LILIANE DE MOURA BORGES [1]
(orientadora)
RESUMO: A lei 14.181 de 2021 trata de tema sensível à sociedade, e veio coroar uma situação já existente desde 2012 que é a possibilidade de tratamento adequado para resolver a situação de milhões de brasileiros em situação de superendividamento. Neste contexto, este artigo tem como objetivo tratar da discussão sobre a necessidade ou não da fixação de um valor para o “mínimo existencial”, como forma de proteção da dignidade da pessoa humana. A metodologia adotada é a revisão bibliográfica baseada em textos legais, doutrinários, artigos e anais de eventos e buscou os pontos destoantes entre os que entendem haver a necessidade definir um valor fixo ou um percentual, dentre outras possibilidades. Ao fim, o trabalho demonstra que há que considerar que existem muitos interesses conflitantes a respeito do tema e a discussão segue pujante, por ainda não ter uma regulamentação.
Palavras-chave: Superendividamento; Repactuação; Mínimo existencial; Consumidor;
INTRODUÇÃO
A Lei nº 14.181, de 1º de julho de 2021, conhecida como a “Lei do Superendividamento” ou “Lei Cláudia Lima Marques”, alterou significativamente a Lei nº 8.078 de 11 de setembro de 1990 (Código de Defesa do Consumidor - CDC). Basicamente, a nova Lei institui mecanismos que buscam coibir práticas abusivas por instituições financeiras, bem como audiências para negociações de dívidas, dentre outros.
O CDC, em seu §1º do artigo 54-A, define superendividamento como sendo “a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação".
Essa nova lei impõe à sociedade desafios para sua aplicação de modo concreto, de um lado para o mercado, pois os fornecedores principalmente de produtos financeiros, deverão ter cuidados antes não previstos e, de outro lado, a Lei nº 14.181/21 estabelece que o pagamento ocorra sem comprometer o mínimo existencial, contudo, optou por uma regulamentação do assunto que virá posteriormente.
Para muitos estudiosos do assunto o superendividamento é um problema de ordem social cujos efeitos refletem em toda sociedade e não apenas à determinado indivíduo, por essa razão a nova Lei traz em seu corpo a necessidade de maior responsabilidade para as relações de consumo, onde, de um lado está o comercio e de outro o consumidor.
Trata-se de pesquisa qualitativa com abordagem descritiva por meio do método revisão bibliográfica, onde serão verificados textos legais, doutrinários, artigos em periódicos, relatórios e enunciados de órgãos do SNDC (Sistema Nacional de Defesa do Consumidor), além da jurisprudência.
Este artigo se desenvolve, em capítulos que abordam o tema trazendo uma linha de raciocínio iniciando com os conceitos importantes, depois trata do fenômeno do superendividamento, e em seguida, sobre as questões que envolvem o mínimo existencial.
Ao final, tece as considerações concluindo que a definição para o valor do mínimo existencial é uma possibilidade de oferecer condições ao devedor de pagar suas dívidas, promover a sua reabilitação econômica, sem que haja o comprometimento da sua subsistência.
1.CONCEITOS FUNDAMENTAIS
Antes de ingressarmos na discussão proposta neste trabalho, faz-se necessário trazer algumas definições e conceitos fundamentais, para o entendimento do problema em questão. Cabe aqui esclarecer que os conceitos apresentados nos sub itens a seguir, não visam o aprofundamento dos mesmos, pela simples razão de que tal feito levaria a seara de discussões não contempladas no escopo deste artigo.
1.1. Consumidor
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88), consolidou expressamente a proteção ao direito do consumidor (individual ou coletivo) em seu art. 5º, inciso XXXII e art. 170, inciso V, do capítulo da Ordem Econômica e Financeira.
Mas a devida importância a esse novo sujeito de direitos foi reconhecida quando o legislador constituinte, determina no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), em seu artigo 48, que houvesse a elaboração do Código de Defesa do Consumidor-CDC.
É no CDC que encontramos a definição para “consumidor”, em atendimento ao preceito de Lei Constitucional. Dessa forma o art. 2° do CDC, conceitua consumidor como sendo:
Toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Ou seja, todas as pessoas que vivem em uma sociedade, que trabalha auferindo renda ou não, que utiliza um produto ou serviço de maneira fática ou econômica, é um consumidor.
1.2. A proteção constitucional ao consumidor
Em face à vulnerabilidade atribuída ao consumidor, a proteção aos seus direitos tornou-se um princípio esculpido na atual Carta Magna, como cláusula pétrea.
FARIA (2021) assinala que o Direito do Consumidor reflete as “normas e princípios que visam a cumprir um triplo mandamento constitucional”, disposto nos artigos: 5º, inciso XXXII; no art. 170, inciso V; e no artigo 48 do ADCT.
Art. 5º, XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor;
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
V - defesa do consumidor;
ADCT-Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor.
(BRASIL, 1988)
Assim, a proteção aos direitos do consumidor é matéria de ordem pública e de interesse social, sendo bem irrenunciável. Por essa razão é do Estado a obrigação de promover a efetiva proteção do consumidor direta ou indiretamente, conforme art. 4º, inciso II, do CDC.
1.3. Da vulnerabilidade do consumidor
Constitui como fundamento basilar, para toda a Lei Consumerista, a “vulnerabilidade do indivíduo” (pessoa natural) em suas relações de consumo, objetivando a proteção da parte mais frágil.
Além de princípio norteador das relações consumeristas a vulnerabilidade do consumidor, possui presunção absoluta (jure et de juris), não necessitando ser provada, segundo o entendimento doutrinário majoritário.
A vulnerabilidade é o conceito que fundamenta todo o sistema consumerista, o qual busca proteger a parte mais frágil da relação de consumo, a fim de promover o equilíbrio contratual. A vulnerabilidade da pessoa física consumidora é presumida (absoluta), mas a da pessoa jurídica deve ser aferida no caso concreto. (TJDF, 2021).
Conforme inteligência do Artigo 4º do CDC. “(...) atendidos os seguintes princípios: I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo (...)”.
Desse modo é pacífico o entendimento que o consumidor pessoa física tem a vulnerabilidade presumida e deve ser reconhecida prontamente.
1.4. O consumidor hipervulnerável
Afirma o art. 1º do CDC, que o consumidor é a parte vulnerável nas relações consumeristas. Nesse momento, cabe aqui abrirmos um parêntese para mencionar a condição de hipervulnerabilidade, a qual estão sujeitos alguns tipos especiais de consumidores. Conforme ensina MARQUES (2020, p. 111), são esses tipos especiais os: “idosos, aposentados, pensionistas, crianças, analfabetos, pessoas com deficiências e os doentes”.
A Lei 10.741/2003 (Estatuto do Idoso) define em seu art. 1º, que é considerado como pessoa idosa aquele cuja idade é “(...)igual ou superior a 60 (sessenta) anos”.
O art. 2º da Lei 13.146/2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência) define a pessoa com deficiência como sendo:
(...) aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Os que estão em condições de hipervulnerabilidade necessitam do Estado uma maior proteção nas suas relações consumeristas.
1.5. Definição legal para fornecedor
A definição legal para fornecedor, está expressamente disposta no art. 3º, caput do CDC.
“Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.”
Além do fornecedor definido com base no art. 3º do CDC, é possível encontrarmos, segundo a doutrina, outros três tipos de fornecedores presentes no art. 12, também do CDC. Como bem ensina APOITIA (2019) “com base no art. 12 do CDC, identifica ao menos três espécies de fornecedores: real, presumido, aparente”. Senão vejamos:
Art. 12, caput - O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. (BRASIL, Lei nº 8.078/1990, art. 12).
Por oportunidade do julgamento do Recurso Especial REsp 1.580.432-SP, julgado em 06/12/2018, o Superior Tribunal de Justiça reconheceu a responsabilidade solidária da empresa que faz uso de marca ou nome global, assim como sua condição de "fornecedor aparente".
Observa-se que a lei traz a definição ampliada de fornecedor e a doutrina nacional aponta a existência de quatro subespécies, a saber: a) o fornecedor real; b) o fornecedor presumido; c) o fornecedor equiparado e d) o fornecedor aparente. O fornecedor aparente, que compreende aquele que, embora não tendo participado do processo de fabricação, apresenta-se como tal pela colocação do seu nome, marca ou outro sinal de identificação no produto que foi fabricado por um terceiro. (...). REsp 1.580.432-SP, Rel. Min. Marco Buzzi, por unanimidade, julgado em 06/12/2018, DJe 04/02/2019.
Adotar a Teoria da Aparência do fornecedor no ordenamento brasileiro, significa uma aproximação com o direito europeu que responsabiliza objetiva e solidariamente todo aquele que contribuiu de maneira omissiva ou comissiva com o dano ao consumidor.
1.6. Definições para produto e serviço
Encontramos no CDC, art. 3º, §§1º e 2º, as definições para produto e serviço, as quais balizam o sistema jurídico em suas decisões, são, portanto, definições de produto e serviço:
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Conforme apontado pela pesquisa realizada pela comissão de superendividamento do Núcleo de Defesa do Consumidor (NUDECON), aponta que parte do superendividamento dos brasileiros decorre da aquisição de produtos e/ou serviços de crédito. A pesquisa aponta que a facilidade em contratar serviços de crédito é um dos principais motivos para o "superendividamento" dos consumidores participantes da pesquisa. Ainda segundo NUDECON (p. 98), juntas as operações de crédito mais utilizadas somam 82,9% das operações de crédito pesquisadas, com destaque para o crédito consignado, com 41,8% dos casos.
2. O FENÔMENO DO SUPERENDIVIDAMENTO
De uma forma geral o consumo é algo inerente à natureza humana e seu objetivo está ligado à satisfação de suas necessidades.
No entanto, a grande questão se assenta sobre a aquisição além daquilo considerado como sendo necessário à vida com dignidade. Como ensina OLIVEIRA (p. 209), temos nesse fenômeno o comportamento nocivo conhecido como "consumismo".
Esse fenômeno, o consumismo, é campo fértil para as práticas comerciais abusivas, as quais são por sua vez responsáveis pelo superendividamento dos consumidores.
O §1º do artigo 54-A, do CDC, recentemente incorporado ao texto em razão da Lei 14.181 de julho de 2021, define superendividamento como sendo “a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação".
Para SANSEVERINO (2015, p.1) o superendividamento pode ser considerado como um “dos principais problemas do mercado de consumo contemporâneo, em face do estímulo ao consumo e da extrema facilidade de acesso ao crédito, o que não ocorria a algumas décadas atrás”.
Ainda segundo o autor, graças a esse estímulo pode-se perceber o aumento do número de consumidores impossibilitados em realizar o adimplemento de débitos. Destaca também que o consumidor, é vulnerável e está sujeito à publicidade agressiva e às inúmeras ofertas de crédito, muitas vezes sequer solicitadas.
2.1. Causas para o superendividamento
Em pesquisa realizada pela CNC (Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo), destacou um aumento significativo no percentual de famílias endividadas no país, chegando esse percentual à 76,6% para o mês de fev./2022, além de apontar suas principais causas.
A pesquisa de âmbito nacional, PEIC (Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor, fev./2022), aponta entre as principais causas para esse aumento no endividamento dos consumidores, a disponibilização do crédito de forma indiscriminada.
Deste, os produtos de acesso ao crédito destacam-se os seguintes meios: cartão de crédito, crédito consignado, empréstimo pessoal, cheque pré-datado, cheque especial, carnê de loja, prestação de carro e da casa própria.
2.2. Efeitos econômicos em razão do superendividamento
É apontado pela PEIC como efeito econômico, um significativo aumento de inadimplentes, bem como uma estagnação econômica de forma geral. Ainda segundo a pesquisa, o "número de famílias com contas atrasadas é o maior em 12 anos".
Dados de fevereiro/2022 indicam que 76,6% das famílias brasileiras estão endividadas, estando 27,0% inadimplentes e outros 10,5% não possuindo condições para o adimplemento de suas dívidas.
Os dados acima demonstram que temos um efeito contrário ao pretendido quando da facilitação de acesso ao crédito. Se em um primeiro momento a pretensão seria a de fomentar a economia, agora ela causa uma estagnação econômica, agravando ainda mais o cenário econômico e social atual.
O indivíduo superendividado se torna invisível ao mercado de consumo, as dívidas crescem numa ascendente que não condiz com o aumento de salário anual, existe um baixo nível de qualificação para a maioria da população e, que por isso, não conseguem alternativas para aumentar a renda, essas pessoas tem crédito negado pelo motivo de estar com nome listado nos órgãos de proteção ao crédito como o SPC e SERASA, portanto, vivem numa espiral crescente do aumento de dívidas e colapso da vida financeira, com consequências dramáticas do ponto de vista social e psicológico também.
2.3. Efeitos sociais
Socialmente, encontraremos pessoas não apenas endividadas, mas pessoas com baixa produtividade laboral, muitas delas enfrentando problemas conjugais, com familiares ou amigos.
Se o desconto (na folha de pagamento) consumir parte excessiva dos vencimentos do consumidor, colocará em risco a sua subsistência e a de sua família, ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana. RECURSO ESPECIAL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA. DESCONTO EM CONTRACORRENTE. POSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO A 30% DA REMUNERAÇÃO DO DEVEDOR. SUPERENDIVIDAMENTO. PRESERVAÇÃO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. ASTREINTES. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO DISPOSITIVO DE LEI FEDERAL VIOLADO. ÓBICE DA SÚMULA 284/STF. REsp 1584501/SP RECURSO ESPECIAL 2015/0252870-2. TERCEIRA TURMA do Superior Tribunal de Justiça. Relator Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO. Julgado em 06/10/2016. Data da Publicação, DJe 13/10/2016.
O fato de estar endividado, não pode visto apenas sob o prisma do dinheiro, precisa ficar claro que é um status que altera o psicológico e o social desse indivíduo, afetando também todo o núcleo familiar.
2.4. Breves considerações aos efeitos psicológicos
Psicologicamente, BAUMAN (2010 apud ARTIFON, 2013) afirma em seu trabalho que o consumo agindo como aliciador, sujeita o consumidor (sob seu domínio) a danos devastadores.
Ainda segundo o autor, isso se dá em razão de aspectos simbólicos ligados ao status/poder de consumo, além dos sentimentos de pertencimento e reconhecimento social. Restando àqueles que não estão na condição de consumidores, os sentimentos de ansiedade e/ou depressivos.
Esse fenômeno é notado não apenas em adultos endividados, mas também em jovens. O efeito das propagandas, o desejo de pertencimento a grupos sociais, a supervalorização do “ter” desencadeia impulsos consumeristas para que o indivíduo adquira, produtos que não condizem com seu orçamento para que possam se sentir “bem” e serem aceitos nos grupos sociais que frequenta.
A obsolescência programada é outro fator desencadeante do uso do crédito para adquirir bens e serviços para acompanhar a “moda”. O consumo provoca sentimentos de prazer, êxtase e alegria momentâneos, logo em seguida, dando lugar à frustração, preocupação, desespero e muitas vezes ideias suicidas.
2.5. Práticas abusivas que levam ao superendividamento
O CDC, adverte a respeito de as práticas abusivas, as quais vão de encontro ao equilíbrio esperado entre os interesses nas relações consumeristas, ferindo direitos básicos do consumidor. OLIVEIRA (p. 200) ensina que são práticas abusivas “aquelas que se dão no sentido vertical da relação, ou seja, do fornecedor ao consumidor”. Ainda segundo o autor, podem se apresentar na fase pré-contratual, contratual, ou na fase pós-contratual. Em alguns casos, apesar de as práticas não ferirem requisitos legais. Trazem consigo aspectos de imoralidade ou opressão dando causa a danos significativos ao consumidor, e estão no centro das discussões levantadas acerca da organização e regulação do mercado.
Conforme lições de BENJAMIN (2014, p. 296 apud OLIVEIRA, p. 201) a descrição das práticas abusivas, estão espalhadas pelo CDC, para além do art. 39 e seus incisos.
Dessa forma, podemos encontrar outros dispositivos que compõem essa descrição nos seguintes artigos também do CDC: artigo 6º, IV - publicidade enganosa ou abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, práticas ou cláusulas abusivas impostas no fornecimento de produtos e serviços; art. 10 - colocar no mercado produto ou serviço com alto grau de nocividade ou periculosidade; art.18, §6º, e art. 20, §2º - a comercialização de produtos e serviços impróprios; art. 21 - o não emprego de peças de reposição adequadas; art. 32 - a falta de componentes e peças de reposição e a ausência de informação, na venda a distância, sobre o nome e endereço do fabricante; art. 36 - a veiculação de publicidade clandestina; art. 37, § 2º - a veiculação de publicidade abusiva; art. 42 - a cobrança irregular de dívidas de consumo; art. 43 - o arquivo de dados sobre o consumidor em desrespeito aos seus direitos de conhecimento, de acesso e de retificação; art. 51 - a utilização de cláusula contratual abusiva;
Nesse sentido, é possível constar uma necessidade de educação para o consumo de ambos os lados da relação de consumo, e principalmente, o fornecedor. Basta verificar o ranking de reclamações de órgãos consumeristas como as plataformas administradas pela Secretaria Nacional do Consumidor (consumidor.gov.br, SINDEC) e outras como Reclame aqui e Proteste já para verificar a quantidade de condutas abusivas que são denunciadas anualmente.
O CDC tem pouco mais de 30 anos e é urgente a atuação do Estado no sentido de punir estas práticas abusivas.
2.5.1. Concessão abusiva de crédito
É um direito básico do consumidor, dentre outras medidas, a segurança de estar participando de relações comerciais sob a “[...]práticas de crédito responsável[...]” como dispões o CDC, em seu Art. 6º, XI.
No mesmo sentido, o Art. 192 da CRFB/88, traz expresso que:
O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram. (BRASIL, 1988, art. 192).
Ainda sobre as políticas de crédito, afirma GAULIA (2009, p. 102) “[...]são grandes as vantagens oriundas de sua introdução no mercado de forma mais agressiva a partir da década de 90”. O crédito como mecanismo de desenvolvimento social, tendo seu status como sendo de um “novo direito fundamental”.
A democratização do crédito remonta aos EUA, país que, antes dos países europeus ocidentais, deixou de interpretar o crédito como sinônimo de pobreza ou de prodigalidade, para o encarar simplesmente como um meio de adquirir uma máquina de costura ou um automóvel, transformando-o num mecanismo fundamental para dinamizar a economia nacional (...) Quando contratado em situação de estabilidade financeira e laboral, o crédito permite melhorar a acessibilidade a determinados bens e serviços, contribuindo para o aumento do bem-estar dos indivíduos e das famílias. (GAULIA, 2009, p. 104).
Segundo o autor, a promoção do desenvolvimento do país e servir aos interesses da coletividade, parecem ser meras expectativas por parte do mercado, o qual se mostra cada vez mais voraz por novos clientes.
Dessa forma, para alcançar seus objetivos, o mercado fornecedor de crédito, utiliza indiscriminadamente de estratégias de marketing com abordagens agressivas levando ao aumento na concessão de crédito.
É possível observar que são inúmeras as estratégias a influenciar as decisões de consumo, dentre as mais conhecidas estão: os aumentos dos limites de crédito sem a solicitação do consumidor, propagandas acerca de crédito consignado disponível para funcionários públicos, aposentados, para não falar do crédito para os negativados.
Portanto, é mister a necessidade de minuciosa análise da capacidade de adimplemento do consumidor face à prática ao crédito responsável, através dentre outros meios: do histórico de pagamentos, da condição atual do consumidor para arcar com novos compromissos.
2.6. Estratégias de combate ao superendividamento
O art. 4º, inciso X do CDC traz expressamente como objetivo prevenir e tratar os casos de superendividamento, além de evitar a exclusão/discriminação social do insolvente. Com base nessa premissa, combater o fenômeno do superendividamento consiste em solucionar o problema de milhares de pessoas (insolventes) bem como aquelas sujeitas à essa situação. Na tentativa de alcançar o eficaz combate e controle da situação do superendividamento o Estado conta com os seguintes instrumentos:
I - manutenção de assistência jurídica, integral e gratuita para o consumidor carente; II - instituição de Promotorias de Justiça de Defesa do Consumidor, no âmbito do Ministério Público; III - criação de delegacias de polícia especializadas no atendimento de consumidores vítimas de infrações penais de consumo; IV - criação de Juizados Especiais de Pequenas Causas e Varas Especializadas para a solução de litígios de consumo; V - concessão de estímulos à criação e desenvolvimento das Associações de Defesa do Consumidor. VI - instituição de mecanismos de prevenção e tratamento extrajudicial e judicial do superendividamento e da proteção do consumidor pessoa natural (Incluído pela Lei superendividamento e de proteção do consumidor pessoa natural; nº 14.181, de 2021); VII - instituição de núcleos de conciliação e mediação de conflitos oriundos de superendividamento. (BRASIL, Lei nº 14.181/ 2021, Art. 5º).
A Lei do superendividamento atualiza o CDC no sentido de ofertar instrumentos para que o Estado, por meio das suas instituições especializadas nesta matéria possam agir para promover espaços dedicados ao cuidado às pessoas que se encontram nesse momento difícil, dando orientação e apoio para se organizarem financeiramente e se defenderem naquelas situações de abuso.
Também são mecanismos de combate ao superendividamento, as práticas acerca do crédito responsável, elencadas no art. 54-D do Código de Defesa do Consumidor.
Art. 54-D. Na oferta de crédito, previamente à contratação, o fornecedor ou o intermediário deverá, entre outras condutas:
I - informar e esclarecer adequadamente o consumidor, considerada sua idade, sobre a natureza e a modalidade do crédito oferecido, sobre todos os custos incidentes, observado o disposto nos arts. 52 e 54-B deste Código, e sobre as consequências genéricas e específicas do inadimplemento;
II - avaliar, de forma responsável, as condições de crédito do consumidor, mediante análise das informações disponíveis em bancos de dados de proteção ao crédito, observado o disposto neste Código e na legislação sobre proteção de dados;
III - informar a identidade do agente financiador e entregar ao consumidor, ao garante e a outros coobrigados cópia do contrato de crédito.
Parágrafo único. O descumprimento de qualquer dos deveres previstos no caput deste artigo e nos arts. 52 e 54-C deste Código poderá acarretar judicialmente a redução dos juros, dos encargos ou de qualquer acréscimo ao principal e a dilação do prazo de pagamento previsto no contrato original, conforme a gravidade da conduta do fornecedor e as possibilidades financeiras do consumidor, sem prejuízo de outras sanções e de indenização por perdas e danos, patrimoniais e morais, ao consumidor. (BRASIL, Lei nº 8.078/1990, Art. 54-D)
Neste ponto, a lei busca garantir a efetividade de um princípio já estancado no CDC e que é direito básico e fundamental: a informação. O consumidor precisa conhecer todos os custos sobre a transação financeira, no caso de empréstimos, o valor das parcelas, os acréscimos, os juros e pequenas cobranças. Não basta conhecer, ele precisa compreender o impacto disso ao longo do tempo.
É importante falar que o regramento legal é de suma importância na efetivação dos direitos do consumidor, mas além disso, é preciso que as pessoas, consumidor e fornecedor, estejam instruídos e abertos a novas perspectivas para que a real efetividade seja alcançada com essa Lei.
2.6.1. Punição por práticas abusivas
Conforme previsto pela Política Nacional das Relações de Consumo, expresso no art. 4º do CDC, a proibição e punição a práticas antiéticas, são medidas que devem ser buscadas objetivando mitigar o problema do superendividamento.
É possível citar como medidas punitivas: “sanções administrativas (cassação de licença, interdição, suspensão de atividade ou intervenção administrativa) e penais (Capítulos XII e XIII)” (BENJAMIN, 2014, p. 297 apud Oliveira, p. 203), além de reparação dos danos causados, inclusive os morais, cabendo indenização, com fulcro no art. 6º, VI e VII.
2.6.2. Combate ao superendividamento e a educação financeira
Segundo o Código de Defesa do Consumidor a educação financeira é medida eficiente à prevenção ao superendividamento, junto com a informação adequada e clara sobre o consumo adequado dos produtos e serviços (art. 6, II, do CDC).
Nesse sentido BESSA (2014, p. 267) afirma que muitas são as ações a serem implementadas visando capacitação do cidadão, pelo conhecimento, para que ele possa gerir adequadamente do seu dinheiro, sob a baliza dos seus direitos e obrigações.
Confirma o pensamento do autor a Lei nº 14.181/2021, em seu artigo 4º, inciso IX, afirma a necessidade de implementação de “ações direcionadas à educação financeira e ambiental dos consumidores”.
Pelo exposto acima é possível afirmar que a solução para o problema do superendividamento, além de outras medidas, passa por um maior investimento no processo de desenvolvimento da educação financeira do consumidor.
Objetivando alcançar essa maior capacitação do consumidor, foi criada em 22 de dezembro de 2010 a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), através do Decreto nº 7.397. A ENEF foi desenvolvida com os seguintes objetivos:
(...) promoção da educação financeira e previdenciária e contribuindo para o fortalecimento da cidadania, a eficiência e solidez do sistema financeiro e uma maior conscientização por parte dos consumidores. (BESSA, 2014, p. 268).
Programa de Educação Financeira para Consumidores, com cursos abertos à sociedade nas modalidades presencial e à distância, visando o empoderamento do consumidor através do conhecimento sobre: produtos; serviços, incluindo os financeiros; orçamento doméstico; planejamento financeiro pessoal; e principalmente sobre seus direitos.
Atuam no desenvolvimento de ações direcionadas à educação financeira, através da ENEF:
A Secretaria Nacional do Consumidor (SENACON), representando o Ministério da Justiça junto ao Comitê Nacional de Educação Financeira (CONEF); Escola Nacional de Defesa do Consumidor (ENDC); Órgão Governamentais entre outros: Banco Central do Brasil (Bacen), Ministério da Educação (MEC), Ministério da Justiça (MJ); representantes da sociedade civil; Grupo de Apoio Pedagógico (GAP); Associação de Educação Financeira do Brasil (AEF-Brasil); (BESSA, 2014, p. 270).
Em busca da solução para a questão do superendividamento, é preciso que o fornecedor entenda o seu papel de ensinar e o consumidor entenda a necessidade de aprender sobre educação financeira.
2.7. Recuperação do superendividado
A recuperação patrimonial do superendividado desponta como relevante instrumento de amparo à pessoa humana, segundo BUCAR (2017, p. 49), mesmo que os textos legais, atualmente vigentes, não sejam satisfatórios para tutelar a reabilitação do superendividado, há que se enfrentar a questão, buscando no ordenamento a solução para a materialização do direito social à reabilitação do insolvente.
O CDC em seu art. 42, garante que na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não terá sua dignidade ferida, quer por algum tipo de exposição, constrangimento ou mesmo ameaça. Dessa forma, a recuperação do insolvente poderá ocorrer dentre outras formas, pela revisão ou repactuação de dívidas, conforme art. 6º , inciso XI do CDC.
Aos consumidores em condição de superendividamento, prevê o art. 104-A a possibilidade de conciliação.
A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. (BRASIL, Lei nº 14.181/21, art. 104-A)
É preciso que fique claro que o plano de pagamento não pode ser utilizado da mesma forma que a negociação individual. O que se busca aqui é consolidar as dívidas com todos os credores em uma parcela que consiga ser paga pelo consumidor, sem comprometer o mínimo existencial.
Há que se ressaltar que a Lei não prevê o perdão da dívida, como adotado no ordenamento jurídico dos Estados Unidos, mas seguindo a referência europeia acerca do tema no direito brasileiro, a lei busca a repactuação em um nível de negociação suportável pelo devedor.
2.8. A Lei do Superendividamento
A Lei do Superendividamento, como é atualmente conhecida, tem sua origem advinda do Projeto de Lei do Senado PLS-283/2012, o qual trazia alterações ao CDC.
Sua natureza jurídica é de ordem pública, possuindo característica de norma cogente e caráter social. Tem como objetivo a busca pelo aperfeiçoamento da disciplina do crédito ao consumidor e dispõe sobre a prevenção do superendividamento.
O texto da comissão de juristas foi então encampado pelo então presidente do Senado, José Sarney, e tramitou quase 10 anos no Congresso. Para Rodrigo Cunha, a questão do superendividamento sempre foi uma questão importante, mas “ganhou contornos dramáticos diante dos efeitos econômicos adversos trazidos pela pandemia da covid-19”, já que muitas pessoas perderam emprego e renda durante a pandemia. (SENADO, 2012)
3. O MÍNIMO EXISTENCIAL
Legalmente o mínimo existencial é direito básico assegurado, entre outros dispositivos, pelo CDC, artigo 6º, inciso XI; entretanto, não é informado pelo legislador, qual será o seu valor ou de que maneira será composto. MARQUES (2016, p. 112) define o mínimo existencial como sendo “um conjunto de prestações estatais que assegure a cada um uma vida condigna”.
Nesse sentido BESSA (2017, p. 22) ensina que o mínimo existencial está ligado ao “equilíbrio orçamentário do consumidor, envolve o pagamento periódico de suas dívidas e compromissos, sem prejuízo de verba mensal destinada a gastos básicos e fundamentais próprios e de seus dependentes”.
O presente trabalho busca dar destaque para essa discussão, pelo fato de quê a lei não definiu um parâmetro para saber qual o valor a ser considerado como o mínimo a ser preservado para garantir a subsistência do cidadão. Muitas especulações incidem sobre este tema, que tem uma grande importância para a aplicação da lei, uma vez que as negociações devem ser realizadas com respeito a este valor.
3.1. Desafio para definição do mínimo existencial
É mister que a preservação de um valor mínimo suficiente para garantir a subsistência digna ao devedor é ponto crucial ao sucesso de conciliação, em razão da sua natureza protetiva prevista no art. 104-A. Dessa forma qualquer acordo exige um alto nível de cautela por parte de todos os envolvidos, especialmente dos conciliadores.
O texto legal não traz alguma orientação à definição do mínimo existencial, de modo que não havendo regulamentação caberá ao conciliador, a árdua tarefa de avaliar o percentual da renda do devedor que deverá ser reservado para a despesa de subsistência.
Apesar do consenso de que a totalidade da renda do devedor não pode ser destinada ao pagamento das dívidas, sob pena de comprometer a sua sobrevivência, a questão-chave é quanto ou qual o percentual da renda do devedor é necessário reservar para o pagamento das suas despesas de subsistência. (MARQUES, 2020, p. 126)
Nesse sentido é possível perceber o movimento por parte dos PROCONS (Institutos de Promoção e Defesa do Cidadão e Consumidor), ao atendimento dessa necessidade, em detrimento ao disposto no art. 4º do Código Civil, o qual assevera ser de responsabilidade do julgador a aplicação da lei ante a omissão legislativa, sendo facultado ao julgador, agir por analogia, pelos costumes, bem como pela aplicação dos princípios gerais de direito.
Enunciado 7 - A noção do mínimo existencial tem origem constitucional no princípio da dignidade da pessoa humana (...) o mínimo existencial de consumo deve ter relação com ‘o menor valor mensal não tributável a título de imposto de renda’ ou ser feito por faixas de renda, como na França, com um valor fixo ‘vital’ de um salário mínimo ou de 2/3 do salário mínimo, em todos os casos, de autoria da professora doutora Claudia Lima Marques, do professor doutor Fernando Rodrigues Martins, da professora doutora Sophia Martini Vial e da professora doutora Clarissa Costa de Lima.(...) (CDEA, 2021 apud JOELSONS, 2021)
Art. 5º, §3° - O cálculo do mimo existencial deverá levar em conta a situação familiar, de moradia, de alimentação e vestuário mínimo do consumidor, podendo de forma geral ser considerado, nas faixas entre 1 a 5 salários mínimos, a necessidade de manutenção de cerca de 60% a 65% da remuneração mensal do consumidor para as despesas de sobrevivência, podendo aumentar nas faixas superiores de 5 a 10 salários mínimos até 50% da remuneração mensal. (PROCON-MA, 2021, p. 3)
O Poder360 apurou que hoje há 3 cartas na mesa para definir o mínimo existencial. Eis as propostas em avaliação: R$ 400 – a cifra foi escolhida com base na média do Auxílio Brasil. Tem simpatias no governo e de instituições financeiras. A Febraban, que representa os grandes bancos, quer um valor único em todo o Brasil; 30% de manutenção do salário – facilitaria a definição do mínimo existencial por ser flexível. Mas dificulta a vida dos bancos e dos governos, já que 41% trabalham informalmente; 1 salário mínimo – qualquer dívida que superasse o mínimo seria considerada superendividamento. (...) (WALTENGERG, 2021)
“Qual o valor mínimo de renda que uma pessoa deveria ter protegido de credores para viver com dignidade em caso de superendividamento, enquanto renegocia uma forma de pagar o que deve?” Essa é a pergunta feita por vários profissionais do Direito, instituições de defesa do consumidor, operadores de crédito e jornalistas como estampado na revista eletrônica Jota. Essa pergunta desconcertante norteou o presente estudo, que encontrou a resposta como demonstrado nos itens anteriores, que está na regulação do mínimo existencial, considerando as condições essenciais para uma pessoa viver dignamente.
Até o presente momento não há uma definição legal, de um lado as entidades empresariais acreditam que se for definido um valor de mínimo considerado elevado e que afete todo tipo de dívida irá comprometer a oferta de crédito no país e como em cascata, haverá um retração do PIB ( Produto Interno Bruto). A FEBRABAN defende que dívidas de financiamento imobiliário, rural e cartão de crédito fiquem fora desta conta e não apoiam um valor único para todos.
Por outro lado, institutos de defesa do consumidor defendem a definição de um percentual sobre a renda como mínimo existencial, e que é necessário considerar vários fatores como a natureza das dívidas, o montante do débito, o perfil de renda, enfim, conhecer a realidade do consumidor.
Há quem concorda com a natureza protetiva da Lei do superendividamento, no entanto teme que possa prejudicar outros tantos de terem acesso ao crédito.
Atualmente existe uma proposta de regulamentação por decreto presidencial e muitos pareceres apresentados com diferentes propostas, não é surpresa que haja opiniões divergentes, num país com dimensão continental, grande diversidade e alta desigualdade social.
4. CONCLUSÃO
A definição para o valor do mínimo existencial ou de alguma maneira para sua constituição, deforma a oferecer condições ao devedor para a sua reabilitação econômica, sem que haja o comprometimento de um mínimo para sua subsistência.
A matéria é urgente sobre tudo em face do crescente nível de endividamento do consumidor e da fantástica capacidade do mercado fornecedor em ladear os mecanismos e medidas propostas.
Tamanha urgência se justifica, como mostram os estudos mencionados neste trabalho, pelo fato de o superendividamento possuir diversas causas e que todas perpassam à figura do devedor, atingindo toda sociedade.
Por essa razão, temos no fenômeno do superendividamento uma questão de ordem pública, a qual exige uma urgente apreciação do Estado em face mediante a implementação de medidas efetivas para a resolução do problema norteador do presente estudo, qual seja, a definição do mínimo existencial para fins de negociação de dívidas.
Trata-se de temática difícil de ser resolvida, de um lado há várias nuances a serem observadas do ponto de vista legal e por outro lado, é urgente a regulamentação por se tratar da dignidade da pessoa humana.
Ademais, tema que interessa a toda sociedade e que deve ser objeto de constante análise e participação em audiências públicas.
5. REFERÊNCIAS
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[1] Mestra em Ciências Ambientais e Saúde pela PUC GO, Especialista em Direito do Consumidor, Técnica em Defesa do Consumidor do Procon -TO, Advogada e Professora da Faculdade Serra do Carmo - FASEC. e-mail [email protected].
Graduando em Direito, pela Faculdade Serra do Carmo – FASEC. Servidor público do poder Executivo do Estado do Tocantins. e-mail: [email protected]
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COSTA, DORVILÊ SOBRINHO. A lei do superendividamento e a necessidade de regulamentação do mínimo existencial Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 jun 2022, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58690/a-lei-do-superendividamento-e-a-necessidade-de-regulamentao-do-mnimo-existencial. Acesso em: 23 dez 2024.
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