, tendo em vista a gravidade do delito cometido. Há situações delitivas em que o cumprimento da prisão se dará, pelo menos inicialmente, em regime fechado. Isso significa que o preso não poderá voltar para sua casa, nem trabalhar fora da unidade prisional.
Já a detenção é cumprida nos regimes aberto e semi-aberto e a prisão simples, também cumprida em regime aberto e semi-aberto e cabe nos casos de contravenção penal. Assim, a pena privativa de liberdade é cumprida em regime progressivo. Sobre isso falam inúmeros doutrinadores, dentre eles Heráclito e Júlio César Mossin:
A pena de reclusão é cominada para as infrações penais mais graves. Aquelas que ofendem de maneira mais contundente os bens jurídicos tutelados pela norma penal sancionatória, notadamente quando essa é praticada mediante o uso do dolo em quaisquer de suas modalidades. Há aqui a presença de maior reprovabilidade social.
A pena de detenção é reservada para as transgressões penais menos graves, não só relativamente à espécie de bem, interesse tutelado pela norma penal, mas também levando em consideração o elemento subjetivo no tipo penal, que no caso é a culpa, em quaisquer de suas formas. A reprovação social, pela ótica do legislador, é mais suave. (MOSSIN e MOSSIN, 2012, p. 233).
Com a devida “venia” ao entendimento dos ilustres doutrinadores, sabe-se que vários são os fatores que influenciam na determinação do regime em que se cumprirá a pena, tais como a gravidade do delito, já mencionada por eles, mas também as características do réu, sua vida pregressa, etc. Para Mirabete (2006, p. 52):
Apesar de ter contribuído decisivamente para eliminar as penas aflitivas, os castigos corporais, as mutilações, etc; Não têm a pena prisão correspondido às esperanças de cumprimento, com as finalidades de recuperação do delinquente. O sistema de pena privativa de liberdade e seu fim constituem verdadeira contradição.
Por fim, dos meios de aplicação de pena esta é reconhecida como sendo a mais rigorosa das que estão dentro do ordenamento jurídico.
2.1.2 Penas restritivas de direito
As penas restritivas são também entendidas como penas autônomas, e não acessórias, ou seja, as mesmas tem caráter inadmissível quanto a sua cumulação com a pena privativa de liberdade.
São penas alternativas expressamente previstas em lei, tendo por fim evitar o encarceramento de determinados criminosos, autores de infrações penais consideradas mais leves, promovendo-lhes a recuperação através de restrições a certos direitos (NUCCI, 2014, p. 342).
As penas restritivas de direito, levando em consideração a regra do código penal, podem ser aplicadas sendo substituídas pelas penas privativas de liberdade. Dessa forma, o Juiz, quando toma a decisão de condenar o acusado a uma pena privativa de liberdade, tem o poder para também substituir essa pena por uma pena restritiva de direito, porém, precisa-se levar em consideração alguns pontos.
As alternativas penais, também chamadas substitutivo penais, são meios de que se vale o legislador visando impedir que o autor de uma infração penal venha a ser aplicada medida ou pena privativa de liberdade (JESUS, 2005, p. 559).
As penas restritivas de direito, também conhecidas como penas alternativas, adotada pelo Código Penal são: a prestação pecuniária, a perda de bens e valores, a prestação de serviços à comunidade ou entidade pública, a interdição de temporária de direitos e a limitações de fim de semana. Assim, podem ser localizadas no CP art. 43. Nas palavras de Nucci (2014, p. 343) as espécies de penas restritivas de direitos são melhores esclarecidas:
A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro feito à vítima e seus dependentes ou a entidade pública ou privada, com destinação social, de uma importância fixada pelo juiz, não inferior a um salário mínimo nem superior a 360 salários mínimos. Pode, conforme o caso transformar-se em prestação de outra natureza, conforme veremos no item próprio.
A perda de bens e valores consiste na transferência, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, de bens e valores adquiridos licitamente pelo condenado, integrantes do seu patrimônio, tendo como teto o montante do prejuízo causado ou o proveito obtido pelo agente ou terceiro com a prática do crime, o que for maior.
A prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas é a atribuição de tarefas gratuitas ao condenado junto a entidades assistenciais, hospitais, orfanatos e outros estabelecimentos similares, em programas comunitários ou estatais.
A interdição temporária de direitos é a mais autêntica pena restritiva de direitos, pois tem por finalidade impedir o exercício de determinada função ou atividade por um período determinado, como forma de punir o agente de crime relacionado à referida função ou atividade proibida, frequentar determinados lugares ou inscrever-se em concurso, avaliação ou exame públicos.
A limitação de fim de semana consiste na obrigação do condenado de permanecer, aos sábados e domingos, por cinco horas diárias, em Casa do Albergado ou lugar adequado, a fim de participar de cursos e ouvir palestras, bem como desenvolver atividades educativas.
Portanto, quanto à duração da pena aplicada, a restrição a um montante de quatro anos somente ocorre nos casos de crimes dolosos. Os culposos não possuem esse limite.
3.DOS REGIMES PENAIS
De acordo com Capez (2011, p. 397) o regime de cumprimento da pena apresenta suas regras, previstas no Código Penal e na Lei de Execução Penal. Todavia, seu objetivo gradual consiste principalmente na inserção do condenado na sociedade, promovendo o incentivo para que este busque a ressocialização e sua recuperação, e no futuro não cometa novos crimes. Apresenta-se o regime fechado, semi-aberto e o regime aberto.
3.1 Regras do Regime Fechado
O regime inicial fechado, portanto, é um regime de exceção, cuja aplicação exige motivação idônea, tendo em vista que a privação da liberdade, um bem tão precioso ao ser humano, não deve ser permitida, sem elementos que verdadeiramente a justifiquem.
No regime fechado o condenado cumpre a pena em penitenciária e estará obrigado ao trabalho em comum dentro do estabelecimento penitenciário, na conformidade de suas aptidões ou ocupações anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena. Nesse regime o condenado fica sujeito ao isolamento durante o repouso noturno (art. 34, § 1º, do CP), porém, na prática, esse isolamento noturno, com os requisitos exigidos para a cela individual (art. 88 da LEP), não passa de “mera carta de intenções” do legislador brasileiro, sempre tão romântico na fase de elaboração dos diplomas legais. Com a superpopulação carcerária constatada em todos os estabelecimentos penitenciários, jamais será possível o isolamento dos reclusos durante o repouso noturno.
Quem cumpre pena em regime fechado não tem direito a frequentar cursos, quer de instrução, quer profissionalizantes. E o trabalho externo só é possível (ou admissível) em obras ou serviços públicos, desde que o condenado tenha cumprido, pelo menos, um sexto da pena (BITENCOURT, 2012, p. 1342).
Contudo, segundo Nucci apud Mossin e Mossin (2012, p. 251) “optou o legislador por criar uma presunção absoluta de incompatibilidade de cumprimento superior a 8 anos em regime mais brando, impondo o fechado”. Há crimes, portanto, em que, em regra, o regime inicial de pena é o fechado; mesmo diante da insistência de alguns pensadores, que afirmam que é preciso olhar as circunstâncias do crime, para então se estabelecer o regime. O entendimento, inclusive jurisprudencial, é controverso.
3.2 Regras do Regime Semiaberto
Conforme Capez (2011, p.386), no regime semiaberto, o preso “cumpre a pena em colônia penal agrícola, industrial ou em estabelecimento similar”. Nesse regime, também, o preso começa a ter um pouco mais de liberdade. Aqui é possível trabalhar e estudar com mais facilidade, remindo a pena, para poder sair da prisão o mais breve possível.
No regime semiaberto não há previsão para o isolamento durante o repouso noturno. Nesse regime, o condenado terá direito de frequentar cursos profissionalizantes, de instrução de 2º grau ou superior. Também ficará sujeito ao trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou em estabelecimento similar. Aqui, no regime semiaberto, o trabalho externo é admissível, inclusive na iniciativa privada, ao contrário do que ocorre no regime fechado. Este, o serviço externo, pode ser o penúltimo estágio de preparação para o retorno do apenado ao convívio social. O próximo e derradeiro passo será o livramento condicional (BITENCOURT, 2012, p. 1344).
O regime semi-aberto, é aplicado em caso de delitos cuja gravidade é considerada menor, sem reincidência, ou ainda quando já houve a progressão de regime, ou seja, o preso já cumpriu parte da pena em regime fechado. Esses ambientes não têm todo aquele aparato da penitenciária.
Os compartimentos podem ser coletivos, mas observa-se, também aqui, a seleção dos presos e o limite da capacidade de alojamento.
O ambiente coletivo se justifica tendo em vista que aqui os presos passarão apenas a noite nesses compartimentos, trabalhando durante o dia.
3.2 Regras do Regime Aberto
Em relação ao regime aberto, de acordo com Capez (2011, p. 386), nesse regime, o indivíduo apenado “trabalha ou frequenta cursos em liberdade, durante o dia, e recolhe-se em Casa do Albergado ou estabelecimento similar à noite e nos dias de folga”.
O regime aberto baseia-se na autodisciplina e no senso de responsabilidade do apenado. O condenado só permanecerá recolhido (em casa de albergado ou em estabelecimento adequado) durante o repouso noturno e nos dias de folga. O condenado deverá trabalhar, frequentar cursos ou exercer outra atividade autorizada fora do estabelecimento e sem vigilância. Com responsabilidade e disciplinadamente o detento deverá demonstrar que merece a adoção desse regime e que para ele está preparado, sem frustrar os fins da execução penal, sob pena de ser transferido para outro regime mais rigoroso (art. 36, § 2º, do CP) (BITENCOURT, 2012, p. 1346).
Antes de tudo, é preciso lembrar que o direito ao cumprimento da pena em regime aberto é adquirido pelo condenado após o cumprimento de parte dela em regime semiaberto, pelo que se chama “progressão do regime”.
Aqui, o preso tido como de “bom comportamento” tem a oportunidade de retornar à sociedade, ainda que tenha de dormir ou passar suas folgas em “Casa do Albergado”. Essa é uma boa alternativa como reprimenda ao ato praticado, que leva a pessoa a experimentar um pouco do que seria “estar encarcerado”, desmotivando-o a novas condutas delitivas, ou pelo menos, é o que se espera que aconteça.
3.2.1 Prisão Albergue Domiciliar
A Prisão Albergue Domiciliar consiste na pena a ser cumprida em residência informada ao juiz, sendo o apenado obrigado a voltar ao local todas as noites até as 20 horas, a partir disso ele somente só poderá sair de novo às 6 horas da manhã.
Aos sábados, domingos e feriados o apena pode permanecer em casa, ainda vale lembrar que o apenado não pode sair da cidade em que mora por hipótese alguma. Salvo em casos específicos (trabalho e/ou estudo), porém, tudo isso com autorização do juiz (RAESP, 2016).
Outra característica e norma importante é que deve comparecer ao Patronato nas datas marcadas e caso haja algum e/ou qualquer descumprimento do regime acarretará a revogação ou suspensão do benefício, sendo dificilmente concedido novamente.
Em caso de prisão albergue domiciliar monitorada, alguns cuidados de- vem ser tomados, aos quais:
Não se afastar mais de 5 metros do aparelho;
Se o aparelho estiver sem sinal do GPS, emitirá um sinal sonoro, neste caso deverá sair imediatamente do local e ir para onde o GPS possa captar; A tornozeleira não poderá ser rompida;
O aparelho deverá ser carregado na tomada duas vezes por dia; O aparelho não poderá ser danificado;
Qualquer alteração no aparelho deve-se entrar em contato imediata- mente com o Patronato para informar a alteração (RAESP, 2016 on-line).
O art. 117 da Lei de Execução Penal é bem taxativo, principalmente no que consiste em indicar os condenados a cumprir sua pena em regime aberto em sua residência particular. Assim, vale descrever o artigo:
Art. 117 - Somente se admitirá o recolhimento do beneficiário de regime aberto em residência particular quando se tratar de:
- Condenado maior de 70 (setenta) anos;
- Condenado acometido de doença grave;
- Condenada com filho menor ou deficiente físico ou mental;
- Condenada gestante (BRASIL, 1984).
Entretanto, algo que merece destaque é a discussão a respeito do fato de ter o agente de cumprir a sua pena em regime aberto, sendo que, normalmente na Comarca na qual a mesma deverá ser executada a pena, não existe Casa do Albergado, sendo este o local destinado a este propósito, conforme determina o art. 93 da Lei de Execução Penal (GRECO, 2008).
Art. 93 - A Casa do Albergado destina-se ao cumprimento de pena privativa de liberdade, em regime aberto, e da pena de limitação de fim de semana (BRASIL, 1984).
O Desembargador Vieira de Brito do TJMG, em voto prolatado no Agravo em Execução nº 1.0000.06.439898-5/001, destaca:
Estado que pune é aquele que deve se equipar com os meios adequados às punições que institui. Se assim não se porta, recebe o ônus de ver sentenciados em regime aberto cumprindo sua pena em casa, pois situação pior não lhes pode ser conferida.
Portanto, a lei garante regime prisional em uma modalidade bem menos rigorosa em se tratando da progressão de regime, portanto, quando não há um local devido para que seja cumprida essa pena no regime aberto, não há como obrigar o condenado a permanecer recluso, pois a própria lei oferece e determina a melhora nas condições do cumprimento.
3.3 Progressão e Regressão de Regime
O Código Penal Brasileiro, no bojo de sua tradição brasileira e aproveitando-se do próprio pensamento punitivo emergente das ideias político-filosóficas e jurídicas que persistiu a partir do início do século XIX, acabou resultando na consagração do sistema penitenciário progressivo, melhor observado na Parte Geral do Código Penal, em seu art. 33, § 2º:
Art. 33, § 2º: As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso [...].
A Reforma Penal tomou posse de todo o sistema progressivo de cumprimento de pena que, de acordo com Bitencourt (2003, p. 430) dá condições ao próprio condenado “através de seu procedimento, da sua conduta carcerária, direcionar o ritmo de cumprimento de sua sentença, com mais ou menos rigor”.
Em outras palavras promove ao condenado a possibilidade de conquistar, de maneira lenta a sua liberdade, sendo durante o cumprimento da pena, em observância de que a pena a ser cumprida nem sempre será a pena aplicada.
No que tange o regime fechado, que é considerada o período mais rígido do cumprimento da pena, possibilita o Código Penal a conquista progressiva de parcelas da liberdade suprimida.
A progressão do regime também aparece como sendo garantida na Lei de Execução Penal em seu artigo 112, dispõe a lei:
Art. 112: A pena privativa de liberdade será executada em forma progressiva com a transferência para regime menos rigoroso, a ser determinada pelo juiz, quando o preso tiver cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior e seu mérito indicar progressão.
Parágrafo único. A decisão será motivada e precedida de parecer da Comissão Técnica de Classificação e do exame criminológico, quando necessário.
Capez (2010, p. 92) adota um conceito sobre a progressão de regime como a “passagem do regime mais rigoroso para outro mais brando de cumprimento da pena privativa de liberdade”.
Assim, o condenado quando começa a cumprir sua pena em regime fechado, tem totais condições para avançar um pouco no intuito de alcançar os regimes semi-aberto e aberto e, consequentemente, obter o livramento condicional, até resultar na liberdade completa. Todavia, tudo isso depende de seu bom desempenho durante o período prisional, pois é este que normalmente revela uma aparente recuperação moral do condenado. Conforme Leal (2003, p. 204):
É afastada a tese utilitarista da pena como instrumento de recuperação, admite-se que o mérito resulta do simples fato de que, ao cumprir parte de sua pena, sem faltas ou infrações disciplinares, o condenado resgata parcialmente o preço de seu crime e, com isso, adquire o direito à progressão.
Assim, quanto a progressão é preciso analisar delicadamente tanto o mérito do condenado, sendo este um requisito subjetivo, como também que o condenado tenha cumprido ao menos um sexto da pena no regime anterior, apresentando-se como caráter objetivo. É preciso salientar que este condenado não poderá progredir direto do regime fechado para o aberto, devendo passar pelo regime semi-aberto primeiro.
Neste sentido, defende Mirabete (2002, p. 359) que a progressão deve ser efetuada por etapas, já que “nas penas de longa duração, a realidade ensina que se deve agir com prudência para não permitir que o condenado salte do regime fechado para o aberto”, ou seja, é exatamente por esse motivo que a lei torna obrigatória a passagem pelo regime intermediário ou semi- aberto.
Dessa forma, de maneira detalhada, para que ocorra o ingresso no regime aberto, além do cumprimento de um sexto da pena e pelo mérito do condenado, é de fundamental importância analisar se o condenado preenche os requisitos do art. 114 da Lei de Execução Penal, sendo estes:
Se o apenado está trabalhando ou se demonstra a possibilidade de vir a fazê-lo imediatamente e, se apresenta, pelos seus antecedentes e pelo resultado dos exames a que se submeteu, fundados indícios de que se ajustará com autodisciplina e senso de responsabilidade ao novo regime afirma que (BITENCOURT, 2003, p. 431).
A progressão do regime de pena, portanto, atua no instituto garantido tanto por Lei Penal quanto por Lei de Execução Penal, ou seja, é imprescindível que seja respeitada e concedida pelos operadores do Direito a todos os condenados.
4. LEI DE EXECUÇÃO PENAL
Lei de Execução Penal, Lei 7.210 de 11 de julho de 1984, também conhecida como LEP, é considerada uma das mais evoluídas e abrangentes do mundo. Em seu artigo 1° expõe que tem como objetivo ―efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado‖.
A Lei n°7.210 atendeu aos anseios jurídicos nacionais da época, revogando a Lei 3.274/1957 e trazendo novidades como a jurisdicionalização da execução penal, diretamente ligada ao Estado de Direito, mais humanitária e responsável pelo bem-estar e recuperação do apenado.
Observa-se que a LEP trouxe em seu texto a grande preocupação do legislador em não apenas punir o infrator condenado, mas poder dar ao mesmo a possibilidade de redimir-se de seus erros e poder regressar a sua vida em sociedade, sem que voltasse a delinquir.
Renato Marcão (2015, p. 32) reitera que: A execução penal deve objetivar a integração social do condenado ou internado, já que adotada a teoria mista ou eclética, segundo a qual a natureza retributiva da pena busca apenas a prevenção, mas também a humanização. Objetiva- se, por meio da execução, punir e humanizar.
O Estado manteve a sua intensão de punir, como meio de tentar impedir que novos delitos fossem praticados por medo das penas impostas, mas também a preocupação de que, havendo a necessidade de punir, o infrator tivesse condições de remir a sua pena e não mais delinquir, evitando a reincidência e a sua total reintegração com a vida em sociedade. Ainda neste sentido é possível destacar o exposto na Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal nos itens de n° 13 e 14:
13. Contém o art. 1º duas ordens de finalidades: a correta efetivação dos mandamentos existentes nas sentenças ou outras decisões, destinados a reprimir e a prevenir os delitos, e a oferta de meios pelos quais os apenados e os submetidos às medidas de segurança venham a ter participação construtiva na comunhão social.
14. Sem questionar profundamente a grande temática das finalidades da pena, curva- se o Projeto, na esteira das concepções menos sujeitas à polemica doutrinária, ao princípio de que as penas e medidas de segurança devem realizar a proteção dos bens jurídicos e a reincorporação do autor à comunidade.
Punir, prevenir e ressocializar, pode-se dizer que seriam estes os destaques encontrados na LEP e que a tornam tão bem vista no meio jurídico internacional.
4.1 A ressocialização e a reinserção dos apenados
Quando se fala em ressocialização, a primeira coisa que se deve pensar é na etimologia da palavra “ressocializar”, que é preciso que o cidadão volte a ser uma pessoa que tenha condições de permanecer no convívio social. Um homem vivendo sozinho em uma montanha isolada, não precisaria se preocupar em ter um comportamento sociável ou de acordo com esta ou aquela norma. Mas quando se agrega, formando grupos sociais, o homem precisa obedecer a certas normas de organização, sob risco de se ter um completo caos social, caso não o faça.
Quando se convive com o outro, portanto, as regras de conduta são muito importantes, porque não se trata mais apenas do bem-estar individual, na lógica do “vale-tudo”, é preciso buscar o interesse coletivo, o bem-estar de toda a coletividade. Daí porque a infringência às normas sociais geram sanções, as quais possuem várias finalidades, tais como reprimir a conduta lesiva, fazer cessá-la, e educar o agente causador do dano para que não volte a delinquir (MIRABETE, 2002).
Essa educação para a vida em sociedade pode assumir diversas formas, como, por exemplo, estimular o delinquente a desenvolver serviços sociais na sua comunidade, por meio das medidas substitutivas da pena privativa de liberdade – nos crimes de menor potencial ofensivo; permitir que possa remir o tempo de prisão através do trabalho ou do estudo no próprio meio prisional, ajudar o preso a encontrar curso de qualificação que possa fazer para se reinserir no mercado de trabalho, quando é liberado da prisão, etc.
Assim, o processo de ressocialização, é uma tentativa em tornar o ser humano uma pessoa mais consciente, capaz de viver em sociedade seria, sem dúvida, algo desejável e possível se o sistema prisional conseguisse oferecer todos os meios que a própria Lei dispõe como essenciais à ressocialização. O trabalho e o estudo, por exemplo, permitem que a pessoa volte a ser “útil” à sociedade e que tenha seu meio de sustento. Com isso, pelo menos no aspecto material, não haveria razões para delinquir.
A pena, por si só, em especial, em regime fechado, e mais ainda nos presídios abarrotados de gente e sem as mínimas condições de salubridade e higiene, não ressocializa, não traz de volta a sensibilidade e a humanidade, a compreensão e a percepção da alteridade. Ao contrário, ela “deseduca”, endurece o caráter e desperta a fúria.
Existem inúmeras teorias sobre a pena. Segundo Bitencourt (2012, p. 131) a primeira delas e que ganhou muita força em tempos passados foi a que considera a pena como forma de retribuição ao mal que se causou, um castigo ou uma punição ao delito – teorias absolutas ou retributivas da pena.
Para estas teorias não importava o futuro, o que interessava era o passado. Muitas das penas eram cruéis e degradantes e não garantiam que o criminoso não voltaria a reincidir, porque o Estado não estava preocupado em educá-lo ou em torná-lo um ser humano melhor. Seu interesse era, unicamente, reprimir, retribuir o mal com outro mal.
Assim, Beccaria em sua obra “Dos Delitos e das Penas” afirma que, muitas vezes, o mal causado pela pena era pior e muito mais grave que o próprio delito. Daí se dizer que não havia proporcionalidade na aplicação dessa pena. A seguir vieram as teorias relativas ou preventivas da pena. Aqui, a pena ganha um caráter preventivo. Segundo Bitencourt:
Para as teorias relativas a pena se justifica, não para retribuir o fato delitivo cometido, mas sim para prevenir a sua prática. Se o castigo ao autor do delito se impõe, segundo a lógica das teorias absolutas, somente porque delinqüiu, nas teorias relativas a pena se impõe para que não volte a delinquir. Ou seja, a pena deixa de ser concebida como um fim em si mesmo, sua justificação deixa de estar baseada em um fato passado, e passa a ser concebida como meio para o alcance de fins futuros e a estar justificada pela sua necessidade: a prevenção de delitos (BITENCOURT, 2012, p.140)
Assim, pela perspectiva dessas teorias a grande finalidade do Direito Penal seria inibir a prática de novas infrações penais e coibir a reincidência, até porque se o mal já está feito e não há como voltar atrás, melhor que pelo menos e antes de tudo não se faça mal a outros.
No âmbito da ressocialização, além das alternativas já mencionadas, Bitencourt, acrescenta, com base nestas teorias modernas e garantistas do Direito Penal – em conformidade com o Estado Democrático de Direito, pluralista, justo e fraterno que se pretende construir, segundo a Constituição Federal de 1988:
No momento de conformar o tipo e o regime concreto de pena, entra em consideração o fim de ressocialização (prevenção especial). Por razões de prevenção especial será possível justificar a diversificação do tipo de pena a ser executada, e, inclusive,uma redução da quantidade de pena abaixo dos limites inicialmente fixados pela exigência de proporcionalidade. O contrário, contudo, não será permitido, ou seja, não cabe aumentar a quantidade de pena com base na finalidade de ressocialização, pois o limite máximo da pena está determinado pelo princípio de proporcionalidade e o respeito a outras garantias individuais. A diminuição de pena e/ou sua diversificação em prol da ressocialização encontram, contudo, como limite, a necessidade de estabilização do sistema (prevenção geral positiva) de modo que apesar da clara tendência de reduzir a intensidade da intervenção estatal, esta não pode resultar na completa frustração da eficácia preventivo-geral da pena (BITENCOURT, 2012, p.160)
Assim, a ressocialização também necessita que se verifique a forma de se cumprir a pena, que se dê a oportunidade de redução desta, em certos casos, sempre observando os limites legais, a fim de trazer de volta o indivíduo ao convívio social em condições de viver em coletividade.
O sistema penal brasileiro tem dificuldades gigantes em vista da superlotação carcerária e do alto índice de reincidência de egressos do sistema penal. As políticas públicas pertinentes ao sistema prisional são insignificantes e não apontam para um comprometimento mais eficaz por parte das autoridades para obter um resultado mais expressivo de ressocialização do apenado.
O estado além da função de punir aqueles que cometem crimes tem o dever de reintegra- los a sociedade, sendo muito importante a participação da comunidade na sua ressocialização. Possui também o dever de prevenir condutas criminosas e acompanhar o cumprimento ou o aguardo da sentença penal condenatória
A ressocialização traz à tona a necessidade de promover ao preso condições ideais para que ele possa se reestruturar e, com isso, retornar ao convívio social para que não torne mais a delinquir, propiciando o livre exercício de direitos, tal como a dignidade da pessoa humana. Ressalta Mirabete (2002, p. 87):
Exalta-se seu papel de fator ressocializador, afirmando-se serem notórios os benefícios que da atividade laborativa decorrem para a conservação da personalidade do delinquente e para a promoção do autodomínio físico e moral de que necessita e que lhe será imprescindível para o seu futuro na vida em liberdade.
Os projetos tanto de educação quanto de trabalho dentro dos presídios são imprescindíveis para que ao sair das penitenciarias o egresso tenha condições de voltar ao mercado de trabalho mais capacitado e não retorne ao crime, o trabalho vem como um resgate da dignidade humana, o artigo 28 da LEP como já mencionado anteriormente trata do direito do preso ao trabalho.
O artigo 22 da LEP aduz que a assistência social deve ter por finalidade amparar o preso e o interno, e prepara-los para o retorno a sociedade. Dessa forma, o presente artigo reforça a ideia do artigo 10 da mesma lei. Ademais, a assistência social além de amparar o preso e o interno, visa prepara-los para o retorno à sociedade.
Art. 25. A assistência ao egresso consiste:
I - na orientação e apoio para reintegrá-lo à vida em liberdade;
II - na concessão, se necessário, de alojamento e alimentação, em estabelecimento adequado, pelo prazo de 2 (dois) meses.
Parágrafo único. O prazo estabelecido no inciso II poderá ser prorrogado uma única vez, comprovado, por declaração do assistente social, o empenho na obtenção de emprego.
Art. 27.O serviço de assistência social colaborará com o egresso para a obtenção de trabalho.
Ambos os artigos regulam a assistência ao egresso, o artigo 25 ressalta a importância da ressocialização para que o egresso não se frustre e retorne a cometer crimes, disciplinando também o prazo de dois anos se concedido alojamento e alimentação, podendo também o prazo ser prorrogado uma vez se comprovada à necessidade.
As mazelas sociais, como a falta de moradia digna, escolaridade e qualificação profissional, são fatores que levam as pessoas a entrarem nas instituições prisionais, essa falta de estrutura faz com que mesmo após saírem da prisão, os egressos continuem tendo as mesmas deficiências pela falta de efetividade da ressocialização e a deficiência do sistema de atendimento jurídico-social, pois sem alternativa para a sua subsistência acaba por reincidir no crime.
Com todas essas deficiências, portanto, fica evidente na situação em que o sistema prisional se encontra de tal forma, que o Estado não vem cumprindo com o dever de zelar pelo apenado desde a sua entrada no estabelecimento prisional até a sua saída, isso ocorre muitas vezes por falta de interesse social e político.
A liberdade do preso não ocorre apenas com a liberdade adquirida, o Estado deve dar o suporte necessário para reintegrar o preso a sociedade, proporcionando as instituições prisionais condições ideais para que sejam desenvolvidos atividades e programas que venham a auxiliar a reinserção do preso a sociedade, oferecendo uma execução da pena que realmente venha atender seus objetivos, dando uma nova chance para mudar e ter um futuro melhor independente do que tenha acontecido no passado.
5.CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo da história sempre houve uma variedade e diferentes conceitos para os estabelecimentos penais, sendo aplicadas as diversas formas de cumprimento da pena. O regime de modelo pensilvânico, conhecido como o regime celular, que aplicava a reclusão total aos reclusos, sofreu diversas críticas por não possibilitar a ressocialização do condenado, que enclausurado, sofria de diversos transtornos psíquicos.
Assim, surgiu o sistema auburniano, que prezou ser menos rigoroso que o pensilvânico, possibilitando aos condenados exercer algum tipo de trabalho desde que respeitada a lei do silêncio, entretanto, o sistema mais difundido foi o sistema progressivo, comumente aplicado através dos vales, inclusive este é o modelo que mais se aproxima do adotado pelo Brasil.
Por conseguinte, se tem o progresso conjunto da legislação e da aplicação da pena, que, com o passar do tempo, foram sendo afastadas as penas cruéis, progredindo para uma pena com caráter mais humanitário. É importante observar que, independentemente do grau de instrução do homem, este sempre terá seu comportamento controlado pelo Estado através do seu direito de punir, tendo em vista que é necessário o medo da pena para haver o controle dos delitos.
Por isso, a legalidade, individualidade, humanidade, dentre outros, se fazem de grande valia como princípios balizadores para a aplicação da pena, impedindo o livre arbítrio do Estado no seu jus puniendi e garantindo a segurança jurídica do cidadão. Cumpre destacar que, mesmo com toda a alteração e tentativa de evolução do sistema penitenciário, percebe-se que ainda hoje este carece de estrutura e não fornece as condições adequadas para o cumprimento da pena.
Com a superlotação e a falta de unidades prisionais, são poucos os presos que tem acesso ao estudo ou trabalho dentro das unidades prisionais, tirando todo o caráter humanizado da pena e tornando a pena restritiva de direitos apenas punitiva e não ressocializadora. Assim, os problemas carcerários se multiplicaram durante o decorrer dos anos, situação em que não são preservados os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal e na Lei de Execução Penal. As condições insalubres, falta de higiene, superlotação estão presentes na maioria dos presídios brasileiros.
Consequentemente, a aplicação da pena privativa de liberdade se faz inócua, pois submete o condenado a cumpri-la em condições desagradáveis, com altos índices de violência, desse modo, o ideal ressocializador e reintegrador da pena fica distante. É de se perceber que o Estado não é capaz, aparentemente, de gerir toda a massa carcerária, seja por questões econômicas ou administrativas. Frente a isso, aparecem em nossas vistas alternativas para suprir a presença material do Estado dentro do presídio.
A privatização, tema debatido neste trabalho, por se dar como umasaída estatal para enfrentar todos os problemas atuais frente que a iniciativa privada sempre se mostrou mais eficiente que o Estado na administração em geral. Entretanto, há quem diga que está transferência pode ser inconstitucional, haja vista que a jurisdição da execução penal está nas mãos do estado, sendo intransferível nos termos da Constituição Federal. Muito embora há quem assim argumente, a privatização vem ocorrendo de maneira sútil no Brasil e já foi adotada em alguns estabelecimentos penais.
Outra possibilidade é o Estado fomentar a participação da comunidade na execução penal. Como explanado neste trabalho, as Associações de proteção e Assistência aos Condenados fazem um excelente trabalho humanizado durante o processo de cumprimento da pena, fornecendo as condições mínimas e adequadas para que condenado possa, ao longo de sua pena, refletir e se reeducar para o retorno à sociedade.
Assim, conclui-se que diante de todas as mazelas enfrentadas pelo sistema penitenciário brasileiro, pode-se encontrar saídas reais para atingir as finalísticas da pena privativa de liberdade, de modo que o condenado tenha os seus direitos e garantias respeitados durante a execução da pena e, consequentemente, possa reintegrar-se a sociedade sem retornar à vida delituosa.
REFERÊNCIAS
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[1] Professor orientador. Pós Graduado em Direito Público Aplicado, ESCOLA BRASILEIRA DE DIREITO, (EBRADI). E-mail:[email protected]
Graduando em Direito pela Unidade de Ensino Superior do Sul do Maranhão (UNISULMA). E-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FERRAZ, David Moura. O sistema penitenciário brasileiro e a atual ineficácia na finalidade da pena em ressocializar os condenados no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 maio 2022, 04:20. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58267/o-sistema-penitencirio-brasileiro-e-a-atual-ineficcia-na-finalidade-da-pena-em-ressocializar-os-condenados-no-brasil. Acesso em: 26 dez 2024.
Por: Nathalia Sousa França
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