VINÍCIUS PINHEIRO MARQUES[1]
(orientador)
Resumo: O artigo em comento possui como objetivo demonstrar as justificativas para a infiltração dos agentes policiais no ambiente virtual, considerando que tal infiltração decorre à extrema importância na colaboração investigativa dos policiais. Seus objetivos específicos, por seu turno, são relacionados à análise as alterações legislativas e a necessidade de novos mecanismos investigativos no ambiente cibernético, bem como explanar acerca dos limites legais frente a temática. Seu problema consiste, desse modo, na seguinte indagação: Quais as justificativas e fundamentos da infiltração no ambiente cibernético? Metodologicamente, o estudo foi delineado com base nas referências bibliográficas, caracterizada pela leitura e interpretação de obras doutrinárias, artigos científicos relacionados ao tema proposto, legislação aplicada e suas respectivas alterações, entendimentos jurisprudenciais. No estudo se verificou que com a promulgação da Lei 13.441/2017, que prevê a infiltração de agentes de polícia na internet que é necessário aprimorar as técnicas investigativas no combate aos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes. Apesar do ordenamento jurídico brasileiro tutelar a população infantojuvenil, ainda há necessidade de socorrer às técnicas especiais investigativas a fim de obter eficiência no combate às condutas criminosas, especialmente, com o uso da internet.
Palavras-Chave: Infiltração policial. Internet. Criança e adolescente.
O presente trabalho possui o seguinte objetivo: demonstrar as razões e fundamentos relacionados a modalidade de infiltração policial virtual. Seus objetivos específicos, por seu turno, são relacionados à análise as alterações legislativas e a necessidade de novos mecanismos investigativos no ambiente cibernético, bem como explanar acerca dos limites legais frente a temática. Seu problema consiste, desse modo, na seguinte indagação: quais as justificativas e fundamentos da infiltração no ambiente cibernético?
Dessa forma, a presente pesquisa adotará o método dedutivo, considerando que partirá de um aspecto geral para chegar a uma conclusão válida. O método dedutivo ficou conhecido pela lógica aristotélica, dando origem ao conhecido silogismo. Tal método, consiste na construção de três proposições, as quais sejam respectivamente: premissa maior; premissa menor; e por conseguinte, uma conclusão a qual estabelece a relação lógica e verdadeira entre as premissas anteriores.
A justificativa reside na importância do tema. De fato, ocorrem avanços no mundo tecnológico e cibernético que promovem sofisticação de mecanismos para prática delituosa no mundo virtual. Dessa forma, houve a promulgação da Lei 13.441/2017, que prevê a infiltração de agentes de polícia na internet dada a necessidade de aprimorar as técnicas investigativas no combate aos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes. Ante o exposto, o estudo em questão buscou discorrer sobre a infiltração policial de modo a exemplificar o modus operandi dessa técnica especial aliada à proteção da criança e do adolescente. Tal modalidade é prevista na Lei supracita, a qual altera a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), para prever a infiltração policial no âmbito da internet com a finalidade de investigar crimes sexuais contra crianças e adolescente.
O presente estudo propõe discursar sobre a infiltração policial como técnica especial de investigação em casos extremos para obtenção de provas contra ilícitos com grande proporção de gravidade, a ponto de causar à sociedade prejuízos devastadores para a segurança, saúde e economia pública.
Apesar do ordenamento jurídico brasileiro tutelar a população infantojuvenil, ainda há necessidade de socorrer às técnicas especiais investigativas a fim de obter eficiência no combate às condutas criminosas, especialmente, com o uso da internet. Diante da evolução criminal, envolvendo o meio cibernético, houve a necessidade de inovação dos ordenamentos jurídicos, afinal, o Direito Penal consiste em uma ciência social e à medida que as condutas criminosas evoluem, a alteração legislativa se faz necessária.
Os crimes sexuais entram nessa vertente, considerando que com o advento e evolução dos meios virtuais, há a prática gradativa de delitos de cunho sexual no âmbito de dispositivos informáticos. Crimes como pedofilia; pornografia da vingança; divulgação de cenas de estupro são cada vez mais corriqueiros, com ampla propagação nos meios midiáticos.
Com isso, o dispositivo penal não precisará se atualizar toda vez que surgir um dispositivo de armazenamento de informações e dados, sendo genérico e, ao mesmo, tempo específico. Nesse contexto, foi aprovada Lei nº 12.965, de 23 de abril de 2014, a qual estabelece princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil, Marco Civil da Internet, sendo que o principal objetivo da aludida lei consiste em oferecer uma maior segurança ao usuário ao navegar na internet.
2 CRIMES VIRTUAIS QUE ENVOLVAM CRIANÇAS E ADOLESCENTES
2.1 O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE
Trazendo novos rumos para os direitos da criança e do adolescente, e seguindo previsão constitucional, em 13 de julho de 1990 foi aprovado o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. O novo diploma legal trouxe mudanças substanciais para a efetivação e tutela dos direitos dessa classe vulnerável de seres humanos tais como: criação dos conselhos tutelares; órgãos encarregados de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, protegendo-as contra abusos ou ameaças; e dos conselhos de direitos que formulam e acompanham a execução das políticas públicas de atendimento à infância e à adolescência.
Além disso, o ECA reconhece a criança e ao adolescente como portadores de direitos e estabelece ações para a sua efetivação, tais como: saúde, educação, proibição do trabalho infantil e demais pertinentes aos direitos humanos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente, apelidado de ECA e amplamente referenciado como Lei nº 8.069/1990, trouxe em seu bojo expressões como “proteção integral” e “sujeitos de direitos”: “Art. 1º - Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente” (BRASIL, 1990). Desta forma, seu advento passou a ser considerado um marco jurídico de proteção à infância e à adolescência.
A construção do Estatuto centra-se na ideia de inserir as crianças e os adolescentes em um cenário de direitos:
Foi à exigência legal de reconhecer um sujeito a quem atribuir as denúncias já feitas há tempos. Porque não é possível defender alguém que não existe dentro da sociedade, alguém que é o futuro, alguém que ainda vai ser, que está crescendo, que um dia vai ser alguém (VOLPI, 2016, p. 37).
Não obstante, buscou-se destacar alguns artigos da Lei 8.069/1990, que expressam a preocupação com questões próprias do universo da infância e adolescência e que imprimiram ao documento legal um olhar humano, centrado em valores como liberdade; respeito e dignidade da pessoa humana, recebendo – inclusive – destaque a nível internacional.
A referida Lei elevou as crianças e os adolescentes à condição de sujeitos de direito (Lei nº 8.069/1990, art. 15°), inclusive, garantindo que tais sujeitos tenham seus direitos tutelados mesmo contra os próprios pais. Trata-se de reconhecê-los como cidadãos de direitos.
O texto da Lei, em seu art. 2°, especifica quem é a criança e quem é o adolescente para seus efeitos: “considera-se criança [...] a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”. (BRASIL, 1990).
Como exemplo da proteção trazida pelo Estatuto pode se dizer que o ECA, em seu art. 3°, reconhece os direitos fundamentais desses segmentos, sem prejuízo da proteção integral. Em seu art. 7°, elenca como direitos prioritários a proteção à vida e à saúde, chamando os setores públicos a efetivar políticas sociais que permitam o nascimento e o desenvolvimento sadio e harmonioso. No art. 11°, tem o intuito nobre de assistir as crianças e adolescentes com deficiência. E, por fim, o capítulo V, aborda o direito à profissionalização e à proteção ao trabalho, proibindo o trabalho aos menores de 14 (quatorze) anos de idade, a não ser, na condição de aprendiz nos termos da lei.
O Estatuto também reconhece que não apenas os pais ou os responsáveis que são os únicos a zelar pela criança e pelo adolescente. No entanto, o que determina em seu art. 70 do ECA estabelece que é dever de todos a responsabilidade por prevenir a ocorrência de ameaças ou de qualquer forma de violação dos direitos desses sujeitos (poder público, família, comunidade, escola, conselhos de direitos etc.). Também deve ser assegurado o direito à convivência comunitária e familiar.
O art. 98 regulamenta que as medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis todas as vezes que os direitos preconizados e reconhecidos no Estatuto forem alvo de ameaças ou violações, ou seja, quando ocorrerem por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; por ausência, omissão ou abuso dos pais ou responsáveis, ou em razão da conduta da criança ou adolescente.
Todavia, verifica-se que o texto da Lei é belo e nobre em intenção, mas faz-se necessária uma análise crítica do que é preconizado e do que é efetivado na prática, pois vale lembrar que o Brasil é um país dotado de leis, mas pobre no que se refere às ações efetivas.
Tal realidade revela que crianças e adolescentes seguem sem conhecer integralmente seus direitos, deixando assim de ter e desenvolver a percepção política para a exigência e conquista desse legado de direitos. Essa dificuldade em entender na íntegra as concepções de mundo e de realidade da criança e do adolescente em sociedade, bem como dos modos e práticas abordadas pelo ECA é o que tem resultado em interpretações diferenciadas de uma mesma lei pelos diferentes agentes envolvidos no processo de proteção à criança e ao adolescente.
Também não é raro que os próprios pais ou responsáveis se mantenham alheios ao que preconiza o ECA, contribuindo assim para o inverso do proposto: a falta de apoio, proteção e o desamparo.
O Estatuto da Criança e do Adolescente é tido como uma das legislações mais modernas do mundo e inovador pela dimensão protetiva, pautada nas ações dos conselhos de direitos, Conselhos Tutelares e das delegacias e promotorias especializadas nos temas infanto-juvenis. Sua implementação, no entanto, ainda sofre críticas por não ter ocorrido de maneira efetiva até hoje.
Sobre isso expõe Nogueira Neto:
De nada adianta colocar-se a luta pelo reconhecimento dos direitos humanos de crianças e adolescentes, o reconhecimento de que são “sujeitos de direitos” e ao mesmo tempo “pessoas em condição peculiar de desenvolvimento“, - se com isso não se procurar garantir esses direitos, isto é, promove-los e protegê-los, por meio de instrumentos normativos (leis, tratados, resolução, decretos etc.), de instâncias públicas (órgãos estatais e entidades sociais, por exemplo) e de mecanismos (processos de mobilização, de construção de capacidades, de apoio técnico-financeiro, de monitoramento, de ações judiciais, do gerenciamento de dados e informações, de fundos de investimento etc.) (NOGUEIRA NETO, 2015, p. 12).
Segundo o mesmo autor, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) foi criado para compor o Sistema de Garantia de Direitos das Crianças e Adolescentes - SGDCA, figurando no universo dos instrumentos e mecanismos de promoção e proteção de direitos humanos, porém esse sistema ainda não é forte o suficiente para assegurar que todas as crianças sejam alcançadas por ele.
Funciona mais como um sistema estratégico do que como um sistema de atendimento direto, universal e integrado. Com o exposto, verifica-se que o Estatuto da Criança e do Adolescente consiste em um importante documento legal de proteção a esse público que, por ser vulnerável, precisa de uma atenção especial do Poder Público; da família e da própria sociedade.
2.2 CRIMES VIRTUAIS CONTRA A CRIANÇA E AO ADOLESCENTE
A internet torna-se um ambiente propício para o cometimento de crimes que envolvam crianças e adolescentes devido ao caráter inocente delas, que estão conectadas nas redes a fim de fazer amigos e ampliar o seu círculo social, o que de fato, as deixam mais vulneráveis ainda.
Lidchi (2018) demonstra que são muito comuns os crimes de mostrar cenas pornográficas ou obscenas, distribuir ou usar cenas de abuso sexual, ciberbullying, ameaça, estímulo ao turismo sexual, pedofilia, exploração comercial sexual e tráfico humano. Os crimes cometidos contra crianças e adolescentes na internet possuem inúmeras peculiaridades, inclusive dispensando o contato físico entre o abusador e a vítima, basta que seja dado o caráter pornográfico.
Desta maneira, por haver diversas configurações tal crime merece a máxima atenção possível, pois atingem o indivíduo em uma fase da vida que pode afetar o seu desenvolvimento e violar sua intimidade, dignidade, liberdade sexual e psíquica, que decorrerão em traumas e síndromes que podem perdurar por toda a vida. (VERONESE; SILVEIRA, 2017).
Convém salientar que a postura familiar dos pais sobre o comportamento e liberdades dados aos filhos é essencial para diminuir os riscos dos filhos sofrerem algum tipo de assédio na utilização da internet, devido à sua condição de criança ou adolescente, pois conforme o marco civil da internet é dever parental o controle no acesso à internet e a definição de boas práticas para o uso seguro dela por crianças e adolescentes. (BRASIL, 2004).
Pois como preconiza o art. 4º, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é dever do Estado, da família e da comunidade em geral assegurar direitos referentes à proteção da infância e juventude, de modo que permita que elas tenham condições dignas para um desenvolvimento e crescimento saudável e digno. (BRASIL, 1990).
Por fim, observa-se que o cometimento de crimes contra crianças e adolescentes por meio da internet é uma infração penal que deve ser amplamente discutida, a fim de alertar pais; familiares; crianças e adolescentes e a sociedade como um todo, e tenha a devida punição legal para agentes infratores, para que sirva de maneira a dissuadir novos crimes.
Pois até os 12 anos, os indivíduos ainda estão em fase de desenvolvimento e caso ocorra de forma inadequada com traumas e problemas psicossociais acarretará problemas por toda a sua vida, tornando-os adultos que não exercerão em sua totalidade o seu papel de cidadão produtivo na sociedade. Além do mais é dever de todos zelar para que crianças e adolescentes tenham uma infância e juventude saudável cujos direitos sejam assegurados.
Poucos temas provocam tanta revolta quanto a pedofilia. A repulsa provocada por relatos de adultos, aproveitando-se sexualmente de crianças e adolescentes não encontra paralelo na sociedade moderna. As principais sequelas do abuso sexual são de ordem psíquica, sendo um relevante fator na história emocional de homens e mulheres com problemas conjugais, psicossociais e transtornos psiquiátricos.
Os pedófilos são encontrados em todos os segmentos da sociedade, existindo na maioria dos casos, uma relação de dependência entre o indivíduo e a vítima. Em conclusão, o abuso e a exploração sexual por meio da Internet é uma realidade, bem como as redes organizadas de pedofilia e sua ligação com o crime organizado.
A princípio, frisa-se que a pobreza e o abandono que expõe as crianças mais carentes a andar sem rumo pelas ruas fazem com que elas se curvem às exigências sexuais dos adultos. Portanto, o certo seria uma ação preventiva promovendo a sensibilização nas escolas, junto das crianças, de pais e profissionais da infância, tendo o interesse coletivo, proporcionando – por exemplo – palestras nos bairros e dentro das escolas e trazendo maiores informações sobre o assunto.
Com esse crime que assola a sociedade desde tempos antigos, devemos proteger mais as crianças e adolescentes, pois as consequências dos abusos sexuais foram objetos de inúmeras pesquisas epidemiológicas, e a maioria concorda em reconhecer que a criança vítima de abuso sexual corre o risco de uma psicopatologia grave, que perturba sua evolução psicológica, afetiva e sexual (MARTINS, 2016).
Não obstante, a despeito dessa conjuntura, é necessário que seja promovida atenção e proteção integral à criança. Veja-se:
A Lei estabelece a proteção integral às crianças e adolescentes brasileiros, regulamentando o artigo 227 da Constituição Federal de 1988. A grande mudança de enfoque é que, anteriormente, no Código de Menores, vigorava a doutrina da situação irregular, pela qual o menino de rua, a menina explorada sexualmente, a criança trabalhando no lixão, o adolescente infrator, o menino vítima de agressões e tortura, entre outras situações, estavam em situação irregular e deveriam ser "objeto" de intervenção dos adultos e do Estado, já que não eram considerados "sujeitos de direitos". Com o ECA, nessas situações acima descritas, quem está irregular é a família, o Estado e toda a sociedade que não garantiram a proteção integral às crianças e aos adolescentes, colocando- os a salvo de qualquer violação de seus direitos fundamentais. (ROSSATO, 2019, p. 3).
Deve haver atenção no que se refere à presunção de violência sexual, especialmente, prestando atenção em pessoas que não aparentam ser suspeitas, pois o pedófilo não tem cara de pedófilo. Além disso, em sua grande maioria ele possui uma relação familiar entre a vítima. Ele não possui características específicas, podendo ser de qualquer nível social e cultural, no entanto, a predominância vem do sexo masculino. Além de tudo isso, os adultos devem ficar atentos aos sinais que as crianças passam, seja ele físico – como por exemplo, uma lesão ou marca que possa ser advinda de uma batida em algum lugar acidentalmente, pois é comum que a criança esteja com algum arranhão ou machucados pequenos – ou comportamentais, apresentando algum desvio anormal, reação agressiva ou até mesmo inibida dentro de casa, se mostrando o oposto do que se era. Vale salientar que muitas vezes um pedido oblíquo de socorro pode passar despercebido e, por isso, deve-se ficar atentos aos sinais, ainda que sejam sutis. (PINHEIRO, 2018).
E, por último, atentar-se ao uso da Internet, um dos meios de tecnologia que mais tem propiciado a pedofilia, orientando a criança de como se deve usar sem que seja enganada ou abusadas sexualmente. Além disso, atentar-se aos tipos de sites que as crianças entram ou – até mesmo – bloqueando páginas indevidas, a fim de evitar futuros constrangimentos ao menor de idade (CUPIS, 2017).
O abuso sexual contra crianças e adolescentes podem ser denunciados aos Conselhos Tutelares ou delegacias de Polícia Civil e Federal. Pode ser, ainda, comunicado à Polícia Militar, pois os policiais militares podem agir com mais precisão e rapidez (SANCHES, 2020).
Para a prevenção, o Promotor da Infância e Juventude do Ministério Público de Minas Gerais acredita que a melhor forma é a coragem, a desinibição diante do pedófilo, pois nem todos sabem ou nunca pararão para pensar, que os pedófilos em geral são covardes. Diante disso, a melhor forma seria o adulto ou responsável demonstrar que está sempre atento à criança, e que está de olho nas estranhezas e mudanças da personalidade da criança. Assim o pedófilo se sente inibido para a ação do crime. (MARTINS, 2016).
A Internet é o meio de comunicação de maior avanço tecnológico de hoje. A Internet é uma ferramenta que era para ser usada em prol de interligar pessoas do mundo inteiro de uma maneira saudável e construtiva, porém se tornou nos últimos tempos uma ferramenta para as práticas da ação criminosa, principalmente, para os pedófilos que a utilizam para aliciar suas vítimas.
Percebe-se que o mundo do crime se adapta a essas inovações criando novas formas de criminalidade no caso da Internet, viu-se uma grande porta aberta para o crime contra crianças e adolescentes: a pornografia, a prostituição, a exploração sexual infanto-juvenil e a pedofilia.
No ambiente virtual criou-se um espaço para os criminosos, pois para eles é um meio de fácil divulgação, porém também de ocultação, ou seja, praticam-se crimes e permanecem às escondidas. Diante dessa realidade, surge em 1998 a Campanha Nacional pelo fim da Exploração Sexual Infanto-Juvenil e Pedofilia na Internet, com o objetivo de impor aos provedores meios legais para coibir tais atitudes criminosas. É possível entender que a ‘teia virtual’ propaga a pornografia infantil como um todo entre violência e pornografia, crime e brincadeira intencional ou ocasional. Dessa forma, o ambiente da Internet se dispõe uma dinâmica que impossibilita que a pornografia infantil seja entendida por todos que tem esse contato como uma forma de violência, de abuso. (MARTINS, 2016).
Para oferecer mais proteção ao uso da Internet, foi criada a Central Nacional de Denúncias de Crimes Cibernéticos, que é constituído em um sistema automatizado de gestão de denúncias com parceria do Ministério Público Federal, com a Polícia Federal e a Secretária Especial dos Direitos Humanos da presidência da República (SANCHES, 2020).
É importante fazer a distinção entre a pornografia infantil e a pedofilia, em geral muito confundidas. A pornografia infantil é a exteriorização de uma violência sofrida por uma criança ou adolescente e é considerada crime no Brasil, conforme preceitua o artigo 241 da Lei 8069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente).
Segundo o mesmo regulamento, em seu art. 2º, considera-se criança, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Já a pedofilia é considerada um desvio sexual de personalidade:
Pedófilo, segundo entendimentos médicos e jurídicos, é todo o indivíduo adulto que sofre de um grave distúrbio de conduta sexual, com desejo compulsivo por crianças ou adolescentes, podendo ter característica homossexual ou heterossexual. De acordo com a Organização Mundial da Saúde, o indivíduo com pedofilia tem 16 anos ou mais e pelo menos cinco anos a mais que a criança pela qual sente atração. O transtorno costuma se manifestar na adolescência e inicialmente leva o agressor a aliciar suas vítimas dentro do próprio círculo familiar. Os pedófilos, em geral, são inseguros e tímidos. (FLORENTINO, 2015).
Na psicologia/psiquiatria, pedofilia é definida como uma perversão sexual, caracterizada pela atração sexual em curso por crianças pré-púbere. Uma abordagem psiquiátrica mostra que é uma modalidade de parafilia, sendo vista como uma doença psiquiátrica, com caráter obsessivo, sendo que na maioria das vezes o pedófilo tem plena consciência que comete um ato delituoso e desviante, mas acredita que nunca será descoberto ou que a vítima não irá denunciar a lesão sofrida. Conforme Rodrigues:
A pedofilia pode ser identificada através do seu conceito clínico, identificando o pedófilo como uma pessoa doente e que precisa de acompanhamento médico. Por outro lado, no sentido mais usual, a referida nomenclatura tem se aplicado para todos os casos que envolvem a relação sexual, direta ou não, entre um adulto e uma criança. As formas de ação do agente pedófilo sob este aspecto são muito flexíveis, podendo ser desde a simples interação por meio de salas de conversação em sites na internet até à relação forçada pela violência física, a qual muitas vezes resulta na morte da vítima. (RODRIGUES, 2018, p. 1).
A pedofilia não está prevista no nosso ordenamento jurídico, porém, o contato sexual entre crianças e adultos, se enquadra juridicamente no crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do Código Penal), com pena de oito a quinze anos de reclusão e é considerado crime hediondo, portanto, possuir a doença psicológica não é considerado um crime, mas deixar que as consequências dela se aflorem, sim.
Ainda há outras condutas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente que consistem na exteriorização da pedofilia em fatos típicos. A esse respeito, cita-se o artigo 241 do ECA; o artigo 241 -A; o artigo 241 – B; o artigo 241 -C e artigo 241 – D. Tais condutas, incluídas pela Lei n° 11.829, de 2008 possuem penas diversas, variando de 1 (um) a 8 (oito) anos de reclusão. Assim,
Como se nota, os artigos estão destinados ao combate à pornografia infantil, deixando para o Código Penal o combate à violência sexual decorrente de outros atos que não a pornografia. Neste momento surge a primeira falha do Estatuto. Pois embora o Código Penal consiga abarcar muitas das atuações pedófilas, não possuí no seu conteúdo a realidade do bem jurídico tutelado quando se trata de uma criança ou adolescente, visto que o único instrumento que ameniza esta diferença consta na presunção de violência quando a vítima do crime é menor de 14 anos (artigo 224 do CP). O Código Penal serve, na realidade, como um manual de analogias quando se trata de pedofilia, visto que esta não possui um tipo penal específico. O que ocorre é a utilização dos artigos 213 (estupro) e 214 (atentado violento ao pudor) de modo analógico para definir condutas relacionadas à pedofilia e a qualificação destas condutas em decorrência da presunção de violência. (RODRIGUES, 2018, p. 3).
Ao permitir que muitas das pessoas que navegam pela Internet percebam a pornografia infantil como uma forma de pornografia e não de violência, estamos caminhando na direção contrária aos movimentos internacionais e nacionais de direitos da criança e do adolescente. É preciso insistir no contrário, conscientizando as pessoas de que a pornografia infantil é, sim, uma forma de violência e que pode, inclusive, esconder outras formas de violência como por exemplo, o estupro. Os pais devem ficar atentos, pois a Internet não nos permite visualizar a realidade, onde, por exemplo, uma criança pode achar que fez um amiguinho, uma amizade nova e na realidade é um sujeito sem escrúpulos.
3 POLÍCIA JUDICIÁRIA E A INFILTRAÇÃO POLICIAL NO AMBIENTE VIRTUAL À LUZ DA LEI 13.441/2017
Em face da complexidade dos métodos utilizados e dos altos recursos tecnológicos empregados pelas organizações criminosas, bem como pela ocorrência cada vez maior de crimes cibernéticos; lavagem de dinheiro e ocultação de bens; transferências eletrônicas de valores; além do narcotráfico e da “biopirataria” cuja atuação atravessa fronteiras, surge a necessidade de se acionar as mais diversas unidades de inteligência. Seu objetivo é investigar e descobrir o autor do delito, bem como de prevenir e combater essas organizações. A atividade de inteligência “busca o entendimento sobre ações futuras e, principalmente, sobre o que isso significará de forma isolada ou conjugada com outras situações semelhantes ou até diferentes” (FERNANDES, 2016).
Outro fator importante decorrente do surgimento de unidades de inteligência é a troca de dados e de informações entre o poder público, quer no âmbito federal, quer no estadual, por se constituir ferramenta necessária e útil à repressão da criminalidade organizada que não respeita fronteiras administrativas. Com a criação dos núcleos de inteligência, surge a necessidade de capacitação dos profissionais de inteligência, tendo em vista que se trata de atividade com características peculiares.
Neste sentido:
Agente infiltrado é aquele policial que, ocultando sua verdadeira identidade e função através do uso de identidade fictícia, aproxima-se de suspeitos da prática de determinados crimes para fazer prova da sua ocorrência. [...] O agente infiltrado, por outro lado, intenta criar uma relação de confiança que permita desvendar a prática de crime ou introduzir-se no universo de organização criminosa, para melhor entender seu funcionamento (WOLFF, 2017, p. 216).
Ademais, entende-se que a infiltração é realizada tão somente por agentes de polícia Judiciária, ou seja, policiais Federais e Civis, de modo que o artigo 144 da Constituição Federal aponta os órgãos responsáveis ao exercício da segurança pública, sendo este rol de natureza taxativa.
A atividade de infiltração, por violar a intimidade e outros direitos fundamentais, somente se legitima quando está voltada à coleta de provas a serem utilizadas no processo penal. Então, tal medida só pode ser executada por agentes de polícia judiciária (WOLFF, 2017). A própria Lei nº 11.343 de 2006 (Lei de Combate ao Tráfico de Drogas) explica que somente os órgãos da polícia judiciária são os responsáveis pela utilização da infiltração como método de investigação pelas suas equipes especializadas.
A figura do agente infiltrado foi prevista, inicialmente, no art. 2°, I, da Lei n° 9.034/1995. No entanto, foi vetada integralmente pelo presidente da República. Então, de forma válida, a previsão desse tipo de investigação passou a ser prevista no ordenamento jurídico pátrio a partir da Lei 10.217/2001. Posteriormente, passou a ser prevista na Lei nº 11.343/2006 (Lei de Drogas), artigo 53, I e na Lei n° 12.850/2013, artigo 3°, inciso VII. Além disso, a figura do agente infiltrado também pode ser reconhecida a nível internacional, conforme dispõe o artigo 20, item 1 do Decreto nº 5.015 (Convenção de Palermo).
Posteriormente, conforme os anos foram se passando, houve a necessidade de aplicar mecanismos investigativos que alcançassem a evolução criminosa, na qual faz o uso da rede mundial de computadores com o fim de praticar condutas delituosas, especialmente às organizações criminosas.
Dessa forma, com o advento da Lei nº 13.441/2017, alterou a Lei nº 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) para regulamentar a infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar crimes praticados contra a dignidade sexual de criança e adolescente, conforme disciplina o artigo 190 – A.
Contrariando o que pensa Rocha (2012), que entende ser temerário um policial neste tipo de ação, pois sua situação profissional vai colocá-lo em risco mais cedo ou mais tarde. No entanto, o citado autor se posiciona de forma diferente, visto que além desse agente possuir um vínculo público oficial com a Administração em virtude do cargo de carreira que possui, vai possuir identidade falsa e uma vida pregressa elaborada de acordo com o tipo comum da quadrilha-alvo, e tal condição só poderia ser entregue a um profissional, que além de treinado para tal, tenha compromisso com a missão.
Além do mais, tal vínculo facilita o controle para aferir o grau de risco da infiltração, de modo que somente o Juiz; o Promotor e o Delegado de Polícia poderão ter acesso e conhecimento aos elementos da operação investigativa, bem como da verdadeira identidade do agente envolvido na infiltração policial. Ainda, ressalta-se que o agente constitui qualificação para este tipo de ação policial, portanto, cabe a eles avaliar tecnicamente a situação de modo a decidir pelo fim da atividade, caso haja risco ao policial infiltrado.
O Agente Infiltrado pode ter diversas formas de conduta dentro da organização criminosa, e de acordo com cada comportamento exteriorizado no caso concreto, será feita a avaliação jurídica do fato. Em uma primeira hipótese, o agente pode atuar como um simples informante, quando repassa as informações das quais adquiriu com os integrantes da organização, de modo que ajude no desmantelamento da organização ou na identificação de seus membros. Do mesmo modo, em uma segunda hipótese, o agente pode se comportar provocando a ação ou omissão de uma ou mais pessoas das quais integra a organização criminosa, induzindo e interferindo diretamente na formação da vontade delas. Nesse caso, o agente terá de ser responsabilizado (CAPEZ. 2018).
Uma terceira hipótese, em que o agente atua conjuntamente com um ou mais integrantes da organização criminosa em uma determinada empreitada criminosa, hipótese clássica de concurso de agentes, seja por participação ou coautoria. Nesse caso não haveria responsabilização do agente pelo crime cometido.
Um policial autorizado judicialmente, fazendo uso de documentos falsos, trabalha em uma empresa, e com isto consegue acompanhar o cotidiano da organização-alvo. Uma vez dentro dessa empresa, passa a identificar e ter encontros com membros do grupo criminoso e, além disso, passa a adquirir a confiança dos membros da organização criminosa. Dessa forma, possibilitará utilizar-se de outras técnicas de investigação, como por exemplo, a captação ambiental e interceptação telefônica, tudo, certamente autorizado pela autoridade Judiciária. O fato de o policial ser colocado de fachada no “bojo” de uma empresa que realize “lavagem de dinheiro” para uma organização criminosa não significa que esteja infiltrado.
Esse policial apenas interage, sem o efetivo ingresso na organização criminosa, sem se tornar parte, estamos falando de “estória-cobertura” e não de infiltração, propriamente dita. Trata-se de uma operação encoberta simples, pois quando por um curto período de tempo, com um orçamento limitado executa uma missão em caráter disfarçado. Outro exemplo de operação encoberta simples seria a aquisição de drogas de um traficante local por um policial disfarçado, que se faz passar por um usuário de entorpecente, e seu objetivo é identificar e efetuar com êxito a prisão do traficante, bem como seu fornecedor, se possível. No Brasil é muito comum essa modalidade, especialmente por agentes que trabalham em delegacias especializadas no combate às drogas (CAPEZ, 2018).
Para melhor entendimento é importante frisar que embora a infiltração policial se valha de uma EC como base de apoio, com ela não se confunde, pois a infiltração, como medida excepcional que diminui as garantias individuais como a intimidade e a privacidade, exige autorização judicial, enquanto a EC não exige para ser instalada.
A figura do agente provocador em uma infiltração, segundo entendimento dessa corrente doutrinária ensina que o agente disfarçado já infiltrado na organização assume papel ativo, estimulando ou induzindo a prática do crime, caracterizando o flagrante preparado ou delito provocado, penalizando o agente nessas condições (BONFIM, 2014).
Nosso entendimento diverge deste, pois acreditamos que não há dolo e a intervenção do agente não significa a criação indutora da vontade do sujeito provocado. Para Capez (2018) o agente não pode ser punido. Segundo o autor, o cenário preparado pelo agente conduz inevitavelmente a uma farsa, uma encenação, sendo esta uma modalidade de crime impossível pela ineficácia absoluta do meio empregado. O suposto autor é um personagem de uma farsa, inexistindo, portanto, o elemento subjetivo do crime.
Seu papel acessório como agente provocador pode nem vir a ser necessário, conforme o caso. Essa imprevisibilidade coloca a “provocação” como alternativa da missão, que de acordo com riscos e perigos calculados, será decidido pelas autoridades que acompanham o trabalho desse policial, optando por abortar a missão, se tal risco não for aceitável. Em suma, o agente de inteligência policial age com respaldo legal precário, pois as normas do Direito Pátrio que regulam essa atividade não conceituam e nem explicam como funciona ou deveria funcionar. É justamente, essa lacuna legislativa que causa a insegurança jurídica desse policial, pois no exercício e cumprimento de seu dever, por vezes, pode ver-se obrigado a participar (ausência de dolo), juntamente com os membros da quadrilha, de algum crime contra terceiros. Até como espécie de “iniciação”, de prova de confiança, de teste, para fazer parte da quadrilha, conquistando a confiança de seus integrantes, e assim iniciar a infiltração, conforme bem explica Mariath (2019).
3.2 INFILTRAÇÃO POLICIAL NO AMBIENTE VIRTUAL E SEU EMPREGO COMO MEIO DE PROVA À LUZ DA Lei n° 13.441, de 8 de maio de 2017
De acordo com a legislação pátria, o objetivo do uso da infiltração policial vem implícito nas normas, embora não encontremos nas mesmas, limitações, proteção ao agente, controle fático da situação quando envolve servidor público a serviço do Estado e Segurança Pública.
Se reportando à Lei nº 9.034, de 03 de maio de 1995, em seu art. 2º, V, percebemos o objetivo da ação policial, ou seja, a autorização judicial será dada quando houver necessidade de obtenção ou formação de provas para a elucidação de um crime praticado por uma organização criminosa. Pode se entender que o objetivo primordial seja a angariação de informações, provas, com a finalidade de desmantelar uma organização criminosa.
Assim encontramos autores e estudiosos que tem o mesmo entendimento. É o que pensa Pinto (2017) que, além de definir a infiltração, a finalidade deste tipo de operação é descobrir de que forma as atividades criminosas são desenvolvidas. Quais os pontos vulneráveis, pessoas participantes, fornecedores e clientes, vinculação estatal, além de buscar documentação e informações probatórias cabíveis ao procedimento judiciário.
Entende-se, portanto que a infiltração policial, no limite do ordenamento jurídico, tem como objetivo angariar informações suficientes para o desmantelamento da organização através de provas que gerarão prisões em flagrante, entre outros procedimentos processuais penais, colocando fim a esta tão arriscada missão (Reschke; WENDT; Matsubayaci, 2020).
Conforme leciona o art. 2º, V da Lei nº 9.034/95, o primeiro requisito apresentado para que ocorra uma infiltração policial é a autorização judicial. Embora a lei seja omissa no sentido de pormenorizar requisitos formais sobre a autorização judicial, para que o magistrado tenha um conhecimento específico sobre a necessidade da autorização, entende-se, inclusive por precaução tanto para a operação como para o próprio agente infiltrado que esta deve ser requerida pela autoridade policial. Devem constar no requerimento, o motivo, o tempo estimado, e o local que será investigado, qual ou quais agentes serão partícipes na referida operação de forma velada ou disfarçada.
Já analisando a Lei nº 11.343/2006, entende-se que outro requisito a ser considerado no entendimento do legislador, além de haver o requerimento judicial, deve o Ministério Público ser ouvido. Pacheco (2018) entende que antes da autorização judicial, é imprescindível a ação conjunta entre o Ministério Público e a autoridade policial de um planejamento operacional, onde será analisada e viabilizada a necessidade deste tipo de operação policial, pois estará implícito o princípio da proporcionalidade, vez que é cediço a possibilidade de violar direitos e garantias fundamentais das pessoas que serão investigadas.
Primeiramente, a infiltração policial deve ser tratada em caráter excepcional, tendo em vista que se trata de uma técnica de investigação que se opõe a preceitos éticos e entende ser incompatível com a reputação e dignidade da Justiça. Nesse contexto, é bastante discutido sobre a validade da infiltração no que tange a valores éticos e morais. A crítica é sustentada pelo modo que a infiltração é realizada, na qual utiliza-se meios de dissimulação vindas do próprio Estado. Posteriormente, é necessária a prévia autorização judicial, devendo ser motivada e circunstanciada de modo a deixar expresso os limites a serem observados durante a atuação policial, em consonância com o artigo 190-A, I.
Em relação à infiltração cibernética, o juiz ainda fixará as tarefas dos agentes, os nomes ou apelidos e os dados cadastrais que possibilitem o reconhecimento destas pessoas, conforme pormenorizado no requerimento ou na representação (Reschke; WENDT; Matsubayaci, 2020).
Ademais, deve-se observar a legitimidade para o requerimento da infiltração, na qual poderá partir tanto do Ministério Público, quanto da representação do Delegado de polícia. No mesmo sentido, salienta-se que o pleito pela infiltração virtual poderá ser realizado em toda a persecução penal – na fase de investigação preliminar ou durante a ação penal, de acordo com artigo 190-A, II. Além disso, é oportuno ressaltar que na hipótese de representação do chefe de polícia, o juiz deverá ouvir o Ministério Público antes de tomar alguma decisão, conforme art. 10-A §2º.
Portanto é um requisito de caráter excepcional. Esta técnica somente deverá ser aplicada quando não houver outro meio de solucionar um delito de forma a ser menos gravoso aos investigados. Outro requisito importante se refere ao juízo de proporcionalidade, ou seja, a atividade do profissional que investiga de forma velada uma organização criminosa deverá estar submetida ao princípio da proporcionalidade, onde o castigo aplicado pelo Estado, não deverá ultrapassar o respeito aos direitos e garantias fundamentais do investigado.
Nesse contexto, adentra a Lei n° 13.441, de 8 de maio de 2017, a qual altera o Estatuto da Criança e do Adolescente, para prever a infiltração policial no âmbito da internet com a finalidade de investigar crimes sexuais contra crianças e adolescente. Nesse contexto, de acordo com o art. 190-A do Estatuto da Criança e Adolescente, a infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar os crimes de natureza sexual contra crianças e adolescentes precisará seguir as seguintes regras, sem prejuízo de outras previstas em outras legislações:
a) Deverá ocorrer após e autorização judicial fundamentada, que estabelecerá os seus limites, após consultar o Ministério Público;
b) Precisará ocorrer por meio de requerimento do Ministério Público ou da autoridade policial, devendo conter a sua necessidade, o alcance das tarefas, os nomes ou apelidos dos investigados. Ainda, quando for possível, deverá constar os dados de conexão ou cadastrais que permitam a identificação desses indivíduos;
c) não poderá exceder o prazo de 90 (noventa) dias. Em caso de renovação não poderá exceder a 720 (setecentos e vinte) dias.
Ainda, conforme §3º do dispositivo em comento, a infiltração não será admitida se a prova puder ser obtida por outros meios previstos em lei. Com isso, como Ultima ratio, a infiltração é exceção, devendo operador ver a possibilidade de outras provas antes de seu uso. Tal questão busca resguardar a privacidade dos envolvidos entre outros fundamentos. Ainda, o procedimento deverá ocorrer em sigilo, sendo que o acesso aos autos será reservado ao juiz, ao Ministério Público e à autoridade policial responsável pela operação.
Ressalta-se que se o delito for praticado na rede mundial de computadores não denota, necessariamente que a competência é da justiça federal. Para que seja de competência federal, é necessário que, conforme inciso V do art. 109 da Constituição Federal: ‘‘os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País, o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente.’’
No que tange a competência, ressalta-se que, conforme explicitado pelo informativo 805 do Supremo Tribunal Federal, compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente conforme os artigos 241, 241-A e 241-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, quando tais delitos envolverem o uso da rede mundial de computadores. Os delitos acima listados são crimes que o Brasil se comprometeu a combater por intermédio de tratado internacional. Os demais delitos virtuais envolvendo a dignidade sexual da criança e do adolescente seguem a regra, qual seja, a de serem processados e julgados pela justiça comum.
A tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal ficou assim explanada:
Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente [artigos 241, 241-A e 241-B da Lei 8.069/1990] quando praticados por meio da rede mundial de computadores.( STF. Plenário. RE 628624/MG, Rel. Orig. Min. Marco Aurélio, Red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 28 e 29/10/2015 (repercussão geral) (Info 805).
O agente policial não é obrigado a se infiltrar, possuindo, ainda, direito a ter sua identidade alterada, aplicando-se, no que couber, o disposto no art. 9o da Lei no 9.807, de 13 de julho de 1999, bem como usufruir das medidas de proteção a testemunhas. Com isso, não pode ter sua identidade revelada, nem ser fotografado ou filmado, sem autorização, pelos meios de comunicação.
Após as investigações, conforme preceituado pelo art. 190-E, os atos eletrônicos decorrentes deverão ser gravados e encaminhados ao juiz e ao Ministério Público. Conforme parágrafo único, nos procedimentos deverão prezar pela preservação da identidade do policial infiltrado e a intimidade das crianças e dos adolescentes. A infiltração policial tem por objetivo primordial a obtenção de provas que possam desarticular uma organização criminosa, bem como comprovar delitos por ela praticados.
Nesse contexto, pode-se entender que, em uma infiltração policial, todas as espécies de provas ou quase todas, podem ser utilizadas, dependendo do caso concreto, suas circunstâncias e as maneiras de obtenção delas. Quando se trata de infiltração policial, baseada na legislação brasileira, se deve ter cautela em afirmar a validade de provas colhidas. Complementando, temos que pensar em situações de risco que um tipo de prova possa causar, por exemplo, usar de testemunho do agente infiltrado como prova para condenar um chefe de uma organização criminosa, na qual o próprio agente se infiltrou e conviveu.
4 CONCLUSÃO
Através deste estudo, percebe-se a tentativa em instrumentalizar o Direito Penal Brasileiro e um destes instrumentos é a infiltração policial. A permissão para o uso de infiltração no combate ao crime organizado e suas organizações, está previsto tanto na Lei nº 9.034/95 e mais recentemente nas leis nº 11.343/2006 e 13.441/2017. Ressalta-se que a Lei n° 13.441/2017 altera o Estatuto da Criança e do Adolescente, para prever a infiltração de agentes de polícia na internet com o fim de investigar crimes contra a dignidade sexual de criança e de adolescente.
Embora esteja determinado que seja necessária autorização judicial precedida de ciência e participação do Ministério Público num trabalho investigativo deste porte, a infiltração policial no Brasil não acontece como em outros países, onde esta prática tem credibilidade, suporte jurídico e eficácia, bem como assegurar a integridade dos agentes envolvidos, física e formal.
Entende-se que um policial jamais age sozinho numa infiltração, mas existe toda uma equipe de apoio e supervisão trabalhando em conjunto. Porém, nem mesmo estando amparado por um grupo operacional encoberto, não há condições legais que garantam a proteção incondicional do agente, colocando inclusive em dúvida a veracidade das provas colhidas em especial no que se refere a crimes cujas vítimas são crianças e adolescentes.
Devido a tantas incertezas do ordenamento jurídico, fica notória a insegurança do juiz em autorizar uma infiltração policial, pois certamente recairá sobre ele (Estado), a responsabilidade total sobre a operação autorizada como também, a responsabilidade integral sobre a vida de um profissional da segurança pública e consequentemente a de sua família.
Importante também será entender a validade da prova obtida pela técnica da infiltração policial no Brasil. Salienta-se que as provas obtidas através deste método de investigação são analisadas e valoradas pelo magistrado, que deverá observar se a obtenção das provas ocorreu de forma lícita ou ilícita, sob pena de nulidade do processo.
Durante a missão de infiltração do agente de inteligência policial, seu objetivo é obter todos os dados úteis para usá-los como prova no processo penal e entregá-los para a autoridade Policial, seja entregando estas informações para o responsável pelo apoio tático e operacional, quando este vai realizar a prisão, pois necessita dessas informações valiosas para planejar sua ação com antecedência e cautela, seja para aquele que está presidindo o Inquérito Policial e cuidando das investigações.
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[1] Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Professor de Direito do Centro Universitário Católica do Tocantins. Advogado. E-mail: [email protected].
Bacharel em Direito
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARBOSA, SANDRO VESCOVI MOZER. Investigação no inquérito policial: Infiltração Policial no ambiente virtual à Luz da Lei n° 13.441/2017 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 maio 2022, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58448/investigao-no-inqurito-policial-infiltrao-policial-no-ambiente-virtual-luz-da-lei-n-13-441-2017. Acesso em: 23 dez 2024.
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