RESUMO: O presente artigo tem como objetivo expor o dever de motivação dos atos e das decisões administrativas sob o prisma da teoria dos atos administrativos, bem como avaliar as disposições introduzidas na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro – LINDB sobre esse dever. Se, por um lado, as decisões nas esferas administrativa, julgadora e controladora já deveriam ser motivadas, com o sopesamento dos impactos da decisão na sociedade, a reforma da LINDB, por outro lado, teve o importante papel de conferir segurança jurídica aos administrados ao impor que o processo de tomada de decisão deverá, necessariamente, levar em consideração as consequências práticas (efeitos jurídicos) no mundo fático.
Palavras-chaves: Ato e decisão administrativa. Dever de motivação. Valores jurídicos abstratos. Consequências práticas da decisão.
ABSTRACT: This article aims to expose the duty to motivate administrative acts and decisions from the perspective of the theory of administrative acts, as well as to evaluate the provisions introduced in the Law of Introduction to the Brazilian Rules – LINDB on this duty. If, on the one hand, decisions in the administrative, judging and controlling spheres should already be motivated, weighing the impacts of the decision on society, the LINDB reform, on the other hand, had the important role of providing legal certainty to those administered by means of imposing that the decision-making process must necessarily take into account the practical consequences (legal effects) in the society.
Keywords: administrative act and decision. Duty to motivate. Abstract legal concepts. Practical consequences of the decision.
Sumário: 1. Introdução. 2. O dever de motivação dos atos administrativos. 3. A LINDB e as alterações de segurança jurídica. 4. Inovação ou Retórica? 5. Conclusão.
1.Introdução
Decidir é tomar resolução sobre algo; dar uma solução para resolver, solucionar, determinar. A definição do conceito é clara, mas a sua aplicação não. Isso porque não há um arcabouço legal específico que guie o aplicador do Direito no processo de tomada de decisão. Nem seria o caso de haver, afinal a multiplicidade de possíveis decisões diante de uma quantidade incalculável de situações jurídicas (com suas respectivas peculiaridades) inviabilizaria normatizar um manual que mecanize o processo decisório.
Para evitar a edição de decisões incoerentes, desviadas ou desproporcionais, a teoria do ato administrativo relaciona requisitos essenciais para assegurar a eficácia e a validade das decisões administrativas, entre eles a motivação. A motivação, enquanto exposição de fundamentos fáticos e jurídicos da decisão, cria um liame entre o fato jurídico e a decisão tomada, ou seja, é a linha de raciocínio utilizada pelo decisor diante de determinado fato para concluir por certa decisão.
Com o propósito de reforçar o dever de motivação, a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro foi reformada para incluir dispositivos que garantissem segurança jurídica na aplicação das normas de direito público. Entre essas novas previsões, duas estão diretamente relacionadas com a motivação dos atos e decisões nas esferas administrativa, judicial e controladora: os artigos 20 e 21. Segundo esses artigos, o processo de tomada de decisão não pode se pautar exclusivamente em valores jurídicos abstratos, sem que se considere as consequências práticas da decisão, e qualquer decisão de invalidação deve indicar as consequências jurídicas e administrativas.
Estes enunciados podem gerar certas reflexões: os decisores já não eram obrigados a refletir sobre as possíveis consequências de suas decisões? Era possível invocar princípios jurídicos ou conceitos jurídicos indeterminados para motivar decisões administrativas? Se a resposta para ambas as perguntas for negativa, houve, então, alguma inovação na reforma da LINDB? São essas questões que pretendemos responder no presente artigo.
2.O dever de motivação dos atos administrativos
Antes de tratarmos sobre o dever de motivação dos atos e das decisões administrativas, precisamos definir um referencial teórico acerca do próprio ato administrativo. Não pretendemos estender a análise à aspectos que não serão relevantes para o debate proposto, mas tampouco podemos tratar sobre a motivação sem antes introduzirmos uma categoria fundamental do Direito Administrativo: o ato administrativo.
Não há no ordenamento jurídico brasileiro uma definição definitiva sobre ato administrativo. Sua conceituação advém da construção doutrinária – a despeito das divergências na delimitação do determinado signo entre autores – que “estratificam um ponto de referibilidade de normas, de efeitos de direito”.[1]
Não seria possível explorarmos o processo de conceituação do ato administrativo sem antes fixarmos uma série de premissas conceituais, tais como função administrativa, função pública e interesse público. Contudo, como não faz parte do escopo deste artigo esmiuçar as bases deste processo doutrinário, tomaremos a liberdade para avançarmos à definição de ato administrativo para, então, indicarmos aquela que utilizaremos como referencial teórico.[2]
Registre-se que optar por uma definição de ato administrativo não significa desprezar as demais. Poderíamos nos valer das lições de Antônio Carlos Cintra do Amaral para adotar o conceito de ato enquanto norma administrativa, isto é, “norma jurídica concreta criada pelo Estado no exercício da função administrativa, que produz efeitos, diretamente, na esfera jurídica dos particulares, fora, portanto, do âmbito do aparelho estatal”.[3] Poderíamos adotar, ainda, uma definição que restringe o ato às declarações unilaterais da Administração Pública, como Hely Lopes Meirelles, para quem “ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir, resguardar, transferir, modificar, extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos administrados ou a si própria”.[4]
Contudo, para fins do presente estudo, utilizaremos a definição de Celso Antônio Bandeira de Mello, segundo a qual o ato administrativo é a “declaração do Estado (ou de quem lhe faça as vezes – como, por exemplo, um concessionário de serviço público), no exercício de prerrogativas públicas, manifestada mediante providências jurídicas complementares da lei a título de lhe dar cumprimento, e sujeitas a controle de legitimidade por órgão jurisdicional”.[5]
Nos valemos também das lições do ilustre administrativista para fixarmos o referencial teórico sobre os elementos e pressupostos do ato administrativo. A sua sistematização prevê que os elementos do ato administrativo envolvem o conteúdo e a forma, enquanto os pressupostos são subdivididos entre pressupostos de existência (objeto e pertinência do ato ao exercício da função administrativa) e de validade (subjetivo – sujeito, objetivo – motivo/requisitos procedimentais, teleológico – finalidade, lógico – causa e formalístico – formalização).
O último pressuposto de validade, isto é, o pressuposto formalístico de regularidade é o mais importante para o objeto deste artigo: é aqui que, na visão do mencionado autor, reside o dever de motivação dos atos administrativos.[6] A despeito da motivação não ter constado expressamente no artigo 37, caput, da Constituição Federal – conforme previsto em seu projeto original – seu fundamento de validade decorre de outros dois dispositivos constitucionais: os artigos 1º e 93, X.
De acordo com o primeiro artigo da Constituição Federal, a República Federativa do Brasil é constituída como Estado Democrático de Direito. É dizer que o nosso ordenamento jurídico privilegia a estrutura republicana, federativa, democrática e de Estado de Direito, o que na visão da doutrina administrativista majoritária, extrai-se uma regra geral de obrigatoriedade da motivação dos atos administrativos.[7] Nessa linha, o Supremo Tribunal Federal, em processo com repercussão geral reconhecida, reconheceu que a obrigação de a Administração Pública motivar os atos administrativos decorre da “própria ideia de Estado Democrático de Direito, no qual a legitimidade de todas as decisões administrativas teria como pressuposto a possibilidade de que seus destinatários as compreendessem e o de que pudessem, caso quisessem, contestá-las”.[8]
Ademais, o artigo 93, X, da Constituição Federal prevê que “as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas em sessão pública”, sendo correta a interpretação de que o constituinte não restringiu o dever de motivação às decisões administrativas do Poder Judiciário, mas também àquelas editadas por órgãos e entidades da Administração Pública Direta e Indireta.
A motivação é a fundamentação, o raciocínio, o apontamento dos fatos considerados relevantes, a exposição de razões e das normas que devem incidir diante de determinado fato jurídico. Especialmente no caso de atos administrativos, a motivação tem a importante função de conferir publicidade aos elementos ponderados pelo administrador para concluir sobre determinada decisão, como conclui Maria Sylvia Zanella Di Pietro ao tratar a motivação como princípio: “o princípio da motivação exige que a Administração Pública indique os fundamentos de fato e de direito de suas decisões”.[9]
Entendemos não haver espaço, em nosso ordenamento jurídico, para posicionamentos defendendo a motivação de atos administrativos somente nos casos em que a lei expressamente impusesse este dever.[10]-[11] E ainda que assim fosse, a obrigatoriedade de motivação, com indicação dos fatos e fundamentos jurídicos, foi incluída na Lei Federal 9.784/1999, que regulamenta o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal,[12] afastando suposta necessidade de leis esparsas optarem quando o ato administrativo deve ou não ser motivado.
Destaca-se que a motivação dos atos administrativos deve, obrigatoriamente, incidir sobre atos administrativos vinculados e discricionários. A Constituição Federal e a Lei Federal 9.784/1999 não excepcionaram a motivação somente a atos administrativos discricionários. Como mencionamos, a motivação indicará os pressupostos de fato e de direito que dão a sustentação ao ato e, portanto, aplica-se também aos atos vinculados.
É evidente que a motivação dos atos administrativos vinculados – isto é, aqueles que a lei já predefine a conduta a ser adotada pelo administrador – estará em segundo plano em comparação com o motivo que ensejou a edição do ato. Caso um cidadão, por exemplo, ingresse com pedido de aposentadoria, demonstrando ter preenchido o tempo mínimo de contribuição definido na Constituição Federal, caberá ao servidor público do Instituto Nacional de Seguridade Social analisar os documentos apresentados e, cumpridos os requisitos legais, conceder ou negar a aposentadoria pleiteada. Esse ato administrativo não comporta discricionariedade.
De toda forma, a concessão ou a negativa da aposentadoria deverá ser motivada com a indicação do pressuposto fático e jurídico ponderado pelo servidor. Caso contrário, em caso de negativa da aposentadoria, o cidadão não terá suporte para questionar eventual negativa ou, em caso de concessão da aposentadoria, os órgãos de controle não terão elementos para realizar fiscalizações.
Como consequência para a ausência de motivação de ato administrativo vinculado, filiamo-nos ao entendimento de Celso Antônio Bandeira de Mello, segundo o qual, via de regra, o ato deverá ser reputado inválido, salvo se a Administração Pública demonstrar que a motivação do ato havia sido editada anteriormente.[13]
Como não poderia ser diferente, o dever de motivação em atos discricionários fica mais evidente ainda. Uma vez que a motivação confere transparência sobre os motivos que resultaram em determinada decisão administrativa, permitindo que o interessado possa exercer o contraditório e o devido processo legal, a exposição de motivos pelo administrador que ensejou um determinado resultado em detrimento de outro (exercício da discrição administrativa) é imprescindível.
Desta forma, a falta de motivação nos atos administrativos discricionários torna o ato inválido e, via de regra, de impossível convalidação. Excepcionalmente, a Administração Pública poderá demonstrar que o ato praticado continha motivação preexistente que justificava a sua edição – ainda que o documento que ampare a justificativa seja apartado ao ato, como um parecer, uma nota técnica, um laudo etc.[14]
3.A LINDB e as alterações de segurança jurídica
A Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, introduzida por meio do Decreto-Lei 4.657, de 4 de setembro de 1942, é um conjunto de normas jurídicas que regem a hermenêutica sobre as demais normas em nosso ordenamento jurídico, isto é, a lei de introdução às próprias leis brasileiras.[15] É a bússola legislativa que orienta o intérprete em sua atividade cognitiva de decodificar o sentido e a aplicação das normas dispostas no sistema.
Originalmente denominada Lei de Introdução ao Código Civil, a alteração da nomenclatura legal, em 2010, teve como objetivo esclarecer que as normas contempladas nesse diploma legal regiam não só o direito privado, mas também a hermenêutica e aplicação das normas de direito público. A alteração da alcunha para LINDB, contudo, não trouxe nenhuma inovação prática ao direito público, afinal grande parte de seus artigos permaneciam se relacionado à interpretação e aplicação do direito privado e do direito internacional.
Esse panorama somente foi alterado em 2018 após o advento da Lei 13.655, de 25 de abril de 2018, que introduziu “disposições sobre segurança jurídica e eficiência na criação e na aplicação do direito público”. Os dez novos artigos incluídos na LINDB passaram a balizar a hermenêutica, revisão e o controle do ato administrativo, a criação e aplicação de políticas públicas e a responsabilização do administrador em casos em dolo ou erro grosseiro.[16]
A partir de expressões usualmente utilizadas pela jurisprudência e, sobretudo, pela doutrina administrativista moderna, como “valores jurídicos abstratos” e “consequências práticas da decisão”, o legislador positivou comandos aplicáveis à atuação de administradores, julgadores e controladores. E essa influência na atividade administrativa tinha o claro propósito de “neutralizar importantes fatores de distorção da atividade jurídico-decisória pública”, nas palavras do relator do projeto de lei que viria a ser sancionada na Lei 13.655/2018.[17]
Em outros termos: a introdução dos artigos na LINDB pretendeu positivar entendimentos construídos por precedentes judiciais e administrativos e pela doutrina moderna, gerando um controle sobre o controle exercido pelas autoridades públicas. Sob esse aspecto, ao mesmo tempo que não negamos a importância das alterações promovidas na LINDB para fins de promover maior segurança jurídica aos administrados, tampouco concordamos que o texto legal tenha criado paradigmas hermenêuticos das normas de direito público.
Para fins do presente estudo, destacamos os artigos 20 e 21 introduzidos na LINDB e que dialogam com o dever de motivação dos atos e decisões administrativas.[18]
O artigo 20 veda a adoção de “valores jurídicos abstratos” como motivação das decisões proferidas nas instâncias administrativa, controladora e judicial sem que sejam considerados os efeitos da decisão, ou seja, as consequências práticas. Isso não significa que o agente não poderá fundamentar a sua decisão em valores abstratos, tais como “interesse público” e “dignidade da pessoa humana”. O conteúdo da norma, na realidade, preocupa-se em assegurar ao administrado que as decisões não serão motivadas somente a partir da invocação de fundamentos indeterminados ou genéricos.
Exige-se, a partir da interpretação desta norma, que a autoridade competente realize um exercício de ponderação em relação às possíveis consequências práticas que sua possível decisão pode gerar no mundo fático. Administradores, julgadores e controladores não poderão, portanto, fundamentar suas decisões em conceitos jurídicos indeterminados como a “supremacia do interesse público” sem avaliar os impactos dessa decisão no caso concreto.
Aqui precisamos destacar dois enunciados aprovados pelo Instituo Brasileiro de Direito Administrativo, em 14 de junho de 2019, sobre a interpretação do caput do artigo 20. De acordo com o Enunciado 2/2019, a motivação poderá ocorrer por remissão a orientações gerais, precedentes administrativos ou atos normativos, desde que a autoridade competente não se exima de analisar as particularidades do caso concreto (inclusive para o caso de não aplicação da orientação geral).
Além disso, o Enunciado 6/2019 prevê que a referência legal à “valores jurídicos abstratos” não se restringe à intepretação e aplicação de princípios, abrangendo, também, regras e outras normas que contenham conceitos jurídicos indeterminados. Essa interpretação é valiosa, pois a contrario sensu poderia se entender que a mera remissão a normas legais seria suficiente para motivar a decisão administrativa. Ocorre que há circunstâncias que a remissão legal se depara com conceitos jurídicos indeterminados como “interesse público”, o que, consoante o Enunciado 6/2019, merece ser sopesado à luz das consequências da decisão.
O parágrafo único do artigo 20 vai além ao dispor que a motivação da decisão deverá demonstrar a “necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas”. Aqui há um evidente espírito de reduzir o hipercontrole exercido por órgãos competentes e que afligem os administrados por falta de segurança jurídica.
O exercício de ponderação das consequências não exige que a autoridade pratique futurologia: o decisor deverá pautar sua análise frente às possíveis alternativas da sua decisão, levando em consideração aspectos sociais, econômico-financeiros, políticos e, evidentemente, jurídicos. E, por força do parágrafo único do artigo 20, a motivação do ato ou da decisão deverá apresentar o racional utilizado, inclusive em relação à necessidade e adequação do conteúdo do ato.
Mais adiante, referimo-nos ao artigo 21 que, em linha com o artigo 20, prevê que as decisões editadas nas esferas administrativa, controladora ou judicial que decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. O parágrafo único desse artigo revela preocupação com a onerosidade excessiva imposta ao administrado ao indicar que eventual regularização de ato ou fato jurídico ocorra de modo “proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais”.
São valiosas as lições de José Vicente Santos de Mendonça acerca da definição das consequências jurídicas e administrativas, necessárias para compreender o espírito desta norma. Ao seu ver, as “consequências jurídicas são estados imediatos e imediatamente futuros associados à interpretação ou à aplicação do Direito e que, certos ou prováveis, sejam exequíveis e admissíveis pela Constituição de 1988. Consequências administrativas são estados imediatos e imediatamente futuros, associados à atuação pública e que, certos ou prováveis, sejam igualmente exequíveis e admissíveis por nossa Constituição”.[19]
Com efeito, assim como a previsão constante do artigo 20 da LINDB, as autoridades competentes que determinarem quaisquer invalidações deverão, obrigatoriamente, sopesar as consequências desta decisão de acordo com os impactos no caso prático.
4.Inovação ou retórica?
Após expormos, em apertada síntese, o dever de motivação dos atos e decisões administrativas e as alterações legais promovidas em 2018, propomos a seguinte reflexão: os artigos 20 e 21 inovaram no ordenamento jurídico ou não, tendo apenas o condão de ratificar aquilo que a teoria dos atos administrativos já previa?
De um lado temos quem afirme que a reforma da LINDB não inovou no exercício hermenêutico das normas de direito público. Segundo essa visão, os artigos 20 e 21 apenas dão eficácia às exposições doutrinárias a respeito da interpretação consequencialista e em sua aplicação pelo administrador, julgador e controlador.[20]
Do outro lado há quem veja as inovações com o exato propósito de eliminar práticas subjetivas e superficiais das autoridades competentes. Entende-se que o objetivo desta reforma foi alcançado pelo fato de aumentar a segurança jurídica aos administrados ao positivar entendimentos então sedimentados na doutrina, mas de baixa aplicação pelos responsáveis pelas decisões administrativas, judiciais e controladoras.[21]
Sem medo de ficar “em cima do muro”, entende-se que ambas as posições são acertadas.
Antes de mais nada, precisamos refutar o tom pejorativo que determinados autores utilizam para discorrer sobre o consequencialismo. Ao contrário do que afirmam, o consequencialismo não representa uma carta branca à disposição do administrador para decidir somente com base em fenômenos econômicos, políticos ou sociais. Na realidade, e aqui faremos referência a Neil MacCormick, um dos principais autores responsáveis pela criação dessa visão, o consequencialismo deve ser visto como a ponderação para os prováveis impactos que a decisão terá no comportamento da sociedade.
É dizer: apesar de a interpretação consequencialista dever ser adotada quando surgirem problemas de interpretação da norma, nenhuma deliberação pode ser feita se estiver em contradição com alguma norma válida e de caráter obrigatório do sistema jurídico. O autor escocês diz que a decisão deve ser coerente com os princípios emanados da ordem jurídica e, portanto, que as consequências jamais poderão se sobrepor à ordem jurídica.[22]
Com isso em mente, verificamos que há muito a doutrina já repercutia que o intérprete do Direito deveria se preocupar com as consequências prováveis de cada interpretação. Adotando as lições de Carlos Maximiliano, o hermeneuta deve interpretar o Direito inteligentemente, afastando-se de interpretações absurdas ou incompatíveis com o interesse geral.[23]
Em relação aos atos administrativos, especialmente os discricionários, tampouco haveria liberdade de escolha conferida pela lei aos administradores competentes. Há, na realidade, uma margem de atuação não-vinculada, cujo processo de análise decisório deve se ser percorrido para satisfazer a finalidade “ótima” da lei.
Nesse contexto, Celso Antônio Bandeira de Mello refuta a discrição administrativa como leque de escolhas do administrador. No seu entendimento, as várias hipóteses abstratamente comportadas pela norma jurídica devem ser avaliadas à luz das circunstâncias fáticas do caso concreto de modo que a depender das balizas estabelecidas, a discrição poderá ser inclusive suprimida a apenas uma alternativa possível.[24]
Os racionais mencionados coadunam com a ideia de que o sistema jurídico brasileiro impõe o “dever de boa administração”, ou seja, que o hermeneuta deve perseguir a solução perfeita diante das circunstâncias concretas. Invocar valores jurídicos abstratos, conceitos jurídicos indeterminados ou princípios jurídicos gerais do direito sem traçar paralelos com o contexto apresentado em determinado caso viola as regras basilares de interpretação jurídica.
Sendo este o caso, temos que o ato administrativo não foi motivado ou, pelo menos, que a motivação do ato não foi adequada para atender a finalidade perfeita da norma. Com efeito, a conduta imposta pelo ato “não é aquela pretendida pela regra de Direito, quem a promoveu atuou em desconformidade com a finalidade legal e quando alguém atua em desconformidade com a finalidade legal, o ato é inválido”.[25]
Aqui temos a demonstração de que a doutrina clássica já se manifestava pela invalidação de atos e decisões administrativas quando não se atentassem às consequências práticas da decisão. Sob esse prisma, nos parece correta a afirmação de que o comando normativo gerado pela inclusão dos artigos 20 e 21 não trouxeram grandes inovações no sistema.
Esse racional, agora positivado na LINDB, parece-nos válido para vincular as esferas administrativa, judicial e controladora que porventura não ponderassem as consequências de suas decisões. E essa é justamente a justificativa por trás da sua inclusão no sistema jurídico.
Ainda sob esse contexto, mais um elemento justificaria a preocupação do legislador ao incluir os artigos 20 e 21 na LINDB: o excesso de decisões fundadas em princípios. Essa discussão ganhou protagonismo após o avanço da teoria pós-positivista,[26] segundo a qual se reconhece a dimensão normativa dos princípios jurídicos e o Direito passa a ser considerado não apenas um conjunto de normas jurídicas, mas uma ordem objetiva de valores.
A adoção de princípios jurídicos para fundamentar decisões administrativas, contudo, gera uma enorme insegurança jurídica ao administrado que se depara, inclusive, com decisões distintas em casos similares. De acordo com Marçal Justen Filho, “a proliferação de normas principiológicas acarreta a elevação do grau de indeterminação da disciplina jurídica”, de modo que a nova imposição legal aos administradores se revela adequada (e até necessária) para garantir a motivação dos atos administrativos.
5.Conclusão
Há muitas décadas a teoria clássica dos atos administrativos enaltece a motivação como fundamento de validade dos atos administrativos. É dizer: o ato (ou a decisão) que não contiver motivação – ainda que em casos de atos vinculados – cerceia a ampla defesa e o contraditório dos administrados, assim como a possibilidade de fiscalização dos órgãos de controle. Como consequência, o ato administrativo sem motivação será, via de regra, considerado inválido.
Ocorre que com a proliferação de decisões fundamentadas exclusivamente em princípios jurídicos e conceitos jurídicos indeterminados, a motivação foi colocada em segundo plano. Dizer que essa ou aquela decisão foi tomada com base na “supremacia do interesse público” ou na “indisponibilidade do interesse público” se tornou recorrente nas vias administrativas, controladoras e judiciais.
Sob este contexto, quis o legislador reformar a LINDB para impor um dever adicional no processo decisório: a motivação deve sopesar as consequências práticas que a decisão pode gerar. Aqui não se exige um exercício de prever consequências incalculáveis ou imprevisíveis, mas somente que o decisor considere alternativas e impactos das possíveis decisões.
Em um cenário de prorrogação de contrato de concessão, por exemplo, a decisão discricionária da Administração Pública por aceitar ou não o pedido de prorrogação deve sopesar quais serão os impactos mediatos e imediatos, envolvendo: (i) custos que a Administração Pública deveria alocar para modelar uma nova licitação; (ii) custos que a Administração Pública incorreria ao assumir a prestação do serviço público enquanto nova concessionária não assumisse a exploração da infraestrutura; (iii) possibilidade de incluir novos investimentos (adequados e necessários) no contrato de concessão para prorrogá-lo para a atual concessionária; entre outros elementos.
A despeito de o Supremo Tribunal Federal já ter reconhecido a discricionariedade da Administração Pública em matéria de prorrogação contratual, defendemos nesse exemplo a imprescindibilidade de as decisões administrativas serem motivadas à luz das consequências práticas que impactarão o orçamento público e a prestação do serviço ao usuário. Uma decisão negando a prorrogação por “interesse público”, sem sopesar os efeitos dessa decisão poderá ser reputada como inválida.
Entendemos, portanto, que as alterações da LINDB no tocante ao dever de motivação dos atos e das decisões administrativas têm como propósito afastar a adoção de princípios jurídicos e conceitos jurídicos indeterminados sem nenhum aprofundamento, reforçando o dever de boa administração e da motivação adequada da teoria dos atos administrativos.
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[1] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 32ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, p. 386.
[2] Para uma análise completa sobre a conceituação de função administrativa, função pública e interesse público, v. por todos: MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In: MARTINS, Ricardo Marcondes; BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Tratado de direito administrativo – v. 5: ato administrativo e processo administrativo [livro eletrônico]. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019.
[3] CINTRA DO AMARAL, Antônio Carlos. Teoria do ato administrativo. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p. 30.
[4] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 16ª ed. 2ª tir. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1991, p. 126.
[5] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 32ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, p. 393.
[6] Há, ainda, posição doutrinária defendendo que a motivação constituiria um “ato jurídico autônomo” de modo que esta integraria a álea dos requisitos procedimentais do ato administrativo. Nestes termos, SUNDFELD, Carlos Ari. A motivação do ato administrativo como garantia dos administrados. Revista de direito público. São Paulo, v. 75, p. 118-125, jul./set. 1985; e CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. Motivo e motivação do ato administrativo. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1979.
[7] “Desses três princípios estruturantes – republicano, democrático e do Estado de Direito – decorre a regra geral de que todo ato administrativo deve ser motivado. Está absolutamente superado o velho entendimento de que somente é obrigatória a motivação quando a lei expressamente a imponha. São os princípios jurídicos que determinam quando uma decisão deve ou não ser motivada: na ausência de uma regra abstrata que imponha a motivação não há que se descartar sua imposição; pelo contrário, como regra geral, ela é sempre obrigatória. Despicienda, assim, sua previsão legal” (MARTINS, Ricardo Marcondes. Ato administrativo. In: MARTINS, Ricardo Marcondes; BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Tratado de direito administrativo – v. 5: ato administrativo e processo administrativo [livro eletrônico]. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2019, RB-5.19).
[8] Supremo Tribunal Federal, Plenário, RE 589.998, Ministro Relator Ricardo Lewandowski, Data do julgamento 20.03.2013.
[9] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 27ª ed. São Paulo: Atlas, 2014, p. 82.
[10] “Les agents publics ne sont tenus de motiver leurs actes que lorsque la loi ou un règlement les y oblige. En l’absence d’un texte, ils n’ont pas besoin de motiver leurs décisions” (JÈZE, Gaston. Les principes généraux du droit administratif. Paris: Marcel Giard, 1926, v. III : le conctionnement des services publics, p. 220).
[11] “No que se refere à motivação, porém, temos para nós, com o respeito que nos merecem as respeitáveis opiniões dissonantes, que, como regra, a obrigatoriedade inexiste. Fundamo-nos em que a Constituição Federal não incluiu (e nem seria lógico incluir, segundo nos parece) qualquer princípio pelo qual se pudesse vislumbrar tal intentio; e o Constituinte, que pela primeira vez assentou regras e princípios aplicáveis à Administração Pública, tinha tudo para fazê-lo, de modo que, se não o fez, é porque não quis erigir como princípio a obrigatoriedade de motivação. Entendemos que, para concluir-se pela obrigatoriedade, haveria de estar ela expressa em mandamento constitucional, o que, na verdade, não ocorre. Ressalvamos, entretanto, que também não existe norma que vede ao legislador expressar a obrigatoriedade. Assim, só se poderá considerar a motivação obrigatória se houver norma legal expressa nesse sentido” (CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010, p. 125-126).
[12] Art. 2º. A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. (...) Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando: (...). § 1º. A motivação deve ser explícita, clara e congruente, podendo consistir em declaração de concordância com fundamentos de anteriores pareceres, informações, decisões ou propostas, que, neste caso, serão parte integrante do ato.
[13] “Assim, se o ato não houver sido motivado, mas for possível demonstrar ulteriormente, de maneira indisputavelmente objetiva e para além de qualquer dúvida ou entredúvida, que o motivo exigente do ato preexistia, dever-se-á considerar sanado o vício do ato” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 32ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, p. 410-411). Nesse mesmo sentido, “Quanto aos atos ditos vinculados os quatro doutrinadores [Celso Antônio Bandeira de Mello, Floriano Dutra de Araújo, Carlos Ari Sundfeld e Juarez Freitas] afirmam, com palavras diferentes, a mesma ideia à qual acedemos sem reservas: a motivação é exigível também dos atos vinculados, o que significa que não se pode transformar em uma prática comum na rotina do administrador a supressão da motivação em atos de competência vinculada; mas, se porventura a motivação não ocorrer – o que deve ser exceção, apenas acontecer por uma falha justificável –, o ato poderá ser convalidado se for reconhecida que a única solução possível a contemplar a competência vinculada é realmente a interpretação jurídica que foi empregada pela Administração” (PIRES, Luis Manuel Fonseca. Controle judicial da discricionariedade administrativa: dos conceitos jurídicos indeterminados às políticas públicas. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009, p. 201-202).
[14] “Entretanto, se se tratar de ato praticado no exercício de competência discricionária, salvo alguma hipótese excepcional, há de se entender que o ato motivado está irremissivelmente maculado de vício e deve ser fulminado por inválido, já que a Administração poderia, ao depois, ante o risco de invalidação dele, inventar algum motivo, ‘fabricar’ razões lógicas para justifica-lo e alegar que as tomou em consideração quando da prática do ato. Contudo, nos casos em que a lei não exija motivação, não se pode, consoante dito, descartar alguma hipótese excepcional em que seja possível à Administração demonstrar e de maneira absolutamente inquestionável que (a) o motivo extemporaneamente alegado preexistia; (b) que era idôneo para justificar o ato e (c) que tal motivo foi a razão determinante da prática do ato. Se estes três fatores concorrerem há de se entender, igualmente, que o ato se convalida com a motivação ulterior” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 32ª ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Malheiros, p. 411). Destaca-se que há posicionamentos contrários a tese exposta,
[15] “Na verdade, é uma lei de introdução às leis, por conter princípios gerais sobre as normas sem qualquer discriminação. Trata-se de uma norma preliminar à totalidade do ordenamento jurídico. É uma lex legum, ou seja, um conjunto de normas sobre normas, constituindo um direito sobre direito (...), um superdireito, ou melhor, um direito coordenador de direito” (DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 29ª ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 73-74).
[16] Para uma análise aprofundada acerca da história legislativa da Lei 13.655/2018 vide, por todos: PALMA, Juliana Bonacorsi de. Segurança jurídica para a inovação pública. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 279, n. 2, p. 209-249, mai./ago. 2020.
[17] Disponível em: <https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=2919883&disposition=inline>. Acesso em: 16 jun, 2021.
[18] Art. 20. Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão. Parágrafo único. A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.
Art. 21. A decisão que, nas esferas administrativa, controladora ou judicial, decretar a invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa deverá indicar de modo expresso suas consequências jurídicas e administrativas. Parágrafo único. A decisão a que se refere o caput deste artigo deverá, quando for o caso, indicar as condições para que a regularização ocorra de modo proporcional e equânime e sem prejuízo aos interesses gerais, não se podendo impor aos sujeitos atingidos ônus ou perdas que, em função das peculiaridades do caso, sejam anormais ou excessivos.
[19] MENDONÇA, José Vicente dos Santos de. Art. 21 da LINDB: indicando consequências e regularizando atos e negócios. Revista de Direito Administrativo. Edição especial: direito público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro – LINDB (Lei nº 13.655/2018), nov. 2018, p. 50.
[20] “Pretendeu-se, por meio da lei, impor aos órgãos de controle e aos operadores do direito em geral a implementação dos avanços científicos. Pode-se dizer que, teoricamente, em relação aos atos administrativos, as inovações da Lei nº 13.655/18 não configuraram, em absolutamente nada, verdadeiras ‘inovações’. Foram uma tentativa de dar eficácia aos avanços científicos das últimas décadas, que não foram, por desconhecimento, implementados no cotidiano da Administração Pública” (MARTINS, Ricardo Marcondes. Teoria do ato administrativo à luz das alterações da LINDB. In: VALIATI, Thiago Priess et. al (Coord). A lei de introdução e o direito administrativo brasileiro. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019, p. 23).
[21] “As inovações introduzidas pela Lei nº 13.655/2018 destinam-se preponderantemente a reduzir certas práticas que resultam em insegurança jurídica no desenvolvimento da atividade estatal. O art. 20 relaciona-se a um dos aspectos do problema, versando especificamente sobre as decisões proferidas pelos agentes estatais e fundadas em princípios e valores de dimensão abstrata. A finalidade buscada é reduzir o subjetivismo e a superficialidade de decisões, impondo a obrigatoriedade do efetivo exame das circunstâncias do caso concreto, tal como a avaliação das diversas alternativas sob um prisma de proporcionalidade” (JUSTEN FILHO, Marçal. Art. 20 da LINDB: dever de transparência, concretude e proporcionalidade nas decisões públicas. Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, Edição Especial: direito público na Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro – LINDB (Lei nº 13.655/2018), nov. 2018, p. 15).
[22] “A adução do princípio ou analogia, embora necessária, não é suficiente para a completa justificação da decisão. A deliberação que rege diretamente o caso deve ser testada pela argumentação consequencialista bem como pela argumentação a partir da ‘coerência’ envolvida no recurso ao princípio ou à analogia. E exatamente da mesma forma (...) deve ser aplicado o teste para verificar a coesão. É preciso demonstrar que a decisão em questão não contradiz nenhuma norma estabelecida de direito, dada uma interpretação ou explicação correta de uma norma dessas à luz de princípios e políticas de interesse público” (MACCORMICK, Neil. Argumentação jurídica e teoria do direito. São Paulo: Martins Fontes, 2009, p. 326).
[23] “Preocupa-se a Hermenêutica, sobretudo depois que entraram em função de exegese os dados da Sociologia, com o resultado provável de cada interpretação. Toma-o em alto apreço; orienta-se por ele; varia tendo-o em mira, quando o texto admite mais de um modo de o entender e aplicar. Quanto possível, evita um a conseqüência incompatível com o bem geral; adapta o dispositivo às ideias vitoriosas entre o povo em cujo seio vigem as expressões de Direito sujeitas a exame. Prefere-se o sentido conducente ao resultado mais razoável, que melhor corresponda às necessidades da prática, e seja mais humano, benigno, suave. E antes de crer que o legislador haja querido exprimir o conseqüente e adequado à espécie do que o evidentemente injusto, descabido, inaplicável, sem efeito. Portanto, dentro da letra expressa, procure-se a interpretação que conduza a melhor conseqüência para a coletividade” (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e aplicação do direito. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 135).
[24] ““(...) quando a norma jurídica vinculadamente estabelece um único comportamento perante situação definida em termos objetivos, ninguém duvida que ela quer um comportamento ótimo e que foi considerado possível pré-definir a conduta dessarte qualificada como ideal para atender ao interesse que se propôs a tutelar; por isso o fez em termos de vinculação total. Mas, caberia perguntar: quando a lei regula uma dada situação em termos dos quais resulta discricionariedade, terá ela aberto mão do propósito e da imposição de que seja adotado o comportamento plenamente adequado à satisfação de sua finalidade? Muito pelo contrário. A discrição, como se espera a breve trecho comprovar, é a mais completa prova de que a lei sempre impõe o comportamento ótimo. Procurar-se-á demonstrar que quando a lei regula discricionariamente uma dada situação, ela o faz deste modo exatamente porque não aceita do administrador outra conduta que não seja aquela capaz de satisfazer excelentemente a finalidade legal” (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 32).
[25] BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2ª ed. São Paulo: Malheiros, 1993, p. 36
[26] “O pós-positivismo busca ir além da legalidade estrita, mas não despreza o direito posto; procura empreender uma leitura moral do Direito, mas sem recorrer a categorias metafísicas. A interpretação e aplicação do ordenamento jurídico hão de ser inspiradas por uma teoria de justiça, mas não podem comportar voluntarismos ou personalismos, sobretudo os judiciais” (BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito (o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil). Revista de Direito Administrativo, Rio de Janeiro, v. 240, p. 1-42, abr. 2005, p. 4-5. Disponível em: <http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rda/article/view/43618>. Acesso em: 10 jun, 2021.
Graduado em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP (2016). Pós-graduado em Direito Administrativo pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo – FGV/SP (2018). Mestrando em Direito Administrativo na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC/SP (2020-2022). Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PICOLO, Felipe Miranda Ferrari. O dever de motivação dos atos e das decisões administrativas e as alterações da LINDB Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 fev 2024, 04:36. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58650/o-dever-de-motivao-dos-atos-e-das-decises-administrativas-e-as-alteraes-da-lindb. Acesso em: 23 dez 2024.
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