ADEMIR GASQUES SANCHES[1]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo tem como posicionamento manifestar um estudo sobre os crimes contra a dignidade sexual contra a comunidade LGBTQIA+ visando a vitimologia dos casos recorrentes dos crimes de ódio. O trabalho decorre de muitas pesquisas realizadas objetivando os casos subsequentes e rotineiros contra a comunidade. Visto que o Brasil é o País que mais ocorrem homicídios e suicídios de pessoas LGBTQIA+, onde de acordo com pesquisas, em 2020 ocorreram 237 mortes de pessoas da comunidade. Apresentando os tópicos mais pertinentes ao assunto, o artigo busca informações e conhecimento sobre a luta diária das pessoas que integram a comunidade. A metodologia utilizada para a conclusão do artigo, decorre de estudos e análises bibliográficas, tanto quanto pesquisas em sites da internet, e estudos da legislação. Interpreta-se desta forma que o tema abordado faz-se completamente conveniente, necessário e apropriado na atualidade, tendo em conta questões presentes a serem desenvolvidas tal como para a legislação quanto para os cidadãos. Assim com as constantes mudanças na legislação, atualizações de novas sanções, e a inserção cada vez mais das pessoas que integram a comunidade, torna-se necessário o conhecimento explícito sobre um assunto tão atual e recorrente na sociedade. Onde lamentavelmente ainda são recorrentes os crimes que acometem o grupo LGBTQIA+.
Palavras-chave: Comunidade. Vitimologia. Dignidade.
ABSTRACT: This article aims to express a study on crimes against sexual dignity against the LGBTQIA+ community, aiming at the victimology of recurrent cases of hate crimes. The work stems from much research carried out targeting subsequent and routine cases against the community. Since Brazil is the country with the most homicides and suicides of LGBTQIA+ people, where according to surveys, in 2020 there were 237 deaths of people in the community. Presenting the most pertinent topics to the subject, the article seeks information and knowledge about the daily struggle of people who make up the community. The methodology used to conclude the article stems from studies and bibliographic analysis, as well as research on internet sites, and studies on legislation. It is interpreted in this way that the approached theme becomes completely convenient, necessary and appropriate nowadays, taking into account present issues to be developed, such as for the legislation as for the citizens. As with the constant changes in legislation, updates of new sanctions, and the increasing insertion of people who make up the community, explicit knowledge about such a current and recurring subject in society is necessary. Where, unfortunately, crimes that affect the LGBTQIA+ group are still recurrent.
Key-words: Community. Victimology. Dignity.
1 INTRODUÇÃO
A comunidade LGBTQIA+ é constituída por um movimento social e político para propiciar a inclusão social das pessoas homossexuais, sempre buscando sempre representatividade e lutando por seus direitos das diversas orientações sexuais e identidades de gênero. Com a constante evolução das siglas, hoje é abrangido pela abreviação das letras; L, lésbica; G, gay; B, bissexual; T, transexuais ou travestis; Q, queer; I, intersexual; A, assexual ou aliados; P, pansexual; +, inclui quaisquer outra identidade de gênero ou orientação sexual que não estão encaixadas no padrão cis-heteronormativo, tais como as pessoas não binárias que não se identificam por um gênero específico, nem masculino nem feminino.
A representatividade da sigla na comunidade LGBTQIA+ vai muito além de apenas letras ou bandeiras como representação, o verdadeiro intuito é abranger e simbolizar e refletir cada vez mais pessoas, fazendo com que se sintam acolhidas pelo movimento e por suas pautas defendidas perante a sociedade.
O movimento deu início em 28 de Junho de 1969, nos Estados Unidos em Greenwich Village. O movimento ficou conhecido como Stonewall Riot (Rebelião de Stonewall), com a durabilidade de 6 (seis) dias, a rebelião foi acometida como uma resposta de manifestação em consequência das ações policiais extremas, que habitualmente realizava revistas e enquadros humilhantes em bares gays de Nova York.
Este movimento acarretou inúmeras consequências. De acordo com o historiador David Carter, a rebelião Stonewall marcou o início do Gay Rights Movement (Movimento Pelos Direitos Gays), promovendo a criação de dois grupos de grande importância na história LGBTQIA+: o Gay Liberation Front (GLF) e o Gay Activists Alliance (GAA).
Para o movimento transgênero/travesti não houve uma data específica, porém a mudança na criação Transvestia: The Journal of the American Society for Equality in Dress deu-se início em 1952, sendo considerado um marco na luta trans nos Estados Unidos, especialmente representados por travestis e transexuais tais como Sylvia Era Rivera e Marcha P. Johnson. No território brasileiro, o movimento LGBTQIA+ constituiu seu desenvolvimento na década de 70, no ápice da ditadura civil-militar.
Com a evolução social e política da comunidade LGBTQIA+, é previsto hoje na legislação brasileira o avanço de leis e decisões judiciais tais como o casamento de pessoas do mesmo sexo, a atualização do nome social, o reconhecimento de direitos previdenciários para casais homoafetivos, garantindo cada vez mais seus direitos e suas conquistas, porém ainda é existente e necessária muita luta para alcançar a igualdade. Tal como o Projeto de Lei do Senado nº 612, de 2011:
Ementa:Altera os arts. 1.723 e 1.726 do Código Civil, para permitir o reconhecimento legal da união estável entre pessoas do mesmo sexo.Explicação da Ementa: Altera a redação do art. 1.723 da Lei nº 10.406/02 (Código Civil) para reconhecer como entidade familiar a união estável entre duas pessoas, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família; altera a redação do art. 1.726 da referida Lei para prever que a união estável poderá converter-se em casamento, mediante requerimento formulado dos companheiros ao oficial do Registro Civil, no qual declarem que não têm impedimentos para casar e indiquem o regime de bens que passam a adotar, dispensada a celebração, produzindo efeitos a partir da data do registro do casamento.
Desta maneira houve uma grande conquista para a comunidade LGBTQIA+, tendo em vista que em 2013 a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) aprovou uma jurisprudência onde é existente a possibilidade que os cartórios realizem o casamento civil para casais homoafetivos.
TJ – SC- Apelação Cível AC 00106332120188240091 Capital 0010633-21.2018.8.24.0091 (TJ-SC)
CASAMENTO HOMOAFETIVO – SENTENÇA QUE RECONHECE A POSSIBILIDADE JURÍDICA E SUBSTITUI A CELEBRAÇÃO DO ATO E DETERMINA AS AVERBAÇÕES NO REGISTRO CIVIL – RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – ALEGAÇÃO DE VEDAÇÃO LEGAL E CONSTITUCIONAL QUE APENAS ADMITE O CASAMENTO ENTRE HOMEM E MULHER – REJEIÇÃO DESSES ARGUMENTOS – RECONHECIMENTO, PELO STF, DA VALIDAÇÃO JURÍDICA DA UNIÃO ESTÁVEL HOMOAFETIVA – CARÁTER CIVIL CONTRATUAL DO CASAMENTO COMO ATO DE AUTONOMIA DE VONTADE ENTRE SERES HUMANOS MAIORES E CAPAZES – NÃO PROVIMENTO DO RECURSO. É possível a celebração de casamento homoafetivo com efeitos civis. O casamento nada mais é do que um contrato laico, firmado com base na autonomia da vontade, entre pessoas maiores e capazes. Não faz sentido que, ante o reconhecimento pelo STF da união estável homoafetiva e seus respectivos efeitos jurídicos, se negue a sua averbação do Registo Civil.
Desta forma, houve a evolução relacionada a adoção homoafetiva no brasil. Em 2010 o STJ (Superior Tribunal de Justiça) manteve a adoção de duas crianças a um casal de mulheres gays, desta forma incentivando o movimento mesmo sendo contestado pelo Ministério Público.
Superior Tribunal de Justiça STJ – RECURSO ESPECIAL: REsp 889852 RS 2006/0209137-4
Ementa
DIREITO CIVIL. FAMÍLIA. ADOÇÃO DE MENORES POR CASAL HOMOSSEXUAL. SITUAÇÃO JÁ CONSOLIDADA. ESTABILIDADE DA FAMÍLIA. PRESENÇA DE FORTES VÍNCULOS AFETIVOS ENTRE MENORES E A REQUERENTE. IMPRESCINDIBILIDADE DA PREVALÊNCIA DOS INTERESSES DOS MENORES. RELATÓRIO DA ASSISTENTE SOCIAL FAVORÁVEL AO PEDIDO. REAIS VANTAGENS PARA OS ADOTANDOS. ARTIGOS 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA. 1º DA LEI 12.010/09 E 43 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. DEFERIMENTO DA MEDIDA [...].
Outra alteração vigente atualmente, é a mudança do nome social para travestis, transgêneros e transexuais, onde mediante apresentação de requerimento e manifestação da vontade terão direito da mudança para o nome social escolhido. Assim a alteração decorrerá somente do prenome, o sobrenome no entanto deverá permanecer o mesmo. Desta maneira foi estipulado que o nome social deverá constar em todos os registros dos sistemas de cadastros, informações, programas, fichas e congêneres da administração pública.
Notavelmente os crimes de ódio tratam-se de uma violência direcionada e estipulada a uma comunidade específica, em outras palavras, os agressores designam suas vítimas assim de acordo com preconceito e seus ideais de sociedade. Desta maneira, é destacado que o crime se devota à focar a uma violação da dignidade da pessoa humana, assim consequentemente produzindo efeito não somente nas vítimas, mas em todo o grupo social que a mesma é pertencente.
Ainda que a legislação Brasileira siga as determinações internacionais dos Direitos Humanos, assim também recorrendo de suas leis específicas contra os crimes de preconceito e discriminação, tal como a Lei 7716 de 1989, ainda são recorrentes os crimes de ódio contra comunidades específicas, conhecidos também como a minoria em sociedades tais como a comunidade LGBTQIA+.
Os ataques também decorrem de grande potencial social. Assim como existe a grande chance de uma variedade de grupos religiosos, do mesmo modo defensores de ideologias extremas que criminaliza a homossexualidade, transexualidade etc. Podendo assim o crime ser cometido tanto verbalmente, quanto fisicamente.
3 VITIMOLOGIA E CRIMINOLOGIA
A vitimologia é considerada um ramo da criminologia, desta forma representando a importância e evolução da vítima na atividade criminosa levando em conta que por décadas o crime era somente voltado ao criminoso do fato. Desta forma:
Vitimologia consiste no estudo da vítima no que se refere à sua personalidade, quer do ponto de vista biológico, psicológico e social, quer o de sua proteção social e jurídica, bem como dos meios de vitimização, sua interpelação com o vitimizador e aspectos interdisciplinares e comparativos. (apud RIBEIRO, 2001, p. 30).
O termo “vitimologia” foi incialmente criado por Benjamin Mendelsohn, em 1945. Em síntese o estudo explana a relação criminoso-vítima, em virtude de colocar a mesma como elemento preponderante e incontestável na realização do delito. Em divergências, alguns consideram a vitimologia como forma de grande importância nos ramos da criminologia. Já outros inclinam-se à tratar-se de uma ciência com o surgimento por meio de estudos de criminologistas, contudo não considerando-os um ramo da criminologia.
Em síntese, o mesmo tem como objetividade o estudo da vítima em relação ao delito cometido, assim identificado como “estudo científico da vítima”, com a intenção da análise do comportamento da vítima frente a legislação, por intermédio de seus componentes biossociológicos, intencionando apurar as condições que a vítima poderá desenvolver, ou diagnósticos decorrentes dos seus atos. Tal estudo, pode ser beneficio para a solução do crime, não somente em relação à responsabilidade e culpabilidade do delito, como também ao julgamento.
É desta maneira que a sua personalidade, comportamento social, reação perante o delito, tornam-se de extrema importância para o estudo do crime. Em relação a comunidade LGBTQIA+, a vitimologia é centrada nos crimes em que a comunidade é vitimizada, dentre a discriminação, violência doméstica e física nas ruas. Assim de acordo com Salo de Carvalho:
[...] creio que seria possível identificar três níveis de manifestação da violência heterossexista ou homofóbica: o primeiro, da violência simbólica (cultura homofóbica), a partir da construção social de discursos de inferiorização da diversidade; o segundo, da violência das instituições (homofobia de Estado), com criminalização e a patologização das identidades não-heterossexuais; o terceiro, da violência interpessoal (homofobia individual), no qual a tentativa de anulação da diversidade se concretiza em atos de violência real.
A vitimologia requer de grande importância na comunidade, visto que a maior parte de pessoas vítimas de agressão, ou morte estão simplesmente vivendo suas vidas sem dar causa ao crime. Assim como na maior parte das vezes a violência é iniciada em casa, por familiares que não aceitam a orientação sexual do indivíduo, ou silenciam-se perante agressão de outros, ou até mesmo colaboram ativamente na reprodução da violência. O ambiente familiar é estabelecido responsável pela grande porcentagem de homossexuais agredidos.
Desta maneira para melhor compreensão, atualmente é efetivo uma classificação das vítimas:
1.Vítimas natas: São o perfeito exemplo do indivíduo masoquista. São as pessoas que fazem tudo consciente ou inconsciente para produzirem crime, assim tornando-se a vítima do delito.
2.Vítimas em potencial: São as pessoas que causam discórdia, levam a agonia aqueles com que convivem.
3.Vítimas inocentes: São as reais vítimas. Não causadoras do fato criminoso, sem qualquer culpa na realização do delito.
4.Vítimas provocadoras: Essas são muito importantes a sua análise, devido sua atividade na ação do delito.
5.Vítimas simuladoras: São aquelas que com consciência de não terem sido vítimas do delito, desta forma normalmente por intenções como obtenção de vantagem ou vingança.
4 CASOS LGBTFÓBICOS
Assim não somente como os casos de homicídio que aumentaram, foram exorbitantes bem como os casos de suicídio realizados pela comunidade LGBTQIA+. Os transtornos psicológicos se elevaram drasticamente, ocasionando em uma maior taxa de suicídios por pessoas que se enquadrem na comunidade.
1. Gustavo dos Santos Lima
Homem, gay de 27 anos, dentista, vítima do crime de homofobia durante a aplicação do imunizante contra o coronavírus. Durante a aplicação da mesma, uma mulher recusou-se que Gustavo vacinasse sua filha, alegando que a mesma não seria vacinada “por esse tipo de gente: um viado”. Gustavo sofria de transtorno depressivo. O mesmo foi encontrado já sem vida na manhã do dia 14 de Outubro de 2021.
2. Roberta Nascimento da Silva
Mulher trans de 32 anos, moradora de rua, foi atacada no centro de Recife (PE). No dia 24 de Junho de 2021 foi golpeada por um adolescente desconhecido, onde teve 40% de seu corpo queimado. Já no hospital, devido aos ferimentos graves a mesma teve o braço esquerdo amputado e parte do direito. Veio a falecer no dia 09 de Julho de 2021.
3. Paola Amaral
Travesti, negra, que foi acusada de furtos pela região de Teresina (PI), estava sendo mantida presa no porta-malas de um carro, com suas mãos e pés amarrados, sendo constantemente espancada por um grupo de homens. A mesma foi espancada sob o olhar da guarda municipal local que nada fez a respeito. É tomado nota que a agressão ocorrida no porta-malas do carro deu-se antes dos oficiais chegarem ao local, contudo em vídeos gravados é possível observar claramente a imagem dos mesmos no território somente analisando a agressão.
4. Jovem vítima de estupro coletivo
Jovem gay de 22 anos, o qual não teve seu nome divulgado, foi vítima de um estupro coletivo em Florianópolis (SC) no dia 31 de Maio de 2021. O mesmo foi estuprado por 3 (três) homens, e teve seu corpo parcialmente tatuado com frases homofóbicas por objetos cortantes. O rapaz foi jogado na rua após o crime, sendo encaminhado ao hospital em estado grave. O caso somente tomou proporção após ser tema de reportagem no jornal “Cidade Alerta SC” no dia 04 (quatro) de Junho. A Delegacia de Polícia da Capital mantém a investigação sob sigilo. A presidente da Comissão de Diversidade Sexual e Gênero da OAB Santa Catarina, Margareth Hernandes emitiu uma nota em repúdio ao crime.
5. Luana Barbosa
Mulher lésbica, negra, mãe, foi morta aos 34 anos na zona Norte de Ribeirão Preto (SP). O caso ocorreu em 2016, onde a mesma foi espancada por 3 (três) policiais militares na esquina de sua casa. Luana foi morta por lesões cerebrais consequentes da covarde agressão pelos oficiais após se recusar a ser revistada pelos soldados exigindo a presença de uma policial feminina. O caso ainda corre fundamentalmente sem o comprometimento dos agressores.
Esses casos são apenas uma pequena demonstração da enorme covardia de pessoas homofóbicas, transfóbicas e preconceituosas da sociedade e que infelizmente a justiça falha na maior parte de casos com pessoas homossexuais e transexuais.
5 PROJETOS DE INCLUSÃO SOCIAL
É essencial a inserção das pessoas LGBTQIA+ na sociedade. Muitas pessoas são demitidas de seus empregos ou não recebem nenhuma oportunidade por conta do preconceito. A inclusão de pessoas travestis, transexuais e transgêneros no mercado de trabalho é extremamente complicado, pois é notável o desrespeito e preconceito em situações cotidianas que são enfrentadas. Como por exemplo o desacato ao nome social.
Visto isso, é existente muitos projetos de inclusão para propiciar uma oportunidade ou acolhimento para as pessoas da comunidade. Como por exemplo a Casa Nem, que está constituída da região da Lapa no Rio de Janeiro. Trata-se de um local de abrigo para os transsexuais, travestis e homossexuais, que estão em situação de fragilidade. A coordenação é voltada a voluntariados e as pessoas que realizam doações para a instituição.
Assim como também é existente um projeto em Sergipe chamado “Projeto Inclusão Arco-íris – Ações de Empregabilidade para LGBTQIA+ em Sergipe”. É um empreendimento da Associação Sergipana de Direitos Humanos e Cidadania LGBT (Astra), tendo como fonte de objetivo impulsionar as atividades de capacitação e escolaridade, com a intenção de obter ofertas e oportunidades de trabalho para pessoas da comunidade LGBTQIA+ proporcionando dignidade.
6 JURISDIÇÃO
É de conhecimento comum que os direitos constitucionais da pessoa humana faz-se necessário para qualquer cidadão. Não há motivos que os tornem diferentes para a comunidade LGBTQIA+. Desta maneira a Constituição Federal em seu artigo 5º alega fundamentalmente a dignidade da pessoa humana, este um direito pelo qual a comunidade luta a décadas, almejando seu reconhecimento, seus direitos e sua dignidade. A Lei 13.104/15 que alterou o Código Penal esclarece o crime de feminicídio, cometido em razão do gênero, sofreu alterações decorrentes ao sexo feminino. Onde antes era “contra a mulher por razões de gênero”, hoje trata-se “contra mulher por razões da condição do sexo feminino”.
Desta maneira, é compreendido duas linhas de entendimento. Doutrinadores modernos absorvem a causa de que mulheres transexuais podem sim configurar-se como sujeito passivo em um crime de feminicídio, acompanhando o critério jurídico de que seu registro civil foi modificado e nele consta como sexo feminino. De outro lado é desenvolvido por doutrinadores mais conservadores, que mulheres transexuais não se configuram como sujeito passivo no crime, assim estabelecendo sua concepção genética mesmo que a mulher tenha passado por cirurgias de redesignação sexual, desta forma a transexual não é passível do crime de feminicídio.
De acordo com Carlos Roberto Gonçalves, o feminicídio:
Para que se caracterize a violência doméstica ou familiar determinadora do feminicídio, é preciso que a violência tenha como motivo o gênero feminino, não sendo suficiente que a vítima seja a esposa, namorada, companheira, filha, etc. Se o marido assassina a esposa, pois a mesma não quis ter relação sexual ou pediu o divórcio, configura-se feminicídio. Porém, se o homem mata a esposa, pois queria receber o seguro de vida que a esposa contratou, não seria tipificado como feminicídio, e sim como homicídio qualificado pelo motivo torpe (GONÇALVES, 2016)
Assim, no ano de 2020, o Supremo Tribunal Federal, considerou que a discriminação pela orientação sexual ou identidade de gênero, seja considerada crime, desta maneira sendo punido pela Lei de Racismo 7.716/89, deste modo um crime inafiançável e imprescritível segundo a norma com pena de um a cinco anos de prisão.
De tal modo, o sistema carcerário para os homossexuais torna-se cada vez mais complicado, visto que uma das regras básicas principais das penitenciárias é a exclusão total daquele que não se enquadrar nos padrões. Os mesmos são proibidos de ter contato com alimentos e de utilizar os mesmos utensílios que os outros detentos, pois segundo os carcereiros, seria uma maneira de transmissão de doenças, claramente um estereótipo social.
Outra questão é a forma como a pessoa homossexual é utilizada na penitenciária como moeda de troca. Sendo estes frequentemente obrigados a realização de tarefas domésticas, como fazer a limpeza de celas, lavar as roupas dos detentos, cozinhar... Além de serem obrigados a colaborar com o tráfico dentro da penitenciária, inserindo objetos, celulares ou drogas no canal anal para receberem algum ensejo que seja concedido pelos detentos “superiores”.
Outra pauta a ser debatida é sobre os crimes sexuais cometidos. Indivíduos com características mais femininas ou transsexuais estão mais vulneráveis a esses crimes. Desta maneira, por serem expostos as práticas abusivas sexuais, estão mais suscetíveis à transmissão de doenças sexualmente transmissíveis como HIV, hepatite, sífilis, entre outros. Em relatos, transsexuais discorrem sobre o fato da exploração e do abuso sexual.
Eu era obrigada a ter relação sexual com todos os homens das celas, em sequência. Todos eles rindo, zombando e batendo em mim. Era ameaçada de morte se contasse aos carcereiros. Cheguei a ser leiloada entre os presos. Um deles me ‘vendeu’ em troca de 10 maços de cigarro, um suco e um pacote de biscoitos. Fiquei calada até o dia em que não aguentei mais. Cheguei a sofrer 21 estupros em um dia. Peguei hepatite e sífilis. Achei que iria morrer. Sem falar que eu tinha de fazer faxina na cela e lavar a roupa de todos. Era a primeira a acordar e a última a dormir (KIEFER, 2014).
Além do fato da discriminação e homofobia cometida pelos próprios carcerários, onde mulheres transsexuais também relatam as humilhações, agressões físicas, em que são submetidas, inclusive com o desrespeito ao nome social das mesmas, considerando a legislação vigente de abril de 2014.
Deste modo também, de acordo com o Promotor de Justiça Flávio Lorza, a apuração da forma de violência doméstica deve ser acometida não a partir do sexo, mas sim do gênero da mulher. (MPSP, 2016.)
Desta forma, há a compreensão de que a Lei Maria da Penha estende-se as mulheres transexuais que sofrem violência doméstica ou familiar. Assim de acordo com a jurisprudência:
TJ-DF – 20181610013827 DF 0001213-52.2018.8.07.0020 (TJ-DF)
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. APLICAÇÃO DA LEI 11.340/06 (MARIA DA PENHA). VÍTIMA TRANSEXUAL. APLICAÇÃO INDEPENDENTE DE ALTERAÇÃO DO REGISTRO CIVIL. COMPRETÊNCIA DO JUIZADO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER. RECURSO PROVIDO. 1. Diante da alteração sexual, comportando-se a recorrido com mulher e assim assumindo seu papel na sociedade, sendo dessa forma admitida e reconhecida, a alteração do seu registro civil representa apenas mais um mecanismo de expressão e exercício pleno do gênero feminino pelo qual optou, não podendo representar um empecilho para o exercício de direitos que lhe são legalmente previstos. 3. Recurso provido.
Por conseguinte, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luís Roberto Barroso concluiu que pessoas travestis e transexuais identificadas pelo gênero feminino podem optar pelo cumprimento da pena em presídios femininos ou masculinos, em área reservada garantindo sua segurança.
7 CONCLUSÃO
É notável com a construção deste artigo que a necessidade de evolução contra o preconceito e toda sua discriminação requer mudanças, mesmo com as legislações vigentes que protegem e recriminam atitudes como crimes de discriminação, ódio e intolerância. A luta da comunidade torna-se sempre necessária para a representação e inclusão.
Na atualidade a vitimologia como já dito, torna-se de extrema importância para os crimes cometidos contra essa comunidade, visto que requer um estudo detalhado sobre a vítima e sua vida, uma vez que a maioria das vítimas são acometidas e escolhidas com base pela sua orientação sexual ou gênero, tornando assim padecente de pessoas que em sua grande parte são desconhecidos sendo regidos pelo ódio e puro preconceito.
Desta forma como já destacado, é vigente pelo artigo 1º da Constituição Federal que um dos fundamentos é a dignidade da pessoa humana. Assim a cirurgia de redesignação de sexo se mostra como uma grande solução para tais problemas. Trazendo desta forma não somente a adequação física em que o indivíduo se encaixa, mas também reduz os impactos sociais, considerando que a possibilidade de sociabilidade do indivíduo elevará. Atualmente a cirurgia é respaldada pelo Sistema Único de Saúde Brasileiro (SUS), assim aos 16 anos o indivíduo poderá dar início às terapias hormonais, porém a cirurgia somente poderá ser realizada a partir dos 18 anos.
Contudo as discriminações ocorridas em instituições de saúde são exorbitantes, com desrespeito ao nome social, a aparência física do indivíduo, sendo estes através de “chacotas”, humilhações, discriminações, entre outras situações constrangedoras e até mesmo agressivas, o que leva a comunidade principalmente a população trans a evitar requerer os equipamentos e serviços de saúde, refletindo assim na piora de suas condições básicas. Dentre a população LGBTQIA+, o segmento trans é o que enfrenta as maiores dificuldades na procura pelos serviços de saúde, tanto pela demanda específica quanto pelos episódios de transfobia presentes no cotidiano.
Ante o exposto, concluo que ainda que a comunidade LGBTQIA+ venha alcançando conquistas, se destacando cada vez mais e ganhando seu merecido espaço na sociedade fazendo com que sua liberdade seja reconhecida como direito essencial, sabe-se que a violência contra essa luta ainda é presente no cotidiano. Torna-se necessário o investimento na legislação e educação. A necessidade de mudança no comportamento social implica em reconhecimento e sensibilização do Estado e sociedade. Desta maneira concluo este artigo ressaltando que as organizações sociais, em vista desses Direitos, carecem de um maior apoio e suporte à comunidade, que embora amparada pela legislação, não estão ainda em igualdade de direitos como os demais cidadãos, assim de acordo com nossa realidade.
REFERÊNCIAS
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Graduanda do curso de Direito UNIFUNEC - Centro Universitário de Santa Fé do Sul - SP
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, Nátalyn Sorfa. Os crimes contra a dignidade sexual contra a comunidade LGBTQIA+ sob a ótica da vitimologia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 26 maio 2022, 04:18. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58473/os-crimes-contra-a-dignidade-sexual-contra-a-comunidade-lgbtqia-sob-a-tica-da-vitimologia. Acesso em: 23 dez 2024.
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